O Fim da Camisinha?

Não sou de comentar notícias, mas essa aqui eu não posso deixar passar. Já escrevi sobre ela aqui e aqui, mas parece que os dias da camisinha estão contados.
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A Bill & Melina Gates Foundation lançou os tópicos para o Grand Challanges in Global Health desse ano e um deles é ‘um novo modelo para a camisinha‘.
“Fundação de Gates financiará projetos para mudar design e características. Ideia é manter benefícios e proteção, mas ter preservativo mais ‘atraente’.” diz a notícia no G1.
Eu, particularmente, adoraria algo em uma linha completamente diferente, como o novo e espetacular ‘NeverWet’, o spray super hidrofóbico que deixa tudo completamente a prova d’água.

Onde estão os alunos? Para onde vão os alunos?

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Assim estava a minha sala de aula ontem, mais de 30 minutos depois do horário do início dos trabalhos.

Me senti como Dan Ariely no video abaixo (não precisa assistir o video todo – propaganda do curso dele no coursera – que é sensacional, diga-se de passagem – so o início já ilustra o meu ponto). A diferença é que… no meu caso… eles nem online estavam. O semestre vai terminar e ainda tenho alunos reclamando que não conseguiram se inscrever no site da disciplina. Se fosse o facebook…

Essa foto não é uma exceção… ao longo de todo o semestre, já há alguns anos, os alunos em sala de aula vão diminuindo. Eu já falei sobre o porquê em diversos textos no blog (veja “De muitos para muitos”).

Mas estou dessa vez não fiquei só irritado. Fiquei preocupado mesmo. Tinha acabado de voltar do evento ‘Educação Científica – Um desafio para a sociedade’, onde assisti uma palestra incrível de Jonathan Osborne, professor da Universidade de Stanford, que mostrou dados alarmantes sobre a diferença entre ‘o que’ e ‘como’ os alunos querem aprender, e ‘o que’ e ‘como’ os professores estão ensinando.

Mas é sinistro! NADA é capaz de mobilizar esses jovens. Tá bom… nada é exagero… Não temos recursos espetaculares (só tenho internet na sala de aula se levar meu cabo de rede e se for no subsolo… nem pensar), mas o problema vai além disso. Depois de anos e anos e anos de ensino equivocado (tudo bem, a gente não sabia o quanto equivocado era o ensino, mas já tem alguns anos que sabemos), agora temos uma geração que, mesmo se dermos as oportunidades, novas formas de ensino… eles não conseguem abandonar a indiferença com relação a formação deles.

Algo do tipo “já que eu não vou aprender nada mesmo… então não vou nem tentar mais”. 

Ouvi dizer que há uns anos, jovens americanos estavam com essa atitude com relação a AIDS. “Há, se todo mundo diz que um dia a gente vai ter mesmo, então um dia a mais ou a menos não vai fazer diferença e vou transar agora sem camisinha”. É por isso que eu não gosto de abordagens alarmistas para combater desinformação e descompromisso: você arrisca criar indiferença.

Os alunos aceitaram o pacto pela mediocridade que reina na universidade, na educação brasileira, hoje. Professores completamente desmotivados ‘acham’ que ensinam enquanto os estudantes desmotivados e indiferentes fingem que aprendem. Uma catástrofe que marcará o nosso país por gerações!

Vejam esse vídeo (agora sim, até o final, juro que vale a pena), que é muito bem chamado de ‘Ignorância Plural’. Os alunos ouvem por vários minutos, sem saber, um texto produzido pelo computador para soar corretamente mas NÃO fazer SENTIDO ALGUM. E ninguém, ninguém se manifesta.

 

Não me contive, dei um esporro.

“O transito…”, “O bandejão cheio…”, “minha mãe tá doente…” todos tinham uma justificativa. Mas quando for o dia da entrevista para entrar na pós-graduação, ou para seleção de uma vaga de emprego, nenhuma dessas explicações servirá de explicação.

Enquanto explicava que a principal diferença entre nós e os outros animais é que conseguíamos pensar não apenas em recompensas imediatas, com os cães que farejam qualquer coisa por um biscoito e os golfinhos que fazem piruetas por sardinhas, mas conseguíamos ludibriar, com muita abstração, os nossos instintos primários de recompensas imediatas (jogar videogame, ficar no telefone brincando no FB, bater papo) com o valor das recompensas a longo prazo (ser incluído sócio-economicamente na sociedade).

