Bias de Divulgação

Saiu na Circulation deste mês. Aparentemente, os ensaios clínicos provenientes de instituições não-beneficentes (como as Big Pharmas) têm maior probabilidade de serem citados do que os ensaios clínicos patrocinados por instituições que não visam o lucro (como universidades e o governo federal). Seria um tipo de bias de divulgação! O mais interessante é que mutatis mutandis, nas palavras dos autores:

“In marked contrast, in analyses limited to trials in which the new intervention was significantly worse than the standard of care, an inverse pattern was observed with fewer citations per publication per year for trials funded by for-profit organizations compared with not-for-profit organizations (33 versus 41; P=0.048)”(grifos meus).
Ou seja, quando o resultado não interessa…

Ainda Sobre Cientistas Éticos

Falling Apart at Street Anatomy

Achei com algum atraso, um post e um artigo da Science sobre ética científica. O post é do excelente Spoonful of Medicine, cujo feed já se encontra ao lado. O artigo refere-se a um juramento que os novos pós-graduandos da Universidade de Toronto devem se submeter para, digamos, evitar certas “coisas” que estão acontecendo na Ciência Médica mundial. Segue o juramento na íntegra e o artigo no link da Science (para assinantes).
“I, [NAME], have entered the serious pursuit of new knowledge as a member of the community of graduate students at the University of Toronto.

“I declare the following:

“Pride: I solemnly declare my pride in belonging to the international community of research scholars.

“Integrity: I promise never to allow financial gain, competitiveness, or ambition cloud my judgment in the conduct of ethical research and scholarship.

“Pursuit: I will pursue knowledge and create knowledge for the greater good, but never to the detriment of colleagues, supervisors, research subjects or the international community of scholars of which I am now a member.

“By pronouncing this Graduate Student Oath, I affirm my commitment to professional conduct and to abide by the principles of ethical conduct and research policies as set out by the University of Toronto.”

Por que criar um juramento para novos cientistas? Os autores respondem:

“The realities of the nuclear age, more frequent acts of bioterrorism, and biotechnological advances such as cloning and stem cells have fueled a call for a similar oath tailored to biomedical scientists that would encourage awareness and discussion of the social and moral responsibilities of students in the life sciences (14). At the Institute of Medical Science (IMS), Faculty of Medicine, University of Toronto, as elsewhere, there is rising recognition of the potential for academic misconduct, in part due to the computer and Internet age, in which there is free access to and exchange of information derived from anonymous sources. Another factor is the increasingly competitive nature and “pressure cooker” milieu of scientific training programs due to the pace of scientific progress. Finally, there is the perception that current students take plagiarism, misrepresentation of facts, and scientific fraud less gravely than did previous generations of scientists. Clearly, the time is ripe to consider improved strategies for instilling basic values about acceptable and expected behavior (5, 6).”

É isso aí…

60 Anos da SBPC

A propósito, o texto do presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência). O texto está escrito em economês (palavras como globalização, transferência de tecnologia, desenvolvimento sustentável, etc). As ações da SBPC são norteadas, segundo seu presidente, por:
– revolução educacional (…);
– superação das desigualdades sociais (…); (até aqui, vá lá…)
– promoção da inovação nas empresas, superando o fosso ainda existente entre universidade e setor produtivo;
– criação de uma rede metrológica e de padrões ampla, com base científica e capacidade de promover qualidade entre as relações da exportação/importação e produção/consumo.
O final é apoteótico:
“No entanto, algumas décadas de luta ainda serão necessárias para colocar a ciência brasileira não somente em pé de igualdade com as nações mais avançadas, mas sobretudo a serviço do desenvolvimento socioeconômico do país”.
Nenhuma palavra sobre ética.

O Frio e o Gênero


Pesquisa de utilidade pública para o Inverno que está chegando.

Está comprovado “cientificamente” (acho demais essa frase bombástica):

Mulher sente mais frio que homem. (desde 1978)

PS. Isso justifica alguma brigas conjugais…

Ainda o Cérebro Humano

A controvérsia do gene do tamanho do cérebro humano parece ter encontrado um beco sem saída nos ASPM e microcefalinas. Achei esse link no excelente blog do Dienekes.

Falsas Esperanças e Medos Injustificados

Na Plos, para variar, um editorial sobre a avaliação de notícias médicas divulgadas na imprensa. Vários países têm sites que atribuem notas (estrelas) às notícias que são veiculadas na mídia leiga de acordo com critérios tipo ABC (Accuracy, Balance, Completeness). São organizações não-governamentais dirigidas por médicos e/ou jornalistas que têm grande credibilidade. Nos EUA temos o Health News Review; na Austrália é o Media Doctor e no Reino Unido é o Behind the Headlines.

