“Quem jamais te esqueceria”

Assista a esse vídeo na página no Youtube em alta resolução, ao som de “Terra de Caetano Veloso, e relembre a antiga abertura do programa “Planeta Terra” na TV Cultura. Lástima das lástimas, não há versão online daquela abertura, mas vai aqui um trecho desta bela música de Caetano (clique “play” ao mesmo tempo nos dois vídeos, já que o da NASA não possui áudio, e aproveite):

Capturadas pela missão STS-119 do ônibus espacial Discovery que acabou de retornar ao planeta ontem, a visão da esfera azul coberta de nuvens como fundo para a Estação Espacial Internacional flutuando placidamente deve inspirar obras tão ou mais belas que músicas como a de Caetano. Claro que você tem que assistir às imagens em alta resolução.

Lá está uma residência permanente de seres humanos, a centenas de quilômetros de altura, ainda ligada ao poço gravitacional do planeta mas prenunciando um dos passos mais importantes para que as criaturas que vivem lá embaixo explorem mundos distantes. Criaturas que por eventos tão fortuitos – e, tão bem-afortunados – desenvolveram a capacidade de compreender e apreciar estas belezas de seu mundo e por isso mesmo estejam ansiosas para conhecer as que estejam além.

E que algum dia, esperamos não tão distante, o “errante navegante”, “por mais distante” no espaço, jamais deva esquecer das belezas desta Terra. Que as granulosas e primitivas imagens que Caetano viu na cela de uma prisão nunca sejam esquecidas, ainda que sejam suplantadas por vídeos em alta resolução partilhados no Youtube em questão de poucos dias depois de capturadas.E que seja um paraibano errante navegando com uma morena em um planeta distante que se lembre da Terra. Compreender a natureza através da ciência pode ser o caminho para apreciar suas belezas de formas que podem inspirar mesmo os mais sonhadores dos poetas. [via Fogonazos]

Tomografia de brinquedo

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“Esta é a tomografia computadorizada de um pequeno coelho de pelúcia. O coelho chegou à radiologia com uma história de constipação. Um exame abdominal foi negativo para sons intestinais e muitas massas pequenas foram apalpadas. Na tomografia podemos visualizar muitas esferas menores e densas no abdômen inferior consistentes com “bolinhas de coelho” e também consistentes com as bolinhas comumente deixadas em pequenos animais de pelúcia durante a fabricação”.

Clique na imagem para conferir o vídeo tridimensional do bicho estufado, e há mais, muito mais (sempre com vídeos sensacionais) em Radiologyart, um trabalho do estudante de medicina Satre Stuelke. “Dedicado à visualização mais profunda de diversos objetos que possuem uma singular importância cultural na sociedade moderna, este projeto pretende plantar uma semente de criatividade científica nas mentes de todos aqueles dispostos a participar”, define Stuelke. [via Howtoons]

A Assassina do Cotonete

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We won’t get fooled again!” – proclamam os Who ao início de cada episódio de CSI Miami. “Não nos enganarão de novo”. A vida real, entretanto, não é tão singela como Horatio Caine pinta. A polícia alemã acaba de por fim a um dos casos que lhes vem intrigande desde 1993. Naquele ano, uma mulher de 63 anos apareceu estrangulada na cidade de Idar-Oberstein sem que o assassino deixasse mais pistas que um pequeno traço de DNA.

Durante os anos seguintes, e em diferentes lugares da Europa, o mesmo rastro de DNA, pertencente a uma mulher, apareceu em até 17 assassinatos não resolvidos, sem que a polícia fosse capaz de encontrar um padrão de comportamento.

Quem era aquela misteriosa assassina procurada durante mais de quinze anos pela Interpol? A polícia científica acaba de chegar ao final da meada: a resposta está nos cotonetes utilizados pelos agentes para tomar amostras nas cenas do crime. Todos eles saíram da mesma fábrica e foram utilizados para investigar os 17 assassinatos.

