Filogenia de café

Afastada do balcão, a mesa estava pejada de figuras de dinossauros. De lado opostos, dois primatas falantes e de idades distintas, dissertavam sobre aqueles bonecos.
Mas este também tem quatro patas.“, argumentava o mais baixo, condizente com a idade.
Todos têm quatro patas.“, ouvi eu dizer ao mais velho, meu contemporâneo. “Isso não quer dizer nada. Este tem cornos na cabeça e este do pescoço comprido não, vês?”, rematava glorioso enquanto agarrava no bicho de plástico.
Está bem, mas podem-lhe ainda não ter nascido…“, devolveu a criança.
São qualidade diferentes, não estás a ver. São diferentes, logo são qualidades diferentes de dinossauros.“, terminou o mais velho enquanto eu terminava o segundo café da manhã ao balcão.
Esta argumentação, pouco diferente é das que os paleontólogos têm em congressos ou em revistas da especialidade.
Os grupos de dinossauros, como outros seres vivos, são agrupados consoante as semelhanças e diferenças físicas, indo-se de detalhe em detalhe até o animal ser colocado numa árvore onde estão representados todos os possíveis parentes – dos mais próximos, aos mais longínquos.
Os meus colegas paleontólogos provavelmente arrancarão cabelos com a esta minha heresia, mas a filogenia tanto pode ser feita no laboratório, com a ajuda de potentes computadores, como à mesa de um café, utilizando bonecos.
Esta última análise, mais simples, pode utilizar os mesmos princípios da sofisticada investigação.
Mas não deixa de ser uma filogenia.
De café.
Imagem – ilustração dos princípios de Sistemática Filogenética, do paleontólogo Matthew Bonnan
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Aveiro style…

Não quero saber que seja um vídeo institucional, que seja bonitinho, ou que o raio que o carregue.
Gosto dele e dela, da minha terra, porque cada vez mais me dói estar longe.
Lamechices de sexta-feira?
Pode ser. Mas não quero saber.
Soube-me bem rever sítios onde cresci, em que fui feliz, onde chorei.
Lamechices?
Sim, mas com muito gosto.
Aveiro style.

Sarrazin, o anti-sarraceno

courb110.jpgNa leitura semanal que faço do jornal El País de domingo, um artigo com o perfil e excertos em discurso directo de Thilo Sarrazin, despertou-me para uma realidade desconhecida.
Que Angela Merkel havia já declarado que o multiculturalismo na Alemanha estava morto e era preciso enterrá-lo, já o sabia. A Chanceler tinha-o proferido publicamente. Em Portugal, quase ninguém o comentou, embrenhados que estamos em pensar no pão que poderá ainda vir dos bávaros e companhia, esquecendo os lírios sociais que despontam por aquelas bandas.
O artigo a que acima fiz referência aponta uma possível origem para as declarações da senhora Merkel.
Thilo Sarrazin, ex-dirigente do Bundesbank e ex- Ministro das Finanças da cidade de Berlim, publicou no ano passado um livro que continua a gerar muita discussão e polémica – para além de mais de um milhão de exemplares vendidos, coisa pouca…
No campeão de vendas “Deutschland Schafft Sich Ab“, Sarrazin defende a tese de que a Alemanha está à beira da extinção. Esta implosão social está a ser fomentada pela emigração turca, em particular, e pela muçulmana, em geral, defende Sarrazin.
Afirma este senhor que devido à baixa taxa integração social e enorme taxa de natalidade, os emigrantes muçulmanos estão a ameaçar a coesão social alemã.
Contudo, a perigosa retórica de Thilo Sarrazin vai mais longe; a fraca inteligência, originada pelo mau património genético dos emigrantes muçulmanos, está a contaminar a população alemã, sendo responsável pela extinção a que a Alemanha está condenada, afirma Sarrazin, sendo estes emigrantes “o coração do problema”.
Os critérios avaliadores da integração social de um grupo de emigrantes são, para este ainda militante do SPD:
1) o êxito dos jovens dessa comunidade no mercado laboral;
2) os resultados escolares desses jovens:
3) a percentagem de pedidos de apoios estatais por parte dessa comunidade emigrante.
Não li a obra, e pelas amostra impressa no El País não o conto fazer, mas
posso julgar, contudo, que ideias de Sarrazin manifestas no jornal são perigosas.
A saber:
1) que se caracterizem e infiram comportamentos sociais de determinados grupos com base em supostos padrões e tipificações genéticos é uma aberração, quer política, quer social. Acrescento que, à semelhança do que pensa o ex-Chanceler alemão Helmut Schimdt, misturar “tradições civilizacionais com herança genética” é, no meu entendimento, profundamente errado, quer científica, quer eticamente.
2) que uma recente sondagem do jornal sensacionalista alemão Bild, tenha revelado que 18% do inquiridos votaria Sarrazin se este se apresentasse a eleições.
3) as ideias do senhor Sarrazin, acrescenta o artigo do El País, têm vindo a ser profusamente difundidas entre a extrema direita alemã, como seria de esperar, acrescento eu…

