Tristeza Retumbante

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Na última 6a feira fui ao Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ ouvir o diretor da área de ciências biológicas do CNPq, Paulo Sergio Beirão e o presidente da CAPES Jorge Guimarães, falarem sobre a inserção de jovens no sistema de C&T brasileiro.

Cheguei a cancelar minha aula na graduação e mandei todos os meus alunos assistirem. Eles são o futuro da ciência, certo? Aquilo deveria ser mais importante do que radiação e radioatividade.

Que tristeza. Ignoraram completamente o tema da palestra. O diretor do CNPq falou com orgulho do insipiente sistema de C&T, criado nos moldes do sistema americano (como todos os outros países do mundo), ainda que, atualmente, esse modelo esteja apresentando sinais de falência em todo o mundo. Mesmo nos lugares onde ele gera as inovações que importamos na forma de produtos com alto valor agregado.

Depois o presidente da CAPES mostrou que apesar do ínfimo número de cientistas do Brasil, deveríamos estar todos contentes porque o percentual de doutores desempregados está abaixo de 1%. Insinuou que os pós-graduandos deveriam aguentar as péssimas condições para se fazer um doutorado no país já que os salários de um doutor são, em média, 7x maior do que o de um graduado.

Ecoa na minha cabeça a frase do Titãs: “a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte. A gente não quer só comida a gente quer saída para qualquer parte”.

Foi uma afronta! Foi ofensivo! Um cala a boca!
Ultrapassados! É a melhor coisa que posso dizer sobre essas pessoas. Não enxergam 10 anos a frente deles. Pensam um modelo de C&T que atende apenas aos seus próprios interesses. Uma tristeza retumbante se abateu sobre mim depois das apresentações de 6a feira.

Certo está o Domenico de Masi: “Não podemos esperar que quem está no poder abra mão dele. O poder se toma com graça ou com a revolução”.

A Queima dos Grelos

“Mamãe, vamos voltar. Quero tirar uma foto com o Harry Potter”

A voz da menina me chamou atenção, mais pelo que ela dizia do que pelo sotaque brasileiro. Não estava rodando pelos Studios da Universal e sim na centenária Universidade de Coimbra. Um templo do saber! O que o menino mágico tinha a ver com aquilo?!

Virei para os lados e a gargalhada foi inevitável. Dezenas de estudantes da Universidade, vestidos com seus trajes típicos de 700 anos, terno e gravata para meninos e meninas, com a capa sobre os ombros indo até a altura dos joelhos. Eram mesmo ‘Harry Potters’.

Talvez tenha me emocionado mais o fato de ter ido a Coimbra a trabalho. Sou co-orientador de doutorado de uma aluna da universidade e estávamos finalizando algumas análises para a tese dela. Eu não era um ‘turista’… eu era, de verdade, parte daquilo ali. Nada contra turistas. Adoro turistar! Mas em um lugar como aquele… eu queria mais. E tive mais.

Não só estava em Coimbra, como estava lá durante a festa da ‘Queima das Fitas’.

“Ao fim de cada ano letivo, os alunos recebem suas ‘fitas’. Cada faculdade tem as fitas de uma cor” me explicou Olimpia, com seu legítimo sotaque português. “As fitas são colocadas na sua pasta de cadernos. Cada uma em uma posição. Uma é para os amigos escreverem, outra para os pais, outra para o namorado…”

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“Só não sei aonde está o meu grelo”

Eu olhei para Olimpia com aquela cara de espanto de brasileiro que está em Portugal e acha que só porque eles falam português, falamos a mesma língua.

“Seu grelo Olímpia?”

“Sim, não está junto com as fitas. Devo ter queimado”.

“Você queimou o seu grelo?”

“Ora pois?! Que cara é esta que estas a fazer? Grelo é apenas a fita mais fina que amarramos na pasta para mostrar de que curso somos. Quando você é um finalista (veterano em português do Brasil), no último dia da festa, queima seu grelo e dá adeus a vida universitária e entra na vida profissional.”

Explicado o embrolho, fomos jantar ‘cogumelos aporcalhados’ na sensacional ‘Tasca do Zé Manel dos Ossos’. De lá seguimos para a primeira festa da ‘Queima’, a ‘Serenata Monumental’, na belíssima praça da Sé Velha, onde os finalistas cantam ‘Fados de Coimbra’ (diferentes dos Lisboetas, eu aprendi) noite a dentro.

Era estranha a sensação de estar caminhando por Ouro Preto ou Olinda, mais ainda ao chegar na praça da Sé e dar de cara com o que parecia uma concentração de bloco. O Fado? Belíssimo, como vocês podem ver/ouvir:

Vocês notaram o silêncio ao final? Tem uma explicação:

“Pelo amor de deus, não me bata palmas! Não se bate palmas ao final do Fado durante a serenta monumental. É a tradição!” me disse Olimpia, coberta por sua capa de Harry Potter.

No dia seguinte fomos fazer turismo pelo campus antigo. A faculdade de direito, a mais antiga, com a ‘sala dos Capelos’, onde até hoje é se fazem os exames de doutorado com toda a pompa e circunstância e a ‘Biblioteca Joanina’… Ahh… a biblioteca Joanina… que lugar mais bonito…

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As pinturas… as esculturas… os livros… Cada um tem o seu templo. Esse, é o meu.

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