Mas parece que a única coisa que eles aprenderam foi o conselho de David Dobel, personagem de Woody Allen no Filme ‘Anything Else’: “Ao longo da sua vida Falk, não faltarão pessoas pra te dizer como viver. Elas terão todas as respostas, o que você deve fazer, o que você não deve fazer. Não discuta com elas. Diga ‘Sim, brilhante, brilhante idéia”, e, em seguida, faça o que você quiser.”

E eles não querem fazer nada!

Sim, as aulas podem ser melhores, os cursos podem ser melhores. Mas como ouvi a psicóloga Rosely Sayão falar: sem disciplina, foco e trabalho, não há aprendizagem!

É triste, mas estes já estão perdidos. Como é que vamos salvar a próxima geração?

Sobre Beagles e Exoesqueletos

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Hesitei em entrar nessa discussão por duas razões: primeiro porque não sou um especialista em ética ou em uso de animais em pesquisa; segundo, porque não acho que exista qualquer coisa que possa ser dita que vá aplacar a motivação daqueles que acreditam que os testes científicos em animais sejam um problema.

A triste verdade é que, com 50% da nossa população beirando o analfabetismo funcional, é extremamente difícil conseguir convencer as pessoas com argumentos técnicos e lógicos. E é por isso que eu acredito que as tentativas dos meus colegas cientistas que entendem muito mais do assunto do que eu para explicar a importância e o cuidado dos cientistas no uso dos animais, tem sido infrutíferas: seus argumentos técnicos funcionam apenas na legião de convertidos capaz de entendê-los e não conseguem alcançar para além deles, a grande massa de excluídos científicos que, sem noção do que é o método científico ou como as coisas que eles usufruem no dia a dia são possíveis, vivem a margem da compreensão das coisas, baseando suas decisões apenas em emoções e percepções superficiais dos problemas.

Quando alguns alunos viram esse vídeo de personalidades falando em defesa dos ‘pobres animais indefesos’, vieram me pedir para fazer um vídeo legal, bem produzido, numa linguagem acessível, sobre a importância do uso de animais em pesquisa.

Mas a verdade é que seria inútil.

, cito Dobzhansky, quando ele diz algo como “quando as conclusões forem desagradáveis, não importa o quão boa seja a explicação ou os fatos: as pessoas irão recusá-las”

Ainda assim, fiquei irritadíssimo ao assistir o tal vídeo: É lamentável que personalidades como essas se disponham a falar de um tema o qual não entendem minimamente, para o qual não apresentam qualquer argumento técnico ou evidência objetiva. Carl Sagan (que eu imagino eles não saibam que foi) disse muito bem: “As pessoas aceitam os produtos da ciência, mas recusam os seus métodos”. Eu gostaria de chamar de hipocrisia, mas é só uma triste falta de conhecimento mesmo.

Conhecimento que textos como esse da neurocientista Lygia Veiga ( A Escolha de Sofia: Os Beagles ou eu, mostra. Nós sabemos o quanto é difícil desenvolver modelos alternativos porque é justamente isso que estamos fazendo no laboratório: Nosso grupo de pesquisa é um dos que não trabalha com animais de sangue quente e sistema nervoso complexo em laboratório, e que se esforça para desenvolver modelos alternativos, que permitam, quando for possível (e é isso que estamos tentando determinar) usar invertebrados como ostras, mexilhões, caranguejos e camarões, em pesquisa biomédica. Bivalves produzem heparina e um monte de outras substâncias úteis para humanos. O primeiro passo para usar esses animais com um sistema nervoso bem primitivo em pesquisa, é conhecer seus genes. É isso que nosso grupo vem fazendo há mais de 3 anos, mas que só agora conseguimos publicar. Ainda assim, com dados preliminares.

Mas nada parece aplacar a ira dos ‘black ALF blocks’, que estão ameaçando pesquisadores e institutos de pesquisa nas redes sociais. E até mesmo meus amigos com grande treinamento em ciência tem postado comentários revoltados nos textos que compartilho na funpage do VQEB no Facebook.

Sob pena de ser julgado pela minha contundência, tenho de afirmar que eles estão equivocados e que nenhuma argumentação ética ou filosófica sobre esse argumento pode se sustentar.

