Profissão Biólogo – Produção de mudas para reflorestamento

Fernanda Furlan, responsável pela produção de mudas da Ziani Florestal

Ir na contramão de todos no Mato Grosso e transformar áreas degradadas em florestas é profissão biólogo.

Ir na contramão de todos em Mato Grosso e transformar áreas degradadas em florestas é profissão biólogo.

Meu nome é Fernanda Furlan e sou botânica, trabalhando com produção de mudas exóticas e nativas em um viveiro e implantando as mudas produzidas em reflorestamento. Trabalho para a Ziani Mudas Florestais. Esse mercado até tem espaço para mais biólogos, mas é limitado e a competição com profissionais das engenharias agronômica e florestal dificulta muito nosso ingresso.

Para trabalhar nessa área é necessário entendimento sobre fisiologia, anatomia e taxonomia botânica. Principalmente relacionada à nutrição das plantas e adaptação a diferentes ambientes. Sou supervisora de produção de mudas e de campo. Oriento a melhor produção das mudas com indicações sobre substrato, adubação, luminosidade e umidade. Além de supervisionar a implantação das florestas. Minha carga horária semanal não é definida. No trabalho de campo devemos considerar as adversidades cotidianas, mas a dedicação varia de 40 a 60 horas. Trabalho em ambiente aberto e na zona rural.

Depois de formada em biologia, outras formações foram necessárias, mas nada ligado a mestrado e doutorado. É muito importante que o profissional continue reciclando seus conhecimentos e adquirindo novos também, nessa área há muita competição. Muitas disciplinas me agradaram na graduação. Não segui uma linha de pesquisa específica, o que contribuiu muito para o meu trabalho. Mas no trabalho uso todos os dias os conhecimentos que obtive nas matérias de Estatística, Botânica, Taxonomia, Fisiologia e Anatomia vegetal.

Ainda durante a graduação comecei com um estágio extracurricular junto com outros quatro estagiários de diferentes áreas de atuação. A intenção desse estágio era contratar um profissional. Acabei conseguindo essa vaga assim que me formei.

Contato com a natureza em campo é o que me motiva nessa profissão. Poder acompanhar o desenvolvimento das florestas contribuindo para a conservação dos biomas. Todo dia acontece algo diferente, nunca vivo uma rotina, afinal o ambiente não é controlado. Por outro lado, os desafios estão em conseguir sobressair mesmo com a concorrência de outros profissionais nesta área em busca da remuneração merecida.

Se você deseja obter um emprego como o meu, sugiro que busque um estágio na área e faça cursos e workshops sempre que possível. Busque realizar trabalhos científicos nesta área ainda durante a graduação e se aprimore em áreas paralelas como a engenharia agronômica e florestal. É importante não parar os estudos depois da graduação. A concorrência é muito alta, pois a área é muito promissora nos dias de hoje, o profissional deve sempre buscar meios de se destacar.

Pensamento de Segunda

“A natureza, por uma necessidade absoluta e incontrolável, determinou-nos para julgar, assim como para respirar e sentir.”

David Hume

O poder do nós também pode ser egoísta

Este post é parte do Blog Action Day

Este post é parte do Blog Action Day

A vida em sociedade é importante para muitas espécies, incluindo, e especialmente, nós humanos. Somos uma espécie altamente social, cuja vida depende muito de outros membros da nossa sociedade. Sempre me ocorre isso quando vejo esses filmes de catástrofes. Tente imaginar, por exemplo, sua vida sem o agricultor que planta trigo ou sem o técnico responsável por manter funcionando sua linha de provisão de energia elétrica. Vivemos numa sociedade com especialização dos trabalhos.

A união faz a força, mesmo que cada um esteja lá por interesse próprio.

A união faz a força, mesmo que cada um esteja lá por interesse próprio.

Recentemente voltou à tona uma discussão que se considerava havia muito enterrada num artigo na Nature. A pergunta que intriga é, por que dedicar os seus esforços para realizar uma atividade que não irá te trazer um benefício direto? Por que ser altruísta?

