A fêmea no poder IV
Ainda na época em que Hillary Clinton disputava com Barack Obama a vaga de candidato à presidência dos Estados Unidos me lembro de um comentário de que uma mulher jamais teria força para definir suas vontades políticas naquele país e que por isso seria uma péssima escolha como candidata. Discordo! Discordo e nossa fêmea poderosa é exemplo disto, a Jaçanã, Jacana jacana.
Uma aluna minha uma vez recortou a foto de uma fêmea de Jaçanã e pregou na parte de dentro do armário que lhe cabia no laboratório, à maneira daquelas fotos dos Menudos na década de 80. Era seu espelho para que todos os dias ela a visse e se lembrasse de como deveria agir. As fêmeas de jaçanã sofrem uma inversão sexual (termo obviamente cunhado por um homem) ao serem o membro dominante do bando, defenderem um território contra invasores e exigirem sexo de seus até quatro parceiros sexuais quando sentem vontade. Se o alimento começa a escassear, a jaçanã avança sobre aves competidoras como o quero-quero e o socó, pia alto, dá-lhes umas esporadas e determina quem é que manda ali. Manter o ninho em ordem, conseguir alimento para os pequenos, cuidar dos filhotes? Nada disso é tarefa assumida pela fêmea, ficando ao encargo do pai-jaçanã. A ela cabe apenas defender o território de competidores, predadores e acasalar.
Aparentemente o pé grande tem mais a ver com conseguir andar sobre plantas flutuantes do que com o comportamento da fêmea
Fonte: ibc.lynxeds.com
Em contraposição à habilidade de lidar com interesses conflitantes da abelha rainha de ontem, o que desejo hoje é que nossa presidenta demonstre a habilidade de impor suas vontades quando elas significarem um bem maior. Acima de tudo desejo a ela a sabedoria de identificar esse bem maior. Esse poder não consigo identificar animal nenhum, macho ou fêmea, que possua. Só sei de um que acha que sabe, mas em geral se engana: Homo sapiens.
A fêmea no poder III
Aos meus amigos Anderson Miranda e Denise Araújo
Abelhólogos poderosos, mas colaborativos
O estadista alemão Otto von Bismarck dizia que a política é a arte do possível. A imagem que me vem à cabeça com esta frase é a de um cabo de guerra com inúmeras pontas, em cada ponta existe um setor da sociedade, um partido político, um interesse internacional, e cada um puxa a corda em sua direção. Quer (e se julga merecedor de) ser beneficiado. Para mim, o que Bismarck quis dizer foi que, em meio a essa disputa toda, o bom político deve saber equilibrar as tensões e abrir mão do que idealizou para atingir um meio-termo que agrade à maioria. É este cenário que aguarda a presidenta Dilma Roussef e só me cabe esperar que ela compartilhe com outra fêmea a capacidade de lidar com conflitos de interesse, a abelha rainha sobre a qual falaremos nesta quarta-feira.
A Rainha passando em revista sua corte, quem é que detem o poder?
Fonte: ucanr.org
Na abelha africana, Apis melifera, as colméias são formadas por centenas de operárias, todas fêmeas, uma rainha e vários filhotes em diferentes estágios de desenvolvimento. O sistema de determinação sexual de machos e fêmeas de abelhas é diferente do nosso, fêmeas nascem de ovos fecundados pelo zangão, machos nascem de óvulos não fecundados que se desenvolvem (partenogênese). Agora faça uma forcinha para me acompanhar no raciocínio matemático! Operárias egoístas podem ter filhos machos com os quais compartilham 50% de seu DNA, no entanto, aquelas que abrirem mão de se reproduzirem para cuidar de suas irmãs mais novas, cuidarão de indivíduos 75% idênticos a si mesmas, desde que a rainha só tenha acasalado com um zangão. Como 75% é mais que 50%, é vantajoso para uma operária que a mãe tenha muitas filhas e nenhum filho. Já para a rainha, tanto filhos machos quanto fêmeas têm 50% de seu genoma. Assim, para ela o ideal seria produzir metade dos filhotes de óvulos fecundados (fêmeas) e metade partenogênica (machos). Está montado o cenário do conflito entre rainha e operárias!