A natureza é Amoral. Tente aplicar ética e moral a natureza e… vamos gerar conflitos irreconciliáveis.

Nos damos ao luxo de discutir o bem estar animal hoje, quando a competição por recursos DENTRO da nossa espécie foi minimizada pela agricultura e… a criação de animais. Por que se acabarmos com os supermercados e restaurantes, não nos preocuparemos nem mesmo com o próximo. Será cada um por si, como está ‘escrito’ nos nossos genes.

Todas, eu disse TODAS, as espécies animais e vegetais exploram o seu ambiente, o que inclui outros animais e vegetais.

Da mesma forma que não podemos acabar com a poluição, porque a segunda lei da termodinâmica dita que não há uso de energia sem produção de resíduo, não creio que seja possível acabar com a exploração animal e vegetal.

Isso não é um argumento para um ponto de vista ou outro: é uma constatação! A natureza é Amoral e não existe certo ou errado, bom ou ruim… o que existe são ‘Estratégias Evolutivamente Estáveis’: o que funciona, evolutivamente, em curto, médio e longo prazo.

Meu chute é que uma estratégia de ‘não exploração de recursos animais ou vegetais’ está fadada a não permanência no pool gênico das gerações futuras. Da mesma forma, não acredito que estratégias de exploração exaustiva fiquem para contar história.

Mas será que seremos nós a decidir? Eu acho que não. Acho que nos extinguiremos como espécie antes disso. É preciso ser mais inteligente do que nós somos, ou menos sensível aos nossos instintos, para criar uma estratégia evolutivamente estável no que tange a exploração de recursos, sejam eles animais, vegetais ou minerais.

Até lá, vamos fazer o melhor que podemos, o que inclui implantar cirurgicamente eletrodos na cabeça (no cérebro) de uma criança tetraplégica para que ela consiga operar uma roupa experimental com o pensamento e dar o ponta pé inicial da copa do mundo do Brasil.

Um isopor explosivo (ou como enviar amostras com gelo seco pela transportadora)

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Saio do ostracismo involuntário para tratar de um assunto pouco interessante mas, para você que é pesquisador, de qualquer nível, muito importante: como enviar amostras biológicas preservadas em gelo seco, de um lugar para outro do Brasil, por uma transportadora aérea.

O pior é que nem é difícil. É trabalhoso, mas difícil… difícil não é. Difícil é física quântica, é biologia molecular. Mas quando a gente não sabe… a dor de cabeça e o trabalho podem estragar o seu dia. Como estragou o meu ontem, tendo que ir 3 (três) vezes ao setor de cargas da TAM para conseguir ter minha amostra (1 tubo de 500 µL contendo 10 µL de DNA sintético) enviada do Rio para São Paulo. O problema é que não existem instruções claras sobre como empacotar o seu material, preparar a embalagem e os documentos necessários EM NENHUM LUGAR! O que me levou a escrever esse guia.

Quando você vai pela primeira vez ao aeroporto, você descobre que existe um ‘check-list’, que eles usam para verificar se o seu pacote está pronto para viagem. Ajudaria bastante ter essa check-list na mão, não é? Então veja a  figura 1. Nela você descobre as etiquetas que precisam estar (e as que não podem estar também) coladas no lado externo do pacote. Veja principalmente a parte do ‘marcado e etiquetado’:HP0025

Use uma embalagem decente. Uma boa caixa de isopor, com paredes sólidas. Ela também não deve estar quebrada ou rachada, obviamente. Não abuse no gelo seco. Você pode usar até 200kg em uma embalagem, mas para amostras biológicas de laboratório em geral precisamos de bem pouco. Mas de uma forma ou de outra, você precisa do PESO LÍQUIDO DE GELO SECO que está sendo embarcado. Ele precisará constar na etiqueta da embalagem (abaixo), no formulário de despacho e na declaração de segurança.

As etiquetas são: Gelo Seco (ou Dry Ice) junto com o código da ONU UN1845 (não esqueça de anotar o peso de gelo seco na embalagem)

DRY ICE UN 1845

E a outra é etiqueta da IATA para identificação de ‘substâncias perigosas diversas’ que ilustra o início desse texto.

