Izquierda ou direita?

Na sexta feira fui assistir uma palestra da Sonia Rodrigues na FIOCRUZ sobre escrita criativa. Já assisti essa oficina muitas vezes e hoje sou um entusiasta da qualificação de leitura. Acho que é um caminho para que alunos de graduação e PG escrevam melhor e se tornem melhores pesquisadores.

Ela inventou um método para ‘liberar’ a mente do vício da interpretação na hora de escrever baseado na retórica Aristótélica e em outros modelos de narrativa descobertos na Roma antiga e testados ao longo dos últimos 25 séculos por caras como Shakespeare. E por mais gente suficiente para que um pesquisador da platéia, especialista em alguma coisa mas certamente leigo em muitas outras, não se sinta credenciado para criticar tão facilmente.

Em um momento, havia um texto de 54 palavras sendo projetado. O texto era inconclusivo, mas repito, em 54 palavras, dizia quem, quando, onde e criava uma situação onde era inevitável um conflito. Como a platéia teve dificuldade de identificar esses elementos, algumas pessoas começaram a dizer que o texto estava mal escrito. Bem, o texto era de Monteiro Lobato, o primeiro parágrafo do primeiro capítulo de Robin Hood, sobre o qual o ilustre escritor infantil, discorre depois 300 páginas.

Ainda sem saber disso, um pesquisador pede a palavra e critica tudo: forma e conteúdo, palestra e palestrante. Ele prossegue citando, pelo menos 3 autores que desqualificariam a apresentação (e com isso Aristóteles, Shakespeare e Monteiro Lobato, pelo menos).

Mas ele ainda citou os ‘memes‘ de Richard Dawkins para falar da importância da cultura e de como o conhecimento se perpetua; e o neurocientista Ivan Izquierdo, para dizer que o contexto criado pela dissertação era fundamental para que o conteúdo da narrativa fosse fixado pela memória

A Sonia respondeu as críticas muito bem e ficou tudo esclarecido, mas grande parte do tempo da palestra se perdera nesse processo: a discussão do procedimento e do conteúdo adotado por uma pessoa que já foi avaliada em todas as instâncias acadêmicas possíveis, autora de mais de 20 livros, que estava ali convidada pelo coordenador da pós-graduação e com um auditório cheio para ouvi-la. Ele foi deselegante e me fez perder meu tempo, simplesmente porque não estava ali para escuta-lo.

E de quebra, ele fez pelo menos duas intervenções incorretas: os ‘memes’ são uma grande besteira que Richard Dawkins, apesar de grande nome da biolgia evolutiva (muitas vezes citado nesse blog), escreveu. O que se comprova por nenhum outro autor ter discutido seriamente essa ‘teoria da comunicação baseada na seleção natural’. A outra, é que o contexto seria assim, tão importante, na formação da memória. O que o cientista argentino radicado no Brasil Ivan Izquierdo diz, e eu o assisti ainda no mês passado na conferência de encerramento da FeSBE, é que o MEDO e não qualquer outro contexto, auxiliam na fixação da memória.

Houve debate sobre a impostura do pesquisador após a palestra. E como em todo caso, opiniões prós e contra. Mas como um amigo levantou, o ambiente acadêmico é muito corporativista, e dificilmente teríamos um pesquisador criticando avidamente outro (mesmo que fossem inimigos)
durante uma palestra. O cara exagerou!

Esse mesmo amigo ainda perguntou: “porque nós cientistas, especialmente quando se trata de área social/humanas, nos achamos credenciados para discutir mesmo com uma base teórica pobre?”

Eu acho que a resposta é uma só: vaidade.

O cientista, em geral, só usa a inteligência para se vangloriar, já que dinheiro, é muito mais difícil de conseguir nessa profissão. É da inteligênicia que ele tira seu prestígio. Mas isso não é credencial. Repito o horóscopo: “você pode ter muitas opiniões, mas isso não significa que saiba muita coisa”. Como a própria Sonia diz, “o brasileiro intelectualóide é pseudo erudito e de meia cultura.”

Meu amigo, com dois artigos na Nature e coordenador do maior curso de pós-graduação da FIOCRUZ, chegou a tentar vestir a carapuça e se incluir nesse grupo de ‘intelectualóides’. É verdade que ele é metido a entender de vinhos, mais do quer realmente entende. Mas confesso que eu também sou. E que mesmo assim, ele entende mais de vinhos do que eu. Mas será que nos encaixamos nesse grupo? Acho que não. Pelo menos não consigo me ver, ou vê-lo, levantando no meio de uma palestra do sobre os Pinot Noir da Borgonha, e discutindo com o autor com base em 1 (um) artigo que ele leu na Wine Expectator.

Acho que existe diferença em ter um ponto de vista diferente e ficar ‘procurando’ um ponto de vista diferente pra poder pedir a palavra e falar, mais de uma vez, por mais de 20 min. E sem manifestar sequer uma idéia original sua. Pecou pela vaidade.

Para dar só as impressões superficiais dele sobre o tema, ele devia ter um blog.

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