Como líder e fêmea, a abelha rainha sabe que não pode prescindir de sua base aliada, de fato, ela é absolutamente dependente das operárias suas filhas. Assim sendo, a rainha frequentemente cede ao interesse de sua plebe e produz um número maior de filhas do que de filhos, sem, no entanto, deixar de produzir filhos machos. É esta capacidade de negociação e de gerenciamento de conflitos que espero que a presidenta Dilma compartilhe com as abelhas.
A fêmea no poder II
Ontem falamos de símbolos fálicos e do poder mencionando o caso da hiena malhada, nossa sociedade matriarcal de hoje é a das Elefantas. Tenho a esperança de que o poder de gerir o país nas mãos de uma mulher seja exercido de maneira muito diferente da masculina. Tenho também a esperança de que a experiência de vida da mulher, que indubitavelmente é diferente da do homem, leve a presidenta que recém tomou posse a guiar o Brasil por outras trilhas.
Em vez de força, sabedoria. Matriarca dos elefantes é definida pela capacidade de resolver os problemas do grupo
Fonte: www.arkive.org
As sociedades de machos e fêmeas de elefantes africanos, Loxodonta africana, são muito diferentes. Enquanto machos formam grupos cuja hierarquia é definida em violentos combates, as fêmeas determinam quem manda através da experiência e conhecimento. As manadas de fêmeas têm cerca de 12 membros de uma mesma família e seus filhotes, os machos vivem isolados ou em bandos unicamente masculinos. A matriarca é geralmente a fêmea mais velha da manada. É ela que identifica se outra manada é amiga ou agressiva, ela define a rota de migração evitando predadores para os filhotes e seguindo sempre por onde haverá fontes de água e alimento. A sobrevivência de todos depende da sabedoria desta fêmea.
A fêmea no poder I
Passei o ano novo em Brasília, portanto estava lá durante a posse de nossa primeira presidenta (como ela mesma gosta de se denominar). Foi daí que surgiu esta série de posts contando exemplos de sociedades animais onde a fêmea assume o papel central. Sem dúvida que em todas as espécies as fêmeas exercem um papel fundamental e que é apenas nossa visão machista (a ciência é fundamentalmente machista, basta ver a quantidade de homens e mulheres neste ramo do conhecimento) que nos faz crer no contrário, mas os exemplos que darei esta semana apresentam aqueles animais que até o mais chauvinista dos cientistas consideraria exemplos da força da fêmea. Esta será minha homenagem ao poder da mulher e um rol de esperanças acerca de como esse poder pode ser exercido de modo mais saudável do que o masculino.
Inveja do pênis? Batedoras em forma de flecha
Fonte: http://fcodantas.blogspot.com/
Durante o trajeto entre a residência presidencial do Torto e o Congresso Nacional as motociclistas que serviam de batedoras à presidenta fizeram uma coreografia que deve ter feito Freud sorrir no caixão, posicionaram as motos na forma de uma flecha. O pai da psicanálise dizia que a mulher tem inveja do pênis pelo símbolo de poder que ele traz. Batedoras em forma de seta foi o falo simbólico que a presidenta ganhou no dia da posse, nem sei se de propósito ou inconscientemente. No entanto, não é só ela que aposta em símbolos fálicos na hora do poder, a hiena manchada faz o mesmo.
Avaliação do status hierárquico entre duas fêmeas de hiena manchada através do tamanho do pseudo-pênis
Fonte: http://www.myspace.com/herberthyena
Hienas manchadas, Crocuta crocuta, formam bandos de até 90 indivíduos (dependendo da abundância de presas) liderados por uma fêmea. Elas ocupam territórios amplos delimitados por marcas de cheiro e gritos, a divisão de tarefas entre os indivíduos é definido por uma hierarquia onde as fêmeas posicionam-se no topo. A fêmea mais dominante, ou alfa, em geral não é definida pela agressividade como na maioria das espécies patriarcais, mas pela capacidade de se articular com outros membros. Eis aí algo a se esperar da nossa presidenta. O símbolo máximo do poder da fêmea dominante vêm do pseudo-pênis, um clitóris aumentado que pode atingir 15 cm de comprimento. Fêmeas mais no alto da hierarquia de poder têm dificuldades na vida familiar. O mesmo órgão que define poder traz à fêmea uma grande dificuldade em dar à luz sua prole, já que os filhotes terão de sair através do estreito e longo canal ao longo do pseudo-pênis, resultando em muitos natimortos.