As bases biológicas do comportamento

Nada como o cheiro das páginas abertas pela primeira vez. O ruido baixo das folhas se desgrudando umas das outras, o odor da tinta gráfica e do papel virgem. Mas se os preços dos livros de verdade aproximam-se cada vez mais do proibitivo para você, um e-book, ou livro eletrônico, pode bem vir a calhar.

O CNPq abriu um canal para aqueles autores de livros científicos que acreditam que conhecimento não tem dono e deve circular livremente por aí. Um desses autores é Marcus Lira Brandão, professor da USP Ribeirão, que disponibilizou a versão revisada de sua obra “As bases biológicas do comportamento”. O livro é uma compilação de artigos de diversos autores e torna a neurociência um terreno menos árido para os que o têm como guia. Eu, que já sou fiel a esse título desde sua versão impressa, acho o livro o melhor do assunto em português, sempre passo alguns capítulos para meus alunos ingressantes no LECR (Laboratório de Ecologia Comportamental da Reprodução, onde trabalho na UNEMAT).

No mesmo espaço o Prof. Kleber Del-Claro, da UFU, ofereceu outro livro na área de comportamento animal. Introdução à Ecologia Comportamental é a transformação em livro daquele professor que te instiga a saber mais e adorar as aulas. Mais uma leitura indispensável aos meus discípulos que está gratuita online.
Para os interessados e ainda não iniciados, alguns outros canais oferecem muitíssimos títulos nas mais diversas áreas gratuitamente online. São exemplos o Projeto Gutemberg, a e-book cult e o Domínio Público, montado pelo governo federal.

USP, 75 anos

Hoje faz 75 anos que a Universidade de São Paulo foi fundada. Essa que foi minha segunda maternidade merece meus parabéns e meus votos de muitos anos ainda por vir. Tenho certeza de que ela abriga diversos problemas e desafios, mas tenho também um imenso orgulho de ser uspiano.
Feliz Aniversário USP

Encontro Brasileiro de Ictiologia em Cuiabá

 

Essa semana acontecerá no Mato Grosso o XVIII Encontro Brasileiro de Ictiologia, reunindo os principais pesquisadores de peixes do país. O encontro pretende abordar temas relacionados a “Ictiologia e desenvolvimento”. Serão cinco dias de palestras, cursos, debates e reuniões realizados na UFMT de Cuiabá. Uma excelente oportunidade para o estado mostrar que aqui também se faz pesquisa. Se algum leitor aparecer por lá será um prazer conhecê-lo. Estarei no apoio aos palestrantes, na sala VIP, no desembarque do aeroporto ou correndo de um lado para o outro mesmo.

Vida após a morte sem mistérios


Qual a graça???

Qual a graça???


Saí para almoçar agora e passei em frente a uma banca de jornal. Me chamou a atenção a matéria de capa de uma revista espírita: “A vida após a morte sem mistérios”. Engraçado como surgem as idéias, né. Acho que foi por isso que nunca me filiei a nenhuma religião. Elas são assassinas de perguntas.

As pessoas acham que a Ciência assassina os mistérios do mundo ao obter respostas para eles. Só pensa isso quem nunca entrou num laboratório ou nunca fez ciência de fato. Nossas falsas respostas científicas são apenas o caminho para novas perguntas. Perguntas mais detalhadas, mais específicas e mais elegantes. As respostas que a ciência gera não têm a pretensão de serem únicas, verdadeiras ou eternas. São enfeites para permitir admirar melhor a beleza da vida como um telescópio ajuda a enxergar um planeta distante.

Vamos combinar que vocês não vão contar a ninguém sobre isso, tá bom. Principalmente às agências de financiamento da pesquisa: CAPES, FINEP, CNPq, FAPESP, FAPEMAT e outras FAPs por aí afora. Às vezes acho que eles realmente pensam que iremos fazer descobertas que irão salvar o mundo, dar-lhes grandes somas de dinheiro em patentes ou, de preferência, as duas coisas. Nos fazem escrever um projeto contendo uma justificativa que, em termos grosseiros, seria: “Como seu projeto poderá render dinheiro ou salvar o mundo?” Das duas uma; ou eles não sabem que nossas respostas não fazem isso ou se deixam enganar.

