O Físico visita o Xamã
“O circulo é o universo. O ponto no centro do círculo representa o ser humano, a convergência de toda a energia do universo…”
É certo que existem muitas verdades, mas qual delas é a mais verdadeira? Eu continuo gostando das verdades baseadas em evidências, mais do que aquelas baseadas na fé. Não existe nenhuma evidência científica da lógica por detrás de um mapa astral. Absolutamente tudo é questionável.
“Mas qual premissa você questiona?”, perguntou o Xamã.
“De que o homem é o centro do universo, por exemplo!”, respondeu o Físico.
O Xamã faz uma cara de espanto e pergunta: “Mas… que outro ser existe?
O Físico pensa se espanta um pouco com a obviedade da resposta que está para dar, mas hesita por um brevíssimo momento: “Uhum… as bactérias?!?”
A longa gargalhada que se seguiu estabeleceu um consenso amigável entre duas realidades tão distintas. Estabelecemos ali os limites do nosso universo possível. O universo onde o físico e o xamã podem se encontrar.
Parênteses: Tenho pensado muito, muito nisso: como os limites, que dão idéia de restrição, podem funcionar para efetivamente te libertar. Uma vez que estabelecemos os limites que não podemos ultrapassar, tudo dentro daquele limite se torna possível. É assim em tantas, tantas coisas na vida. Um não abre uma gama imensa de possibilidades de sims. Fecha Parênteses.
Por que o cientista iria visitar o esotérico? Por que o físico iria visitar o metafísico? Por que o doutor iria visitar o Xamã? Porque abrir a mente é importante. E manter a mente aberta é fundamental. Um físico que vêm de uma família de bruxos precisa se exercitar constantemente para se manter físico. Mas, como em todo exercício, a gente corre risco de atrofiar o músculo. E eu não quero um cérebro atrofiado.
Pode ser que exista verdade por trás da astrologia. Mas se há, não é com a lógica que ela se apresenta que vamos conseguir aproveitá-la. Houve uma época em que pensava que se a lua podia mexer com os oceanos, outros astros também podiam influenciar na nossa vida. Não é só o fato de ser uma astronomia anterior a Copérnico. Toda essa coisa das 12 casas, etapas da vida… gente… tudo isso foi inventado pelo homem! A astrologia é uma grande epidemologia do ser humano. E é por isso que a astronomia se separou dela ao longo dos séculos. A primeira não sobrevivia ao exame da segunda. É o problema da epidemiologia: nem sempre (aliás, dificilmente) se consegue estabelecer a causa olhando a conseqüência.
Uma vez li sobre um experimento onde pediram a um astrólogo para fazer o mapa astral de 3 pessoas. Depois esses 3 mapas foram mostrados, juntamente com as 3 pessoas, a 100 (ou muitos) outros astrólogos, pedindo que eles identificassem a quem pertencia qual mapa. O índice de acerto foi de 30%. Ou seja… chute! Claro, o primeiro astrólogo pode ter sido o charlatão, o que prejudicaria o trabalho dos outros. Por isso seria importante fazer um segundo exame, que é: quantas vezes um mesmo astrólogo acerta? Não sei , mas algo me diz que é em torno de 50%. Chute novamente.
Não digo esse número por acaso. Uma amiga médica homeopata me pediu uma vez ajuda para fazer uma estatística da eficiência de seus tratamentos com crianças. Não cheguei nem mesmo a examinar os dados, porque só uma conversa inicial mostrava que a amostragem era tendenciosa. Se o paciente voltasse, queria dizer que o tratamento havia funcionado. Se ele não voltasse, não tínhamos como saber. Bom, isso criou um índice era de 50%, que como eu disse pra ela, a gente não tinha como avaliar. A homeopatia é outra pseudo ciência que também não consegue se apoiar em evidências científicas.
Então todos os astrólogos são picaretas? A ciência tem sido muito eficiente em rechaçar todas as tentativas de logro em massa inventadas ao longo da história. Mais ultimamente, as abduções e outros tipos de contatos com extraterrestres. É claro que a ciência erra (é feita por humanos), mas a ciência, como instituição, é muito honesta ao admitir o erro, e principalmente, a não se aventurar muito pelo desconhecido sem evidências.
