Construindo confiança
Outro dia assisti uma apresentação sobre como fazer uma apresentação de projeto.
“O que é mais importante na apresentação de um projeto? É você! Quem vai realizar o projeto”
Faz todo sentido. Se os financiadores, sejam eles investidores ou avaliadores de uma agência de fomento, não tiverem confiança na sua capacidade de realizar o projeto, não adianta a ideia ser espetacular.
Como diz o meu amigo Arvind Grupta: “Execute ideas. Execution matters!” A execução é fundamental!
Como todo projeto tem riscos, a decisão de investir em depende então, principalmente, quase exclusivamente, da confiança na capacidade de execução do cientista/empreendedor.
Confiança então é a palavra chave. Como demonstrar que você é confiável?
Confiança você não demonstra, você conquista. E como conquistamos confiança? Com integridade.
Mas como no último post, se você não entende o significado de ‘execução’, ‘confiança’ e ‘integridade’, essas palavras não passam de sons que impressionam por serem politicamente corretos.
Então vou compartilhar com vocês uma tabela que me foi apresentada no ano passado no congresso do Industry Research Institute – IRI, em Denver, Colorado, nos EUA. Foi durante uma sessão de discussão sobre o tema ‘weak ties and innovation’. A tradução literal de ‘ligações fracas e inovação’ não dá a idéia precisa do que foi o evento. Nele, o moderador, Andrew Maxwell, falou da importância da confiança para a inovação, já que, se dependermos dos advogados colocarem todos os termos e variantes dos termos em um contrato, o tempo da inovação já terá passado. Por isso a confiança é tão importante: sem ela, não se pode avançar.
Mas assim como o respeito, que a sabedoria popular diz “Você leva uma vida para conquistar e um minuto para perder” a confiança também é algo que se conquista, vivendo a vida com integridade.
E como fazer para sermos íntegros e dignos de confiança? Andrew nos deu a tabela da figura acima, que eu traduzi livremente abaixo. Ela nos mostra os comportamentos que constroem, abalam e quebram a confiança.
Achei essa tabela I-N-C-R-Í-V-E-L! Um guia real não só para ter integridade, como para balizar e melhorar as relações entre as pessoas. Claro, uma comunicação transparente é parte importante da integridade e da confiança. Quais desses comportamentos você pratica?
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Dimensão da Confiança | Construção de confiança | Abalam a confiança |
Quebra de confiança |
Confiabilidade |
Consistência |
Comportamento que confirma uma promessa anterior | Mostrar inconsistência entre palavras e ações |
Não manter promessas e acordos |
Benevolência |
Mostrar preocupação com o bem estar dos outros | Mostrar interesse próprio e frente do bem estar dos outros |
Tirar vantagens dos outros quando eles estão vulneráveis |
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Alinhamento |
Ações que confirmam valores ou objetivos compartilhados | Apresentar comportamento inconsistente com os valores declarados |
Demonstrar falta de valores compartilhados e vontade de se comprometer |
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Capacidade |
Competência |
Demonstrar habilidades técnicas ou de negócios | Demonstrar falta de competência contexto-específica |
Dizer que possui habilidades que não possui |
Experiência |
Evidência de trabalho relevante ou experiência prática | Se baseia em experiência inapropriada para tomar decisões |
Tenta demonstrar experiência que não possui |
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Julgamento | Confirma habilidades para tomar decisões bem informadas |
Se baseia inapropriadamente em terceiros ou fontes ruins |
Julga os outros sem dar a eles chance de se explicarem |
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Confiança |
Compartilhamento |
Mostra vulnerabilidade ao compartilhar informação confidencial | Compartilha informação confidencial sem pensar nas consequências |
Compartilha informação confidencial que pode causar dano |
Dependência |
Mostra disponibilidade em ficar vulnerável ao delegar tarefas | Relutante em delegar ou introduzir controles na performance dos empregados | Indisponível para se basear na representações de outros ou se recusa a participar | |
Receptividade | Demonstra capacidade de aprender e vontade de mudar | Adia ou evita a implementação de novas ideias ou |
Recusa feedback ou culpa outras pessoas |
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Comunicação |
Acurácia |
Contribui com informação verdadeira no momento apropriado | De forma não intencional, representa erroneamente ou atrasa a transmissão de informação | Deliberadamente representa erroneamente ou esconde informação crítica |
Explicação |
Explica detalhes e consequências da informação fornecida |
Ignora pedidos de explicação |
Nega pedidos de explicações |
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Abertura | Aberto a novas ideias ou novas formas de fazer as coisas | Não ouve ou ignora novas ideias |
Impede ou sabota novas ideias. |
Será que você marcou alguns dos quadros de comportamentos que ‘abalam’ ou ‘quebram’ a confiança? Eu espero que sim, porque estamos longe de ser perfeitos, não é?! Mas se não (ou independente disso), seria interessante pedir a outras pessoas, mais ou menos próximas de você, que preencham esse quadro a seu respeito. Será que essas pessoas vêem você com os mesmos comportamentos que você se vê?