Sim, o gelo seco, que é dióxido de carbono na forma sólida, é uma substância perigosa. Mas como, se o ar está cheio de dióxido de carbono e nós expiramos ele a todo momento?

Bom, o porque ele é perigoso não importa muito, já que existe uma norma que diz que tem que ser assim e se não cumprir isso não levam a sua carga, mas se você é que nem eu que não se contenta com esses argumentos, eu vejo duas razões claras: a primeira é que ele é sólido a temperaturas inferiores a -50oC, o que pode gerar sérias queimaduras na pele. A segunda é que a temperatura ambiente, ele é um gás. Com isso, a sublimação do sólido pode gerar muito gás, aumentar a pressão dentro do recipiente e… explodir. É muito pouco provável que isso aconteça, mas… é possível. E é por isso que um ponto importante, não dito em nenhum lugar até você chegar no aeroporto, é que sua embalagem NÃO PODE ESTAR HERMETICAMENTE FECHADA! É preciso ter algum ponto de escape para o gás. Não vede todas as tampa do isopor com fita adesiva!

Muito bem. Falta ainda descobrir o que são as tais ‘etiquetas irrelevantes’ no check-list. Eu sou cientista e não gosto de nada impreciso. Por exemplo: o endereço do destinatário é irrelevante? Ele consta no documento chamado ‘conhecimento aéreo’ que acompanha a carga, por isso, em teoria, é irrelevante; mas na prática, não é. Então, OUTRAS DUAS ETIQUETAS que você precisa ter na sua embalagem, são o ENDEREÇO DO REMETENTE E DO DESTINATÁRIO.

Não terminamos ainda. O material biológico precisa ser acompanhado de uma declaração de periculosidade. Se a sua amostra, como as nossas sempre são, não apresentam qualquer perigo a saúde, você precisa de uma DECLARAÇÃO DE SEGURANÇA em papel timbrado, assinada por um profissional de saúde (médico, biólogo, veterinário…). O texto pode ser algo como:

DECLARAÇÃO DE SEGURANÇA

A quem interessar possa,

O material contido nessa amostra é composto por DNA sintético , NÃO apresentado qualquer PERIGO para a saúde humana, animal ou ambiental.  É NÃO TÓXICO e NÃO INFECCIOSO

Atenciosamente, (assinatura do profissional de saúde com seu número no registro profissional)

Abre parênteses: Se a sua amostra de material biológico for perigosa, você precisará de uma declaração  assinada por um profissional de saúde (médico, biólogo, veterinário, dentista, etc.), atestando que o material está enquadrado na UN 3373 e garantindo que a ‘Instrução de Embalagem 650 (embalo triplo, com etiqueta UN3373 afixada do lado de fora) foi cumprida. Fecha Parênteses.

Mas essa NÃO É A ÚNICA declaração! Outra, que não está listada em nenhum lugar que eu tenha encontrado, e nem na tal check-list, e que me fez ter de voltar mais uma vez ao aeroporto, é UMA OUTRA DECLARAÇÃO DE PERICULOSIDADE dizendo que sua embalagem contém Dióxido de Carbono sólido, gelo seco ou dry ice (e quanto contém).

DECLARAÇÃO DE SEGURANÇA

 A quem interessar possa,

 A embalagem em anexo contem até 2kg de dióxido de carbono sólido (gelo seco – dry ice).

 Atenciosamente,  Atenciosamente, (assinatura do profissional de saúde com seu número no registro profissional).

 Quase tudo pronto, agora você só precisa preencher a minuta de despacho. Aqui embaixo tem um exemplo, com os campos que você terá de preencher marcados. É importante ter o CPF/CNPJ do destinatário, sabendo que esse número vincula quem poderá receber a carga.

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Finalmente, lembre-se que como carga com gelo seco é considerada perigosa, a TAM pelo menos, não entrega no endereço do destinatário, sendo que alguém terá de ir no aeroporto fazer a retirada. Se o seu destinatário for uma pessoa jurídica, o responsável pela coleta terá de levar MAIS UMA DECLARAÇÃO, EM PAPEL TIMBRADO DA EMPRESA, AUTORIZANDO a retirada da carga XXX (identificada pelo número do conhecimento aéreo) por… (Nome e RG do portador da declaração).

Como eu disse, é muito papel, é chato, mas não é difícil. Pelo menos agora que alguém se dispôs a explicar tudo direitinho.

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