Benjamin Redentor
“E os soldados, tecendo uma coroa de espinhos, lha puseram sobre a cabeça, e lhe vestiram roupa de púrpura. E diziam: Salve, Rei dos Judeus”. – João 19:2-3
Com quase 40 metros de altura, o Cristo Redentor no Rio também usa uma coroa de espinhos, mas uma que é raramente vista e não faz exatamente parte do projeto artístico do monumento religioso, porque é parte do sistema de pára-raios que o protege contra descargas elétricas. Na fotografia acima, de Ricardo Zerrenner (clique para ampliá-la), pode-se ver a “coroa” e o sistema que se estende também pelos braços da estátua.
A proteção dos pára-raios é muito necessária, uma vez que como o periódico O Dia não deixou de notar, “proteção divina não foi suficiente para preservar uma das Sete Novas Maravilhas do mundo”. Parte do dedo da mão direita e pedaços da testa foram danificados em 2007, e autoridades eclesiásticas alertaram que a proteção tecnológica dos pára-raios estava danificada e inefetiva.
Reformas recentes restauraram também o sistema de proteção redentora, pára-raios inventados por Benjamin Franklin em 1749.
O curioso aqui, além da ironia do monumento religioso portar uma coroa de espinhos derivada da ciência da eletricidade, é que o famoso experimento de Franklin ao empinar uma pipa em meio a uma tempestade é em si mesmo uma anedota científica. Embora a imagem icônica do cientista americano de óculos (bifocais, que ele também inventou) empinando uma pipa em meio a relâmpagos seja bem conhecida, fato é que Ben Franklin apenas propôs o experimento e há sérias dúvidas de que alguma vez o tenha realmente conduzido.
Outros cientistas sim levaram o experimento a cabo, mas alguns deles encontraram como consequência um triste fim. Empinar pipas em meio a uma tempestade é um grande risco, como o próprio Franklin sabia muito bem. Como boas histórias acabam logo se tornando “História”, a exemplo de anedotas religiosas, a do cientista com peruca branca empinando pipas na tempestade continua sendo recontada. Se a ciência salva o Cristo Redentor, o faz através de conhecimento que também se conta por anedotas. Em dois mil anos é provável que se Franklin ainda for lembrado, o seja por um experimento que nunca realizou.
Por que falar subitamente do Cristo Redentor e pára-raios? Os nexos foram motivados por uma notícia recente indicada pelo professor José Ildefonso. Uma outra estátua com quase vinte metros de altura de Jesus em Ohio, EUA, foi atingida por um raio nesta segunda-feira.
Ao contrário de nosso Cristo Redentor, devidamente protegido por um pára-raios, a obra construída por uma vertente cristã local era feita de plástico, fibra de vidro e uma estrutura de aço… sem pára-raios. Era um convite ao desastre, ou talvez fé demais em uma proteção divina. Erguida em 2004, é mesmo notável que tenha durado tanto – embora dificilmente seja um milagre. Após o raio que cedo ou tarde cairia, pouco restou do monumento religioso:
A religião precisa se curvar à ciência? Todo Jesus precisa de uma coroa de espinhos de Ben Franklin? A imagem das labaredas acima lembra um anjo com asas abertas? Deixamos as interpretações e lições de moral destes contos sem fadas, mas com Messias, aos leitores, e encerramos com mais um nexo curioso.
As estátuas monolíticas da ilha de Páscoa seriam resultado da mitologia dos nativos, e de certa forma, podem ser monumentos religiosos mais sofisticados que o de Ohio, e mesmo o Cristo Redentor com sua coroa de pára-raios. É a fabulosa teoria defendida pelo professor Francisco Soares, da Universidade Federal do Maranhão, segundo a qual os Moai seriam em si mesmos grandes pára-raios.
Distribuídas ao redor da Ilha, as estátuas com até dez metros ofereceriam proteção a áreas habitadas ao atrair descargas em tempestades. Os chapéus de rocha vermelha porosa que ostentavam seriam capazes de dissipar as descargas elétricas, e os olhos de rocha branca chegariam a brilhar quando atingidos. Deveria ser uma visão magnífica. Os raios não seriam um inconveniente natural ao qual seria necessário uma coroa de espinhos de metal, e sim um fenômeno controlado e apreciado em si mesmo através de grandes monumentos combinando superstição e tecnologia.
