Um memorial ao Cesar Ades
Um dia descobri um curso de comportamento animal na Psicologia da USP. Me inscrevi e na primeira aula fui recebido por um professor sorridente e entusiasmado chamado Cesar Ades. E ele me mostrou que existe uma ciência no comportamento animal.
Um dia defini minha iniciação científica na USP com comportamento de peixes de caverna. Fui até a Psicologia e aquele professor parou tudo o que estava fazendo, que parecia bem importante, para discutir comigo meu projeto. E ele me convenceu de que receber críticas é bom.
Um dia estava no congresso de Uberlândia e me impressionei com o mesmo Cesar Ades deixando de lado as rodinhas de colegas experientes e renomados para se sentar com os estudantes e conversar. E ele me ajudou a ver que todos nós éramos importantes.
Um dia, enquanto contava animado sobre o que tinha aprendido no transcorrer do meu mestrado ao Cesar, ele me perguntou se eu não gostaria de apresentar aquilo tudo na forma de um mini-curso no encontro de etologia seguinte, em Brasília. Tremi de cima a baixo e argumentei que não tinha titulação ainda. E ele me convenceu de que ideias eram mais importantes do que títulos.
Um dia levei meus próprios alunos ao encontro de etologia e lá estava o Cesar para recebê-los com uma simplicidade tamanha que meus meninos nem acreditavam que ele era a autoridade que era. E ele me convenceu de que arrogância não combina com competência.
Um dia, outro dia, fiquei feliz de ver meu nome na mesma matéria que o dele dando palpites sobre comportamento animal, um estudo sobre cognição em primatas e cães noticiado no Correio Braziliense. E ele me fez ver que desde aquele aluno entrando na primeira aula de comportamento animal até hoje já caminhei um bocado e que ele, de uma forma ou de outra, sempre esteve por perto.
O Prof. Cesar Ades teve morte cerebral declarada ontem. Ele fará muita falta para todos nós da etologia.