Vibes Linguísticas

“Não é possível encontrar a obscenidade em qualquer livro, em qualquer quadro, pois ela é tão-somente uma qualidade do espírito daquele que lê, ou daquele que olha”.(MILLER, Henry. L’obscénité et la loi de réflexion. Paris, Pierre Seghers, 1949, p.9 e 17. [Tradução de D. Kotchouhey.]). (in MORAES, ER)

Devo muito do meu gosto por escrever a esse cara (quem sabe um dia aprendo, né?). No dia 26 de Dezembro de 2010 ele faria 119 anos. Henry Valentine Miller foi meu companheiro de plantões em clubes. Fazia “exame de piscina”. Se fazia sol, trabalhava muito. Mas, quando chovia, viajava com ele por Paris e Nova Iorque. Por entre “pernas e delícias”, eu, menino nerd e sem dinheiro, fui aprendendo que só há um meio de sermos verdadeiramente livres: a literatura. Quando (e se) transformamos nossa vida em literatura então, a coisa fica bem mais interessante. Foi o que ele fez.

“O homem que conta a história não é mais aquele que experimentou os acontecimentos narrados. Distorção e deformação são inevitáveis no processo de re-viver a nossa vida. O propósito íntimo de tal desfiguração, obviamente, é captar a verdadeira realidade das coisas e dos acontecimentos. (O Mundo do Sexo).”

O mundo de Miller é um mundo onde o sexo tem uma dimensão sacra. Liberdade e criação. A redenção do humano em seu comportamento sexual. Ou como disse Luis Horácio: “Entram em cena amor e sexo, ora unidos ora antagonistas, existe bem e mal em ambas possibilidades, a liberdade permite a escolha. Os hipócritas optarão pelo antagonismo e perceberão no sexo a devassidão, a sujeira, aqueles que anseiam por liberdade, incluo-me nessa turma, entenderão o sexo como motor fundamental da criação.”

Mas Miller é muito mais que isso. É a própria liberdade em explosão. É uma anti-depressão direto na jugular; uma vertigem explícita da vida. Ele e Nietzsche são perspectivas de uma mesma ambição. A trilogia Sexus, Plexus, Nexus chamada por Miller de “Crucificação Encarnada” é o Zaratustra nietzscheano sem o recalque sexual. Dos dois “amigos” extemporâneos, Miller é o que “fica” com as mocinhas. Miller “vive” a filosofia iconoclasta e libertadora de Nietzsche tendo como porta de entrada algo jamais imaginado pelo filósofo alemão: o mundo do sexo.

A pergunta emblemática de ambos é: Quanto de verdade podemos suportar? O paradoxo é que, se por um lado, somos verdade-aditos, sempre em busca do que acreditamos ser a verdade, por outro, criamos mundos fantasiosos para fugirmos dela. Pode-se quebrar esse encanto de várias formas, todas elas tendo em comum o fato de nos reafirmarmos como animais mortais. Um jeito é filosofar com o martelo. Um outro é… bem, leiam Miller.