Quase com toda probabilidade, a amostra genética da misteriosa mulher sem rosto pertence a uma trabalhadora que, quer por acidente ou por negligência, contaminou os bastões de algodão com seu próprio DNA durante o processo de fabricação.

Se este fosse um episódio de CSI, Horatio colocaria os óculos e pronunciaria alguma grande sacada.

Link: El fantasma de Heilbronn (DW) / Vía: Perogrullo

Tradução autorizada do imperdível Fogonazos

A Evolução dos Ruídos: do Satanismo digital ao que somos

“Abra a última imagem JPEG baixada e salve-a como uma nova imagem JPEG, com um pouco mais de compressão. Repita 600 vezes“. O resultado, ilustrado em Generation Loss, é claro: ao final a imagem se torna irreconhecível, enquanto uma espécie de ruído toma conta de tudo. Um “ruído digital”.

O formato de imagem JPEG, utilizado em todo lugar desde as imagens que você confere pela rede até as câmeras digitais, é um formato de compressão “lossy“, com perdas. Ao contrário das propagandas (que, surpresa, não vendem sempre a verdade), “digital” não é necessariamente sinônimo de precisão e fidelidade absolutas.

Em troca de reduzir o tamanho do arquivo, muita informação é descartada em uma imagem JPEG, jogada fora mesmo, embora isso seja comumente difícil de notar. Afinal, o formato foi definido justamente para descartar as partes da imagem que menos nos chamam a atenção – por exemplo, temos uma sensibilidade maior a contrastes de brilho do que de cor, e a  compressão JPEG costuma simplesmente descartar metade das informações de cor de uma imagem.

A lição é clara e elementar. Nunca “re-salve” uma imagem no formato JPEG, se você a recebeu como JPEG, copie ou transfira o arquivo, mas evite salvá-lo novamente neste formato com perdas. Embora os efeitos sejam muito menos destacados que os exibidos na imagem – sem aumentar a compressão, e re-salvando uma imagem 2000 vezes, os resultados não são tão drásticos – eles estão lá.

Talvez tão disseminado quantos as milhares de imagens JPEG que você deva ter em seu computador são os arquivos MP3. Este formato fabuloso que permitiu reduzir o tamanho de um arquivo de música e revolucionou toda uma indústria de entretenimento também é… lossy. Ao saber disto você já deve ter adivinhado para onde vamos.

O que acontece se você abrir um arquivo MP3 e reconvertê-lo 600 vezes? Ocorre algo assim:

A música é inconfundível (como não?), mas os ruídos e sons estridentes dominam quase tudo, uma tortura auditiva. Melhor (ou pior) que isso, só reconverter “The Number of the Beast” do Iron Maiden… 666 vezes, em uma espécie de satanismo digital. Clique abaixo para conferir:

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Você pode escutar os sussurros do capeta? Provavelmente não, mas todos estes ruídos e experiências podem significar muito mais do que imagina. “Read on” para continuar conosco.

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“Mas isso eu já sabia!”

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As ciências sociais não revelam nenhuma idéia ou conclusão que não possa ser encontrada em qualquer enciclopédia de ditados… Dia após dia cientistas sociais perambulam pelo mundo. E dia após dia descobrem que o comportamento das pessoas é bem aquilo que você esperaria”. Ou pelo menos é como Cullen Murphy, editor do The Atlantic, expressou suas idéias a respeito.

Na semana passada, Ruth de Aquino, diretora da sucursal da revista Época no Rio de Janeiro, opinou basicamente o mesmo, com acusações e questionamentos ainda mais graves a que Carlos Hotta já respondeu em uma excelente réplica. Dela, nos atenhamos ao comentário de Aquino de que os resultados de pesquisas “científicas” (com aspas) seriam para “dar risada”, com resultados que “variam do óbvio ao inverossímil e preconceituoso“. Óbvio?

Em 1949 o historiador Arthur Schlesinger Jr reagiu de forma similar aos resultados obtidos por esses tais “cientistas” depois de meticulosas pesquisas com soldados durante a Segunda Guerra Mundial. “Demonstrações claríssimas”, ele disse, de simples bom senso. Perda de tempo.

