Quem me dera todos os congressos de ciências fossem assim

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Voltei da Feira de Literatura Internacional de Parati, a FLIP, desse ano, com uma certeza: o modelo de congresso de ciências está falido. Ninguém mais tem paciência para longos corredores com uma infinidade de posters, mal preparados as vésperas sem que os orientadores tenham sequer visto os arquivos, com resumos copiados e gráficos com letras minúsculas. Ninguém tem mais paciência para palestrantes que começam suas falas com longas introduções que repetem o óbvio, o domínio público, e deixam a análise dos seus dados, quando muito, para os últimos 2 minutos, invariavelmente ultrapassando o tempo, atrasando a sessão e esgotando a nossa paciência. Ninguém aguenta mais pagar as altas taxas de inscrição para beber o vinho de baixa qualidade e aprender uma ou duas coisas novas.
O TED e a FLIP são modelos mujo mais eficientes de transmissão da informação.
No TED, o evento que acontece anualmente na California (pelo menos em princípio, mas que agora já contagiou o mundo), as palestras são para audiências inteligentes mas variádas. O conteúdo tem que ser transmitido em até 18 min, mas algumas palestras, mesmo de um vencedor do Nobel com Kary Mullis, tem apenas 5 min. É o conteúdo e o tempo disponível da audiência, e não a vaidade do apresentador, que determinam o tempo da apresentação. Todas as apresentações são revisadas por uma equipe de produção e todas as são gravadas em video e disponibilizadas na internet, onde um exército de pessoas bem intencionadas coloca legendas no texto em dezenas de idiomas.
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Na FLIP, autores renomados conversam entre si com ou sem a mediação de um jornalista ou outro escritor. A conversa é sobre trechos de livros ou sobre a tarefa, ou as vezes arte, de escrever. Como ambos escritores são importantes, assim como o mediador, os egos estão sob controle e um extrai o melhor do outro. Quase sempre pelo menos (as vezes não há muito o que extrair, por timidez ou loucura mesmo).
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O mais interessante, e impressionante, talvez, é que as pessoas pagam e fazem fila para ver os autores falarem. Mesmo aqueles que não conhecem, mesmo que o tema não seja de seu interesse especial. Porque?
O que mais diferencia esse novo modelo de congresso dos anteriores é o critério de seleção. Não o critério e a seleção em si, mas o fato que haja um e que haja uma. Os comitês científicos dos congressos não tem feito o seu dever de casa e encontramos uma infinidade de coisas chatas e desimportantes. Em um mundo saturado de informação, a primeira coisa que devemos ensinar a nossos estudantes é a ter critério de seleção.
O comitê de seleção desses eventos é rigoroso e gera um senso de credenciamento que contagia a platéia: “Se esse cara escreveu um livro e foi selecionado para estar aqui, então deve valer a pena escutar o que ele tem a dizer”. Como eu disse, há exceções, mas que só servem pra confirmar a regra.
Não é a preparação de um poster para um congresso internacional, ou uma aula chata de um Nobel brilhante, que vão iniciar nossos estudantes na vida acadêmica e científica. Isso no máximo inicia eles na arte de ‘participar de congressos chatos’. O que eles precisam é aprender a ter critério. E o primeiro critério que tem que aprender é que boas idéias só são boas se funcionarem. Que boas idéias não podem renegar os fundamentos básicos das coisas. Para isso nossos congressos precisam retomar o conceito de ‘feira de ciências’. Mais importante do que montar um poster chato sobre um assunto específico é montar algo, um experimento, que funcione, mostrar pros outros como montou e mostrar funcionar. É ter chance de ver como flui o papo entre dois Nobeis ou entre dois grandes pesquisadores da sua área.
A academia tem tradição em resistir a mudanças. Mas eu sei que ainda vou participar de muitos congressos na minha vida e espero que essa mudança não demore muito.

Diário de um biólogo – Quarta, 27/10/2010 – Quinto dia do ISMEE

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O dia começou com mais uma atração internacional. Dr. Malin Celander da Universidade de Gothenburg na Suécia. Usando os Citocromos P450 como ponto de partida, ela deu tremenda aula, mesmo com a competição do lindo dia de sol lá fora. Mais do que interação entre drogas e enzimas, bioquímica mesmo. Depois, nas avaliações, os alunos escreveriam: “finalmente entendi como os P450 funcionam!”
Depois do almoço começaram os seminários dos alunos sob coordenação do professor Marcelo Einicker. Apesar de não ser ecotoxicologista, ele é professor do instituto de Biofísica da UFRJ, sabe muita fisiologia e tem muito, muito jeito com os alunos.
Enquanto isso, eu ia ao banco pra liberar os fundos do CNPq, comprava adaptadores de tomada, tentava fazer a Internet não parar de funcionar, implorava para os marinheiros limparem o salão, tentava descobrir se o café seria suficiente e preparava alguma coisa da minha apresentação da manhã seguinte.
Parece que o primeiro dia de seminários não foi uma maravilha e os alunos precisam melhorar bastante antes de se apresentarem em um congresso internacional.
A noite o Dr. João Paulo Torres, que estuda concentrações e movimento de poluentes orgânicos no ambiente, apresentou a palestra “(In)justiça ambiental no Brasil”. João não é só um grande pesquisador mas um ávido leitor e conhece não só os problemas ambientais de hoje, mas as suas causas e história. Também sabe, como todos nós, que na maior parte das vezes, não faltam soluções para esses problemas e sim interesse para que eles sejam resolvidos.

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