A criptozoologia que existe

Criptozoologia é, supostamente, a “ciência” que estuda animais fantásticos. É ela a responsável pelas “pesquisas” sobre o pé-grande, a mula sem cabeça, o monstro do lago Ness e outras criaturas fantásticas derivadas de mentes criativas, desocupadas e carentes de atenção.
No entanto, existe toda uma série de animais que existem, mas que são muito pouco estudados, quase desconhecidos e ignorados pela maioria da humanidade. Nos próximos meses conheceremos a criptozoologia que existe, animais quase inacreditáveis, mas reais, e saberemos mais sobre o que eles têm a ver com você e comigo. Não percam, aqui, no Ciência à Bessa!

A imaginação gera obras maravilhosas, mas que fique claro que são imaginativas! (Imagem: Walmor Corrêa)

De volta à vida

É primavera. Aqui no cerrado as chuvas começam a voltar. Na parte mais ao sul do Brasil são as temperaturas que sobem. Por todo lado a vida recomeça.

Sempre que o ambiente impõe condições difíceis demais à vida, uma opção disponível para os animais (e as plantas também) é abrir mão da vida. Não no sentido de se deixar, ou de se fazer, morrer, mas no sentido de abdicar dos processos vitais pelo menos enquanto as coisas andarem difíceis demais. Nesse caso, os organismos reduzem drasticamente seu metabolismo, o consumo de nutrientes, oxigênio e água, paralisam seu crescimento e o investimento reprodutivo e ficam ali, esperando as coisas melhorarem para retomar tudo isso depois. Estes processos são conhecidos por dormência.

Tem hora que não tem jeito, é preciso despertar. (imagem: John Connell)

Há diversos processos diferentes relacionados à depressão metabólica dos animais, como a diapausa, o torpor, a hibernação e a dormência. A duração, intensidade da economia energética e os gatilhos que desencadeiam cada processo de dormência diferem de um tipo para o outro.

Também existem diferentes espécies que entram em dormência metabólica nos mais diversos grupos animais. Mesmo protozoários podem se encistar para evitar a perda de água, a falta de um hospedeiro nas espécies parasitas ou a escassez alimentar. Outros animais que encistam (e insistem em continuar vivos) são os vermes nematóides e platelmintos, assim como os legendários e indestrutíveis tardígrados. Moluscos, minhocas e até peixes pulmonados evitam a morte por congelamento e a perda de água entrando em estivação. Mamíferos se escondem do frio e da desnutrição hibernando. Pequenos mamíferos e aves de metabolismo extremamente alto, como morcegos, camundongos e beija-flores, diariamente entram em torpor para evitar o desperdício energético. Os insetos e os embriões dos peixes anuais entram em diapausa durante períodos de seca intensa. Todos estes grupos são salvos da morte a cada ano (ou mesmo diariamente) graças aos processos de dormência.

A existência é um processo delicado que precisa se equilibrar numa corda bamba entre e existência e o desaparecimento. Cruelmente, a sina de todo ser vivo (pelo menos dos sexuados, mas isso fica para uma outra postagem) é sempre acabar morrendo, a diferença entre o sucesso ou o fracasso biológico está no que você conseguiu realizar enquanto se equilibrava. A dormência animal aparelha diferentes organismos a se manterem vivos ainda que o ambiente esteja hostil num dado momento, um verdadeiro alívio para a manutenção da biodiversidade. Todos passamos por isso, momentos mais difíceis nos quais suspendemos partes de nossas atividades e mantemos apenas o que for vital, mas chega uma hora em que é possível e necessário seguir em frente. O Ciência à Bessa está de volta!

Celacanto, a volta dos que não foram

A partir de hoje o Ciência à Bessa irá experimentar uma nova mídia que está bombando na Internet. Está no ar o primeiro vídeo da série. Espero que vocês gostem! Começamos com a história de como um peixe que se acreditava extinto desde o mesozóico apareceu em 1932 num museu da África do Sul graças ao trabalho de uma jovem e dedicada naturalista.

[youtube_sc url=”https://youtu.be/XEupEAHwC_g” title=”Celacanto”]

Bicho Bizarro: Cobra de vidro

ARKive video - Slow worm giving birth to live young

Fêmea de cobra de vidro dando à luz um filhote.

Fonte: arkive.org

Nem cobra, nem de vidro. O bicho bizarro de hoje é um lagarto que vive sob o folhiço nas matas e, por isso, perdeu as patas ficando com a aparência de uma serpente. Ele possui pálpebras e lingua não bifurcada, ao contrário das serpentes (veja no vídeo). Já o vidro deve-se a outra peculiaridade, a autotomia caudal, hábito de perder a cauda quando perturbada. Devido a isso reza a lenda que uma cobra de vidro partida em cem pedacinhos, mas remontada, cicatriza a ponto de ninguém dizer que foi cortada. O pavor infundado humano das serpentes tem resultado na morte de muitos desses lagartos que são eficientes predadores de pragas de hortas e jardins.

Bicho Bizarro: Linguado

 

Cadê o linguado?

Linguados ganham de longe dos camaleões em troca de cor graças à migração de cromatóforos

Os linguados são um grupo grande de peixes marinhos com raros representantes em águas doces. Sua maior bizarrice reside na total assimetria entre os dois lados do bicho. O linguado eclode do ovo um peixe normal e simétrico, só que durante seu crescimento um lado cresce mais e mais rápido do que o outro, tornando-o assimétrico. Esse peixe vive encostado ao fundo com seu lado mais desenvolvido e pálido para baixo, do outro lado ficam os dois olhos do animal. Linguados são predadores bastante vorazes que se camuflam muito bem no fundo do mar, pegando as presas de surpresa com uma bocarra que se expande absurdamente (hiostilia, primeira questão da prova de hoje para os meus alunos!). Devido à sobrexploração pesqueira estes predadores tiveram sua população reduzida a possivelmente 10% do original, levando a organização Seafood Watch a recomendar os consumidores a evitá-los.

Migração do olho do linguado, vídeo em stop-motion excelente do Jobediah, um anatomista americano