A Evolução dos Ruídos: do Satanismo digital ao que somos

“Abra a última imagem JPEG baixada e salve-a como uma nova imagem JPEG, com um pouco mais de compressão. Repita 600 vezes“. O resultado, ilustrado em Generation Loss, é claro: ao final a imagem se torna irreconhecível, enquanto uma espécie de ruído toma conta de tudo. Um “ruído digital”.

O formato de imagem JPEG, utilizado em todo lugar desde as imagens que você confere pela rede até as câmeras digitais, é um formato de compressão “lossy“, com perdas. Ao contrário das propagandas (que, surpresa, não vendem sempre a verdade), “digital” não é necessariamente sinônimo de precisão e fidelidade absolutas.

Em troca de reduzir o tamanho do arquivo, muita informação é descartada em uma imagem JPEG, jogada fora mesmo, embora isso seja comumente difícil de notar. Afinal, o formato foi definido justamente para descartar as partes da imagem que menos nos chamam a atenção – por exemplo, temos uma sensibilidade maior a contrastes de brilho do que de cor, e a  compressão JPEG costuma simplesmente descartar metade das informações de cor de uma imagem.

A lição é clara e elementar. Nunca “re-salve” uma imagem no formato JPEG, se você a recebeu como JPEG, copie ou transfira o arquivo, mas evite salvá-lo novamente neste formato com perdas. Embora os efeitos sejam muito menos destacados que os exibidos na imagem – sem aumentar a compressão, e re-salvando uma imagem 2000 vezes, os resultados não são tão drásticos – eles estão lá.

Talvez tão disseminado quantos as milhares de imagens JPEG que você deva ter em seu computador são os arquivos MP3. Este formato fabuloso que permitiu reduzir o tamanho de um arquivo de música e revolucionou toda uma indústria de entretenimento também é… lossy. Ao saber disto você já deve ter adivinhado para onde vamos.

O que acontece se você abrir um arquivo MP3 e reconvertê-lo 600 vezes? Ocorre algo assim:

A música é inconfundível (como não?), mas os ruídos e sons estridentes dominam quase tudo, uma tortura auditiva. Melhor (ou pior) que isso, só reconverter “The Number of the Beast” do Iron Maiden… 666 vezes, em uma espécie de satanismo digital. Clique abaixo para conferir:

666.gif

Você pode escutar os sussurros do capeta? Provavelmente não, mas todos estes ruídos e experiências podem significar muito mais do que imagina. “Read on” para continuar conosco.

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A Mãe de todas as Demos

Não, esse não é um texto sobre satanismo, é apenas um anglicismo. No vídeo acima que andou circulando pela rede nos últimos dias, a Microsoft mostra como pode ser o futuro da interação com computadores em apenas 10 anos. É curioso, embora não seja nada tão revolucionário.

Porque se você quiser uma demonstração revolucionária e presciente, dificilmente encontrará algo tão embasbacante quanto a “mãe de todas as demos“, conduzida por Douglas C. Engelbart em 9 de dezembro de 1968, há pouco mais de 40 anos. Você a confere abaixo:

Nesta apresentação conduzida em São Francisco a uma platéia de 1.000 profissionais de computação, Engelbart não só exibiu pela primeira vez um mouse, que a propósito, ele a sua equipe inventaram. Também é apresentada a metáfora da tela de computador como uma folha de papel, mas com texto que pode ser livremente alterado e exibido de diferentes formas, relacionados através de links e hyperlinks, correio eletrônico e muito mais… incluindo como a própria demonstração é feita com teleconferência. A cabeça falante com um headset nos é hoje familiar, e lá estava há 40 anos atrás. Se você preferir, a apresentação dividida em clips com alguns comentários sobre seu conteúdo também pode ser vista aqui.

O nome do sistema revolucionário? NLS, ou “oN-Line System”. Praticamente todas as interações que temos com computadores e todas as “revoluções”, de uma interface gráfica com resposta instantânea à internet e a explosão de mensagens instantâneas e o uso de webcams são exibidas ou prenunciadas na mãe de todas as demos.

Quatro décadas podem parecer um longo tempo, e no entanto, a velocidade com que essas tecnologias passaram a fazer parte da vida de centenas de milhões de pessoas diariamente é completamente fabulosa, e só nossa familiarização com um mundo em mudança exponencialmente acelerada pode dar a impressão de que do laboratório até o seu bolso em um celular, 40 anos seja tempo demais. Everything’s amazing and nobody’s happy.

Apesar de toda sua originalidade, o NLS de Engelbart era notoriamente difícil de usar – sua interface não era totalmente gráfica, apenas parte dela – e o centro de pesquisas no Stanford Research Institute que criou acabou no fim da década de 1970. Vários dos especialistas que participaram da experiência contudo rumaram para outras companhias que se tornariam mais conhecidas, em particular, um outro centro de pesquisas, o Xerox PARC, mais amplamente reconhecido como a origem da interface gráfica. Que por sua vez só se tornaria popular com o Macintosh da Apple e de fato onipresente com o Windows 3.11 da Microsoft.

Steve Jobs talvez seja mais reconhecido por suas apresentações – merecidamente, a do Macintosh é incrível, completa com ‘Chariots of Fire‘:

Mas a de Engelbart em 1968, embora não tão emocionante, é a mãe de todas as demos. Estava mesmo à frente da de Jobs em 1984, incluindo conectividade e teleconferência em tempo real.

Além destes comentários sobre a história da computação, não resisto escrever que curiosamente, pouco depois da demonstração de Engelbart, uma outra exploração de idéias heterodoxas também teve lugar no SRI. No início dos anos 1970 várias pesquisas foram realizadas sobre fenômenos paranormais, incluindo mesmo um notório entortador de talheres israelense, um tal de Uri Geller. Os pesquisadores Russel Targ e Harold Puthoff investigariam mesmo a aplicação da parapsicologia para fins militares. Esta abordagem heterodoxa do SRI é uma das inspirações para a fictícia Iniciativa Dharma de LOST.

Enquanto muitos à época pudessem acreditar que tais pesquisas paranormais mudariam o mundo, o que não ocorreu, talvez não imaginassem que alguns anos antes Engelbart já havia demonstrado como profundas mudanças sociais e culturais ainda estariam por ocorrer através da tecnologia de computação. Ainda não temos telepatia, mas podemos nos comunicar em teleconferência com pessoas do outro lado do mundo instantaneamente a custo baixíssimo.

Certa ferramenta de busca também surgiria na Universidade de Stanford, e através dela, utilizando um mouse e clicando e hyperlinks, é fácil descobrir como entortar talheres.

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