O velho truque da mariposa na árvore
O “melanismo” é o nome do fenômeno relacionado ao escurecimento da pele, pelagem ou plumage, não está relacionado apenas a predação. Na mesma época, não só as mariposas, mas também outros animais, menos sujeitos a predação intensiva, como gatos, besouros e pássaros; também escureceram. Nos pássaros por exemplo, o melanismo pode favorecer a absorção de luz solar e o aquecimento do corpo, ou a coloração da plumagem pode favorecer nos rituais de acasalamento.
No exemplo dos livros, a mariposa Biston betularia, não apresentava formas escura até revolução industrial. A forma pigmentada foi observada nos arredores de Manchester em 1848 e teve a sua freqüência aumentada até alcançar 90% da população no início do século XX. Mas com a redução da poluição, as formas melânicas tiveram novamente uma redução na freqüência para menos de 10% da população. A verdade é que as formas pigmentadas já existiam nas florestas da Inglaterra e também da América do norte, mas a forma clara, salpicada de melanina era a mais freqüente na cidade, e se misturava com os liquens das árvores.
Foi em meados dos anos 50 que um autor chamado Kettlewell explicou a variação da freqüência das diferentes formas em função da pigmentação e da predação por pássaros.
De acordo com a “lenda”, a forma clara estava adaptada a camuflagem nas árvores cobertas de liquens. Quando a poluição aumentou, os liquens (que são super sensíveis a poluição atmosférica) desapareceram e as mariposas claras ficaram mais destacadas nos troncos escuros das árvores e podiam ser mais facilmente identificadas pelos pássaros. O aparecimento de uma mutação para mariposas com maior pigmentação, levou a uma maior eficiência na camuflagem. E com a menor predação pelos pássaros, essa variedade pigmentada conseguia se reproduzir mais e aumentou a sua freqüência na população.
Mas adivinhem…. muitos autores demonstraram que essas mariposas praticamente não ficam nos troncos das árvores! Principalmente durante o dia, preferindo as copas das árvores, que são áreas mais protegidas.
A B. betularia pode apresentar 3 padrões de pigmentação, que dependem da expressão de 4 genes (4 alelos porque são genes que juntos determinam uma mesma característica): a típica forma “Pálida”, a intermediária “Insulária” e a forma melanômica total “Carbonária”.
Apesar da forma Carbonária ser efetivamente melhor camuflada que a forma típica Pálida, nunca houve uma substituição total de uma população pela outra. Além da freqüência da forma típica ter voltado a aumentar em Manchester quando os níveis de poluição diminuíram, existe uma alta freqüência da forma Carbonária em regiões não poluídas da Inglaterra. Isso sugere que o rápido aparecimento das formas pigmentadas foi, provavelmente, uma “exportação” dessas formas. Sem a necessidade do aparecimento da “mutação”.
O assunto é polemico e tem despertado livros e artigos de autores defendendo e questionando o melanismo das mariposas como o melhor exemplo vivo de evolução natural atuando.
Um experimento de criação dos 3 tipos de mariposas em laboratório mostrou que a raça típica Pálida tem uma sobrevivência 30% inferior a da Carbonária e 7% inferior a Insulária. Um modelo de computador que leve em consideração essa sobrevivência geral mostra que a distribuição prevista após 150 gerações de mariposas (um número razoável de se imaginar de 1848 até agora), se aproxima muito mais a distribuição atual do que quando se leva em consideração apenas a capacidade de camuflagem e a poluição.
É mais difícil provar o que é menos intuitivo, ainda que seja o verdadeiro!
Que bichinho é esse?
Quando uma pergunta começa com “Você que é Biólogo…” geralmente ela termina com “…que bichinho é esse?”
O Morcego-Aranha é um mamífero (fala sério?! Você não sabia que os morcegos são mamíferos?) muito social. E essa espécie tem hábitos especialmente sociáveis. Os machos possuem um harém de fêmeas. Durante o dia, quando eles vão dormir, os machos são sempre os primeiros a voltarem para o abrigo e se posicionam sempre a esquerda. As fêmeas vão chegando e antes de se posicionarem a direita, elas lambem o macho. Cada uma delas, por ordem de chegada.