Biólogos até a década de 1960 sustentavam que a evolução privilegiava ações de indivíduos que agissem pelo bem da espécie. No entanto, uma análise mais detalhada demonstrou que esses comportamentos dificilmente se sustentariam se o indivíduo infligisse a si um prejuízo para beneficiar seus pares. O prejuízo auto-infligido se converteria numa punição evolutiva, menos filhos herdando o hábito de ajudar os outros. Já o benefício oferecido pelo altruísta se converteria em mais descendentes para aqueles que não fossem generosos, rapidamente diminuindo na população o hábito de ajudar a qualquer preço.

Um ato altruísta tende a ser retribuído

Um ato altruísta tende a ser retribuído

No início do mês um pedreiro de Catalão, Goiás, encontrou uma pasta com 50 mil reais. Ele levaria 2 anos para ganhar esse valor, mas não teve dúvida, devolveu o dinheiro aos donos. Se a evolução privilegia o egoísmo, por que é que não vivemos numa sociedade de aproveitadores perversos? Por que é que vemos rotineiramente atos de generosidade como esse?

Acredita-se que a resposta esteja em benefícios indiretos. O ato altruísta pode gerar um prejuízo a quem o realiza de imediato, mas, se no futuro ele resultar em benefício, já se justificará. Esse benefício pode vir na forma de reciprocidade. A escola dona dos 50 mil encontrados pelo pedreiro lhe ofereceu em retribuição uma bolsa para o filho, estimo isso em uns 12 mil reais por ano, mais do que o dinheiro devolvido se o menino cursar do 5º ao 9º ano ali.

Mas e essas generosidades cujo receptor nunca fica sabendo quem o beneficiou? Receptores de sangue nunca ficam sabendo quem o doou. Como retribuir o favor? Muitas vezes quem retribui o favor, nesse caso, são os outros. Aqui na UNEMAT doador de sangue ganha isenção nas taxas de todos os concursos estaduais. Num experimento, pessoas identificadas como generosas receberam mais ajuda de estranhos do que pessoas sem essa característica. É o que chamamos de reciprocidade indireta.

Recentemente alguns pesquisadores têm tentado trazer de volta a seleção de grupo. Eles sugerem que dentro de um grupo de generosos, um egoísta seria privilegiado. No entanto, quando grupos são postos a competir, os mais generosos tendem a se dar melhor. Por isso os autores chamaram esse processo de seleção multinível, embora ela represente basicamente a seleção de grupo.

O problema é que esse conceito não contribui em nada mais do que a seleção sobre o indivíduo. Sim, grupos mais coesos superarão competitivamente os mais egoístas. Mas isso porque os indivíduos desses grupos se darão melhor. A unidade de atuação da seleção natural continua sendo o indivíduo e não o grupo.

Um por todos e todos por um, uma hora chega a sua vez de ser ajudado.

Um por todos e todos por um, uma hora chega a sua vez de ser ajudado.

A ressurreição da seleção de grupo reanimou a esperança numa natureza intrinsecamente altruísta1,2 e 3, especialmente em espécies sociais como a nossa. De fato, só a ação sinérgica de muitos indivíduos seria capaz de nos dar um poder maior do que a soma de cada um. No entanto, esse processo pode sim ser guiado por interesses pessoais e ainda assim trazer um benefício geral. Não é necessário que haja um altruísmo desprendido e cego, até evolutivamente perigoso, para que vivamos em uma sociedade forte e generosa.

Pensamento de Segunda

“É necessário que ao menos uma vez na vida você duvide, tanto quanto possível, de todas as coisas.”

René Descartes

Profissão Biólogo – Jogos biológicos

Pensamento de Segunda

“A melhor prova é a experiência.”

Francis Bacon

Cinquenta tons de cinza, uma abordagem evolutiva

Cinquenta tons de cinza, romance para fêmeas padrão. Fonte: intrinseca.com.br

Cinquenta tons de cinza, romance para fêmeas padrão. Fonte: intrinseca.com.br

O inegável fenômeno editorial Cinquenta tons de cinza, de E. L. James, tem batido recordes de vendas. Seu sucesso, em especial entre as mulheres, é, no entanto, previsível. Ele reflete a natureza humana com precisão. O livro é recheado do que há de mais adequado ao papel sexual feminino desde muito antes do surgimento do Homo sapiens.

