O peso da evidência
Esse final de semana assisti “O curioso caso de Benjamin Button“. O filme é muito rico e cheio de conexões, que te levam a pensar em tantas outras coisas, com as quais, tenho certeza, vou me entreter por algum tempo.
Mas queria comentar uma coisa me chamou a atenção no filme: a falta de espanto e curiosidade quando as pessoas encontravam um ser que rejuvenescia ao invés de envelhecer.
É certamente uma incongruência, sobre a qual já comentei aqui. Mas o excelente texto de 1948 de Bruner não explica diretamente COMO resolver o problema do reconhecimento da incongruência característico da natureza humana (e não só).
A resposta é: com evidências!
Tão forte quanto a nossa vontade de negar evidências que contrariam nossos paradigmas, é nossa capacidade de reconhecer que essas evidências contrariam o paradigma. “É assim que se fazem as revoluções científicas!” diria Thomas Khun, do outro lado da sala, encerrando a discussão.
As pessoas não questionavam o rejuvenescimento de Benjamin simplesmente porque ele era uma evidência inquestionável. Dia após dia, ano após ano, todos podiam observá-lo quebrar o paradigma que regia todos a sua volta. E como o próprio personagem diz: “Você pode se irritar o quanto quiser, mas no final, só nos resta, sempre, aceitar”. Ou algo desse tipo.
Eu já ouvi todo o tipo de metáforas para questionar meu ceticismo. Tem uma que eu gosto mais que as outras. Uma vez um cara me disse que nós eramos como peixes. Um peixe vive em um mundo particular sem poder acessar um outro mundo que está acima da superfície do seu. Porém, isso não significa que esse mundo não exista (como nós, na argumentação dele, sabemos existir). Se é assim para os peixes, porque não poderia ser assim conosco?
O problema dessas metáforas é que elas não trazem um argumento, apenas tentam justificar a ausência dele. Não há evidência, apenas a justificativa ausência delas. Ainda assim, a metáfora não se sustenta. Ligassem os peixes para paradigmas, perceberiam que do firmamento deles cai de tudo, de anzól a pneu velho, passando por migalhas de pão e latinhas de coca-cola. Talvez não chegassem nunca a compreender ou conhecer esse mundo, mas as evidências dele são inegáveis.
Benjamin Button seria uma revolução científica. Mas enquanto não tivermos evidências de extraterrestres e vida após a morte tão incontestáveis quanto latinhas de coca-cola no fundo do mar, Benjamim Button continuará sendo possível apenas no cinema, e eu continuarei cético e feliz.
PS: Esse texto faz parte da Roda de ciência. Por favor, comentários aqui.