Qualquer dia prefiro os criacionistas…se calhar não!

“No Verão vêem-se mais OVNIs em Portugal”
“os fenómenos OVNI estão bastante localizados em Portugal, com maior incidência junto à água, nas barragens e nas Serras da Gardunha, de Sintra, de Montejunto, da Estrela e de Monchique».”

Jornal Sol on-line, 30/06/2007

O curioso é que descobri uma referência a um grupo de investigação numa universidade privada portuguesa e que se dedica a este tipo de questões – CTEC – Centro Transdiciplinar de Estudos da Consciência, Universidade Fernando Pessoa.
Outro grupo português, Sociedade Portuguesa de Ovnilogia, cujo lema é “Estudar sériamente observações de OVNIS em Portugal”.
Já agora, e seriamente, não há ninguém que os avise que “seriamente” não é acentuado?

Algumas perguntas breves, que tenho uma tese à espera (citações subsequentes do site do CTEC):

“Os territórios do CTEC atendem, sobretudo, à convicção de que não é mais possível ignorar as profunda e potencias consequências de relações, até há pouco indiscerníveis, entre a consciência humana, a mente e o corpo.”
Convicção? Se já partem da convicção em algo talvez não seja um ponto de partida muito fiável para um processo científico…
“…estudar as implicações dos modelos holográficos e quânticos da consciência…”

Desculpem a ignorância…alguém me pode explicar o que são os ditos modelos?
“…promovendo a compreensão das relações do ser humano com o universo;…”

Isto também eu gostava de perceber… Para mentes simples como a minha talvez fosse melhor – Qual é o sentido da Vida?
“…testar e ampliar novas metodologias exigidas pelas dimensões físicas e neurofisiológicas como por exemplo, as experiências para-religiosas, “próximas da morte”, “fora do corpo”, onde se esbate a nossa actual definição de Real.”

O Real…o meu real é tudo aquilo que percepciono por intermédio do meu corpo…se sair dele o que tenho?
O extra-real ou o Real?

Muito New Age para o meu gosto….
Mas que sei eu?
Nada!

(o “outro” lado, na visão publicitária)

(adenda – 01/07/2007 – DN)
“Espécie de ovni avistado nos céus do Alentejo”
“É um fenómeno muito visto. São umas luzes que têm comportamentos inteligentes. Nalguns casos ficam como que a observar, noutros há testemunhos de pessoas perseguidas por estas luzes”, diz. Luís Aparício conta que “muitos idosos chamam-lhes “avejões“, que é a mistura de ave com anjo”.
Coisa m’ai linda!!

Patas e Preconceitos

Muitos animais que vivem ou se refugiam em árvores desenvolveram adaptações que permitem que os seus dedos apertem involuntariamente, com um gasto de energia mínimo .
Se oser humano se quiser agarrar a um ramo de árvore necessita efectuar uma enorme força muscular com o consequente gasto energético.
Pelo contrário, morcegos, aves e outros grupos de animais desenvolveram mecanismos nos seus tendões que lhes permitem, de forma “automática”, unir os seus dígitos.
Conhecem-se casos em que foram encontrados animais mortos ainda agarrados a troncos de árvores como consequência daquele mecanismo de preensão.

Este processo evolutivo fez-me lembrar os preconceitos.
Como, em determinados contextos, podemos ficar presos ou mortos por não sermos capazes de os largar…

(Fotos – pata de corvo – site “Six Feet Under”; pisco morto ainda agarrado a ramo – site “Tetrapod Zoology”, de Darren Naish)

Auto da Ocorrência

PEGADA VALE MEIOS(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 28/06/2007)

Trânsito parado. Avançamos. Polícias. Medem algo na estrada. Mais à frente, carros batidos. Os peritos continuam a medir e a escrever. Finalmente conseguimos passar, apenas retendo na memória o resultado final do que aconteceu.