O Morcego-Aranha se achava muito esperto. Mas como vocês podem ver na foto, ele dorme sempre sozinho!
Por que acreditar no óbvio?
Existe um livro legal chamado “Penso, logo me engano” que retrata as grandes trapalhadas científicas dos grandes nomes da ciência, como Newton (a natureza corpuscular da luz) e Einstein (a constante universal). Mas alguém duvida do Cálculo de Newton ou da Relatividade de Einstein?
A problema do erro é quando ele passa a afetar a credibilidade. E para definir isso, o momento do erro é crucial. Erre no início e você está ferrado. Erre no meio e tem uma chance. Erre no final e ninguém vai ligar. É injusto? Não sei, mas é assim.
A primeira lição que tive de credibilidade na ciência, foi de um professor do mestrado, pelo qual hoje não tenho nenhum respeito científico (o que não quer dizer que não tenha aprendido nada com ele). Ele falou: “Minha metodologia tem que ser correta, para que ninguém questione meus resultados”. Foi uma lição que aprendi. Hoje no laboratório, você pode questionar minha interpretação, mas nunca o meu resultado (ou dos meus meninos).
Outras lições se seguiram com o tempo. Quando eu era representante dos alunos de PG, eu aprendi, nas longas reuniões com os cabeças-coroadas, a ouvir muito e falar pouco, e saber quando falar: basicamente quando eu tiver alguma coisa pra dizer. Isso porque argumentos emocionais não quebram paradigmas e que não basta você estar certo, se não tiver os argumentos certos. Então, falar demais, de menos, ou na hora errada pode afetar em muito a sua credibilidade.
Uma vez, discutindo um caso de ética na ciência. A dúvida era o que fazer com um experimento onde um tubo havia perdido a etiqueta. Se o tubo fosse colocado no grupo experimental o resultado seria significativo, mas se fosse colocado no grupo controle ou descartado, ou resultado significava que todo o experimento teria de ser repetido. Sem hesitar, a professora que estava discutindo conosco falou: Repete tudo! A ciência tem que ser sempre confiável! Ela estava certa.
Fui me tornando autodidata e a outra lição eu aprendi dentro do laboratório, sozinho. As vezes você quer economizar tempo e avançar uma etapa sem se certificar do resultado do estágio anterior. Pular uns dois estágios talvez. Muito, muito poucas vezes isso funciona. E na maioria das vezes, para economizar duas horas de trabalho, você perde 2 dias para repetir tudo. E depois de perder vários dias pra rê-extrair RNA só por preguiça de esterilizar a cuba antes de correr o gel, aprendi que “Só se deve avançar para o próximo passo depois de estar certo do resultado do passo anterior.”
Voltando para o Brasil, pensei em abrir uma ONG para conseguir financiamento fora dos meios acadêmicos tradicionais. Fui conversar com um advogado daqueles de gente rica, que sabe das coisas. Expliquei a minha idéia e ele me perguntou: “Quem é você?”
Primeiro eu estranhei… afinal, eu já tinha consertado o computador dele tantas vezes que era óbvio que ele sabia quem eu era. Depois (muito depois 😉 percebi que era uma perguntar retórica. E tomei um soco no estomago quando realizei a resposta: Eu não era ninguém! Quem ia dar dinheiro ou investir em um projeto da minha ONG sem saber quem eu era? Pra quem eu trabalhava? O que eu já tinha feito? Quem me conhecia? Quem me garantia? Vi que eu ainda tinha um longo caminho a trilhar.
Como tantas vezes na minha vida, me vi terminando uma era de inocência e iniciando um novo caminho no mundo real. Alguns semanas depois abriu uma vaga para professor do melhor instituto de pesquisa da UFRJ e eu não hesitei. Professor da UFRJ era, entre outras coisas, uma injeção de credibilidade no meu nome.
