Supercondutores
Pesquisa que emprega duas técnicas complementares melhora a compreensão sobre materiais supercondutores
Os pesquisadores empregaram duas técnicas para estudar materiais supercondutores em altas temperaturas. |
15 de junho de 2009
A supercondutividade é um estado peculiar onde os elétrons se movem livremente dentro de um material sólido. Essa completa ausência de resistência elétrica pode se traduzir em cabos de transmissão de energia elétrica incrivelmente eficientes, assim como em várias outras tecnologias promissoras.
Mas há um probleminha. A maior parte dos materiais supercondutores só fica supercondutora em temperaturas extremamente baixas, frequentemente nas vizinhanças do zero absoluto (em torno de -273°C). Para resfriar um material o bastante para que seus elétrons se tornem “descolados” de seus átomos, os cientistas precisam banhá-lo continuamente em hélio líquido, uma tarefa dispendiosa e complicada.
Nos anos 1980, os pesquisadores decobriram grupos de materiais que perdem a resistência elétrica em temperaturas bem mais quentes, de até -218°C. Muitos desses supercondutores de “alta-temperatura” podem ser resfriados com nitrogênio líquido,
que ferve a escassos -196°C e é muito mais barato e fácil de usar do que o hélio líquido.
Mas o Santo Graal da supercondutividade seria um material que perdesse a resistência à temperatura ambiente. A fim de descobrir tal prêmio, no entanto, os pesquisadores precisam compreender melhor de que maneira funcionam os supercondutores de alta-temperatura atuais.
As duas técnicas complementares
Um grupo de cientistas, financiado pela Divisão de Pesquisa de Materiais da Fundação Nacional de Ciências (National Science Foundation = NSF), realizou uma pesquisa que abordou a supercondutividade em altas temperaturas por dois caminhos diferentes. Os professores Vidya
Madhavan e Hong Ding do Boston College, juntamente com uma equipe internacional de pesquisadores, usou tanto a microscopia de tunelamento (scanning tunneling microscopy = STM), como a espectroscopia fotoelétrica de resolução angular (angle-resolved photo-electron spectroscopy = ARPES) para estudar o mesmo material, uma cerâmica feita de camadas de óxidos de cobre. Os resultados obtidos foram relatados em Physical Review Letters.
“A STM nos informa acerca das propriedades eletrônicas do material no nível atômico”, explica Madhavan. “Enquanto isso, a ARPES nos dá informações acerca do momento dos elétrons, ou seja, suas velocidades e direções. Empregando essas duas técnicas complementares, podemos obter um quadro mais completo do que acontece”.
De acordo com Madhavan, a STM é simples em conceito: “Se aproxima a ponta de um fio metálico bem para perto da superfície do material em estudo e então se aplica uma pequena voltagem”, ela descreve. Por causa da proximidade entre o material e o fio, no intervalo de poucos Ångstroms entre si, a mecânica quântica entra em cena.
“Embora os elétrons não tenham energia suficiente para saltar da superfície para o fio e vice-versa, a mecânica quântica diz que existe uma possibilidade finita de descobrir um elétron do outro lado”, explica
Madhavan. “Isto se chama tunelamento quântico e nós usamos isso para conduzir um sinal elétrico que pode ser medido como uma corrente”.
Portanto, a corrente elétrica é sensível à distância entre a amostra e a ponta. “Se houver calombos causados por átomos individuais, a distância muda enquanto se escaneia”, diz Madhavan. “Podemos medir essas mudanças e plotar a topografia do material. É como se passassemos o dedo por uma superfície áspera”.
Medindo o Momento
A STM busca a posição de grande número de elétrons no espaço real. Em contraste, a ARPES obtem informação sobre a média das velocidades e direções de um grande número de elétrons no espaço.
A ARPES funciona segundo o princípio fotoelétrico. Uma corrente de fótons atinge a superfície do material, empurrando para fora elétrons, de forma que se pode medir sua energia e momento. Os pesquisadores podem empregar esses dados para calcular o momento dos elétrons dentro do material.
