Não foi falta de comparência…foi KO!

Ao contrário do que se pensava os dinossauros não dominaram todo o Mesozóico (251-65 milhões de anos).
Os vertebrados terrestres dominantes eram outros.
Até ao final do Triásico, algumas das faunas dominantes eram, por exemplo, os grupos Rhynchosauria, répteis herbívoros, os Aetosauria (1, 2), também herbívoros, e os carnívoros Phytosauria.

Entre os representes mais antigos do clado Dinosauria contam-se o Herrerasaurus ischigualastensis e o Eoraptor lunensis, ambos procedentes de jazidas da Formação Ischigualasto do Triásico superior Argentina.
Para além das análises filogenéticas que proporcionaram formular, permitindo perceber o enquadramento dos vários elementos basais de Dinosauria, aquelas duas espécies revelaram igualmente pormenores anatómicos que permitem compreender a evolução locomotora do grupo*.

A transição entre as faunas de não-dinossáurios para um domínio faunístco de dinossáurios, ao nível de diversidade e ocupação de ecossistemas, deu-se, segundo a revista Science, de forma diferente e menos rápida do que se supunha**.

O grupo de paleontólogos que apresentou estes resultados propôs que essa substituição faunística, ao nível de vertebrados terrestres, ter-se-à dado não só mais lentamente mas também de forma distinta em vários locais do planeta.
Os vertebrados terrestres dominantes, pensava-se, teriam entrado em declínio, permitindo assim que os secundários dinossauros ocupassem os nichos ecológicos abandonados.
Mas o que propõem os paleontólogos é que ambas as faunas – dominantes e dinossauros – coexistiram durante um período grande de tempo – 15 a 20 milhões de anos.
O que se verificou , por outras palavras, foi uma vitória por KO (adaptativamente os dinossauros foram melhores) e não uma vitória por falta de comparência (as faunas até aí dominantes coexistiram com os dinossauros e não se extinguiram previamente ao aparecimento daqueles).

* – Ao contrário do que sucedeu com os mamíferos, cujos elementos conhecidos (alguns exemplos 1, 2 , 3) mais primitivos eram todos quadrúpedes, a locomoção original nos dinossauros era a locomoção bípede.
**- A associação faunístca estudada e que permitiu estes resultados foi a da Formação Chinle do Triásico superior do Novo México, nos EUA.

Referências:

Langer, M.C., Benton, M.J. 2006. Early dinosaurs: a phylogenetic study.Journal of Systematic Palaeontology 4 (4): 309–358

Sereno, P. 2007. The phylogenetic relationships of early dinosaurs: a comparative report. Historical Biology, 2007; 19(1): 145–155

Randall B. Irmis, Sterling J. Nesbitt, Kevin Padian, Nathan D. Smith, Alan H. Turner, Daniel Woody, Alex Downs. A Late Triassic Dinosauromorph Assemblage from New Mexico and the Rise of Dinosaurs. Science 20 July 2007: Vol. 317. no. 5836, pp. 358 – 361
DOI: 10.1126/science.1143325

Imagens – capa da revista Science de 20 de Julho de 2007; ©Carlos Papolio 2006

Cada vez mais altriciais…*

Antes, ia aos correios, com 6 ou 7 anos, pagar as contas ou levantar uma encomenda à minha mãe.
Andava de uma lado para o outro, ia a casa dos meus amigos desafiá-los para jogar à bola ou simplesmente para passear.
Agora, sobrinhos com o dobro da idade que eu tinha quando circulava sozinho, têm cada vez menos autonomia.
Vão às discotecas, mas são “deixados e levantados” à porta; passam horas ao telemóvel com os amigos, mas raramente os vêm, fora das câmaras da net; não aparecem lá por casa, marcam-se horas.
Agora, na idade adulta, saímos cada vez mais tarde do tecto dos pais; casamos mais tarde; temos filhos mais tarde;…

Estaremos a ficar cada vez mais altriciais?
Ou as ameaças dos “predadores” cada vez mais intensas?
Ou apenas paranóicos?

* o grau de desenvolvimento e de dependência das crias em relação aos progenitores pode ser diverso.
Basta comparar um vitelo (precocial- bem desenvolvido e ao fim de pouco tempo já se desloca autonomamente) com as crias de coelho (altricial – com um grau de desenvolvimento baixo e completamente dependentes dos progenitores).

