Na China II – Marte é um Dragão
Philip K. Dick estava certo quando construiu diálogos na língua híbrida futurista em Blade Runner: misto de chinês e espanhol.
Voltei à Terra e não fiz bem a descompressão.
Rodeiam-me neons embrulhados em pauzinhos;
búfalos puxados por cabos USB;
incapacidades de dizer não negadas com sorrisos de olhos rasgados;
miríades de gentes aos berros cheias de ausências;
calmas nervosas em acelerações esperadas;
surpresas incontáveis e inenarráveis;
cheiros a nada e de tudo;
estar do outro lado da jaula;
coreografias kitsch em cibercafés;
pedido de roupa lavada pelo Google translator nos confins do mundo;
pratos de fungos divinos com ninfas melíferas…
P.S. – texto de Dezembro de 2006, acabado de chegar do oriente…
De formiga a…framboesa
Não é nenhum milagre conhecido, muito menos o da multiplicação das framboesas.
Um parasita, pertencente ao Filo Nematoda, infecta a formiga Cephalotes atratus, do Panamá, e origina quer a alteração morfológica do abdómen (ver foto abaixo) quer a alteração comportamental.
Os adultos não são infectados directamente, sendo-o na fase larvar, comportando-se distintamente de uma formiga não infectada, elevando o ruborizado abdómen .
O nemátode origina, assim, não só uma alteração morfológica, mimetizando o abdómen fórmico numa estrutura semelhante a uma framboesa, mas igualmente uma alteração comportamental no seu hospedeiro.
Estas modificações têm como “objectivo” aumentar as probabilidades de as formigas serem capturadas por aves, e desta forma, perpetuar o ciclo de vida deste parasita, já que os dejectos das aves (restos de frutos e de insectos) irão ser fazer parte da dieta de outras formigas.
A taxa de infecção pelo nemátode numa colónia de C. atratus é de cerca de 5%.
A
Vídeos do voo planado da – aqui
Vídeo da infecção parasitária – aqui
Referências –
Dudley, R., G. Byrnes, S. P. Yanoviak, B. Borrell, R. Brown, and J. McGuire. 2007. Gliding and the functional origins of flight: biomechanical novelty or necessity? Annual Review of Ecology and Systematics 38: 179-201.
Yanoviak, S. P., M. Kaspari, R. Dudley, and G. Poinar, Jr. 2008. Parasite-induced fruit mimicry in a tropical canopy ant. The American Naturalist (in press)
Imagens – K.T. Ryder Wilkie; Steve Yanoviak/University of Arkansas
Os Museus também se abatem…!
“Museu dos dinossauros é fechado em Uberaba
Prefeitura da cidade informou que vai reabrir o local e assumir a direção
Foram fechados, nesta terça-feira, o museu dos dinossauros e o centro de pesquisas paleontológicas de Uberaba, no Triângulo Mineiro. A fundação responsável pelo local não renovou o convênio com a prefeitura, que garantia o repasse de recursos para manter o museu. O acervo do centro de pesquisas já começou a ser retirado e todos os funcionários foram demitidos.
O prefeito de Uberaba, Anderson Adauto, disse que a prefeitura vai reabrir o Museu de Peirópolis. A direção também será assumida temporariamente. Em duas décadas, o local já foi visitado por 300 mil pessoas.”
FONTE – Globominas.com
Ciclo de Palestras de Geologia – DO GRÃO AO PLANETA
PALESTRA DO PROFESSOR MÁRIO CACHÃO, hoje, 17 de Janeiro de 2008, 21h30
Ciclo de Palestras de Geologia
“DO GRÃO AO PLANETA”
na Galeria Matos Ferreira – Rua Luz Soriano, 14 e 18, Bairro Alto, 1200-247 Lisboa
“A palestra, integrada nas celebrações do Ano Internacional do Planeta Terra 2008, visa dar a conhecer, alguns dos valores do Património Natural geológico (essencialmente de natureza paleontológica, i.e. fósseis de corais tropicais e das “laranjas” num cenário pretérito de ilha vulcânica activa) que irão servir de base à futura candidatura de Porto Santo a Geopark UNESCO Europeu.”
Disparates
Depois de em Novembro aqui ter referido a descoberta de um mega escorpião marinho, verifiquei que o Oceanário voltou a meter a “pata na poça”.
Não sei quem fará a revisão destas notícias mas afirmar “Cientistas ingleses descobriram um insecto que, por mais que quiséssemos, não conseguíamos dar cabo dele com o mata-moscas! Os cientistas encontraram uma das garras do insecto e esta é tão grande que rapidamente concluíram que terá pertencido ao maior insecto de todos os tempos!“ é um bocadinho exagerado!
É que Insecta é diferente de Eurypterida (escorpiões marinhos, extintos), apesar de ambos pertencerem a Arthropoda.
Seria como noticiar a descoberta de uma nova espécie de porco gigante e classificá-la como o maior morcego já existente.
Enfim…preciosismos de quem tem que descansar a descobrir erros nos materiais do Oceanário.
Imagens – Ernst Haeckel’s “Kunstformen der Natur”; daqui
Quem és tu, Zé rato? Josephoartigasia monesi
Josephoartigasia monesi é a sua graça. Viveu durante o Pliocénico no Uruguai e é o maior roedor que já viveu.
Este “rato” podia atingir as 2.5 toneladas.