As pessoas acham que a Ciência assassina os mistérios do mundo. Não o fazem! Elas são passageiras, frágeis e estão aí para serem desmontadas. As respostas da religião, por outro lado, invocam uma verdade inquestionável e imutável. Elas assassinam a beleza da dúvida, os mistérios do mundo. Não quero que a vida após a morte deixe de ser um mistério. Não quero que nossa origem deixe de ser povoada de dúvidas. Rejeito uma missão fixa para o nosso papel no universo. Prefiro a beleza da incerteza à paz fria e monótona das verdades eternas.

Templo

Outro dia o amigo Carlos Hotta, do Brontossauros dizia que a experiência mais próxima do espiritual que teve foi visitar a casa do Darwin. Ainda não a conheço, mas entendi do que ele falava quando, de férias pelo Rio de Janeiro, fui dar um passeio pela Biblioteca Nacional. Como o acesso lá é restrito a determinadas salas para quem quer ler, preferi uma visita monitorada. O prédio é lindo, a estrutura é de primeiro mundo e acho que é possível sentir todo aquele conhecimento ali. A duas quadras fica a Academia Brasileira de Letras e a outras cinco o Real Gabinete Português de Leitura, outra sala linda onde Machado de Assis ia ler quando jovem.

O dia de 25 horas

Sempre achei estranha a nossa forma de ensinar Ciências nas escolas. Ora, a base do pensamento científico é não ater-se à lógica ou ao que o mestre diz, mas contrapor tudo o que se supõe correto à realidade. Testar suas hipóteses. Confesso que eu mesmo, a despeito de toda a força que faço, devo incidir nesse erro de vez em quando. Dizer que o universo surgiu de uma grande explosão e vem se expandindo desde então é tão dogmático quanto dizer que a terra foi feita em seis dias de trabalho de Deus (catolicismo, judaísmo e islamismo), a partir da divisão em dois do dragão Tiamat (mitologia suméria) ou das entranhas do Deus Sol (Índios Cherokee).

Um dos dogmas científicos mais divulgados é que a Terra é um planeta redondo orbitando ao redor do sol. Tudo bem, isso só passou a ser aceito como verdade virtualmente absoluta em astronomia devido à avassaladora quantidade de evidências em favor dessa teoria. Mas, seja franco, quanto foi que você já botou à prova a idéia de que a terra é redonda? Se você ignorar os conteúdos de escola parece bastante intuitivo que a Terra seja plana, já que não é possível ver sua curvatura do nosso ponto de vista. Já estive em paragens abertas como uma giga-plantação de soja no Mato Grosso ou um desfiladeiro em Chapada Diamantina e juro que não vi nem um grauzinho de inflexão em defesa da Terra redonda.

Hoje foi meu aniversário e foi um dia ímpar para mim. Amanheci em Brasília, onde passava alguns dias com minha família. Logo pela manhã peguei um vôo para o Mato Grosso, para encontrar minha esposa e passar o resto do dia. Acontece que o Mato Grosso tem uma hora de diferença de fuso horário em relação a Brasília, por isso meu aniversário foi um dia de 25 horas. Maluquices apenas possíveis graças à nossa Terra redonda.

Se isso não é o suficiente para convencê-lo (Aliás, espero que não seja, afinal, fusos horários são convenções humanas, e não astronômicas) proponho dois experimentos: o primeiro consiste em telefonar assim que o sol se puser para alguém que more em algum ponto mais ao leste ou a oeste e perguntar como está o céu ali. Fiz isso outro dia ligando do Mato Grosso para conhecidos de férias em Recife, parentes no Rio e em Brasília e o resultado foi bem divertido. Outra idéia seria combinar uma hora para que pessoas em vários lugares do globo colocassem no chão uma haste de 30 cm e medissem sua sombra e para que lado ela estaria apontando com a ajuda de uma bússola. Vamos combinar a brincadeira aqui? O dia será domingo, 11/01/2009, vou fazer meu experimento aqui em Cuiabá às 11 h local; meio-dia em Brasília, Rio, São Paulo etc; 13 h em Fernando de Noronha e por aí vai. Se possível batam fotos do experimento e enviem para mim que eu vou fazer outro post nos dias que se seguirem falando sobre isso.