Imagens – “Views of a Fetus in the Womb”, Leonardo da Vinci ; e daqui com diversos vídeos e textos.

No meio das claques…

(Na sequência de um post que publiquei e a que a Palmira F. Silva fez referência fui apelidado, por um blogger anónimo, de “…(e agora até liga outros) blogs anti-religião.”)

Caro anónimo(s) jonatasianos e criacionistas menos derivados,

Raramente vos comento em matérias que não envolvam a minha área de trabalho.
Não poderia, no entanto, deixaria de vos dizer o seguinte:
-com agrado, fundado apenas na ignorância de pessoas por quem nutro desacordo intelectual, verifiquei que os epítetos à minha pessoa entraram num campo original – apelidarem-me de anti-religioso.
-poderia tecer considerações sobre a minha religiosidade ou a inexistência dela mas seria, na minha opinião, revelar pormenores pessoais que somente a mim dizem respeito – não conhece quem quer, apenas quem a isso está disposto – e Vossas Excelências não merecem tal agrado.
-é com satisfação que vejo que não largaram as dicotomias argumentativas a que, habitualmente, se recorrem – ou pró-criacionismo ou anti-religioso.
Deverei, por analogia e no mesmo nível de raciocínio, perguntar-vos que se for pró-Beira-Mar serei um esconjurado anti-Académica? Pois então sim! Venham de lá essas capas da Briosa inundar os meus ovos-moles beira-maristas!!

E quanto ao Sumol? Prazenteiros consumidores de Sumol de ananás inibirão a consulta de blogs pró-Sumol de laranja?

Se ser anti-religioso é pactuar intelectualmente com as atoardas, ignorâncias voluntárias e maniqueísmos de Ciência vs Religião, pois que seja.

Prefiro partilhar o Inferno com os primos Pan troglodytes que o Céu com exemplares Homo sapiens como vós.
Ao menos sei o que move os meus primos – felicidade, seja a procriar, comer ou o que for.
A vós o que vos move? A felicidade dos outros?
Duvido.
O medo. A ignorância. A manipulação deliberada.
A mim move-me procurar a minha felicidade e a dos outros.
Se passar pela religião, que passe.
Se não passar, deixai-a.
O que vos digo é o mesmo que digo a quem critica a religião alheia: não voltareis a provocar que sinta tristeza por pertencer ao mesmo género e espécie que vós.
Ignoro-vos. Ou melhor, tento.

Luís Azevedo Rodrigues

O mar e as entranhas – histórias de bactérias

(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 12/07/2007)
A escuridão é total. Mas há vida.
Não poderíamos viver nestes ambientes. Mas conhecemo-los.
Ou partes dele.
O fundo do mar.
O nosso sistema digestivo.
O grande desconhecido que é o profundo marinho tem equivalências no invisível interno humano.
O PNAS*, de 5 de Julho de 2007, publicou um estudo sobre a vida microscópica, onde se relacionam os dois ambientes, com personagens que estão mais relacionadas do que até aqui se imaginava.
Quer o sistema digestivo quer o fundo do mar são ambientes inóspitos – escuros e com baixas concentrações de oxigénio.
Ainda assim estão repletos de bactérias.

Sulfurovum litthotrophicum, descrita em 1984, e Nitratiruptor tergarcus são duas espécies de bactérias do grupo ε-Proteobacteria, que habitam o fundo do mar. Sobrevivem a temperaturas comos as que temos no frigorífico lá de casa, 4º C, até aos 70º C. Vivem ambas no substrato marinho de grandes profundidades obtendo energia através da fixação de azoto provenientes de fontes hidrotermais. São consideradas das mais resistentes formas de vida, pois conseguem sobreviver naqueles ambientes adversos, onde as temperaturas podem atingir mais de 100º C, a profundidades, como no caso da fonte hidrotermal “Menez Gwen” dos Açores, de 1700 m.
Apesar da enorme resistência daquelas bactérias em ambiente natural, só recentemente foram cultivadas em laboratório permitindo que fossem estudadas mais detalhadamente.

O outro grupo de bactérias que ninguém gostaria conhecer, pelo menos na prática ocupa, com maior ou menor frequência, o nosso sistema digestivo.

