Diário de um Biólogo – Segunda 01/10/2007
14h – 5a aula do curso de narrativa:
“Prof. Mauro Rebelo, o senhor concorda que essa cadeira é uma cadeira?”
Respondo que sim. Resolvi não polemizar lembrando a palestra do Enio Candotti, onde ele dizia que a diferença entre os políticos e os cientistas é que, para os primeiros, as verdades eram ‘consensuais’. Se decidissem que a cadeira, para o bem de todos, não deveria existir, então, apesar de poder ser medida e pesada, a cadeira não existia.
“Prof. Mauro Rebelo, com base nos seus conhecimentos de biologia, eu posso dizer que essa cadeira é uma baleia?”
Respondo “Não” pra deixar ela concluir.
“Então Prof. Mauro Rebelo, da mesma forma, o senhor não pode inverter a ordem das perguntas do modelo narrativo, criado e testado há 25 séculos. Simplesmente porque, ainda que o senhor não perceba a diferença, estaria tão errado quanto dizer que uma cadeira é uma baleia”.
A Sonia, impressionada com a capacidade da turma de ‘resistir’ para manter suas convicções, pergunta se eu iria examinar cientificamente essa questão algum dia, porque deveria ser fruto de alguma ‘deformação morfológica’, e escrever a respeito no blog. Ainda antes da aula terminar lembro que já escrevi sobre isso aqui. A resistência ao novo é importante para dar uma sensação de ambiente estável aos organismos, mas interfere na percepção da incongruência legítima.
17h – Termina a aula. O Milton (coordenador da PG da Fiocruz) vem encontrar com a gente e começa um amplo debate, em frente ao prédio de Farmanguinhos, sobre resistência e criatividade, que debanda, inevitavelmente, para ‘estabelecidos e outsiders‘. Vejo que minha resistência com a professora é devido ao quanto ela pode ser tendenciosa em suas opiniões.
Vamos ao aeroporto buscar meu hóspede, um aluno de uma amiga pesquisadora do Ageu Magalhães, a Fiocruz de Recife, precisava de pousada por uns dias no Rio para apresentar seu trabalho na jornada de iniciação Científica e Pós-graduação.
No caminho para casa, a discussão já tinha passado por Paulo Lins e Ismael Beah na Flip e chegado em “Tropa de Elite”. Concordamos que só ‘pobreza de espírito’, aliada a pura babaquice, pode explicar alguns colunistas de ‘O Globo’ classificarem o filme de facista.
Acho que foi a única outra concordância do dia.