Mas então como lidar com o inexplicável? Não aquilo que todo mundo acha que é inexplicável. Estou falando do que é REALMENTE inexplicável? Em um livro que li mais ou menos recentemente (Um adivinho me disse; Tiziano Terzani), um jornalista italiano viaja todo o sudeste da Asia e em cada cidade por onde passa com o seu trabalho de correspondente, visita o mais brilhante adivinho da região. Homens que lêem o futuro em cinzas de ossos, borra de café, na palma da mão. Chineses que prevêem que você ficará rico, muçulmanos que dizem que você terá muitas esposas. Um monte de charlatões, ainda que fossem charlatões que aceitassem visa, com fila de espera e consultados pelo altos escalões dos governos asiáticos. Mas ao se consultar com o astrólogo de um traficante de heroína na Birmania, ele se depara com um verdadeiro xamã. Ele dá seu nome, mas a data e hora do nascimento do traficante. O astrólogo faz uma perfeita leitura… do traficante, sem conseguir encaixar o que vê no mapa astral com a pessoa a sua frente. Parece que algumas pessoas realmente, lendo mapas ou cinzas, mãos ou datas de nascimento, conseguem algum tipo de conexão com outras pessoas.
No seu livro “O mundo assombrado pelos demônios” Carl Sagan dizia que a telepatia, em algum nível, era algo que a ciência eventualmente iria explicar. Aparentemente, existe um corpo de evidências grandes o suficiente para indicar algo nesse sentido. Nessa mesma direção, no livro “As ilusões da vida. A estranha ciência do extremamente comum”, Jay Ingran relata a série de experimentos que mostram que algumas pessoas, realmente possuem a capacidade de dizerem, a distância, se estão sendo observadas por outrem.
“Os olhos não vêem, quem vê é o cérebro”. Já ouvi essa afirmação muitas vezes e ela é completamente verdadeira (mas também já ouvi de neurocientistas a explicação de como nossa visão do mundo se organiza dentro de nossas mentes e garanto pra vocês que pode ser mais fantástico do que um jogo de Tarot). Está tudo na nossa capacidade de perceber o mundo. E essa capacidade é limitada por nossos cinco sentidos. Cinco?
É verdade que eu não conheço nenhum outro, mas durante muito tempo eu também tive dificuldade para entender como os físicos conseguiam pensar em 10, 11 dimensões (depois de muito tempo e muito esforço, comecei a conseguir entender a 4ª dimensão: o tempo). Hoje em dia consigo pelo menos assistir a um documentário da BBC sobre a Teoria das Membranas, a mais nova sensação entre os físicos para explicar o universo, e entender quase tudo. De qualquer forma não acho sadio acreditar que nossos sentidos são suficientes para percebermos o mundo como ele deve realmente ser. Alguns animais conseguem, por exemplo, enxergar comprimentos de luz no ultravioleta. Com ajuda de equipamentos especiais nós também podemos ver fenômenos de fluorescência de UV. Imagina como seria uma imagem do mundo se pudéssemos ver o UV emitido e refletido pelos objetos? Qual seri
a a ima
gem que teríamos do mundo se tivéssemos outros sentidos para captar outros tipos de energia que estão pairando pelo universo?
Um cientista não pode ser permitir fechar os olhos, ou os outros poucos sentidos que têm, para perceber a coisas que não pode explicar no. Corre o risco de perder o NOVO. Aceitar o novo pode ser difícil, mas é inevitável. E talvez por isso, é brilhante! Mas o que é esse novo que estou me dispondo aceitar?
“Há mais entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã sabedoria” disse Shakespeare. É pouco provável que você encontre um bom xamã. No seu livro “A imortalidade” Kundera discorre sobre a limitação física do corpo humano e usa um aceno de mão como partida para mostrar que nossos gestos se repetirão inevitavelmente em outras pessoas, por uma simples limitação biológica. O lugar comum entre os humanos é mais comum do que imaginamos. Chico Buarque deveria ser o maior Xamã de todos, afinal, quem não se identificou, tantas vezes, com o que ele diz em suas canções? Chico Buarque também é um grande epidemiologista da humanidade!
Assim como encontramos médicos que são melhores ou piores epidemiologistas, você pode encontrar xamãs que sejam melhores ou piores epidemiologistas. Deixe ele desenhar o circulo dele, mas desenhe você o seu. Mas dependendo de quão bom epidemiologista você é para com você mesmo, esses caras podem realmente ser de muito pouca ajuda.
Mas, digamos que você cruze com um xamã de verdade no seu caminho. Alguém que, como o inseto que eu falei, vê com outros sensores o que nós não conseguimos ver. Nesse momento, se o coração e a mente estiverem abertos, pode ser que a gente aprenda a ver um pouco mais também, dentro do círculo de possibilidades infinitas.