Referência – Andrés Rinderknecht and R. Ernesto Blanco. The largest fossil rodent (2008). Proceedings of the Royal Society, B | doi:10.1098/rspb.2007.1645 [PDF grátis]
Imagem – daqui
Quanta vida por descobrir – Idioneurula donegani
Uma nova espécie de borboleta – Idioneurula donegani – descoberta nos Andes.
Já agora a exposição “Borboletas através do tempo” continua em exibição no MNHN.
Referência (PDF grátis):
Huertas, B. and J. J. Arias. 2007. A new butterfly species from the Colombian Andes and a review of the taxonomy of the genera Idioneurula Strand, 1932 and Tamania Pyrcz, 1995 (Lepidoptera: Nymphalidae: Satyrinae). Zootaxa 1652: 27-40.
Saudades
Não tenho tempo para comentar esta notícia.
Apenas para a recordação emotiva do primeiro dinossáurio que estudei – o Tenontosaurus – no American Museum of Natural History, em Nova Iorque.
Mais do que um Museu, uma casa de Ciência.
Às vezes dá-me para isto…
Referência: Lee, A.H. and Werning, S. 2008. Sexual maturity in growing dinosaurs does not fit reptilian growth models. PNAS. January 15, vol. 105 | no. 2, 582-587.
Fusões
Quando a locomoção animal encontra o showbiz.
É o que dá misturar trabalho e prazer.
Imagem – montagem de Luís Azevedo Rodrigues a partir de “The Horse in Motion” (1878), Edward Muybridge e Hilary Swank (2005), Norman Jean Roy
Mail Columbiforme
(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 10/01/2008)
Nos tempos que correm quase ninguém passa sem enviar ou receber mails. Boas e más novas chegam ao nosso conhecimento sob a forma de impulsos eléctricos materializados num qualquer ecrã.
A piada do amigo, a foto do sobrinho, o documento do chefe, tudo nos chega pela via electrónica.
Esta facilidade e rapidez incrementa o que se envia e recebe, não permitindo a necessária filtragem arbitral que o tempo concede.
E quando se estava no tempo em que a biologia condicionava a troca de informação?
Em o que o ritmo informativo era mantido pelo sangue do animal e não pelo silício dos circuitos?
A ideia absurda de me entrar um pombo-correio pelo monitor adentro, com um ficheiro anexo no bico, fez-me escrever este texto – descansem os leitores que não me encontro, ainda, em delírios surrealistas a La Buñuel ou Dali.
A utilização de meios biológicos na comunicação humana é antiga. No caso dos pombos-correio (ordem Columbiformes, espécie Columba livia domestica) os primeiros registos datam do séc. XII na Pérsia (actual Irão), embora seguramente possam ser mais antigos.
A utilização destas aves assenta na sua capacidade de regresso aos locais de onde partiram. Assim, eram utilizados no passado, para transportar informações, em especial de natureza militar. Curioso que a Internet também surgiu de um objectivo militar…
Foram feitas diversas experiências com o objectivo de avaliar a capacidade de regresso a casa dos pombos. Transportaram-se os animais em caixas de metal (a fim de evitar a localização magnética) e anestesiados, para locais remotos. Ainda assim, os pombos conseguiram regressar aos seus pombais de origem.
Tal como os mails, os pombos-correio chegam aos seus destinos em dias de sol e dias encobertos e, se treinados, viajam mesmo de noite. Das poucas condicionantes que inviabilizam o seu labor é a chuva forte. Já os mails dependem se se pagou ou não ao servidor de acesso.
A navegação dos pombos é feita com base na observação do sol, por olfacto e por intermédio do uso de uma “bússola”. Foi detectada a presença de material ferromagnético (Fe3+) no bico destas aves.
Da mesma forma que uma bússola funciona graças à sua agulha magnetizada, também os pombos-correio se servem daquelas substâncias magnéticas na sua orientação.
Evolutivamente, esta capacidade de navegação parece ter-se desenvolvido para permitir um regresso seguro ao ninho após longas viagens em busca de alimento. A selecção artificial feita pelo Homem “aperfeiçoou” esta característica.
Actualmente a utilização de pombos-correio faz parte dos hobbies. Concursos são realizados internacionalmente sendo a maior distância percorrida por um pombo-correio, nos EUA, de 1800 km. Apesar da sua enorme capacidade de orientação, existem sempre casos de desnorteamento
Se ainda dependêssemos do pombo-correio, poderia existir o spam Columbiforme. Este, manifestar-se-ia pela entrada massiva destas aves pelas nossas janelas. Ainda que de arma em riste, seria complicado afastar essa chuva de publicidade não desejada. Os vírus informáticos teriam a sua versão pré-digital na forma da gripe-das-aves. Ao contrário da binária, a biológica afecta os mensageiros e não os receptores da informação.
Quando estavam no poder no Afeganistão, os Taliban aboliram o uso dos pombos-correio.
Tal facto só poderá ser explicado pela confusão daqueles com a pomba da Paz…
P.S. – os meus agradecimentos sinceros, uma vez mais, ao Luís Veloso que sempre em-cima-da-hora me “serve” as ilustrações.
A segunda ilustração é de Hanzlik et al.
Referências
Hanzlik M.; Heunemann C.; Holtkamp-Rötzler E.; Winklhofer M.; Petersen N.; Fleissner G. 2000. Superparamagnetic Magnetite in the Upper Beak Tissue of Homing Pigeons. BioMetals 13: 325-331.
Walcott, C. 1996. Pigeon Homing: Observations, Experiments and Confusions. The Journal of Experimental Biology 199, 21-27.