Paul Lazarsfeld, no mesmo ano, listou o que seriam algumas das descobertas apresentadas em The American Soldier, obra descomunal de dois volumes:

  1. Soldados melhor educados sofreram mais problemas de ajuste que os menos educados (Intelectuais eram menos preparados para o stress das batalhas que as pessoas comuns).
  2. Soldados do sul lidaram melhor com o clima quente da Ilha South Sea do que os soldados no norte. (Sulistas estavam mais acostumados ao clima quente).
  3. Soldados brancos estavam mais ansiosos em serem promovidos a oficiais do que soldados negros. (Anos de opressão desmotivam suas vítimas).
  4. Negros do sul preferiam oficiais do sul ao invés de do norte (porque oficiais do sul eram mais experientes e habilitados a interagir com negros).

Apenas bom senso, não? Leia mais uma vez esses itens, são, como Aquino bem escolheu o termo… são o óbvio. Seria realmente necessário um dos maiores esforços já empreendidos no campo das ciências sociais, compreendendo o período desde Pearl Harbor até o final da guerra em que mais de duzentos questionários diferentes, muitos dos quais com mais de 100 perguntas, foram ministrados a mais de meio milhão de soldados? Apenas para descobrir… o óbvio? Quanta perda de tempo!

Pois bem. Como Lazarsfeld completou logo depois, “todos esses itens são exatamente o oposto do que foi de fato descoberto“. Ráááá! Pegadinha do Lazarsfeld. O esforço científico descomunal em uma das mais importantes pesquisas sobre o comportamento humano descobriu que… soldados com pouca educação eram menos preparados para lidar com o rigor da batalha. Aqueles intelectuais se adaptaram melhor. Sulistas não se ajustaram melhor ao clima tropical. Negros estavam ainda mais motivados a serem promovidos que brancos, e preferiam oficiais do norte.

Claro, pode lhe parecer que esta foi uma pegadinha maliciosa em que escolhemos itens contrários ao óbvio, opostos ao bom senso, apenas para invertê-los e sacanear nossos prezados leitores. Mas lembre-se que ao historiador Schlesinger, que leu a obra sem esta pegadinha, os resultados de fato também lhe pareceram óbvios.

“Se tivéssemos mencionado os resultados verdadeiros da investigação no início, [como ocorreu com Schlesinger], o leitor também os teria classificado como ‘óbvios’. Obviamente algo está errado com todo o argumento sobre obviedade… Já que todo tipo de reação humana é concebível, é de enorme importância conhecer que reações ocorrem com maior frequência e sob quais condições“. Já escrevia Lazarsfeld em 1949.

E como podemos estar realmente seguros de que os itens lhe pareceriam óbvios não importa tanto quais fossem? Porque, obviamente, este efeito também já foi estudado pelas ciências sociais. É o preconceito retrospectivo, uma inclinação que temos a superestimar nossa capacidade de adivinhar algo depois que este algo já ocorreu. Há uma série de estudos publicados sobre o “hindsight bias“.

Conhecer o preconceito retrospectivo tem aplicações mais amplas e importantes do que admoestar jornalistas e leigos que desmereçam o valor de pesquisas sociais. Julgamentos sobre negligência podem ser um tanto injustos uma vez que tanto o juiz como o júri podem ser vulneráveis a tal preconceito. Mesmo eventos como os ataques de 11/9 parecem “óbvios” depois que ocorreram.

Porque, como diz o ditado americano, “hindsight is 20/20”.

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Referência (de onde esta nota é um semi-plágio)
Did You Know It All Along? Excerpt from: David G. Meyers, Exploring Social Psychology. New York: McGraw-Hill, 1994, pp.15-19.