Mas ainda assim eu tinha que investir no “Quem me conhecia? Quem me garantia?” Nesse momento, decidi que não recusaria nenhum convite para palestra, nenhuma colaboração, nenhuma aula, nenhuma análise estatística de resultado, nenhuma solicitação de aluno. E nos últimos 2 anos eu rodei grande parte do Brasil dando palestras e contando histórias. As pessoas estão começando a me conhecer.
No ano passado, colhi o primeiro grande fruto dessa grande jornada de autoconhecimento. O coordenador de uma rede de pesquisa da qual eu faço parte, tentando me acalmar antes de uma apresentação importante, pelo fato de eu ser jovem e rebelde, falou: “Mauro, você pode ser jovem e ter cabelo comprido e usar brinco, mas quando você fala, todo mundo ouve. Você sabe do que está falando e transmite muita segurança de que é capaz de fazer o que está dizendo. Você tem credibilidade!”
E eu finalmente tinha credibilidade!
Sem credibilidade, não adianta nada saber das coisas. Não basta você saber o que está falando e acreditar no que está falando (ainda que ajude muuuuito). Os outros tem que acreditar. O curioso é que a credibilidade é mais importante quando se trata do inusitado. Quanto mais improvável for o seu resultado, ou a interpretação que você faz dele, maior deverá ser o seu esforço para que ele seja aceito. Você vai precisar de muita credibilidade antes de propor algo improvável. Mas se os seus resultados apenas confirmam algo que já foi dito e redito, ai não precisa muita não. Mesmo que o dito e redito no futuro se descubram errados. A credibilidade não é necessária para dizer o óbvio. Mas que cientista quer o óbvio?
Para o cientista, a falta de credibilidade é péssima, mas para o público o ruim é a credulidade. Acreditar pode ser um risco, justamente porque é mais fácil acreditar no óbvio. É preciso coragem para acreditar no improvável, para acreditar no que não é óbvio. Se o erro é menos importante no final do que no início, então o importante é o tempo e não o erro. E assim, também o acerto é menos importante.
Só quem tem credibilidade pode te trair.
Bate Coração!
Pensei que eu poderia fazer um artigo com coisas bem mais legais para serem contadas sobre o coração.
Vocês sabiam que o som do tambor é o único som presente em todas as culturas? Alguém se arrisca no porquê? Exatamente, o som do coração! Desde a antiguidade clássica (egípcios, gregos e romanos), ainda que não se soubesse muito de anatomia e fisiologia, já era conhecida a relação entre os batimentos do coração e a vida.
Só que era uma relação intuitiva: nos corpos vivos dá pra ver, sentir, ouvir os batimentos no peito, enquanto nos mortos… não.
Essa relação entre os batimentos e a vida, levou esses povos a acreditarem que o coração era a “residência da alma”. Por isso, era o órgão aonde se depositavam todas as emoções humanas. Entre elas, o amor!
Nasceu entre os egípcios a tradição de usar um anel pra representar o casamento. Mas foi depois de 2000 anos que os gregos inventaram de usar o anel no dedo anular da mão esquerda. Segundo eles, um anel imantado ajudaria a atrair o coração. Isso por que no dedo anular esquerdo existiria a vena amoris a “veia do amor” que conectaria direto com o coração! Mas antes que as meninas delirarem dizendo “ah…. que romântico”, devo dizer que não existe nenhuma evidência científica ou anatômica da venas amoris! Era tudo um truque de algum Don Juan barato da época.
Mas essa não foi a única confusão que os antigos fizeram por não saberem anatomia. Eles confundiram um monte de coisas. Pra eles era o fígado que produzia e bombeava o sangue, que só caminhava pelas veias. Isso por que eles viam apenas pessoas mortas. E nos mortos, o sangue sai das artérias e se acumulam no fígado. As artérias ficavam vazias. Alias, esse era outro equivoco. Eles acreditavam que era ar que circulava pelas artérias. Tanto que receberam esse nome AR-TÉRIA “caminho do ar”. Se vocês prestarem bem atenção, vão ver que o coração nem está do lado esquerdo do peito. Ele tem uma posição central, estando ligeiramente apontado para o lado esquerdo. Feche o seu punho esquerdo. Coloque na região central do toráx, acima da barriga e entre os peitos. Ai fica o seu coração. E ele, inclusive, tem aproximadamente esse tamanho: o de um punho fechado!