A Helicobacter pylori, descoberta em 1982, está presente em metade da população mundial, sendo a causadora da inflamação da mucosa do estômago bem como das úlceras gástricas e do duodeno. A descoberta desta relação concedeu, em 2005, o prémio Nobel da Medicina a Barry Marshall e J. Robin Warren.
O minúsculo ser vivo acompanha a espécie humana desde há muito num fenómeno coevolutivo, facilitado pela sua grande variabilidade genética.
Segundo investigadores do Instituto Max Planck em Berlim, a Helibobacter tem sido transmitido de pais para filhos desde a nossa ancestral saída de África.
Reconstruindo a árvore evolutiva desta bactéria, foi possível identificar dois grandes ramos – um que infecta os europeus e norte-americanos e outro que afecta sobretudo os asiáticos. Essas duas linhagens estão associadas às migrações humanas, permitindo reconstituir essas antigas movimentações.
Outro dos géneros de bactérias patogénicas analisado foi o Campylobacter jejuni, responsável por intoxicações alimentares nomeadamente a gastroenterite. Os ambientes favoritos para a sua disseminação são leite cru ou mal pasteurizado, aves mal cozinhadas e água não tratada (líquida ou em gelo).

A equipa de investigadores procedeu à análise do ADN presente nas bactérias que partilham o nosso ambiente digestivo – Helicobacter e Campylobacter – e o das bactérias das profundezas marinhas – Sulfurovum e Nitratiruptor.
Os dois grupos de bactérias apresentaram afinidades genéticas, que lhes possibilitam viverem em ambientes hostis. Entre as semelhanças estão a quase ausência de genes de reparação do ADN. Este facto permite não só a grande adaptação destes seres vivos a novas condições extremas, mas também ao próprio sistema de defesa de um organismo hospedeiro.
Segundo os investigadores, as bactérias humanas evoluíram a partir de ancestrais de grande profundidade, adquirindo o seu “mau-feitio” quando estabeleceram relações simbióticas com invertebrados marinhos.
Não era novidade que tínhamos todos uma origem marinha.

Foi de lá que viemos.
O profundo marinho e o sistema digestivo humano partilham coincidências evolutivas.
O sistema digestivo humano serve de mar a uma variedade de fauna microscópica; sabemos agora que parte dessa fauna tem parentes próximos nos fundos marinhos.

* Proceedings of the National Academy of Sciences


Referências consultadas

-Inagaki, F. et al. 2004. Sulfurovum lithotrophicum gen. nov., sp. nov., a novel sulfur-oxidizing chemolithoautotroph within the ε -Proteobacteria isolated from Okinawa Trough hydrothermal sediments. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology, 54, 1477-1482.
-Nakagawa, S. et al. 2007. Deep-sea vent ε-proteobacterial genomes provide insights into emergence of pathogens PNAS published July 5, 2007, 10.1073/pnas.0700687104.
-Nakagawa, S. et al. 2005. Nitratiruptor tergarcus gen. nov., sp. nov. and Nitratifractor salsuginis gen. nov., sp. nov., nitrate-reducing chemolithoautotrophs of the -Proteobacteria isolated from a deep-sea hydrothermal system in the Mid-Okinawa Trough. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology, 55, 925

Qualquer dia prefiro os criacionistas…se calhar não!

“No Verão vêem-se mais OVNIs em Portugal”
“os fenómenos OVNI estão bastante localizados em Portugal, com maior incidência junto à água, nas barragens e nas Serras da Gardunha, de Sintra, de Montejunto, da Estrela e de Monchique».”

Jornal Sol on-line, 30/06/2007

O curioso é que descobri uma referência a um grupo de investigação numa universidade privada portuguesa e que se dedica a este tipo de questões – CTEC – Centro Transdiciplinar de Estudos da Consciência, Universidade Fernando Pessoa.
Outro grupo português, Sociedade Portuguesa de Ovnilogia, cujo lema é “Estudar sériamente observações de OVNIS em Portugal”.
Já agora, e seriamente, não há ninguém que os avise que “seriamente” não é acentuado?

Algumas perguntas breves, que tenho uma tese à espera (citações subsequentes do site do CTEC):

“Os territórios do CTEC atendem, sobretudo, à convicção de que não é mais possível ignorar as profunda e potencias consequências de relações, até há pouco indiscerníveis, entre a consciência humana, a mente e o corpo.”
Convicção? Se já partem da convicção em algo talvez não seja um ponto de partida muito fiável para um processo científico…
“…estudar as implicações dos modelos holográficos e quânticos da consciência…”

Desculpem a ignorância…alguém me pode explicar o que são os ditos modelos?
“…promovendo a compreensão das relações do ser humano com o universo;…”

Isto também eu gostava de perceber… Para mentes simples como a minha talvez fosse melhor – Qual é o sentido da Vida?
“…testar e ampliar novas metodologias exigidas pelas dimensões físicas e neurofisiológicas como por exemplo, as experiências para-religiosas, “próximas da morte”, “fora do corpo”, onde se esbate a nossa actual definição de Real.”

