Complexos
It is an old maxim of mine that when you have excluded the impossible, whatever remains, however improbable, must be the truth.
Arthur Conan Doyle, 1858 – 1930
Se é certo que o Ciência Ao Natural não desfruta dos milhares de visitantes que recebem, por exemplo, A Educação do Meu Umbigo ou o De Rerum Natura, também é verdade que tem fiéis leitores, fruto mais do apoio que o jornal Público lhe presta do que pelo mérito da minha prosa.
Assim sendo, é fácil observar a procedência e parte dos gostos dos visitantes que frequentam o espaço de divulgação que é o Ciência Ao Natural. É uma actividade que me dá gosto: ver quem me visita, que artigos prefere, etc.
Na 2ª feira, dia 5 de Janeiro de 2009, publiquei um post intitulado “Currículo Cívico“, onde chamava a atenção para a inusitada clareza de análise de Medina Carreira. Apelava para que o vídeo de uma entrevista fosse visto, particularmente numa parte que Medina Carreira disserta sobre o estado da Educação em Portugal.
E que aquela entrevista deveria ser escutada por todos os portugueses.
Mesmo pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Curioso é que, no dia seguinte, constatei ter sido visitado demoradamente, algumas das visitas com mais de uma hora, por utilizadores quer da Ceger – Centro de Gestão da Rede Informática do Governo, quer da DGIDC – Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular.
Se um post que tem como palavras-chave “Primeiro-Ministro”, “Educação” e “Medina Carreira” gera longas visitas dos referidos organismos governamentais, pergunto:
que tipo de visitantes institucionais terei quando rabiscar um post que tenha como palavras-chave “aloé vera”, “pirâmide” e “loucura”?
Expressões irritantes
…foram seleccionadas de compiladas por investigadores da Universidade de Oxford.
Aqui estão elas:
1 – At the end of the day
2 – Fairly unique
3 – I personally
4 – At this moment in time
5 – With all due respect
6 – Absolutely
7 – It’s a nightmare
8 – Shouldn’t of
9 – 24/7
10 – It’s not rocket science
Gosto particularmente da última; já a ouvi algumas vezes em relação ao meu trabalho…
Têm sugestões de frases irritantes e, ainda assim, ouvidas até à exaustão na língua de Camões? (esta é a minha modesta contribuição – língua de Camões…enfim…)
Poesia Concreta
É o que dá pegar neste texto, copiá-lo e colocá-lo aqui.
Dá nisto.
Já alguns se tinham lembrado antes, aquando da Poesia Concreta, mas agora é mais fácil.
Pelo menos mais fácil mas sem resultados artísticos garantidos…
P.S. – o título, aparentemente pretensioso, refere-se obviamente não à “carne literária” que introduzi.
P.P.S. – a fonte da “máquina” veio de uma mensagem de Thomas Holtz para ‘dinosaur mailing list’…
Cada vez mais altriciais…*
Antes, ia aos correios, com 6 ou 7 anos, pagar as contas ou levantar uma encomenda à minha mãe.
Andava de uma lado para o outro, ia a casa dos meus amigos desafiá-los para jogar à bola ou simplesmente para passear.
Agora, sobrinhos com o dobro da idade que eu tinha quando circulava sozinho, têm cada vez menos autonomia.
Vão às discotecas, mas são “deixados e levantados” à porta; passam horas ao telemóvel com os amigos, mas raramente os vêm, fora das câmaras da net; não aparecem lá por casa, marcam-se horas.
Agora, na idade adulta, saímos cada vez mais tarde do tecto dos pais; casamos mais tarde; temos filhos mais tarde;…
Estaremos a ficar cada vez mais altriciais?
Ou as ameaças dos “predadores” cada vez mais intensas?
Ou apenas paranóicos?
* o grau de desenvolvimento e de dependência das crias em relação aos progenitores pode ser diverso.
Basta comparar um vitelo (precocial- bem desenvolvido e ao fim de pouco tempo já se desloca autonomamente) com as crias de coelho (altricial – com um grau de desenvolvimento baixo e completamente dependentes dos progenitores).
Imagens – “Views of a Fetus in the Womb”, Leonardo da Vinci ; e daqui com diversos vídeos e textos.
Destapar a poesia das coisas
Como (quase) todos os dias começo por me deleitar com as palavras e histórias do Fernando Alves no “Sinais” na TSF.
O Fernando tem o que é imprescindível a qualquer cientista – a curiosidade e o poder da observação.
Alia essas características ao dom de manejar as palavras numa teia que prende e vicia, conduzindo-nos a ela por voz reconhecível.
Quando uma vez quis falar comigo, por motivos profissionais, fiquei mais nervoso do que em muitos congressos.
Mas acabei por fazê-lo.
Hoje, uma vez mais, o destapar a poesia das coisas como só ele o faz.