Sempre me interessei por literatura erótica, descobrir um título novo me chamou a atenção logo no início. Me adiantei e baixei na Amazon a amostra grátis para Kindle, ainda em inglês. Para quem ainda está por fora, a narrativa descreve o romance entre o bilionário-poderoso-autoritário-lindo-bem sucedido-e-perturbado Christian Grey e a jovem atrapalhada e inexperiente Anastasia Steele. Desde muito cedo na trama a jovem se sente atraída pelo galã, com quem inicia um relacionamento sadomasoquista cheio de reservas, mistérios e clichês.

Não sei se diria que se trata de um livro erótico, essa foi a primeira coisa que me surpreendeu. O livro começa em ritmo de comédia romântica à la Marian Keyes sobre o interesse crescente de Anastasia e suas dúvidas sobre a reciprocidade de Grey. Li até o sétimo capítulo, terminou a amostra à qual tinha direito no Kindle e nada da ação esperada para um livro dito erótico. Fiquei entre o desapontamento e a curiosidade (o primeiro mais forte do que o segundo, claro, senão teria comprado o e-book inteiro) até pegar emprestado com uma aluna a versão traduzida, aí tive minha segunda surpresa.

Surpreendi-me em seguida porque, depois de quarenta anos de revolução sexual, esperava que um livro erótico com tanto apelo para o público feminino tivesse sintonizado com as conquistas feministas. Cinquenta tons de cinza não relata aspirações feministas. Relata, sim, aspirações femininas. De todas as fêmeas, inclusive as que eu julgo entender melhor, que são as fêmeas não-humanas.

Anastasia Steele é uma fêmea jovem e fértil, apesar de ter dúvidas sobre sua qualidade enquanto parceira reprodutiva. Ela sabe do valor de seus gametas. Ah sim, óvulos preciosos e raros. Por isso, até os 21 anos, guardou-os muito bem, não confiando a nenhum macho de sua espécie a mais remota possibilidade de aproveitar-se deles. Ana sabia que seus óvulos valiam algo mais, eles deveriam trazer benefícios a ela. Foi aí que a mocinha conheceu Christian Grey.

Christian é um macho alfa: Poderoso, bilionário e sedutor. Ao primeiro contato ela percebe que aquele macho pode lhe prover todo o valor de seus caros óvulos. Ele sim tem muito mais a trocar do que os irrisoriamente baratos espermatozoides oferecidos pelos colegas de subemprego ou de faculdade. Fêmeas de babuíno trocam seus óvulos pela proteção do macho alfa contra agressões. Fêmeas de alguns algumas aranhas trocam seus óvulos por alimento de qualidade oferecido pelo macho. Fêmeas do peixe joaninha trocam seus óvulos por um lar que o macho construiu. Anastasia Steele trocaria os seus por tudo isso!

Presente nupcial, o objeto branco no abdômen da fêmea é um alimento nutritivo dado pelo macho que, assim, aumenta suas chances de acasalar. Fonte: abc.net.au

Presente nupcial, o objeto branco no abdômen da fêmea é um alimento nutritivo dado pelo macho que, assim, aumenta suas chances de acasalar. Fonte: abc.net.au

No entanto, machos opressores não são opressores só com os outros. Essa dominação se repete na alcova. Pássaros caramanchão repetem para suas fêmeas durante a corte o mesmo tipo de movimento agressivo que usam para intimidar rivais. Tubarões brancos mordem suas parceiras para se segurar a ponto de deixar lacerações profundas no dorso. Patos imobilizam a fêmea antes de copular. Bandos de golfinhos nariz de garrafa encurralam uma fêmea e se alternam em copular com ela. Christian Grey, quando finalmente começam as passagens picantes do livro lá pela centésima página, se diverte causando dor e subjugando suas parceiras. Ok, ela adora e consente tudo no clima de envolvimento em que se encontra. Ainda assim o custo da segurança que Grey oferece a Ana é a agressão.