Foi apenas durante a época dos gladiadores que o papel do coração começou a ser esclarecido. Galeno, o médico chefe dos gladiadores, tinha chance de observar corpos vivos abertos. Alguém tomava uma espadada e o peito aberto podia ser observado: o coração batia e o sangue jorrava pelas artérias. Conforme o gladiador ia morrendo, os batimentos iam diminuindo e se Galeno tivesse sido um pouco mais observador, já poderia ter observado a contração seqüencial dos átrios antes dos ventrículos.
Mas ele foi muito importante e durante mais de 10 séculos suas descobertas guiaram a medicina. Claro, com uma pequena participação do fato dos experimentos necessários para aprimorar os seus conceitos acabarem levando as pessoas para morte na fogueira durante a idade média.
Atualmente, as coisas estão muito mais avançadas e o Brasil é líder mundial nas pesquisas de células tronco para o tratamento de infarto do miocárdio (inclusive, o instituto onde eu trabalho é o líder!).
Mas quando eu dou aula, uma coisa que chamam mais atenção é da força do coração. Um coração sadio em bate cerca de 70 vezes por minuto. E em cada batimento, bombeia cerca de 70 mL de sangue para a Aorta. Faça as contas e você vai ver que o coração é capaz de bombear em torno de 5 litros de sangue por minuto. Você sabe quanto é isso? É muito! Pra vocês terem uma idéia, eu fiz um vídeo caseiro. Peguei uma garrafa de 1,5L de água e abri a torneira do tanque a ponto de enchê-la em 18s (faça de novo as contas, 5L em 60s; 1,5L em 18s). A vazão dessa torneira é a vazão do seu coração quando você está tranqüilo, lendo um livro ou vendo TV. Em repouso. (O video termina antes de encher a garrafa porque minha câmera é antiguinha e só grava 15s.)
Mas já se a mulher da sua vida rêaparecer, se um caminhão quase te atropelar ou se você resolver correr a meia-maratona do Rio, a vazão do coração pode aumentar muito. Em situações de ansiedade, estresse ou, principalmente, de esforço físico; os tecidos do corpo vão precisar trabalhar com mais intensidade, vão gastar mais energia e precisar de mais oxigênio. E como quem leva o oxigênio é o sangue, então o coração tem que bombear o sangue com mais intensidade. No vídeo abaixo, abri totalmente a torneira do tanque, e a garrafa levou sete segundos para encher. Isso corresponde ao coração batendo em torno de 180 vezes por minuto.
Só que não pára por ai. O coração ainda é “elástico” e com a necessidade, pode passar a bombear mais de 70mL/batimento. Com o aumento do volume bombeado para 130mL/min e o aumento da freqüência cardíaca para 220 bat/min, faça as contas novamente, e você vai ver que o coração pode chegar a incrível marca de 28.600 mL/min. Quase 30 litros de sangue por minuto!
Pense nisso da próxima vez que for maltratar seu coração!
PS: Algumas dessas curiosidades estão no livro: “As dez maiores descobertas da medicina. (Friedman M, Friedland GW. 2000. Capítulo 2: 37-63. Companhia das Letras. Rio de Janeiro. 363pp)”
O Ignóbel
Desde 1901 a Fundação Nobel e a Real Academia Sueca de Ciências premiam as grandes realizações nos campos da física, química, fisiologia ou medicina, literatura e paz. O Nobel. O prêmio foi instituído por Alfred Nobel (o bonitão da foto), um sueco nascido em Stockholm em 1833. A família do cara morava em São Petersburgo e quando o negócio de seu pai faliu após a guerra da Crimea (entre os Impérios Russo e Otomano, no Mar Negro) ele ficou rico inventando a nitroglicerina. Mesmo tendo perdido um irmão e mais de um laboratório em explosões no manuseio da, ainda descontrolava, nitroglicerina, ele continuou suas pesquisas e ficou ainda mais rico inventando a dinamite. Mas além de inventor e cientista, Nobel também era autor, interprete e um pacifista. O prmio foi possível quando ele fez seu último testamento em 1895, deixando a maior parte a sua riqueza para a instituição do Nobel, antes de morrer na Itália em 1896. As áreas de premiação refletem os interesses de Nobel em diferentes áreas do saber.