O Real…o meu real é tudo aquilo que percepciono por intermédio do meu corpo…se sair dele o que tenho?
O extra-real ou o Real?

Muito New Age para o meu gosto….
Mas que sei eu?
Nada!

(o “outro” lado, na visão publicitária)

(adenda – 01/07/2007 – DN)
“Espécie de ovni avistado nos céus do Alentejo”
“É um fenómeno muito visto. São umas luzes que têm comportamentos inteligentes. Nalguns casos ficam como que a observar, noutros há testemunhos de pessoas perseguidas por estas luzes”, diz. Luís Aparício conta que “muitos idosos chamam-lhes “avejões“, que é a mistura de ave com anjo”.
Coisa m’ai linda!!

Criacionismo e Educação


A ler esta moção do Conselho da Europa sobre os perigos do Criacionismo na Educação.


“Draft Resolution” (perdoem-me a ignorância de terminologia legal…) 11297, que apresenta um texto substancialmente maior e mais abrangente sobre o Criacionismo
Fonte

Descubra as diferenças

Ilustrações:
Konrad von Gesner in Historiae Animalium”
Albrecht Dürer “Rhinoceros”
P.S. – post “inspirado” no post de Palmira F. da Silva “Ciência e Arte II

Podcasts, modernices e erros


As acções de divulgação científica requerem linguagem acessível e simples.
Esta condição não pode invalidar o fundamental: o rigor científico.
Quando se simplifica a linguagem e se quer ser correcto muitas coisas podem falhar de forma que o balanço dos dois factores – linguagem acessível e rigor científico – nem sempre é fácil.
Este ponderar a nem sempre é respeitado, como tenho verificado em especial no que diz respeito a conceitos da minha actividade profissional – evolução de vertebrados em especial de dinossáurios.
O que quero comentar surgiu na sequência da audição do 7º podcast da publicação on-line Ciência Hoje intitulado “Das galinhas pré-históricas a Robin dos Bosques com Leonardo da Vinci pelo meio”.
O podcast inicia-se com a descrição de um estudo feito a partir da análise de moléculas orgânicas provenientes ossos fossilizados de dinossáurios.
Algumas frases menos felizes, em termos evolutivos, dos autores do podcast.

“…estudo que demonstrou que os parentes mais próximos do Tyrannosaurus rex são, nada mais nada menos que as galinhas.” “…galinha era o organismo mais próximo do Tyranossauro rex”.

Estas afirmações estão incorrectas em dois pontos: o que o estudo veio confirmar foi a relação de parentesco entre os dinossáurios (concretizado neste estudo do T. rex) e as aves.
Embora se possa utilizar a metáfora (claramente apelativa, reconheço) que a galinha e o T. rex estão directamente relacionados é absolutamente errado dizer o parente mais próximo do gigante pré-histórico é a galinha.
A linhagem evolutiva da ordem Galliformes e família Phasianidae à qual pertence a galinha (Gallus gallus domesticus) não é o “caminho” evolutivo mais curto a partir dos Theropoda (dinossáurios carnívoros).
Há toda uma linhagem com dezenas de grupos e animais em clados intermédios e esquecer isso demonstra ignorância científica sob o ponto de vista evolutivo. Pode parecer um preciosismo mas não é. É apenas rigor científico que deve estar na base de qualquer produto de divulgação científica.
Era como descrever uma reacção bioquímica apenas referindo as moléculas iniciais e final esquecendo todos os passos intermédios – quantas vezes o desejei nas aulas de Bioquímica; mas não era possível, todos os compostos intermédios eram fundamentais para a compreensão de determinada reacção ou ciclo.

“…os pássaros descendem directamente dos dinossauros.”

