Islamismo na era espacial


Como muçulmano devoto e primeiro astronauta da Malásia, o xeique Muszaphar Shukor tem um problema: para que direção deve apontar em suas orações diárias quando estiver na Estação Espacial Internacional, se a Meca (ou melhor, a estação) se move a quase 30.000km/h, em quase 16 voltas pelo planeta ao dia? Ainda que ele aponte inicialmente na direção correta, ao final das preces já estará apontando para algo completamente diferente. E isso sem levar em conta as dificuldades de como definir qual seria a “direção correta” em qualquer momento: deveria ser calculado a partir de uma projeção da posição da estação no solo, ou diretamente da posição da estação em órbita; deveria percorrer a superfície da Terra ou apontar diretamente através do planeta ao local sagrado de sua religião?
A agência espacial malaia, Angkasa, promoveu uma conferência com 150 cientistas islâmicos para discutir a questão, que produziu um documento depois aprovado pelo Conselho Fatwa da Malásia. Recomendaram a seguinte ordem de prioridades para o cálculo da qibla: 1) a Caaba, 2) a projeção da Caaba, 3) a Terra, 4) Qualquer lugar. O xeique ao final ainda não se decidiu, e é bem provável que acabe apontando para qualquer lugar.
Curiosamente, o cálculo da qibla não é um dilema tão novo, porque mesmo na superfície do planeta há pelo menos duas formas de determinar a direção. O alcorão apenas determina que se dirija a face à mesquita sagrada, não diz como isso deveria ser feito.
Poderia comentar como seria um exemplo da irracionalidade em meio à ciência (como de fato é, uma agência espacial nacional promover um simpósio religioso) e como o caso lembra o fiasco do astronauta brasileiro (os malaios conseguiram sua passagem ao espaço em um contrato de bilhões em aviões russos). Mas creio que o pensamento mais interessante que me veio à mente nesse episódio foi como esse detalhe é perfeito em histórias de ficção científica.
Em vários contos de Isaac Asimov, por exemplo, depois de centenas de milhares de anos de expansão pela Galáxia, a humanidade acaba perdendo contato com seu planeta de origem, e ao final não sabe nem onde nem mesmo se a Terra realmente teria existido. Bem, não só isso não acontecerá se o islamismo e o cálculo da qibla continuarem sendo praticados pelos próximos milênios; como mesmo aqueles não-muçulmanos podem passar a praticar um ritual não tão diferente para louvar sua origem.
Ah sim, preciso mencionar também que ao final, todos muçulmanos apontam para um meteorito. Mero detalhe. 🙂
[via Wired]

Discussão - 1 comentário

  1. Cesar disse:

    O problema da ficção científica é que todas as estrelas estão em movimento, não só em relação umas às outras, mas também em relação ao centro galáctico. Um método para localizar o planeta tem que ser meio problemático... Talvez seja interessante uma bóia espacial, um poderoso emissor de ondas de rádio que possa ser ouvido em qualquer ponto da Galáxia. Só que se a colonização espacial se der a uma velocidade superior à da luz (digamos, usando buracos de minhoca), vai demorar um pouco até a bóia espacial ter alguma utilidade...

Envie seu comentário

Seu e-mail não será divulgado. (*) Campos obrigatórios.

Sobre ScienceBlogs Brasil | Anuncie com ScienceBlogs Brasil | Política de Privacidade | Termos e Condições | Contato


ScienceBlogs por Seed Media Group. Group. ©2006-2011 Seed Media Group LLC. Todos direitos garantidos.


Páginas da Seed Media Group Seed Media Group | ScienceBlogs | SEEDMAGAZINE.COM