Vencedor do Quiz
Uma das aulas mais marcantes de todo semestre na minha disciplina de Zoologia dos Vertebrados é a de Diversidade e Ecologia de Lepidossauria. Esse grupo de ‘répteis’ (assim entre aspas porque não é um agrupamento natural) inclui as serpentes, lagartos e anfisbenas, familiares a todos os alunos. O grupo inclui ainda os tuatara, Rhynchocephalia ou Sphenodontidae.
O Tuatara é um réptil exclusivo da Nova Zelândia. Apesar da aparência, não é considerado um lagarto. São características desses aniamais a presença de dentes fundidos à maxila (eles não podem extrair um dente, seria arrancar um pedaço do osso, ao contrário dos nossos dentes que só se inserem no maxilar), um terceiro olho funcional capaz de divisar claro e escuro através da pele do alto da cabeça usando uma estrutura conhecida como glândula pineal. Por outro lado, os lagartos, serpentes e anfisbenas compartilham o sumiço de um osso chamado quadradojugal, que continua presente nos tuatara.
Durante o Mesozóico os tuatara formavam um grupo diversificado de répteis, tendo se extinguido em todo o mundo, exceto algumas ilhas costeiras da Nova Zelândia. São animais de cerca de 35 cm que se alimentam de insetos e pequenos vertebrados e têm temperatura corporal em atividade de até 6° C, bem mais baixa do que nos lagartos.
Tive a chance de conhecer essa no Zoológico de Auckland recentemente. Ela é uma fêmea usada para educação ambiental ali. Agradeço tremendamente a atenção da Elena Dray-Hogg que me oportunizou essa experiência única de interagir com um animal tão enigmático e ímpar na história evolutiva dos vertebrados.
Sem mais delongas, o ganhador do brinde foi o Roberto Takata no tempo récorde de 28 minutos e não dando chance nenhuma para os outros candidatos. Entrarei em contato contigo pelo e-mail para descobrir para onde enviar seu presente, outro ícone dessa ilha de bizarrices, a Nova Zelândia.
Memórias do cárcere
A restrição da liberdade é uma das formas de punição mais distribuídas nas sociedades humanas, mas também a aplicamos constantemente a animais nos jardins zoológicos. Entre os humanos a reclusão é um estímulo aversivo que pretende inibir determinados comportamentos inaceitáveis, mesmo assim os presos têm seus direitos e até sabem se organizar para fazer exigências, como mostra o filme “Salve Geral” que assisti este final de semana. Já os animais de zoológico, que nada fizeram contra a sociedade, são mantidos em cativeiro com pelo menos três funções:
- Preservação ex situ de animais silvestres, ou seja, a manutenção de alguns exemplares protegidos, mesmo que fora de seu ambiente natural.
- Possibilidade de pesquisar animais raros ou pouco afeitos ao contato humano.
- Ferramenta de educação ambiental para a sociedade aprender a cuidar dos que permanecem em liberdade.
Onças do zoo da UFMT tomando um delicioso picolé de sangue e vísceras nos fundos do seu recinto
Assim, é fundamental que os animais ali mantidos tenham a oportunidade de viver da forma mais salutar que a perda da liberdade pode oferecer-lhes. Estas condições de vida ideais são básicas para assegurar os três objetivos mencionados acima, muito embora apenas bem recentemente tenha-se começado a pesquisar formas de proporcionar bem-estar em cativeiro. A principal linha de esforços neste sentido é o enriquecimento ambiental, um tipo de terapia ocupacional para animais cativos. Estas técnicas procuram atiçar os sentidos, entreter cognitiva ou socialmente, desafiar espacialmente ou variar a alimentação dos animais e tem sido utilizada amplamente por zoológicos, mas também em aquários públicos (siiiim, enriquecimento ambiental para polvos e raias!) e a cobaias de laboratório.
Chimpanzé em Curitiba “lê” para afastar o estresse
Fonte: www.uol.com.br/sciam
Duas instituições estão em momentos diferentes deste processo por aqui. A Scientific American Brasil publicou recentemente um artigo sobre os trabalhos já bem estabelecidos no Zoológico de Curitiba para enriquecer o cativeiro de répteis, onças e lobos-guará. Segundo o artigo esta iniciativa já atinge 1400 animais ali expostos e reduziu sobremaneira as ocorrências veterinárias entre os animais. A outra face da moeda está no zoológico da UFMT, em Cuiabá, onde meus alunos e eu acabamos de publicar um artigo pela Shape of Enrichment, a maior organização de enriquecimento ambiental de que tenho notícia, sugerindo técnicas de enriquecimento para onças pintadas em um clima muito quente. Por aqui ainda temos muito o que caminhar, mas a interação com os bichos tão íntima como é nos trabalhos de enriquecimento ambiental e o interesse do pessoal da UFMT tornam o caminho muito prazeroso.
Esta pauta foi gentilmente sugerida pela Scientific American Brasil.