A raiva tem lógica

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ResearchBlogging.org

(Essa é uma postagem colada e talvez você queira ler primeiro o artigo anterior)

“Os seres humanos diferem da maioria das espécies no número, intensidade e duração de relações de colaboração próximas”

Biologicamente, a raiva de baseia na habilidade das pessoas de mudarem o peso que dão ao bem estar alheio em função de uma reação raivosa. Mas claro, essa habilidade não responde apenas a isso, principalmente em uma espécie tão social como a nossa. Reciprocidade e troca são outros fatores que se somam a formidabilidade e conferibilidade e aos que comentamos anteriormente, capazes de influenciar no processo de decisão.
Sim, mas apesar desse papo todo bonitinho de colaboração, o que conta, no fim das contas, é mesmo o tamanho do braço.
Sim, os pesquisadores correlacionaram as respostas do questionário (que, não canso de repetir, incluía perguntas como: Você encara os outros? Desde os 14 anos você esteve em quantas brigas? A violência resolve problemas pra você?) com o a circunferência do biceps e a carga de peso levantada no supino. O resultado não poderia ser outro: uma correlação significativa com a propensão a raiva e com o histórico de brigas.
Não poderia ser outro porque na verdade estamos falando de uma herança ancestral. A força da parte superior do corpo sempre conferiu habilidade a um homem de infligir dor aos seus oponentes. Esse é, também, um dos principais critérios cognitivos para despertar atração das mulheres. Logicamente, então, a força muscular aumenta o ‘índice de formidabilidade’ de um indivíduo.
Abre parênteses. Curiosamente, não havia correlação com a capacidade de ruminar. Não, não estou chamando os fortões da academia de ruminantes. Ruminar é o termo, também nomeado no Inglês, para o tempo que uma pessoa permanece com raiva. Na verdade, nenhum dos parâmetros avaliados pelo estudo apresentou relação com a ruminância. Fecha parênteses.
Mas se a força na parte superior do corpo de um homem pode servir de argumento para que ele espere que as outras pessoas atendam as seus caprichos (ou sofram as consequências), será que esse argumento também funcionaria para as mulheres? É verdade que quando a minha fisioterapeuta me pegava pelo trapézio com apenas o polegar e o indicador, a dor era tanta que eu seria capaz de qualquer coisa. Ela nem precisaria dar um pitty.
Mas para as mulheres o critério é outro: a beleza! Quanto mais atraente uma mulher, maior também o seu índice de formidabilidade e, principalmente, de conferibilidade.
Você acha estranho? Não, não acredito. Depois de tudo que eu já falei aqui e aqui?! Mas se precisar ainda de um argumento, o artigo traz vários: A beleza é um importante critério de juventude e pessoas mais bonitas são mais valorizadas como parceiros sexuais, companheiros, aliados, tem salários maiores, maiores probabilidades de assumirem posições de liderança, para serem eleitas para cargos públicos e, até mesmo, recebem penas menores do sistema judiciário.
E ainda que as mulheres reclamem da quantidade de outras mulheres e de homens gays no mercado, o acesso sexual as fêmeas é um fator muito, mas muito mais limitante para os homens do que o acesso sexual aos homens é para as mulheres. E assim, mesmo uma pequena habilidade de oferecer acesso a sexualidade, garante um grande poder de barganha para uma mulher. Não me massacrem, por favor. A culpa é da seleção natural.
De fato, os autores encontraram que as mulheres mais bonitas (ou melhor, as que se percebem – e são percebidas – como mais bonitas – por fotos ou então por perguntas de questionário como: eu mereço mais do que uma pessoa comum? Eu sou melhor do que a maioria das pessoas?) são mais eficientes em resolver conflitos, tem maiores expectativas com relação ao que os outros devem oferecer a elas, e tem uma propensão significativamente maior a acessos de raiva.
Novamente, a beleza não se correlacionou com a ruminação. Mas porque o tempo que ficamos com raiva não se correlaciona com a propensão a raiva? A explicação é lógica. Se o papel da raiva é atrair atenção (e energia, e esforço) para os nossos problemas (ainda que caprichos), então ela deveria se dissipar logo depois do objetivo ter sido atingido. A ‘ruminação’ acontece quando alguma coisa nos impede de tomar uma ação direta enquanto estamos com raiva, e temos que avaliar se essa ação considerando as consequências. Que podem ser políticas, sociais ou até criminais. E como as leis se aplicam a fortes e fracos, feios e bonitos, a ruminação não se correlaciona com nenhum dos fatores medidos nesse estudo.
O artigo termina mostrando que a força muscular é fator mais relevante para avaliar a propensão a raiva do que a própria testosterona, que a propensão a raiva está ligada também a uma atitude mais conivente com a agressão (já que homens fortes e mulheres bonitas tendem a aceitar melhor que o seu país entre em guerra com um oponente) e que a propensão a raiva tem um componente filogenético (ancestral e evolutivo) mais forte do que o ontogenético (histórico e desenvolvido).
Ao que tudo indica, “o crime não compensa”, mas a raiva sim.

Sell A, Tooby J, & Cosmides L (2009). Formidability and the logic of human anger. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 106 (35), 15073-8 PMID: 19666613

Discussão - 4 comentários

  1. Fernando Felix disse:

    Cara, que Blog é esse???????????
    Melhor Blog que já encontrei na net ainda mais pelo assunto que eu amo, Ciência, Ser Biologo hahaha to quase lá
    você tem um e-mail pra nos comunicarmos algumas dúvidas que tenho. abraçãooooooooo

  2. Mauro Rebelo disse:

    Fala Fernando, é só clicar na aba de contato no menu superior. Um abraço, Mauro

  3. trak.trak.trugui disse:

    Excelente!!!
    Nunca havia entendido muito bem os mecanismos da raiva, mas depois desse artigo ficou tudo muito claro.
    Obrigado pela excelente leitura.

  4. cayman disse:

    Muito legal esse post, mas devo confessar que a foto do post deu até medo!

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