São explicitadas as causas de más reportagens sobre saúde e medicina, como no trecho abaixo:

“The origin of hype in health stories goes even deeper than journalists’ lack of training and the hurried pace of broadcasting. Ransohoff and Ransohoff have described medical researchers and reporters as “complicit collaborators,” both of whom may benefit from a sensationalized story [7]. Researchers benefit from the publicity because it may increase citations to their study and help their chances of promotion or tenure, while a highly visible story of a dramatic medical breakthrough can boost a journalist’s career. Sensationalism occurs, they say, “when the participants stand to benefit from publicity without a corresponding penalty for misleading reports.” HealthNewsReview.org could now provide such a penalty with its public naming and shaming of poor reporting, which in turn may drive journalists toward more balanced reporting.”

Esse tipo de trabalho tem sido realizado no Brasil principalmente na blogosfera. Blogs como do Paulo Lotufo e do Marcelo Leite, são iniciativas isoladas dentro de um panorama desértico. A esmagadora maioria dos blogs sobre saúde e medicina no Brasil são de “dicas”, vendedores de remédios ou de tratamentos de eficácia duvidosa. Não há uma leitura crítica ou um ombudsman de notícias médicas. O leitor/consumidor brasileiro não tem como se proteger. A saída pelo menos, é ler o dos gringos.

Doze de Junho

Lung lovers at Street Anatomy

Mais imagens médicas muito interessantes no Street Anatomy. Essa é pelo dia dos Namorados.

PS. Tentando limpar a barra por ter falado da sogra…

A Barba e a Ciência

Seria a barba um sinal de sabedoria ou um meio de cultura que pode transmitir infecções? Grandes cientistas ostentavam barbas e bigodes poderosos. Fica bem a um médico usar barba ou é anti-higiênico? Por incrível que pareça existe um ensaio clínico sobre o assunto. Também existem estudos microbiológicos e um artigo em um site de ciência do qual peguei a foto acima.

De minha parte, às vezes deixo uma barba incipiente alardeando um descanso à pele. Confesso que no espelho, na dependência do humor, oscilo entre um George Clooney tupiniquim e um amarfanhado pós-plantonista. Infelizmente, nunca me senti mais inteligente.

Mais Neo-obscurantismo

Essa foi demais. Veja a Folha online 19/05/08. Decisões judiciárias baseadas em psicografia são um passo para a MBAP (Medicina Baseada em Artigos Psicografados!). Quem sabe o Hipócrates não dá uma luzinha…

Novo Conceito de Doença

Interessante o artigo de Andrew Pollack no New York Times que recortei do blog do Marcelo Leite.

Nesse artigo, o repórter científico fica entusiasmadíssimo com a possibilidade de se redefinir doenças a partir de sua similaridade genética. Nas palavras dele:

“Dr. Butte, an assistant professor of medicine at Stanford, is among a growing band of researchers trying to redefine how diseases are classified — by looking not at their symptoms or physiological measurements, but at their genetic underpinnings. It turns out that a similar set of genes is active in boys with Duchenne and adults who have heart attacks.

The research is already starting to change nosology, as the field of disease classification is known. Seemingly dissimilar diseases are being lumped together. What were thought to be single diseases are being split into separate ailments. Just as they once mapped the human genome, scientists are trying to map the “diseasome,” the collection of all diseases and the genes associated with them.”

“Diseasome”? Um mapa gênico de doenças! Um novo jeito de ver, cria novas concepções de mundo (e vice-versa! Acho que Bachelard já tinha dito isso!). Tudo teria uma base genética, não é mesmo?

Mas, o que dizer então, das irritantes doenças de diagnóstico puramente clínico como por exemplo a fibromialgia, enxaquecas, depressões, sem contar na infinidade de distúrbios psiquiátricos. O autor mesmo responde:

“Indeed, Dr. Duffin said, people who feel sick nowadays “don’t get to have a disease unless the doctor can find something” and instead might be told that it’s all in their head. Doctors argue, for instance, about whether fibromyalgia or chronic fatigue syndrome, which have no obvious anatomical causes, are really diseases.”

Mas, achar um defeito na síntese de uma proteína importante para determinada ação biológica e suas relações com outras disfunções não supostas antes é, de fato, mapear as doenças da espécie humana?