Pra vocês terem uma idéia do calibre dos laureados com o prêmio, o primeiro Nobel em física foi para Wilhelm Conrad Röntgen. O cara descobriu os esranhos raios que tinham a capacidade de atravessarem a matéria e marcar um filme fotográfico do outro lado. Aqueles raios invisíveis que posteriormente foram apelidados de Raios X.
Na semana passada o prêmio foi anunciado e entre os ganhadores estavam Andrew Fire e Craig Mello por terem descoberto o silenciamento de genes através da interferência por RNA de dupla fita. Parece complicado? E é, mas é muito mais simples que fazer um transgênico e muito mais promissor como técnica de tratamento gênico. Mandando uma fita complementar de um RNA mensageiro pra dentro da célula, você pode formar um RNA fita dupla e impedir que ele seja traduzido em proteína. Sem proteína… sem função!
Muito bem, essa introdução toda foi pra falar de um outro prêmio, que ao invés de premiar as descobertas mais interessantes ou impressionantes, premia os trabalhos mais esdrúxulos. Sejam pela inutilidade quanto pela excentricidade dos temas.
O IgNobel foi instituído há 16 anos pela universidade de Harvard e a cada ano tem coisas mais impagáveis. Muitas vezes os laureados não aparecem, mas aqueles que aparecem, levam a coisa na esportiva. Então, apesar da minha tendência a não reproduzir reportagens de jornal, não posso deixar de colocar a lista dos premiados desse ano pra vocês tirarem suas próprias conclusões. Os destaques especiais podem ser acompanhados na foto da matéria.
- Ornitologia: Ivan R. Schwab (EUA). Explicou por que pica-paus não sentem dor de cabeça
- Nutrição: Wasmia Al-Houty e Faten Al-Mussalam (Kuwait). Mostraram que besouros “rola-bosta” têm um gosto refinado. Eles escolhem as fezes que vão comer
- Literatura: Daniel Oppenheimer (EUA), pelo artigo “Conseqüências do amplo uso da erudição vernacular: problemas com o uso de longas palavras sem necessidade”
- Paz: Howard Staleton (País de Gales). Inventou um dispositivo sonoro repelente de adolescentes.
- Acústica : Lynn Halpern, Ranolph Blake e James Hillenbrand (EUA). Explicaram por que som de unhas arranhando lousa irrita.
- Matemática: Nic Svenson e Piers Barne (Austrália). Calcularam quantas fotos são necessárias para que ninguém no grupo saia com olhos fechados.
- Medicina: Francis M. Fesmire (EUA). Tratou soluços com “massagem digital no reto”.
- Física: Basile Audoly e Sebastien Neukirch (França). Descobriram por que espaguete seco ao ser dobrado se quebra normalmente em mais de dois pedaços.
- Química: Antonio Mulet, José Javier Benedito, José Bon e Carmen Rosselló (Espanha). Estudaram a velocidade ultra-sônica em queijo cheddar.
- Biologia: Bart Knols e Ruurd de Jong (Holanda). Mostraram que a fêmea do mosquito da malária é igualmente atraída por cheiro de queijo limburger e por chulé.
O gene do Tocha humana
A questão levantada na última mesa de bar, com maioria arrasadora de biólogos, do tipo que não perdoam uma, foi: existe um gene para a “autocombustão”?