A Mãe de todas as Demos

Não, esse não é um texto sobre satanismo, é apenas um anglicismo. No vídeo acima que andou circulando pela rede nos últimos dias, a Microsoft mostra como pode ser o futuro da interação com computadores em apenas 10 anos. É curioso, embora não seja nada tão revolucionário.

Porque se você quiser uma demonstração revolucionária e presciente, dificilmente encontrará algo tão embasbacante quanto a “mãe de todas as demos“, conduzida por Douglas C. Engelbart em 9 de dezembro de 1968, há pouco mais de 40 anos. Você a confere abaixo:

Nesta apresentação conduzida em São Francisco a uma platéia de 1.000 profissionais de computação, Engelbart não só exibiu pela primeira vez um mouse, que a propósito, ele a sua equipe inventaram. Também é apresentada a metáfora da tela de computador como uma folha de papel, mas com texto que pode ser livremente alterado e exibido de diferentes formas, relacionados através de links e hyperlinks, correio eletrônico e muito mais… incluindo como a própria demonstração é feita com teleconferência. A cabeça falante com um headset nos é hoje familiar, e lá estava há 40 anos atrás. Se você preferir, a apresentação dividida em clips com alguns comentários sobre seu conteúdo também pode ser vista aqui.

O nome do sistema revolucionário? NLS, ou “oN-Line System”. Praticamente todas as interações que temos com computadores e todas as “revoluções”, de uma interface gráfica com resposta instantânea à internet e a explosão de mensagens instantâneas e o uso de webcams são exibidas ou prenunciadas na mãe de todas as demos.

Quatro décadas podem parecer um longo tempo, e no entanto, a velocidade com que essas tecnologias passaram a fazer parte da vida de centenas de milhões de pessoas diariamente é completamente fabulosa, e só nossa familiarização com um mundo em mudança exponencialmente acelerada pode dar a impressão de que do laboratório até o seu bolso em um celular, 40 anos seja tempo demais. Everything’s amazing and nobody’s happy.

Apesar de toda sua originalidade, o NLS de Engelbart era notoriamente difícil de usar – sua interface não era totalmente gráfica, apenas parte dela – e o centro de pesquisas no Stanford Research Institute que criou acabou no fim da década de 1970. Vários dos especialistas que participaram da experiência contudo rumaram para outras companhias que se tornariam mais conhecidas, em particular, um outro centro de pesquisas, o Xerox PARC, mais amplamente reconhecido como a origem da interface gráfica. Que por sua vez só se tornaria popular com o Macintosh da Apple e de fato onipresente com o Windows 3.11 da Microsoft.

Steve Jobs talvez seja mais reconhecido por suas apresentações – merecidamente, a do Macintosh é incrível, completa com ‘Chariots of Fire‘:

Mas a de Engelbart em 1968, embora não tão emocionante, é a mãe de todas as demos. Estava mesmo à frente da de Jobs em 1984, incluindo conectividade e teleconferência em tempo real.

Além destes comentários sobre a história da computação, não resisto escrever que curiosamente, pouco depois da demonstração de Engelbart, uma outra exploração de idéias heterodoxas também teve lugar no SRI. No início dos anos 1970 várias pesquisas foram realizadas sobre fenômenos paranormais, incluindo mesmo um notório entortador de talheres israelense, um tal de Uri Geller. Os pesquisadores Russel Targ e Harold Puthoff investigariam mesmo a aplicação da parapsicologia para fins militares. Esta abordagem heterodoxa do SRI é uma das inspirações para a fictícia Iniciativa Dharma de LOST.

Enquanto muitos à época pudessem acreditar que tais pesquisas paranormais mudariam o mundo, o que não ocorreu, talvez não imaginassem que alguns anos antes Engelbart já havia demonstrado como profundas mudanças sociais e culturais ainda estariam por ocorrer através da tecnologia de computação. Ainda não temos telepatia, mas podemos nos comunicar em teleconferência com pessoas do outro lado do mundo instantaneamente a custo baixíssimo.

Certa ferramenta de busca também surgiria na Universidade de Stanford, e através dela, utilizando um mouse e clicando e hyperlinks, é fácil descobrir como entortar talheres.