Imaginei que se pretenderia utilizar a designação corrente da palavra pássaro; por isso fui consultar rapidamente o dicionário on-line da Porto Editora o qual referia: pássaro = substantivo masculino; popular- ave pequena; popular – indivíduo astuto; Ornitologia-ave pertencente à ordem dos pássaros.”
Obviamente que os autores do podcast pretendiam referir-se às aves (classe Aves) através da palavra pássaro; mas quer sob o ponto de vista popular (ave pequena) quer do ponto de vista ornitológico (ave pertencente à ordem Passeriformes) aquela utilização está errada e é enganadora.
Pássaros são aves pertencentes à ordem Passeriformes.
Dever-se-ia utilizar a palavra aves ou a Aves (para a classe Aves) senão como explicar que uma avestruz (que pelo tamanho mas sobretudo pela filogenia não é um pássaro ou pertencendo a Passeriformes) também descenda dos dinossauros?

“-…eu esperaria que espécies como o dragão de Komodo ou crocodilos, por se tratarem de répteis, fossem mais semelhante a um dinossauro que uma galinha. Não é esse o caso? -Na realidade, Alex, é provável que sim…”

De certeza que não.
As análises filogenéticas revelam todas que os parentes mais próximos dos dinossáurios são as aves. O clado Crocodylia está aparentado com os dinossáurios dentro do clado Archosauria (Aves+ Crocodylia ) mas os descendentes directos dos dinossáurios são as aves.
Apesar de aparentados, se tivermos que hierarquizar parentescos entre aves e crocodilos e os dinossáurios, as primeiras estão mais próximas dos dinossauros que os segundos.
No caso do dragão de Komodo o erro ainda é maior pois este animal descende evolutivamente dos répteis mesozóicos denominados mosassáurios – não são dinossáurios. A família Varanidae à qual pertence o dragão de Komodo (Varanus komodoensis) iniciou a sua divergência filogenética dos mosassáurios há cerca de 100 milhões de anos tendo o género Varanus o primeiro registo fóssil há cerca de 15 milhões de anos.

Por vezes o discurso directo, como o utilizado neste podcast, pode conduzir a reprodução menos correcta de conceitos científicos, baseados, por exemplo, apenas no “aspecto” ou “aparência” revelando um desconhecimento da história evolutiva de um grupo de vertebrados que “apenas” possui actualmente mais de 9000 espécies…

Apenas alguns exemplos de bibliografia que pode ser consultada:

Bell, G. L. Jr. and Polcyn, M. J. 2005. Dallasaurus turneri, a new primitive mosasauroid from the Middle Turonian of Texas and comments on the phylogeny of the Mosasauridae (Squamata). Netherlands Journal of Geoscience (Geologie en Mijnbouw) 84 (3):177-194.

Chiappe, L. 1995. The first 85 million years of avian evolution. Nature 378: 349-355.

Feduccia A. 1995. Explosive evolution in Tertiary birds and mammals. Science 267: 637-638.

Feduccia A. 2003. ‘Big bang’ for Tertiary birds? Trends in Ecology and Evolution 18: 172-176.

Lee, M.S.Y. 1997. The phylogeny of varanoid lizards and the affinities of snakes. Philos. Trans. R. Soc. London Ser. B 352, 53-91.

Livezey, B. C., and R. L. Zusi. 2007. Higher-order phylogeny of modern birds (Theropoda, Aves: Neornithes) based on comparative anatomy: II. – Analysis and discussion. Zoological Journal of the Linnean Society. 149: 1-94.

(figura adaptada de Feduccia 1995)

Invejas…


Já tinha ouvido falar (e digo ouvido porque na verdade não sei muito da vida sexual dos periquitos…) que os periquitos só acasalavam por “inveja” – macho+fêmeas=nicles; macho+macho+fêmea=festa!!
Um recente artigo conclui que as mulheres também sofrem de algo semelhante – acham mais atraentes os homens que recebem mais sorrisos de…outras mulheres!
E venham-me dizer que o Amor é estanque…
Resto da história – aqui

(imagem da direita e do fundo do artigo Social transmission of face preferences among humans Benedict C. Jones, Lisa M. DeBruine, Anthony C. Little, Robert P. Burriss, David R. Feinberg, Social transmission of face preferences among humans, Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences, 16 Jan 2007, Page FirstCite, DOI 10.1098/rspb.2006.0205, URL http://dx.doi.org/10.1098/rspb.2006.0205)

