Squeeze my balls, baby!
Quando um jornal escreve que descobriram o gene de alguma coisa… por princípio, duvíde. Nem tudo está nos genes. Algumas coisas estão nas bolas!
Duas semanas atrás recebi alguns e-mails alertando sobre a descoberta do “gene da infidelidade masculina”, que foi divulgada pelos principais jornais do país (veja artigo na Folha de São Paulo). Como eu não confio nos jornais, eu fui até a fonte, o artigo publicado na prestigiosa revista científica da academia de ciências americana PNAS.
O artigo é um clássico exemplo do que Ioannidis fala no seu aclamado “Porque a maior parte das descobertas científicas é falsa“: alguma coisa tendencioso e certamente as evidências não são suficientes para a conclusão de que homens carregando o alelo 334 na região reguladora RS3 do gene do receptor do neuropeptídeo arginina vasopressina tem uma menor propensão a estabelecerem vínculos duradouros com parceiros do sexo oposto.
Ops, essa frase pareceu até o Sheldon tentando explicar Mecânica quântica para a Penny no seriado “The Big Bang Theory”: tão difícil que não deu pra entender nada.
Corrigindo: o estudo conclui que homens que possuem a variante 334 do DNA na região que controla a produção de uma importante proteína do cérebro, tendem a permanecer solteiros ou fazerem as parceiras menos felizes. Embora a metodologia do estudo pareça ser adequada, acho que o maior problema é conceitual. Os autores abusam da plausabilidade da sua hipótese e confundem significância estatística com verdade causal.
O estudo foi feito em 552 indivíduos suecos (gêmeos e seus parceiros) pretendia verificar a influência desse gene que já havia se mostrado importante na comparação entre duas espécies de ratos que possuem comportamentos sociais diferentes.
Porém, eles usaram índices sociais para avaliar a relação dos casais (o Partner Bonding Scale – PBS, aplicado em primatas), que são influenciados tanto pelos entrevistados, quanto pelos seus parceiros. A região reguladora que era importante no rato não era existia nos humanos, então eles testaram 3 regiões que apresentavam alguma variação. Apenas uma entre elas (a RS3) mostrou uma pequena variação entre os indivíduos. Nessa região, foram encontradas 17 variantes da seqüência de DNA (ou alelos) e apenas um deles, o 334, apresentou uma pequena, porem significativa, correlação com os resultados do PBS. Os autores não são tão contundentes como os jornais, mas foram certamente precipitados. Outros estudos já haviam sugerido a participação da vasopressina em síndromes de deficit de socialização como o autismo. Mas também sugeriram participação no altruísmo e na idade da perda da virgindade (ou do 1o intercurso). Oh good lord, please! É determinismo biológico demais para o meu gosto. Obviamente, nenhum desses resultados foi obtido repetidamente de forma consistente (que é o que torna a significância estatística uma verdade causal).
Tomara que você tenha aguentado o biologuês até aqui, porque o melhor vem agora. Para Robin Baker, autor do livro “A guerra dos espermatozóides” há uma explicação muito mais plausível, convincente e interessante. A melhor forma para avaliar o potencial de, digamos, fixação de um homem, é o tamanho dos testículos.
O livro, que é imperdível, mostra que apesar de homens e mulheres precisarem um dos outros para obter seu sucesso reprodutivo, não utilizam as mesmas estratégias para alcançá-lo. Isso é de se esperar dados dois elementos fundamentais: As fêmeas fazem um grande investimento na reprodução (gestação, aleitamento, risco de vida) e por isso são seletivas, mas são recompensadas com a certeza que sua prole é sempre sua. Os machos por outro lado nunca podem ter certeza que sua prole é realmente sua, e por isso estão menos dispostos a investir em uma prole específica, optando por uma estratégia mais promíscua para aumentar sua probabilidade de efetivamente produzir alguma prole.
Isso cria uma série de dilemas que tem de ser resolvidos por machos e fêmeas. E que efetivamente são, afinal, estamos todos aqui. Na verdade, boa parte do livro trata sobre esses dilemas e eu não posso me alongar muito aqui. O que importa é que uma das estratégias de seleção dos machos pelas fêmeas é deixar que o esperma de dois ou mais machos se enfrentem no seu trato reprodutivo (desde o cerviz até a trompa) em uma “guerra de espermatozóides”, para garantir que o fecundador é REALMENTE o mais apto.
Não é a toa que o esperma dos animais, de insetos a primatas, é composto predominantemente de “soldados”: espermatozóides que não estão preparados para fecundar o óvulo, mas sim para identificar e aniquilar espermatozóides de outros machos. Possuem uma cabeça diferenciada, receptores celulares capazes de identificar seus ‘irmãos’ e poderosas substâncias químicas capazes de destruir seus competidores.
E onde são produzidos os espermatozóides? Nos testículos. Quanto maior o testículo (e o direito é sempre levemente maior que o esquerdo) maior a quantidade de esperma produzida. Maior o exército. E nessa guerra, um exercito simplesmente maior, pode ser a diferença principal arma para a vitória. Ou a fecundação, como prefiram.
Por isso, homens com testículos pequenos tendem a evitar a guerra. São mais cuidadosos (ou deveria dizer possessivos?) com suas fêmeas, estão sempre próximos e evitam deixá-las desacompanhadas, já que na eventualidade de uma ‘escapada’ da fêmea, seu exército tem menor chances de vitória. São os fiéis. Homens com testículos grandes não tem medo de arriscar. Seu principal cuidado com suas fêmeas é o de mantê-las inseminadas constantemente. Depois eles procuram oportunidade para inseminar outras fêmeas, pagando o alto preço de deixar sua própria fêmea desacompanhada, mas confiante na potencia do exército que ele deixou. O que ele ganha com isso? Bom, ele considera que a chance de ter o benefício de um outro homem, provavelmente de testículos pequenos, criando um filho seu é maior do que a chance dele próprio acabar tendo de criar o filho de um outro homem, que teria os testículos maiores ainda que os dele. Quem está disposto a apostar?
O sentimento, ao que parece, tem pouco ou nada a ver com isso.