Neurocientista termina Mario Galaxy

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É o que avisa o post mais recente do novo blog de Suzana Herculano Houzel, que dirige o Laboratório de Neuroanatomia Comparada na UFRJ e é uma divulgadora científica daquelas que nos dá prazer em saber ler português.
Não perca: A neurocientista de plantão
[Imagem de cérebro azul gigante de Bruxelas via Nerdcore]

Os Gritos do Calor e os Espíritos do Tubo de Rijke

Com vocês, o alto e agonizante som de uma grade de metal aquecida dentro de um tubo. É uma demonstração do incrível mas pouco conhecido tubo de Rijke.

Descoberto em 1859 pelo físico holandês PL Rijke, dificilmente poderia ser mais fácil de reproduzir. Basta dispor de um tubo de certo comprimento, aberto em ambas as extremidades, inserir uma grade de metal na sua metade inferior e aquecê-la até que fique incandescente. E pronto. No vídeo acima foi usado um tubo de vidro para facilitar a visualização, mas qualquer tubo que resista ao calor serve.

Ao retirar a fonte de calor, um som muito alto e com um comprimento de onda igual ao dobro do tamanho do tubo será emitido enquanto a grade estiver suficientemente quente. Parece mágica – ou magia negra! – mas é apenas um efeito termoacústico, explicado alguns anos depois, em 1879, pelo Lorde Rayleigh.

A grade aquece o ar que tende a subir por convecção, mas enquanto ele o faz há uma interação entre a pressão cambiante no interior do tubo e a freqüência de ressonância do mesmo. Forma-se uma onda estacionária que reforça a si mesma a cada ciclo, enquanto ar quente e ar frio entra e sai por ambas as extremidades. O resultado é o grito do tubo de Rijke. Saber disso permite que se produza um som contínuo se usarmos uma resistência elétrica para aquecer a grade. Também leva a aplicações práticas em combustores que aproveitam as ondas estacionárias em seu interior para queimas mais eficientes e que poluam menos.

Interessante, não? Pois há mais. Muito mais, de espíritos e fantasmas à religião.

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Darwinspeak

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Não bastou formular a Teoria da Evolução. Nem que sua teoria estivesse correta fosse válida. Charles Darwin promoveu-a acima de tudo como um formidável escritor. A Origem das Espécies (PDF) é uma leitura surpreendentemente acessível, o que só se torna mais impressionante considerando sua relevância. Em retrospecto, que seja tanto seminal quanto acessível não deve ser mero acaso, isto é, que algo tão revolucionário seja exposto de forma compreensível a todo leitor educado com algum esforço explica em grande parte seu sucesso.

E que sucesso. Ben Zimmer, do Visual Thesaurus, vasculhou o Oxford English Dictionary para descobrir as contribuições do naturalista inglês para o léxico de sua língua. Darwin foi o primeiro a utilizar nada menos que 144 novas palavras. Em comparação, é em torno de um décimo das contribuições de Shakespeare. Nada desprezível. Abraham Lincoln, nascido no mesmo dia que Charles, e muito mais famoso por sua eloquência, é tido como fonte primária de uma única palavra (e uma nada notável, “Michigander“, um sujeito de Michigan).

Além de termos como seleção natural, filogenia e fertilização cruzada, o inglês que celebramos este ano levou a palavra “alfalfa” da Espanha para os anglófonos, garantindo um nome para um dos Batutinhas, assim como “rodeo”.

Vale notar que “a sobrevivência do mais forte”, como é mais conhecida em português, ou “a sobrevivência do mais bem-adaptado”, são expressões que Charles curiosamente não cunhou. O original em inglês é de Herbert Spencer, que comentou a seleção natural e sua relação com idéias econômicas.

A maior surpresa encontrada por Zimmer é sem dúvida como Darwin foi o primeiro a utilizar uma palavra para descrever os críticos religiosos de suas teorias. Em 1859, escreveu em uma carta:

“Que piada seria se eu lhe desse um tapinha nas costas quando ataca alguns criacionistas obstinados”.