O Plágio, o Bacalhau e a Rã

(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 18/01/2007)
O plágio humano pode ser uma homenagem. Pode ser um reconhecimento. Pode ser agradecimento público. Pode ser feito às claras.
Mas não é nada disso.
É antes uma forma de usurpação do trabalho alheio. Um conceder de auto-indulgência à mediocridade e ao deixa-andar. Um permanecer no contentamento da pasmaceira intelectual.
O acelerar da tristeza da mediania.
O caso de aparente plágio, e digo aparente porque ninguém, à excepção do Provedor do Público o categorizou assim, muito menos o Sindicato dos Jornalistas, levado a cabo pela jornalista Clara Barata, despertou em mim o desejo de procurar exemplos naturais que estivessem relacionados com plágio.
No artigo que escrevi nestas páginas há uns meses e intitulado Falsificações Naturais referi alguns exemplos de cópias e imitações levadas a cabo na Natureza.
Nele referi casos de Evolução Convergente como, por exemplo, os membros anteriores das aves, dos morcegos e dos pterossauros (répteis voadores, parentes e contemporâneos dos dinossauros).

g-morhua.jpgUm dos casos de evolução convergente que agora quero referir compreende proteínas que evitam o congelamento em águas muito frias.
Este tipo particular de glicoproteínas anticongelantes – AFGPs – permite aos peixes sobreviver em águas com temperaturas tão baixas quanto -1,9º C (a concentração de sal na água do mar baixa o ponto de congelação da mesma…).
Existem diferentes tipos de AFGPs que evitam o congelamento a diversos seres vivos – peixes, insectos e plantas – e em 1997 foi publicado no PNAS o caso de dois grupos de peixes filogenética (não-aparentados) e geograficamente distantes que possuem o mesmo tipo de anticongelante.
Este caso de evolução convergente tem como um dos protagonistas o denominado bacalhau do Árctico – Boreogadus saida (parente do bacalhau do Atlântico, Gadus morhua). O outro actor desta história de plágio natural habita o lado oposto do planeta – a Antártida – e dá pelo nome de Dissostichus mawsoni.
O mais interessante da referida publicação científica é o facto destes dois peixes – o do pólo norte e o do pólo sul, se assim os podemos chamar – terem desenvolvido o mesmo tipo de proteína anticongelante apesar de estarem separados quer ao nível da proximidade física quer “familiar”.
Outro facto curioso é de estes investigadores terem concluído que a mesma AFGP se originou por um percurso genético diferente nos distintos grupos bem como em momentos diferentes do passado. No caso do Dissostichus mawsoni do continente gelado do sul entre os 7 e os 15 milhões de anos; no caso do bacalhau do Árctico foi mais recente, há “apenas” 2 milhões de anos. Grupos e locais distintos utilizam as mesmas “armas”!

2123418706_c48a118323_o.jpgA rã do género Dendrobates pode ser uma verdadeira engenheira química. Esta variedade habita a América do Sul e América Central possuindo pele venenosa. Esta toxicidade cutânea tem fundamentalmente dois objectivos: repelir microrganismos que possam atacar a sua pele húmida e, por outro lado, defender-se dos ataques de predadores.
A matéria-prima para esta guerra química provém da ingestão que as rãs fazem quer de formigas, quer de artrópodes. O que investigadores descobriram é que os alcalóides -substâncias químicas tóxicas- não se apresentam na mesma forma em que foram ingeridas. No PNAS de Setembro de 2003, os investigadores relatam que a rã não só é capaz de ingerir os tóxicos como ainda os aperfeiçoa – até cinco vezes mais potentes!
A “maquinaria” celular – enzimas – destas rãs é verdadeiramente notável uma vez que não se limita a fazer “cortar e colar” dos venenos das formigas; melhoram-nos e aprimoram-nos!
Este caso não é plágio do mundo natural e deve servir-nos de referência- aproveitar o que há de bom, modificá-lo e produzir algo de novo.

O aparente silêncio a que a maioria da comunicação social remeteu o referido aparente plágio só me leva a concordar com Clara Ferreira Alves, que na última edição da revista Única do Expresso, escrevia “No mundo dos patrocínios e da subordinação ao economicismo, o jornalismo foi-se diluindo em formas que renegam e abandonam esse corpo de princípios e preceitos que fez o apogeu do jornalismo como quarto poder, e que determinará a sua queda e ascensão tecnológica dos “media” concorrentes.”
Esperemos que não.
Que a Wikipedia e outras formas de massificação da informação nos dias que correm sirvam para que aproveitemos o melhor, o transformemos e criemos algo de verdadeiramente original.

Nota – PNAS refere-se à publicação científica americana Proceedings of the National Academy of Sciences.

Imagens: identificada na primeira e a segunda daqui