Igualdade entre os sexos, qual o que? A Anastasia Steele que existe em cada leitora quer o mesmo príncipe encantado de sempre: poderoso, provedor e que a admira, mesmo que a subjugue de alguma maneira. Assim como todas as fêmeas do mundo animal, as de nossa espécie também buscam o merecido valor por seus caros gametas femininos, custe o que custar. Se animais pudessem ler, Cinquenta tons de cinza venderia muito mais, porque sua narrativa vai direto ao que as fêmeas esperam dos machos em qualquer espécie.

3º setor, Profissão Biólogo

Pensamento de Segunda

“Sabemos de quase nada adequadamente, de poucas coisas a priori, e da maioria por meio da experiência.”

Gottfried Wilhelm Leibniz

A tesourinha complexada

Para minhas colegas de trabalho Alessandra e Jéssica

Torta, mas funcional. A forfícula dos machos é assimétrica para ajudar nas lutas. Fonte: www.sfsu.edu

Torta, mas funcional. A forfícula dos machos é assimétrica para ajudar nas lutas. Fonte: www.sfsu.edu

ResearchBlogging.orgNaquela manhã, no consultório psicanalítico…

A doutora abriu o consultório e por trás do balcão de atendimento a secretária lia um desses compêndios das piadas mais idiotas. Como era difícil encontrar uma boa funcionária, pensou a doutora. Ela nem contava que a secretária trocasse a revista de piadas pelos sonetos de Shakespeare ou O Livro dos Símbolos do Jung. Não a embaraçar na frente dos clientes já seria suficiente.

– Bom dia, vamos entrando. – Convidou a terapeuta.

O insetinho tinha uma compulsão quase irresistível pelas frestas, estava sentado num canto do sofá encolhido. Bem na hora em que se levantou e virou em direção à porta do consultório, a secretária disparou uma risada nada abafada em reação ao chiste, gargalhada dessas de mostrar obturação em dente siso. Imediatamente a tesourinha curvou os tergitos mediais do abdômen e grudou na parede. Correu para dentro do consultório com as lacínias tortas numa expressão inconfundível de quem foi ofendido.

– Doutora, ela riu de mim. – Sentenciou o animal desconfortavelmente enfiado entre duas dobras do divã.

– E o que há de engraçado em você, Sr. Anisolabis?

– Não é engraçado, é constrangedor! Doutora, nem tamanho de tesourinha que se preze eu tenho. Além disso, morro de vergonha de uma parte do meu corpo.

– O que há de errado com ela? – Instigou a terapeuta que já havia percebido a assimetria e a estatura diminuta do cliente.

– Ah, ela é feia, é pequena. E, doutora, o pior é que ela é mais torta de um lado que do outro. Por isso sua secretária riu de mim. Ela viu como sou horrendo.

– Mais torta para um dos lados, mas será possível? Você mostraria para mim?

– De jeito nenhum, você riria de mim como ela riu. Tenho vergonha. – Respondeu o inseto com o clípeo corado de vergonha.

– Sr. Anisolabis, eu sou uma profissional!

Ainda meio contrariado a tesourinha puxou lentamente seu abdômen de dentro das dobras de tecido do divã e expôs sua extremidade. Ali estava uma estrutura escura e alongada, um lado bem curvado, o outro mais aberto. Era mesmo torto, mas a analista tinha autocontrole e sabia do que se tratava.

-Não tem nada de estranho aí. Sua forfícula está dentro do tamanho padrão para a sua espécie. Além disso, o formato dela assim desigual é, na verdade, uma forma de você lutar melhor, você luta bem graças à sua forfícula torta.

– É verdade. Mesmo eu não sendo dos maiores, luto muito bem e sempre uso com habilidade minha forfícula.

– Você deveria se preocupar mais com a firmeza do aperto de forfícula do que com seu tamanho ou forma. – A analista sempre sabia como contornar uma situação constrangedora.

– Falando assim a senhora até parece minha mãe. – Respondeu o dermaptero.

– Chega de trasferência por hoje, Sr. Anisolabis! Vamos deixar sua relação com sua mãe para a próxima seção. Passar bem.

Nicole E. Munoz & Andrew G. Zink (2012). Asymmetric Forceps Increase Fighting Success among Males of Similar size in the Maritime Earwig Ethology DOI: 10.1111/j.1439-0310.2012.02086.x