Talvez fosse altura de olharmos menos para o pão que poderá ou não vir da Alemanha e mais para algum joio que poderá aparecer misturado naquele hipotético cereal.
Porque nem só de pão vive o homem…

Referências: El País, 20 de Março de 2011, suplemento Domingo, p.8-9.
Imagem: Gustave Courbet, “Les cribleuses de blé”

Ciência Para Miúdos e Graúdos

No próximo dia 16 de Março vai iniciar-se na Escola Secundária Gil Eanes, Lagos, uma série de palestras e saídas de campo designadas “Ciência Para Miúdos e Graúdos”.

As palestras e as saídas de campo, da responsabilidade do grupo de Biologia e Geologia desta Escola, têm como principal objectivo a divulgação das Ciências Naturais, e estão dirigidos aos pais e alunos, bem como ao resto da comunidade escolar. Com estas acções pretende-se igualmente promover o contacto, fora do contexto das aulas, de alunos e famílias, promovendo simultaneamente o conhecimento científico.
PROGRAMA
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16 de Março 2011 – 21h, auditório da Escola Secundária Gil Eanes, Lagos.
Dinossauros: Novas Técnicas, Velhos Mitos – por Luís Azevedo Rodrigues.
A palestra abordará os últimos avanços científicos na investigação dos dinossauros, bem como o papel destes animais do passado na cultura popular actual: cinema, imaginário infantil, literatura.
Temas aparentemente tão díspares como as Tomografias Axiais Computadorizadas efectuadas em dinossauros, se é possível saber a cor dos dinossauros ou como se movimentavam, ou a influência dos dinossauros na obra do autor de Sherlock Holmes, e o Património paleontológico do Algarve serão algumas das questões abordadas nesta palestra, sendo apresentados casos concretos.
30 de Março 2011 – 21h, auditório da Escola Secundária Gil Eanes, Lagos.
Tremores de Terra para Principiantes – por Margarida Agostinho
Nesta palestra será feita a introdução científica aos sismos, quais as técnicas de medição da energia e efeitos de um sismo. A revisão histórica e científica ao sismo de 1755, bem como o seu impacto no Algarve e na cidade de Lagos, serão também abordados. O que fazer em caso de sismo constituirá outro dos pontos de interesse desta palestra, sempre com o contexto regional algarvio como pano de fundo.
27 de Abril de 2011
Darwin: entre Baleias com Patas e Dinossauros com Penas – por Luís Azevedo Rodrigues
A evolução dos dinossauros, particularmente de um grupo de dinossauros carnívoros, será o mote para a primeira parte da palestra, já que esse grupo originou o grupo de vertebrados terrestres mais diversificado – as aves, com cerca de 10 000 espécies. A origem do voo e das penas serão explorados à luz das mais recentes informações científicas.
A segunda parte da palestra explorará a evolução de um grupo de mamíferos, que depois de serem terrestres, foram “empurrados” pela Evolução de novo para o mar – os cetáceos, que incluem os golfinhos e as baleias.
As teorias evolutivas de Darwin, e o seu papel na Ciência actual, serão o tema unificador dos dois casos evolutivos referidos: as aves e os cetáceos.
SAÍDAS DE CAMPO (em Abril e Maio, em datas a definir)
Praia da Salema – orientada por Luís Azevedo Rodrigues e Margarida Agostinho, nesta saída de campo serão observadas e analisados dois tipos de rastros de pegadas de dinossauro presentes na Praia da Salema: dinossauros ornitópodes (herbívoros) e dinossauros terópodes (carnívoros). O património paleontológico deste local será utilizado para se ilustrarem diversos tipos de informação que os paleontólogos recolhem, nomeadamente a velocidade a que o animal se deslocava, o seu tamanho, etc. O enquadramento e a história geológica da Praia da Salema serão igualmente abordados de forma a que os visitantes tenham uma imagem mais completo do ambiente em que estes dinossauros viviam há 125 milhões de anos.
Praia da Luz – Margarida Agostinho e Luís Azevedo Rodrigues, nesta saída de campo serão observadas diversas estruturas geológicas e paleontológicas, desde as rochas e várias estruturas sedimentares, passando pelos fósseis de invertebrados, até aos vestígios de um velho vulcão, num contexto com mais de 100 milhões de anos de idade. Várias histórias da Terra são abordadas no contexto da Praia da Luz.