A familiar cena de cidade poderia ser um qualquer dia de um paleontólogo que estude pegadas de dinossauro.
T
al como os polícias e os mirones, também os cientistas procuram saber o que se passou. Medem os vestígios do acontecimento ocorrido algures num passado mais ou menos remoto. Os elementos da autoridade medem o rasto da travagem para inferirem o tempo de duração da mesma e a velocidade provável a que se deslocava o carro. Os paleontólogos medem o espaço entre pegadas para deduzirem a velocidade do animal. Esta medição permitiu, por exemplo, constatar que, no Cabo Espichel, o trilho de um dinossauro carnívoro apresentava um passo (série de duas pegadas) irregular; por outras palavras, o animal coxeava. As razões para este comportamento podem ser várias: ferimento numa das patas ou, motivo mais difícil de comprovar, poderia estar a transportar uma presa.
Os paleontólogos conseguem inferir uma série de informações biológicas a partir da “cena do crime”: p.e., com base no tamanho e forma da pegada, conseguem concluir a altura do animal até à anca e assim ter uma ideia geral do tamanho do animal.
No caso da maior jazida portuguesa de pegadas de dinossauroPedreira do Galinha, na zona de Fátima – podem observar-se centenas de pegadas de saurópodes – dinossauros herbívoros quadrúpedes. Este local apresenta os maiores rastos de dinossauros do Jurássico médio (sensivelmente há 165 milhões de anos) a nível mundial, dois dos quais com mais de 140 metros de extensão.
Não só os rastos permitem deduzir informações sobre a velocidade e comportamento do animal.
A partir da forma das pegadas individuais, os paleontólogos obtêm informações sobre o seu autor: à semelhança de um CSI natural, deduzem, com maior ou menor rigor, o retrato-robô de quem andou (literalmente) num determinado local.
As pegadas de dinossáurio também exerceram fascínio na produção literária.
A descoberta em 1909 de pegadas de Iguanodon, em Inglaterra, originou uma enorme excitação em Sir Arthur Conan Doyle, o criador do detective Sherlock Holmes.

Alguns autores apontam este motivo, bem como a publicação da “Origem das Espécies” de Darwin, como os principais factores de inspiração para que Conan Doyle escrevesse “O Mundo Perdido”, relato de aventuras num país da América do Sul povoado de criaturas perigosas e pretensamente extintas.
Ao contrário do que se passa nos acidentes de automóvel, em que os responsáveis materiais normalmente ficam junto do local da “ocorrência”, no caso das pegadas de dinossauro estes nunca lá estão para soprar no balão. Uma das perguntas mais frequentes que me são feitas refere-se ao motivo pelo qual os ossos de dinossauro nunca são encontrados perto das jazidas de pegadas. As razões são essencialmente duas: a maioria das pegadas é produzida em momentos de actividade biológica habitual, isto é, quando o animal se encontrava em movimento para pastar ou caçar, não sendo provável, assim, que tivesse deixado aí o seu esqueleto…

O segundo motivo diz respeito às condições de preservação – tafonomia – dos vestígios. Pegadas e ossos necessitam de condições geológicas diferentes para fossilizar, ou seja, os ingredientes para a fossilização são distintos para o registo icnológico (pegadas) e o registo osteológico (ossos).

Tal como os índios norte-americanos, que perseguiam os seus adversários ou as presas numa caçada, também os paleontólogos seguem os rastos, embora nunca consigam alcançar os seus autores… ao contrário daqueles, apenas ficam com pedaços duma ocorrência do tempo passado.

Foto: Luís Azevedo Rodrigues – jazida de Vale de Meios

Fácil opção*

*…em caso de possível escolha para preservação…

NY Times

Nos últimos dias o jornal New York Times dedicou espaço a dois temas que muito me interessam.
O primeiro, motivos profissionais, inclui uma série de artigos e documentos multimédia sobre a evolução, entres o quais especialistas como Sean Carrol (vídeo).
Para quem como eu tem a evolução morfológica em mente e nas mãos, bem como para todos os interessados, é ma série de artigos de divulgação muito interessante.
O segundo, por motivos pessoais, concerne a minha cidade natal; orgulha-me e a todos os meus patrícios.

Imagens:;Susanna Raab para o The New York Times

Pinguim…gigante!

Julia Clarke ainda deve estar a pensar que tem que adiar o seu livro da história de culinária – uma das muitas ideias, aparentemente absurdas, que trocávamos enquanto fumávamos no telhado do American Museum of Natural History, em Nova Iorque.
É que a nova espécie de pinguim – Icadyptes salasi – que agora descreveu não lhe deve ter deixado muito tempo livre.
Este novo “cromo” tinha 1,5 m de altura e viveu (há 36 milhões de anos) muito mais a norte do que os seus “primos” contemporâneos – na costa do Peru.
Para além de ser uma nova espécie com um tamanho muito apreciável (apesar de mais pequeno que o Anthropornis nordenskjoeldi , com1,7 m de altura e 90 kg de peso) viveu numa zona desértica, num período da história em que a Terra era bastante mais quente do que é actualmente.