Uma história fantástica, com o pequeno detalhe que talvez não seja verdadeira. Não pude encontrar referência a avaliações independentes à teoria de Soares, e a crítica mais elementar que se pode fazer é por que as estátuas não parecem funcionar mais como pára-raios, o que se presume que deveriam continuar agindo como se ainda estão de pé. O microclima na ilha de Páscoa já foi bem diferente, principalmente no ápice da cultura Rapa Nui que erigiu os Moai, e talvez a ilha fosse palco para constantes tempestades elétricas, e talvez os Moais desempenhassem a função proposta. Mas a arqueologia mainstream não parece dar muita atenção à ideia.
Seja qual for a resposta, esta viagem pelos muitos nexos entre religião, superstição, raios, história e tecnologia já está de bom tamanho. Que um raio caia na minha cabeça se estiver mentindo.
Discussão - 10 comentários
"A religião precisa se curvar à ciência?"
Se Curvar e se Arrastar para fora da Sociedade Secular, Laica e Plural.
Que pena que o Elefante Branco Brasileiro esteja justamente "protegido" pela Ciência que sua Ideologia Genocida tanto despreza, sua queda real seria ainda mais Fenomenal do que ocorreu em 2012 e em FlashFoward.
Primeiro a comentar, hehe.
Parabéns Mori, sempre trazendo artigos curiosos e bem escritos.
Eu fico especialemente tocado por esse tipo de artigo pois sou cristão confesso, evangélico por escolha e também cientista por escolha.
E é inevitável para mim, com a minha fé observar a relação desses fatos, mesmo que especulando um pouco também, com a bíblia.
Pois de fato, Deus não gosta nenhum pouco dessas imagens, pois nem são d´Ele e Ele mandou que não as fizesse. (Êxodo 20, o primeiro mandamento). Semelhante também ao que aconteceu a imagem de Dagon na bíblia (não me lembro onde).
A especulação vem agora, não duvido nada de que Ele fique com vontade mesmo de mandar raio nessas coisas.
Contudo, o que eu quero dizer é que essa ironia de proteção divina não faz sentido para quem lê a bíblia, Kentaro. Somente para os supersticiosos mesmo, mas não para cristãos.
Para cristãos que creem mesmo na bíblia o fato é até muito coerente.
Olá Kentaro!
muito interessante essa idéia dos Moais com o propósito de proteger dos raios.
Só conhecia a outra parte da lenda: proteger dos inimigos.
Fiquei bem curiosa pra saber mais sobre esse assunto.
Abç. ; )
C.
Eu também queria saber mais... 🙂
Infelizmente, há quase nada a respeito na rede. Ainda que não seja verdade, é uma ideia fascinante.
FIRST! Oh, wait...
Esse negócio dos moais servirem de para-raios é muito estranho. Uso muito específico para algo nem tão necessário, não?
É, também não boto muita fé. Mas seria espectacular, isso seria!
"Rayden vs Moai, FIGHT!!!
Moai wins, electricity"
Caro KENTARO,
Foi com muito prazer que li seu post e percebi seu comentario a respeito do meu trabalho realizado na UFMA sobre os MOAI! Realizei minhas pesquisas com a ajuda de um profesor doutor em Fisica que disponibilizou seu laboratorio para que pudessemos provar que oa estatuas eram verdadeiros para-raios e que seus chapeus eram dispositivos de DISSIPAÇÃO DE CARGA só patenteados pelos EUA nos anos 70 ! Hoje o Prof Oliveira é Vice-Reitor da UFMA e eu continuo avançando em minhas pesquisas sobre a Ilha de Páscoa!
Se for do seu interesse poderiamos conversar mais sobre o trabalho e eu teria a oportunidade de mostrar as evidencias de uma grande mudança climatica que ocorreu na IPC, em torno de 1640, que provocou o abandono do culto dos MOAI e gerou um novo culto pascoense baseado: o Homem-Passaro (tangata manu)!
Conheci um nativo da ilha, chmado Hani-hani, que me relatou que a primeira vez que viu um moai recebendo uma descarga eletrica , ficou paralisado de medo e foi proibido pelo seu pai decomentar com alguém pois seria considerado louco !!!
Mas tbem se vc quiser posso mandar cópia de ampla materia publicada pela revista GLOBO CIENCIA
Excelente, o prazer é meu em estabelecer contato: por certo tenho interesse em mais informações! Enviei-lhe um email, por favor, confira.
De acordo com o professor Francisco Soares, para o sistema dar certo, os chapeus, ou mais, feitos com basalto poroso (basalto vesicular) precisariam ser saturados com uma solução salina, algo muito fácil de se conseguir em uma ilha oceânica (água do mar). Assim, quando pararam de realizar essa tarefa, os pararraios deixaram de funcionar.