Eu farei isso com a minha equipe.
O Brasil tem um dos maiores índices de desconfiança do mundo e isso atrapalha enormemente as nossas relações (como no exemplo dos contratos acima). É um das, senão a principal, razões pelas quais arriscamos pouco e inovamos pouco. E precisamos mudar isso urgentemente.
Pra terminar, deixo vocês com uma pérola de sabedoria retirada de Homem- Aranha 2: “Change is not just a word. Change comes with commitment and persistence.” Mudança não é apenas uma palavra. Mudança vem com compromisso e persistência.
Como contar uma história sem usar uma palavra
O cérebro é realmente incrível e mais incrível ainda é como a nossa mente funciona utilizando as coisas que vemos e sabemos como peças na criação de coisas novas.
Como professor e empreendedor, eu tenho me defrontado com o constante desafio de dizer as pessoas o que eu faço, usando o menor tempo possível e causando o maior impacto possível. Homens de negócio e investidores tem pouco tempo, alunos tem pouca atenção. Se você não causar impacto imediato: Bum! Perdeu a sua chance.
Assuntos complexos não ajudam. Biodiversidade, biotecnologia, engenharia genética, são coisas que as pessoas tem dificuldade de entender mesmo depois de uma vida de estudo. Mas isso só torna o desafio mais importante. Ainda assim, muito difícil.
Mas as vezes tudo que a gente precisa é saber que é possível. Sabendo que é possível, é muito mais fácil acreditar e perseverar na busca do objetivo.
E foi com um quadrinho do Calvin que eu descobri que era possível. Nesse quadrinho genial, Bill Watson explica que nas tirinhas de domingo, onde o espaço dele no jornal é maior, ele pode explorar mais nuances e eliminar completamente o diálogo.
A história de Calvin tem todos os elementos importantes da narrativa (situação inicial, personagens, conflito, conclusão) e responde todas as perguntas do lead jornalístico e da retórica greco-romana: o que, quem, como, quando, onde, porque. Tudo isso Sem Dizer Uma Palavra!
Tomei para mim então o desafio de contar a história do que fazemos no nosso laboratório e empresa em apenas uma página e sem usar nenhuma palavra. Um quadrinho que pudesse ser usado em qualquer país, lingua, cultura, com clareza e precisão, do mesmo jeito que Bill Watson fez com as peripécias de Calvin.
Falei com a unica pessoa que seria capaz de colocar essas minhas idéias doidas no papel: Julia Back, a melhor designer do mundo(!), que não se intimidou com o desafio (que não era só de criação, mas também de tempo: tinha que ficar pronto em 3 semanas.
Seguindo a estrutura do Bill Watson, mandei um roteiro para Julia com uma descrição de uma linha para cada quadrinho. O resultado superou as expectativas. As minhas pelo menos.
Educar para a ciência não é trabalho de ‘alguém’. Todo cientista precisa se dedicar a contar a sua história de forma que todo mundo possa entender.