Sabe quando está passando aquela mulher gostosézima, você está com a sua namorada do lado e… você sabe que ela vai estar te vigiando, mas…. você deveria olhar pra calçada, mas… não consegue se controlar e…. olha pra bunda da gostosa?! Tipo quando está em uma mesa predominantemente de mulheres e… começa com o maior papo machista de falar mal da mulher que você tem (ou bem das mulheres que você não tem)? Isso serve pra contar piadas de mal gosto, dar aquele drible a mais no futebol, tirar a cebola da pizza e pra mais um monte de coisas. É queimação na certa, mas é inevitável.
Fiquei pensando se esse comportamento não se encaixaria em um dos padrões conhecidos de expressão gênica, e esse gene, quando ativado por algum fator externo, levaria a uma disfunção na cascata de ativação das fosforilases que deveriam ativar o seu superego, a região do seu inconsciente que trava, por razões boas ou ruins, essas enxurradas de inoportunismos.
Os genes em organismos superiores, os eucariotos, são controlados de muitas formas, apesar de poderem apresentar um mecanismo básico: possuem uma região promotora, que é capaz de receber sinais do exterior da célula e ativar a transcrição do gene; possuem seqüências espaçadoras chamadas Íntrons, que ajudam a determinar a forma final do RNA; precisam de um conjunto de enzimas para transcreverem a seqüência do DNA em uma seqüência de RNA; e de um outro conjunto de enzimas e moléculas (os ribossomos) para transformarem esse molde de mRNA em uma proteína.
Muitos genes possuem mecanismos de indução e repressão. Moléculas sinalizadoras (em geral proteínas) chamadas fatores de transcrição, podem se ligar ao DNA fazendo com que o gene seja mais. Outras moléculas, chamadas repressores, enquanto estão ligadas ao DNA, impedem que o gene seja ativado. Nesses casos, o sinal para ativação do gene é o desligamento dessa molécula.
Em geral (de novo) o mecanismo de comunicação entre o meio extracelular e o núcleo da célula (onde está o DNA) é através de uma cascata de reações. Uma proteína receptora específica na membrana celular é ativada pela ligação do seu sinal específico (por exemplo, o álcool no sangue). Essa proteína usa então passa um fosfato para uma outra proteína abaixo dela, que vai passando o fosfato adianta, através de várias outras proteínas no citoplasma, até a proteína, final, ligada ao fosfato, entrar no núcleo e se ligar ao promotor do gene no DNA, ativando a transcrição.
Então, voltando ao gene de “autocombustão”. Me parece um mecanismo de repressão clássico, com uma molécula ligada ao DNA constantemente, que impede que a gente seja inconveniente na maior parte do tempo (pelo menos a maior parte de nós, por que tem gente… que insiste em ser inconveniente o tempo todo). Algum fator… que não me parece ser o álcool, a nicotina, ou a cafeína; poderia ser o desbloqueador desse gene. Mas ainda assim, me parece estranho… não deveríamos ser inconvenientes em momento nenhum! E qualquer gene que levasse a inconveniência seria rapidamente excluído da população pela seleção natural. Como já vimos, os chatos acabam se reproduzindo assexuadamente.
Então o gene não seria da autocombustão e sim um gene da resposta mal-criada (esse sim, com grande utilidade em diferentes momentos). Por um erro na cascata de fosforilação, esse gene seria ativado em situações desnecessárias fazendo com que você, ao invés de mal-criado, acabe sendo inconveniente, inoportuno e… se queimando.
Finalmente, poderíamos ter um gene do “não-tô-nem-ai”, que também é muito útil, mas que funciona com um mecanismo diferente. Esse, em geral, não tem repressor, nem ativador, está acionado o tempo todo. Tem gente que é assim mesmo.
Mas, infelizmente, tudo isso é divagação. Não existe nenhum gene para esse comportamento. Como começamos a ver no início da semana, o determinismo biológico é furado! A inconveniência, a autocombustão e o inoportunismo dependem do ambiente e do contexto. O problema da gente não é ativar um gene ou outro: é não reconhecer os diferentes contextos, ambientes e situações particulares. Pode ser por falta de hábito, pode ser por desatenção, falta de jeito ou por pura falta de educação mesmo.