Isso mesmo. Charles Robert Darwin foi o primeiro a utilizar o termo “criacionista”. “Creationism”, ou Criacionismo, já havia sido cunhado e Darwin não deve ter precisado de muito esforço para o neologismo. Mas ele o fez.

Mais algumas palavras cunhadas por Darwin podem ser conferidas nesta lista. Como Ben nota, “quem diria que Darwin foi também um pioneiro na evolução das palavras?” [via blog do irmão do Ben Zimmer]

Reconstrução do mecanismo de Anticitera

O vídeo do modelo de Michael Right do mecanismo de Anticitera já é um dos mais vistos do canal de vídeo da NewScientist. Não é por menos, esta ilustre desconhecida peça do tamanho de uma caixa de sapatos é provavelmente um dos artefatos arqueológicos mais valiosos em todo o mundo.

Com mais de dois milênios de idade, o mecanismo inclui uma miríade de engrenagens, possivelmente um conjunto diferencial, e parte de mostradores com gradações bem definidas. É o mais antigo exemplo de um instrumento com mostrador. A sofisticação técnica envolvida no trabalho literalmente de relojoaria só seria vista novamente mais de mil anos depois.

Grosso modo, seria mesmo como encontrar evidências de aviões a jato na América pré-colombiana. Absurdo, inacreditável, e no entanto, real. Historiadores romanos de fato deixaram referência a mecanismos dessa sofisticação – e de fato, mesmo exatamente ao mecanismo de Anticitera – mas os historiadores modernos presumiam que eram exageros ou fantasias.

Em 79 AC, por exemplo, o orador e político romano Marco Túlio Cícero foi a Rodes, provável cidade onde o mecanismo de Anticitera foi construído, e descreveu em De natura deorum II:

“Suponha que um viajante leve a Cítia ou Bretanha o planetário recentemente construído por nosso amigo Posseidônio, que a cada revolução reproduz os mesmo movimentos que têm lugar nos céus a cada dia e noite o Sol, a Lua e os cinco planetas. Irá qualquer nativo duvidar que este planetário era o trabalho de um ser racional?”

A descrição de Cícero pareceria fantasia, mas agora indica a existência muito plausível de uma tradição de construção de planetários em Rodes. Por mais inacreditável que pareça, o mecanismo realmente existiu.

Escrevi um texto há alguns anos recheado de detalhes sobre o Mecanismo de Anticitera, e também traduzi na ocasião o artigo original de Derek Price a respeito. O artigo de Price é a referência a todos os interessados pelo mecanismo.

Carl Sagan costumava repetir que simplesmente descobrir que teríamos companhia em algum outro ponto do Universo já seria uma das informações mais importantes já descobertas pela ciências. Teríamos confirmação de que não somos únicos, que outras inteligências sobrevivem além da nossa, a despeito da capacidade tão tragicamente tentadora da auto-destruição. É aqui que reside a importância, e o alerta, do Mecanismo de Anticitera.

Como Price ponderava há exatamente meio século:

“É um pouco assustador saber que pouco antes do declínio de sua grande civilização os gregos antigos chegaram tão perto de nossa era, não só em seu pensamento, mas também em sua tecnologia científica”.

Talvez não seja mera coincidência que tão pouca atenção tenha sido dada ao mecanismo. Se há uma verdade inconveniente é que a ciência e tecnologia, por si só, não são capazes de evitar o colapso das mais sofisticadas culturas. O conhecimento fechado em caixas mágicas que leigos observam e mesmo historiadores registram com espanto e incompreensão é um indicador perigoso de que a relação simbiótica entre o avanço e acúmulo de conhecimento e a sociedade que permite tal não está andando muito bem.

Daqui a mil anos, historiadores podem descobrir surpresos que as referências de nosso tempo a caixas retangulares que como mágica acessavam um mundo de informação eram reais.

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