Os cientistas e seus egos

Um livro de tiragem pequena, circulação restrita e edição esgotada, é um dos meus livros de cabeceira. Chama “O perfil da ciência brasileira” de Leopoldo de Meis e Jacqueline Leta. O livro trata a do que se convenciona chamar cienciometria, ou os indicadores da ciência. No caso, a brasileira. Entre outras coisas, o livro mostra que, a partir da década de 80, a produção científica brasileira aumentou vertiginosamente. Paradoxalmente, no mesmo período, os investimentos em ciência e tecnologia no país sofreram sucessivos cortes. Como explicar o fenômeno, que culminou nos anos 90, com a entrada do Brasil no seleto grupo dos 20 países que contribuem com mais de 1% da ciência mundial (e que hoje ocupa a 17 posição)?
Não é tão difícil. No mesmo período aumentaram, proporcionalmente, as bolsas de pós graduação, especialmente de doutorado. E com isso, aumentou a produtividade da ciência brasileira. Mesmo sem verba para pesquisa, aumentando o número de trabalhadores jovens, foi possível, graças a criatividade e esforço, superar as dificuldades financeiras. As estatísticas mais atuais do CNPq ou da CAPES, mostram que a correlação entre número de pós-graduandos e produção científica se mantém nos diferentes institutos de pesquisa do país: mais pós-graduandos, mais produção científica!

Desde que tomei conhecimento dessa informação, quando ainda era um estudante de pós-graduação, comecei a lutar por essa causa. Hoje fazemos parte de um grupo que defende os interesses dos jovens cientistas, definidos atualmente como os doutores com algo entre 5 e 10 anos da defesa da tese de doutoramento. Esse grupo tem sido especialmente preterido no Brasil nos últimos 10 anos. Aqui, os jovens tem de ficar mercê dos cientistas seniores, que são os capazes de determinar linhas de pesquisa e conseguir financiamento dentro do sistema de financiamento de ciência brasileiro.

O Rapto das Sabinas de Gianbologna representa a quebra de paradigmas e a vitória do novo sob o velhoIsso vai continuar acontecendo enquanto as agências de fomento a pesquisa, fundações de apoio a pesquisa em nível estadual (como a FAPERJ) e o CNPq e a CAPES em nível nacional, não possuírem jovens pesquisadores em suas instâncias decisórias (os conselhos diretores e comitês assessores). Pra entender que essa o quanto essa presença é fundamental, basta ver o quanto são insipientes e ineficientes os programas de fomento para jovens pesquisadores.

O que forma um novo paradoxo, já que é nessa fase da vida que os cientistas são mais produtivos. Basta ver que Einstien, Newton, Watson e Crick… tinham todos menos de 40 anos quando fizeram suas grandes descobertas.

“O Gabeira disse que o mundo inteiro quer paz”, essa tirada de uma amiga que assistiu o Gabeira na FLIP virou pra mim retrato daquelas coisas que são fáceis de todo mundo querer, e de todo mundo saber. Então vou dar a minha: O ego e a sede de poder são inerentes ao ser humano! Apenas me parece que naquelas profissões onde a remuneração não é compatível com o nível intelectual, a inteligência acaba sendo super valorizada, já que só sobra ele como moeda de valorização do ego. “Eu ganho pouco, mas olha aqui o que eu sei e que ninguem mais entende”! Mas ainda é impressionante ver mesmo nesses círculos super restritos, a sede por um poder minúsculo, reconhecido apenas por uma meia dúzia de pares, é grande. E as batalhas intensas. Só que os jovens são tirados fora dessas brigas pelo poder. A eles cabe trabalhar enquanto aos “Grandes” cabe decidir. Resta saber quem decidiu isso?

Na semana passada estive no Congresso da FeSBE em Águas de Lindóia e quando perguntei a um professor catedrático, chefe de um comitê assessor da CAPES, como ele explicava que os jovens cientistas serem os principais atores nos planos da CAPES para nuclear novos grupos de pós-graduação em áreas do Brasil sem tradição em pesquisa, mas não terem assento nos comitês assessores (como aquele que ele presidia no momento), a resposta dele foi: vocês ainda tem que comer muito arroz com feijão!

Como li em um artigo da Nature que não consigo mais encontrar de jeito nenhum: “É mais fácil fazer um dia frio no Inferno que os pesquisadores estabelecidos permitirem mudanças nas regras da distribuição de verbas para pesquisa”.

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