Tal pai, tal filho

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Quando duas semnas atrás o prof. Juraci Alves me ligou para me convidar novamente para participar da banca de cconcurso para docente da Universidade Federal de Viçosa, eu não hesitei: desmarquei todos os compromissos e agendei a viagem para depois do primeiro jogo do Brasil.
Não tanto pelos atrativos de Viçosa que, devo dizer, não são muitos, mas pela hospitalidade mineira com que fui recebido da última vez que estive por lá (vejam aqui).
Fiz questão de seguir a dica da minha amiga Alexandra Pinedo, que morou lá por muitos anos, e fui comer o risoto da Coccinella na 5a feiura a noite. Quem me levou foi o prof. Og de Souza (sim, ele mesmo, o homem da densidade 0,12) com sua mulher a prof. Flávia da Silva e seus filhos, Pedro de 15 e João de 11 anos.
Mais uma vez foi uma noite divertidíssima, só que dessa vez, a estrela foi João (esse que aparece desenhando ai em cima).
Filho de peixe, peixinho é. Filhos de cientistas são certamente mais divertidos que os dos outros. Enquanto crianças de 11 anos estão doidas para ir conhecer a Disney, João sonha conhecer o LHC ou ‘Grande Colisor de Hadrons’, o maior acelerador de partículas do mundo que fica na Suiça. Provavelmente agora terá chance, já que seus pais estão saindo para um pósdoc na Inglaterra. Enquanto os adultos discutem as propriedades organolépticas do Cabernet Sauvignon chileno que pediram, ele desenha quietinho na mesa. O desenho é super divertido: Jesus Cristo pedindo uma cerveja.
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Quando chega o nosso risoto, de Palmito, Açafrão e Mozzarella de búfala, Flávia começa a contar da pergunta que o filho fez acordando em uma das frias manhãs da semana anterior:
“Mãe, se a Terra fosse partida ao meio e nós caíssemos na fenda, chegaríamos até o outro lado, ou ficaríamos suspensos no centro, atraídos pela força da gravidade?”
E você que temia que seu filho dessa idade pudesse perguntar sobre sexo…
Pedro, o irmão mais velho, que ao invés de se preocupar com roupas da moda e outras coisas de adolescente se orgulha de seus dedos “feios” (longos, magros e com grandes articulações, próprios para interação com o teclado do computador), rapidamente corrige o irmão:
“Seu mané, se caíssemos na fenda, ao passar pelo centro da Terra estaríamos cheios de momento linear e por isso passaríamos direto, mesmo atraídos para o centro pela gravidade”
João então rapidamente mudou a pergunta:
“Então vamos ficar quicando no vácuo, como uma bola, até pararmos no centro?”
Tava ficando complicado pra mim e, aproveitando as habilidades artísticas do menino, pedi pra ele desenhar.
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Vendo o desenho, o pai, bem lembra, que não existe mais centro, então não poderiam mais ser atraídos pela gravidade, e ai confunde a cabeça do menino.
Ai eu lembrei do filme “Síndrome da China”, onde um acidente em um reator de uma usina nuclear podería, hipoteticamente, ficar tão quente, que derreteria o solo e abriria um buraco que chegaria até a China. Se ai invés de ‘fatiar’ a Terra, fizéssemos um buraco como esse do filme, passando pelo centro da Terra, então o centro de gravidade não mudaria, e João poderia testar a sua teoria sobre a queda.
Enquanto terminávamos o prato do 2o risoto da noite (de Camarão com Gorgonzola) ele continuou desenhando, os adultos conversavam sobre os tempos de faculdade, e a quantidade de aulas perdidas fazendo atividades pouco produtivas como jogar truco, João continuava desenhando. Pensei que ele poderia estar pensando em como sabotar um reator nuclear para poder testar a sua teoria, mas ele estava só ilustrando a nossa conversa. Quando fomos embora pra casa eu ganhei de presente a minha caricatura.
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Dessa vez um dos candidatos foi aprovado no concurso e eu espero que eles arrumem outra desculpa qualquer para me convidar a Viçosa novamente.

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Quem tem medo da Física?