“Pense em uma bola rolando por uma rua”, explica Madhavan. “Ela tem uma velocidade, o que implica em uma direção de movimento. O momento é a velocidade de um objeto vezes sua massa, de forma que o momento da bola tem uma direção, já que sua velocidade tem uma direção”.
A mesma coisa se verifica para elétrons que se movem em um sólido, de acordo com Madhavan. “Se pudermos definir a direção e a velocidade com que os elétrons estão se movendo, conheceremos o momento”, disse ela.
“Uma vez que o material é cristalino, seus átomos ficam dispostos em um padrão ordenado que se repete”, prossegue
Madhavan. “Cada um deles atrais ou repele os elétrons negativos, de forma que estes “sentem” coisas diferentes quando se movem em diferentes direções. Seus momentos – ou seja, como eles se comportam em diferentes direções – é realmente muito importante”.
Gaps e Pseudogaps
Os cientistas usaram tanto STM como ARPES para estudar o Bi 2201 (Bi2Sr2-xLaxCuO6+d),
um óxido de bismuto-cobre com alguns átomos de estrôncio substituídos por lantânio. Eles encontraram indícios de dois gaps de energia diferentes no material.
Um gap de energia é uma faixa de energias que os elétrons não podem ter, segundo as regras da mecânica quântica. Para os supercondutores, esse gap é bem conhecido e diretamente relacionado com a TC, a temperatura crítica, abaixo da qual o material perde a resistência.
“Acima da TC não se espera, normalmente, encontrar outro gap de energia”, diz Madhavan.
“Mas em alguns materiais, se encontra um segundo gap que exclui parte dos elétrons – isso é chamado de pseudogap, porque não é um gap completo”. Com esta pesquisa, a equipe estava tentando compreender os pseudogaps.
“Por longo tempo, as pessoas imaginavam que se poderia começar com um material em alta temperatura e ir o resfriando até a fase de pseudogap”, relata
Madhavan. “Então, na medida em que se resfriasse mais ainda, até a TC, o material entraria em uma fase onde só se observaria supercondutividade”.
Porém, tanto a STM como a ARPES mostraram sinais de que existe uma fase de pseudogap dentro da fase de supercondutividade. “Isso significa que as duas fases estão, de alguma forma, competindo e coexistindo”, observa Madhavan. “É possível que os mesmos princípios físicos que levam ao pseudogap, tambem levem à supercondutividade, caso no qual não se pode ter uma sem o outro”.
Em busca dos Pseudogaps
No futuro, a equipe espera procurar por pseudogaps na fase supercondutora de outros materiais de óxidos de cobre. “Eu não quero afirmar que a compreensão do pseudogap vai nos ajudar a desenvolver supercondutores de temperatura ambiente”, acautela Madhavan. “Por outro lado, isso pode nos ajudar a projetar um tipo diferente de material que possa se tornar, eventualmente, um supercondutor de temperatura ambiente”.
Porém Madhavan não está motivada pela utilidade de sua pesquisa. “As aplicações caem do céu inesperadamente a partir desse tipo de descoberta”, diz ela. “Quando não se está buscando nada em particular, se pode, de repente, descobrir uma maneira completamente diferente de usá-la”.
“A razão pela qual estamos tão interessados em compreender o que acontece com esses materiais, é curiosidade acerca do mundo real. É bonito quando se descobre como alguma coisa funciona na natureza”.
-Artigo original (em inglês) de |
Holly Martin, National Science Foundation |
Pesquisadores
Hong Ding
Ziqiang Wang
Vidya Madhavan
Instituições e Organizações Relacionadas
Departamento de Física do Boston College
Centro de Radiação Synchrotron do Winsconsin
Laboratório de ARPES da Universidade Tohoku
Instituto de Física e Laboratório Nacional de Matéria Condensada, Beijing
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