Fortaleza Europa

Genoese_fortress_in_Sudak_by_inObrAS.jpgOs pastores que não guardavam os seus rebanhos, e os seus cães de guarda, seus dos pastores que às ovelhas mordiam apenas, estão a cair. As rezes revoltaram-se, jogando o jugo para trás.
Os pastos vazios de anos de opressão não chegam agora às rezes sem guia e, como noutros tempos, viram-se para o outro lado do Mediterrâneo, em busca de melhor sorte.
Empurrados para a tolerante Europa, dão de caras com a fortaleza.
A Fortaleza Europa.
“Tunísia, Marrocos, Egito, Bahrei e Iémen continuam num clima de instabilidade e de contestação com os contestatários, liderados pela juventude, exigem profundas reformas políticas e constitucionais e lutam pela instauração da democracia no seu país.”

Referências: Asian Dub Foundation, “Fortress Europe”, Enemy of the Enemy, 2003
Imagem: daqui

1 000 000 000 de dólares

Algumas ideias de como gastar mil milhões de dólares, especulações de diversos cientistas, entre os quais um paleontólogo…
A ver…e a pensar.
O que fazer com este dinheiro?

Não sei se foi a banda sonora oficial destes depoimentos mas poderia-o muito bem ter sido…

Fonte: Scientific American

Saudável Liberdade

396058018_a754cff31a_z.jpgJosé estava mais do que preparado para o embate que se avizinhava – a entrevista de emprego.
Nos últimos dois anos, para além de inúmeros contactos pessoais e envio de CV’s, tinha-se preparado afincadamente para o momento: cursos, especializações e até umas aulas de mandarim lhe haviam ocupado o tempo sem trabalho.
Sentou-se, carregado da sua competência, formação e atitude.
“O senhor fuma?”, perguntou o inquisidor laboral.
“Já uma pausa?”, pensou José. “Sim, fumo.”, respondeu em tom agradecido.
“Humm…Então parece que a entrevista vai ter que ficar por aqui. Sabe, a nossa empresa tem a política de não contratar fumadores. Escuso já de ver o resto do seu CV.”, debitou monocordicamente o ex-futuro-empregador.
Actualmente nos E.U.A. existe já um número considerável de empresas que negam trabalho a fumadores, chegando a realizar análises sanguíneas para se detectarem eventuais vestígios de nicotina.
Se não se podem negar os malefícios do tabaco, mas esta cruzada da saúde esconde outro tipo de controlos. Agora é o tabaco, amanhã o sal ou o açúcar, e num futuro mais próximo do que antevemos, iremos ter que provar geneticamente se desenvolveremos Alzheimer, quais as probabilidades de contrairmos cancro numa idade precoce, ou mesmo a disposição para votarmos num determinado partido.
No passado, a purificação da raça foi lema de algumas mentes doentes. Hoje, são as mentes da saúde que procuram a pureza dos genes.
Atentar contra a liberdade individual é mais fácil (e mais barato) do que educar os indivíduos para o livre arbítrio.
Relato agora um diálogo que há tempos tive com a minha cardiologista, tinha a Assembleia da República acabado de legislar sobre os teores de sal nos alimentos.
A Liberdade e a Cardiologista
Abandonei o silêncio penitente a que se remetem os pacientes.
Farto da parede muro-das-lamentações que me tapava a vista, falei.
“E o sal, doutora?”.
Não o meu; o da Assembleia da República.
“Legislaram bem. Apesar de não ser original, já que os teores de sal são já controlados em muitos alimentos…Olhe, até nos refrigerantes eles põem sal!”.
Reforçou o argumento espetando-me o peito com maior intensidade.
“Bem…”, ganhei balanço, entre empurrado pelo desconforto do ecocardiógrafo.
“Não se trata só de uma questão de Saúde Pública. É também uma questão de liberdade individual, de escolha pessoal. A seguir vem o quê? A cor dos meus boxers?”.
Agradeci encontrar-me num cardiologista e não num urologista, já que a estética cromática é uma lacuna grave da minha personalidade.
“Liberdade? O senhor sabe o custo para os contribuintes do consumo excessivo de sal? Sabe que o cancro do estômago está relacionado com teores de sal na urina, que por sua vez reflectem o consumo de sal? É caríssimo, não há dinheiro. É preferível cortar essa pequena liberdade!”.
Num instante, o meu miocárdio deve ter posto a língua de fora porque a médica me perguntou:
“Tem andado a sentir-se bem?”.
Maldita tecnologia, pensei. Não dá a mínima hipótese, qual detector de mentiras.
“Claro que tenho, doutora. O meu dealer salino está em promoções!”.
Imagem: daqui