(fotos – REUTERS/Stringer; site TSF)
Todos os Nomes*
Nomear e classificar são actos intrinsecamente humanos. Chamamos as coisas pelos nomes para as discriminar, mas esse acto acrescenta algo mais do que a mera nomeação da coisa.
“Não me chames nomes!”, dizia-me um colega de escola para não ser ofendido; “Isso não se diz!”, corrigia a minha mãe quando eu apelidava, com várias intenções, alguém de quem não gostava.
A classificação dos seres vivos, quer actuais quer os do registo fóssil, obedece a regras precisas com o objectivo de não gerar equívocos e mal-entendidos na comunicação científica.
Utilizando várias fontes online, todas baseadas na “bíblia” da nomenclatura dos animais – o ICZN (International Code of Zoological Nomenclature), dediquei algum tempo à pesquisa de nomes inusitados com que alguns animais têm sido nomeados.
Não poderia deixar de começar com uma personagem fóssil que tem estado ligada à minha vida profissional – o Apatosaurus louisae. Este dinossáurio saurópode americano foi dos primeiros a ser descoberto e montado numa exposição, nos finais do séc. XIX. O mecenas das escavações e trabalho científico, Andrew Carnegie, tinha como esposa a senhora Louise, sendo esta a musa inspiradora para o nome do grande animal.
Mas a homenagem dos paleontólogos não se ficou pela patroa; também o senhor Carnegie teve direito ao seu quinhão – Diplodocus carnegii – outro saurópode, sendo assim apelidado para preservar o nome do chefe. Não morder a mão que nos alimenta e abençoar o seu nome devia ser a moral da história…
Ainda no mundo dos dinossáurios de referir o Masiakasaurus knopfleri, um carnívoro descoberto em Madagáscar. A história do baptismo é conhecida mas foi-me contada na primeira pessoa por um dos autores, Catherine Foster. Justificou-me ela que ouviam a música dos Dire Straits, cujo vocalista é Mark Knopfler, quando descobriram o sáurio. Espero estar ouvir Amália da próxima vez que estiver a escavar, pensei eu na altura. E não é que existem pelo menos 13 animais com o nome “amalia”, entre aves, moluscos e insectos?
Outro dos ícones portugueses, o Pantera Negra, entra no nome científico de dois animais – Libellula eusebioi (uma libélula fóssil) e um ácaro das Filipinas, Dolicheremaeus eusebioi.
Aproxima-se o importuno Dia dos Namorados mas nada como relembrarmos o Bela eva, um gastrópode de Moçambique. Que nome bonito e adequado para a nossa cara-metade. Bem, a menos que ela seja uma malacologista – estudiosa de gastrópodes e bivalves – pois nesse caso não achará grande originalidade ao nosso piropo conjugal. Mas podemos sempre atirar-lhe com Amoraster – ouriço-do-mar do Miocénico da Austrália. Quem feio escuta, bonito lhe parece, pelo menos nesta situação.
Há 470 milhões de anos, quando fossilizou, o equinoderme primitivo Delgadocrinus oportovinum mal imaginava que teria o seu baptismo científico associado ao produto agrícola mais famoso de Portugal – o Vinho do Porto. Pois foi isto que a equipa liderada por um paleontólogo da UTAD fez; a justificação para a designação da nova espécie assenta na sua morfologia já que esta faz lembrar um cálice do néctar duriense, sendo a primeira parte do nome uma “vénia” ao geólogo Nery Delgado, responsável pelas primeiras recolhas de material.
Se os paleontólogos puderem ter algum apoio do sector vinícola, é ouro sobre…um Porto de Honra!
” ****, seu **** “, são nomes que não posso repetir e que apelidam o senhor do apito que corre de calções, com outros senhores que pontapeiam uma bola; mas quando “joga” o Taedia benfica – insecto pertencente à família Miridae e descrita por cientistas brasileiros, não me parece que haja muitos protestos, salvo se estivermos para os lados das Antas ou Alvalade.
O prémio para nome contraditório poderia perfeitamente ser atribuído à Boa canina – um réptil da ordem Serpentes; esta besta, que mata por estrangulamento, de boa não tem nada, pelo menos para as suas vítimas; e de canino, talvez apenas a fidelidade ao seus instintos.
Já o Turanogryllus mau – um grilo africano – pode invocar que tem a reputação manchada pelo nome científico que lhe calhou na rifa…
O mundo da Internet já serviu igualmente de inspiração ao “negócio” de alcunhar animais. A Proceratium google é uma formiga de Madagáscar, descrita em 2005 e, justificam os investigadores, tem a particularidade de saber procurar muito bem as suas presas, tal como o seu homónimo informático.
A lista de nomes é imensa, mas finalizo com Libellago finalis – uma libelinha.
Assim, acho que ainda tenho tempo para agarrar La cerveza – uma traça norte-americana.
*Uma sincera homenagem à obra homónima de José Saramago.
(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 15/2/2007)