Cérebros jovens e o futuro da Ciência


obtido em: www.folha.com.br

obtido em: www.folha.com.br

Os ganhadores do prêmio Nobel de física e química desse ano se uniram em um discurso em prol do estímulo à entrada de jovens na carreira científica. Vou aqui me unir à convocação deles. As grandes descobertas da ciência são, em geral, produto de dois fatores igualmente importantes: conhecimento e criatividade. O próprio Einstein já dizia que a imaginação é mais importante que o conhecimento. Contudo, pelo menos em um diálogo do Einstein interpretado pela Cia. Arte e Ciência no Palco de São Paulo, alguém com muita imaginação e pouco conhecimento acabaria perdendo muito tempo com perguntas que já têm respostas. Na opinião desses laureados é entre os 25 e 40 anos que as pessoas têm um melhor equilíbrio entre o conhecer e o imaginar, de forma que seria nessa faixa etária que a ciência mais progrediria. É também nessa idade que famílias são construídas, portanto, sem segurança numa perspectiva de estabilidade, pouca gente se aventuraria a tornar-se cientista. É imprescindível que se ofereça bases para que os jovens cresçam dentro da carreira científica ou o mundo carecerá de idéias em breve.

 
 

 

 
 

 

Biologia se aprende é no mato

Esse feriado eu, o colega Rogério Añez, professor de botânica na UNEMAT, e mais 29 estudantes de Biologia passamos quatro dias inesquecíveis no Pantanal Mato-grossense. Fomos com o intuito de estudar um pouco dessa paisagem de exceção, como o classifica Ab’Saber e acabamos vivenciando muito mais. Dos catastróficos efeitos da água não filtrada dos rios, à dor da ferroada de um bagre, à importância do trabalho em equipe, acho que todos voltamos de lá pessoas melhores. Obrigado a todos que participaram da saída de campo e espero que muitas outras se sucedam.

Que dia

07:00 – Cansei de brigar com meus lençóis por mais alguns minutos de sono. Desisto. Saio da cama e vou me aprontar. Escolho no armário minha roupa com mais cara de biólogo, uma calça cargo com uns 316 bolsos e uma camisa verde igualmente cheia de bolsos. Odeio acordar cedo, mas é por um bom motivo.
08:00 – Converso com alguns alunos, jovens e sorridentes. Se congratulam. Hoje dispensamos nossos alunos das aulas formais e fomos todos para a praça central de Tangará da Serra, cidade onde sou professor na Universidade do Estado de Mato Grosso, UNEMAT. Ao fundo vejo passando outros alunos com mesas, caixotes e microscópios indo e vindo como formiguinhas para barracas montadas na praça.
09:30 – Somos uns 100 professores e alunos da biologia espalhados em algumas barracas. Na praça transitam estudantes do ensino fundamental e cidadãos comuns de Tangará. Na barraca da botânica os biólogos distribuem mudas de pequizeiro, dissecam flores ao microscópio e mostram plantas desidratadas. Na genética mostram o que são mutantes de verdade. Nada de super poderes, apenas um par de olhinhos brancos. Na microbiologia pontinhos rosados através das oculares passam a ser chamados de bactérias. Na barraca que estou, mostramos a fauna de serpentes venenosas da região, alguns insetos e uma demonstração da forma e função dos dentes na alimentação de mamíferos.
10:00 – Faz 36° C e a umidade não está alta, mas ninguém arreda o pé. Entre um visitante e outro emissoras de tv e jornais impressos vêm nos fazer perguntas e gravar. Nunca me acostumei com minha imagem refletida nas objetivas de uma câmera de vídeo.
11:30 – Missão cumprida! Levamos o curso de Ciências Biológicas da UNEMAT, do interior das nossas salas de aula para o meio da praça. No dia do biólogo mostramos um pouco do nosso papel para a sociedade, pelo menos a tangaraense, fizemos jus ao sustento que eles nos dão com seus impostos.
O biólogo ainda sofre com a falta de reconhecimento. Nossa profissão precisa de momentos como este para mostrar a que veio. Me impressionou hoje o quão pouco o público geral sabe sobre a profissão do biólogo. Isso se reflete na forma como os pais lidam com a escolha de um filho pelo curso de biologia, na compreensão da ciência que fazemos e na preocupação com os recursos naturais. Ainda bem que o prazer de fazer biologia compensa tudo isso.

No começo era o caos…

Já que tudo precisa ter o seu começo, aqui começa o Blog Ciência à Bessa. Nele pretendo apresentar pensamentos cotidianos sobre Ciência, vida acadêmica e Biologia. O espaço também deverá ser usado para apresentar material de suporte para as disciplinas que ministro no curso de Ciências Biológicas da Universidade do Estado de Mato Grosso, em Tangará da Serra.