Texto Publicado no jornal barlavento, 24/02/2011

GPS e a Relatividade

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Um vídeo, premiado (menção honrosa) no 2010 International Science & Engineering Visualization Challenge, concurso organizado pela National Science Foundation americana, que tem como objectivo difundir diferentes formas de difusão da Ciência, seja um vídeo, poster ou ilustração.
Neste vídeo, e de uma forma clara, várias ideias são apresentadas, umas utilizadas por quase todos diariamente, como o GPS, e outras que quase ninguém percebe mas que muitos falam, como a Teoria da Relatividade.
Gosto quando conceitos aparentemente afastados e distintos são dissecados revelando a proximidade escondida.
Este vídeo apresenta apenas um pequeno senão (não para mim…): os seus 8 minutos são demasiado longos para jovens que acham que um vídeo do Youtube com 2 minutos é uma seca…

No site do 2010 International Science & Engineering Visualization Challenge todos os premiados.
Aqui fica o vídeo que agrega o trabalho de alguns dos vencedores deste concurso.

Imagem: 2010 International Science & Engineering Visualization Challenge

Faça a Legenda

…nos comentários.
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Imagem: Alex Andreev

Blogs de Profs

Dois exemplos de blogs de professores
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O primeiro pretende ser um repositório das actividades que o professor Pedro Isidoro desenvolve no seu projecto Bioarte, com alunos da Escola Básica n.º2 de Carregal do Sal / Agrupamento de Escolas de Carregal do Sal.
Do que me foi dado a observar, este projecto envolve a observação de vários seres vivos, com ajuda de lupas binoculares, e posterior desenho do que se observou.
Uma excelente forma de desenvolver a capacidade de observação, indispensável a qualquer pessoa…
7930704_3zlSO.jpegExcerto do projecto:
“…o fio condutor assenta na combinação de algumas actividades desenvolvidas em dois clubes da escola – Clube dos Cientistas e Clube do Ambiente. Os alunos seleccionados pertencem a turmas do 5º ano de escolaridade que cedo se manifestaram interessados em realizar actividades no âmbito da observação de “coisas” ao microscópio. Afinal o microscópio, apesar do seu aperfeiçoamento, tem sido a mola impulsionadora dos progressos da BIOlogia.
Elaborou-se um plano de acção que abrangesse: a recolha e observação de insectos e plantas com lupas binoculares e microscópios, o registo dos desenhos realizados pelos alunos, registos fotográficos, pesquisa de informação científica detalhada sobre os organismos observados, criação de um livro digital com toda a informação recolhida e, finalmente, divulgação periódica de todas as actividades à comunidade educativa.”
“Bioarte” /
A responsável pelo segundo blog de professores que hoje apresento já foi aqui referida. É a Beatriz Tomás Oliveira.
No blog “Prof Bia a bordo” conta-nos a sua participação, a bordo da Caravela Vera Cruz, na recente Campanha científica EMEPC às Ilhas Selvagens. Foram tempos muito intensos, quer ao nível de experiência profissional e investigativa, que a nível pessoal, relatados na primeira pessoa.

Imagens: dos blogs citados.