Estas novas aquisições da biologia terrestre provocam que os paleontólogos tenham que rever a história evolutiva dos pinguins – a migração para norte, que se pensava ter ocorrido entre 6 e 8 milhões de anos atrás, iniciou-se há mais tempo.
O membro mais antigo do grupo dos pinguins viveu, no que é hoje a Nova Zelândia, há 61 milhões de anos.
Para além do “gigante” Icadyptes salasi foi descoberta outra nova espécie – Perudyptes devriesi – que era um pouco mais antigo – data de há 42 milhões de anos e de tamanho semelhante ao pinguim-rei.

Apesar de ambas as espécies estarem adaptadas a climas quentes, este facto não significa que alterações climáticas não tenham um impacto negativo nas espécies actuais, refere Julia Clarke ao jornal The Guardian.

Imagem – Icadyptes salasi e Perudyptes devriesi
Fonte – AP
Referências
Edição on-line da revista Proceedings of the National Academy of Sciences, de 25 de Junho de 2007.

Esqueçam os “fofinhos”!

A ideia que temos dos marsupiais, em geral, e dos cangurus, em particular, é de animais dóceis (apesar de algumas citações em vídeo abonatórias das suas capacidades no mundo do boxe…).
Este (Ekaltadeta ima), descoberto na Austrália (que surpresa!), viveu há 23 milhões de anos. Carnívoro (!), ainda não saltava; corria, qual comum mamífero, atrás das suas presas.
Com base na análise do seu crâneo foi possível inferir que não devia ser boa “companhia” – corríamos o risco de levarmos uma dentada com dos seus quase 13 cm de mandíbula.
Lá se foi o mito dos cangurus “queridinhos”…
Ou não?

Referências:
Wroe, S. (1996) An Investigation of Phylogeny in the Giant Extinct Rat Kangaroo Ekaltadeta (Propleopinae, Potoroidae, Marsupialia) Journal of Paleontology, Vol. 70, No. 4, pp. 681-690
Wroe, S., Argot, C., and Dickman, C. (2004). On the rarity of big fierce mammalian carnivores. Proceedings of the Royal Society (London), Series B

Equilíbrio Pontuado

As relações amorosas sofrem do mesmo mecanismo que a Evolução das Espécies – Equilíbrio Pontuado.
Permanecem estáveis e imutáveis durante muito tempo – Estase.
Depois, e em períodos muito curtos, alteram-se e surgem novas relações.
E espécies.

Amor – metáfora

Uma das principais etapas da Vida foi o aparecimento da célula complexa, constituinte básico dos animais e plantas.
Sabe-se que esse tipo de célula nasceu pela contaminação parasítica de uma célula por outra que a infestou.
A evolução encarregou-se de as fundir, num abraço simbiótico, em que as duas eram agora uma só, formando um novo tipo de célula, mais completo do que as partes.

O que era uma invasão tornou-se uma nova vida; o que era aproveitamento, tornou-se cooperação; o que era luta, tornou-se vida em conjunto.

Referências:
Margulis, L. 1981. Symbiosis in Cell Evolution, 1st Edition. Freeman, New York

Placentários – e daí?

O Maelestes gobiensis é um mamífero, descoberto em 1997, escavado no deserto de Gobi em rochas com 75 milhões de anos.
“E daí?”
O Maelestes gobiensis não é directo ancestral de qualquer grupo de mamíferos modernos apesar de relacionado com os placentários, grupo ao qual pertencemos.
“E daí?”
Das 5416 espécies actuais de mamíferos, 5080 são mamíferos placentários.
“E daí?”
Paleontólogos utilizaram esta espécie como referencial na comparação morfológica de mais de 60 espécies de mamíferos actuais e fósseis.1
“E daí?”
Os mamíferos placentários, das baleias aos ratos, surgiram1, no hemisfério norte, há pouco mais de 65 milhões de anos – quando os dinossáurios se extinguiram.
“E daí?”
Este estudo contradiz um outro2, publicado em Março em baseado no ADN de espécies actuais, que concluía que os modernos placentários tinham surgido antes há 100 milhões de anos – antes do desaparecimento dos dinossáurios.
“E daí?”
Daí, nada…”apenas” mais uma peça no puzzle na evolução dos mamíferos.
Apenas.

Referências

1 J. R. Wible, G. W. Rougier, M. J. Novacek & R. J. Asher Nature 447, 1003-1006 (21 June 2007)

2 Bininda-Emonds, O.R.P., M. Cardillo, K.E. Jones, R.D.E. MacPhee, R.M.D. Beck, R. Grenyer, S.A. Price, R.A. Vos, J.L. Gittleman, and A. Purvis. 2007. The delayed rise of present-day mammals. Nature 446(7135): 507-512.

Ilustrações: Paul Bowden/CMNH

Foto: John Wible/CMNH