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No excelente texto ‘O apagão vem ai‘ de Sonia Rodrigues no Blog Inclusão Digital, ela mostra a sua preocupação com a falta de formandos de Física para suprirem a imensa carência de professores dessa disciplina no ensino médio.
Segundo os dados do INEP que ela cita, são necessários 23,5 mil professores de Física, só para o Ensino Médio, e as todas as faculdades do país formaram, nos últimos 12 anos, apenas 7,2 mil licenciados.
Para ela, essa é a explicação para tantos professores de Biologia dando aulas de ciências no ensino fundamental e de Física no ensino médio. Criou-se um ciclo vicioso: se formam mais biólogos, que se tornam mais numerosos entre os professores de ciências, que puxam a brasa para a sua sardinha nas aulas de ciências, inspirando mais alunos a se tornarem biólogos, que se tornarão também professores de ciências.
O problema é que esse raciocínio cria uma tautologia: quem veio primeiro? O aluno inspirado que vira professor ou o professor que inspira o aluno?
Comentei no texto dela em minha opinião o problema é outro: as pessoas, e os alunos, tem mais medo da física do que da biologia, independente do professor. E como vocês sabem que cientista detesta não ter elementos para apoiar suas conclusões, resolvi fazer aqui uma pesquisa. Então:

De qual materia voce tinha (tem) mais medo na escola?
Historia
Fisica
Quimica
Biologia
Matematica
Portugues
Geografia
  
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Já anuncio o meu voto: matemática!
Acontece que quando a gente entra na faculdade descobre que a Biologia não é mais fácil do que nada: quero ver encarar Bioquímica I no 3o período ou Biologia Molecular no 6o!
E como diz a piadinha: “Quando a gente entra na faculdade descobre que Psicologia é, na verdade, Biologia; que Biologia é, na verdade Química; que Química é, na verdade Física; e que Física é na verdade Matemática (e que mesmo depois de estudar anos, você não vai entender bem nada).”
Por isso acho que existe outro motivo: a Biologia se aproximou mais das pessoas nos últimos 50 anos, enquanto a Física se distanciou. A Ecologia, a Biodiversidade e até o Genoma estão muito mais próximos do homem do que a teoria das Supercordas, os buracos negros e os universos paralelos. Mesmo com todo o charme (?) de Sheldon e do Marcelo Gleiser, os físicos estão perdendo!
Porém, meu comentário suscitou uma outra questão, que eu sei que arrepia a Sonia. Eu não vejo um movimento nas universidades públicas para valorizar as carreiras de base (que formam os professores para as disciplinas do ensino fundamental e médio). Ao contrário, o REUNI exigiu que as universidades criassem novos cursos. E elas criaram cursos voltados para o futuro. Ainda que seja o futuro delas.
Na UFRJ, os exemplos são os cursos de graduação em Biofísica, Nanotecnologia, Metrologia, Bioinformática e Biologia Forense.
São cursos interdisciplinares, antenados com a modernidade de um país que quer investir em inovação e recuperar o tempo perdido no desenvolvimento de tecnologia. Precisamos de profissionais preparados para navegar em diferentes mares e para muitas cabeças pensantes, esses cursos interdisciplinares são a solução. É importante ter em mente que no nosso país, assim como em todo o mundo, o desenvolvimento de tecnologia está ligado a universidade pública (a diferença é que aqui está ligado principalmente e quase exclusivamente a universidade pública – sim, eu sei que EMBRAPA e institutos de pesquisa do CNPq são fundamentais, mas me permitam esse raciocínio). A maior universidade do país (em número de alunos) não poderia se furtar a esse compromisso!
Mas e as disciplinas de base? O número de vagas vem aumentando ao longo dos anos, como por exemplo a criação da licenciatura em Biologia no período noturno (também na UFRJ).
Abre Parênteses: Na teoria é lindo, mas na prática não funciona. Os ‘cursos modernos’ de modernos tem apenas o nome. É mais fácil pronunciar interdisciplinaridade do que praticá-la. O resultado são currículos multidisciplinares, onde as diferentes disciplinas se misturam, mas caminhando paralelas e não convergentes. Não há uma só disciplina de gestão empresarial e de recursos humanos, criatividade, estética, cultura e idiomas. Os conselhos profissionais tem resistência a registrar esses novos profissionais que podem permanecer um bom tempo no limbo. E por outro lado, meus alunos do curso noturno não conseguem chegar pontuais nas aulas porque podem levar até 3h de ônibus para chegar na Ilha do Fundão vindos de São Gonçalo ou Maricá na hora do rush. Fecha Parênteses.
A Universidade Aberta do Brasil é uma tremenda iniciativa para recuperar o déficit de jovens fora da universidade e produzir os licenciados necessários para reverter as estatísticas infames que mostram, por exemplo, que apenas 1% dos professores do ensino fundamental na região norte tem ensino superior.
Não há dúvida que precisamos trabalhar para aumentar o número de licenciandos em física e garantir que haja professores qualificados e motivados ensinando ciências para nossas crianças e adolescentes, mas sem que se comprometa a formação interdisciplinar de pessoas para as profissões do futuro, aquelas que ainda nem sabemos quais são.

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