Homens que choram


Eu sempre chorei a tôa, então sempre tive de conviver com aquela história de que homem não chora. E também que homem não isso e que homem não aquilo.

Por outro lado, nas últimas semanas, tenho ouvido repetidamente as mulheres reclamando dos homens. Que os homens não fazem isso, que os homens não fazem aquilo. Quase tudo que elas reclamam que os homens não fazem, são coisas de mulher. Ou coisa de homem que chora?

Lembrei do texto ‘Testosterona’ do João Ximenes Braga, onde ele fala dos homens heterosexuais que gostam mais de homens (companhia, papo, interesses) do que de mulheres. São os Men’s man. O texto dá ótimas definições, como a dos caras que preferem ficar em rodinhas de outros caras no baixo Gávea e enquanto outros preferem ficar sorrindo para mulheres (ainda que feias) na mesa do bar. Acho que os que choram, devem se encaixar nesse segundo grupo.

Existe um ramo da biologia chamado sociobiologia, que acredita que todos os comportamentos sociais tem fundo genético. Qual a importância de ter fundo genético? É que se está nos genes, de alguma forma isso pode ser passado dos pais para os filhos. E também as escolhas que podemos fazer são muito, muito mais restritas, porque muito já foi decidido no nosso DNA.

A sociobiologia tem seus adeptos, mas é amplamente questionada. Mesmo assim, Edward O Wilson, seu criador e principal teórico e, escreveu em seu livro de 1975 a primeira tentativa de explicar geneticamente o homosexualismo.

Vejam que a parada era duríssima. Explicar as bases genéticas de um comportamento social, que basicamente impede a reprodução e a transmissão genética desse mesmo comportamento. Só que na verdade, já existia uma explicação, que pode ser verdadeira para outros genes que também conferem baixa reprodutibilidade. Nesses casos, a única forma do gene se manter na população, é através de uma maior adaptabilidade dos heterozigotos. Ah… você não lembra o que são os heterozigotos? Vamos supor que a característica ‘opção sexual’ seja determinada pelos genes H e h. Vamos supor ainda que H seja o gene para o gene para heterosexualidade enquanto h o gene para homosexualidade. E continuar supondo ainda que H seja dominante sobre h. Um homem pode ser homozigoto para a característica ‘opção sexual’ se tiver ambos alelos (o par de genes que determina uma característica) iguais. O par HH então caracteriza o homozigoto dominante para heterosexual e o par hh caracteriza o homozigoto recessivo para homosexual.

Como os homosexuais, em princípio, não deixam descendentes, então rapidamente o alelo h desapareceria da população. A não ser que… o heterozigoto, aquele individuo que possue um alelo de cada (ou seja um H e outro h), fosse mais adaptado (o que nesse caso quer dizer sucesso reprodutivo), do que o homozigoto dominante para heterosexualidade.

Voltando ao texto do Ximenes, os heterozigotos Hh seriam um tipo de Woman’s men. Homens totalmente heterosexuais, mas com maior sensibilidade, mais tato (coisas importantes para as mulheres) e por isso fariam mais sucesso, conseguiriam mais oportunidades de reproduzir, e deixariam mais descendentes.

Os heterozigotos então inflacionam um mercado escasso e criam a ilusão de que podem haver homens que efetivamente sejam capazes de fazer o que as mulheres esperam. Só porque um cara prefere ir ao shopping ou assistir a um drama no cinema na companhia de uma mulher, ao invés de jogar futebol com os amigos; elas inferem que eles vão entender também o que se passa no complexo e caótico universo feminino.

É preciso manter em mente duas coisas: A primeira é que a sociobiologia é uma tautologia, um sistema lógico que encontra explicação em si mesmo e por isso nunca pode ser realmente comprovado. É como explicar que a galinha veio primeiro que o ovo, que veio da galinha. Por isso, essas teorias serão sempre hipotéticas. Bom papo pra buteco. A segunda é que, por mais que tenham um alelo h, os heterozigotos são homens. E como homens, querem exatamente a mesma coisa que todos os outros.

O heterozigoto Hh é só aquele cara mais sensível que come todas as amigas, enquanto os caras machões HH acham que ele é viado.

Vai encarar?


No semestre que vem tenho de dar um curso sobre Evolução e como estou numa fase muito literata, comprei um livrinho pra estudar mais sobre “Sociobiologia“. Durante décadas esse foi um tema controverso em Biologia, porque sugere que os comportamentos sociais no mundo animal, incluindo o humano, teriam uma base genética (o autor, Edward O. Wilson, foi até mesmo acusado de Nazista, o que certamente é um exagero).

Já digo pra vocês que não sou muito adepto da Sociobiologia. Queria apenas saber mais sobre o assunto. E foi ai que me deparei com um dos principais temas do comportamento animal: A agressão!

Como a seleção natural sempre foi vista como a “luta pela sobrevivência” a agressão animal sempre teve um papel importante nessa luta. Depois, a visão da seleção foi mudando do “mais forte” para o “mais apto”, ou mais adaptado, e a agressão pode tomar várias formas menos violentas.

O maior problema é sempre a nossa visão romantizada dos eventos naturais e a nossa eterna necessidade de classificar tudo como certo ou errado. A agressão entre animais de espécies diferentes é aceitável, ou pelo menos compreensível, como nas relações predador-presa.

Abre parênteses: Isso me lembra meu primeiro dia de aula na universidade. Fomos todos da turma conhecer os diferentes laboratórios e acabamos chegando na herpetologia (estudo dos répteis) onde um estagiário estava alimentando as cobras no terrário. As meninas da turma logo se indignaram: “Oh…. pobre ratinho”. Seguiu-se então a explicação do estagiário sobre a pobre cobra, presa em cativeiro e que deveria, pelo menos, comer. Com o passar do tempo houve uma curiosa inversão. A cobra ia acompanhando o ratinho dentro do terrário e do lado de fora, todos, inclusive as meninas, passaram a torcer pela cobra. Fecha parênteses.

Já a luta entre animais da mesma espécies é menos aceita. Mas não por isso, quando a luta é intra-específica, acontece algo curioso: a ameaça é mais utilizada do que a agressão. Existe um ritual onde o mais fraco pode sempre dar sinal de conciliação, impedindo a agressão mortal do mais forte. Bem, parece que também existe uma contribuição, essa sim uma tendência genética, a um animal não gostar do sabor da carne de um companheiro da mesma espécie.

Mas o que determina qual o ponto da batalha onde se opta pela conciliação ou pela agressão mortal?

Quem melhor definiu isso foi um outro biólogo, brilhante, chamado Maynard Smith. Roberto Freire disse que “a maioria dos grandes criadores sinceros já sentiu e já comunicou essa sensação de estar sendo uma espécie de tradutor, de comunicador da linguagem do inconsciente coletivo que existe igualmente em todos nós, mas que eles especializaram em decifrar e comunicar. (…) Costumo dizer, com envergonhada honestidade ou com humilde paranóia, que todos os poemas de Fernando Pessoa são meus, como se ele apenas tivesse revelado em seus versos o que já estava pronto poeticamente em mim.” Maynard Smith colocou em teoria matemática o que eu já sabia há muito tempo, como bem já coloquei aqui no blog outras vezes: Não existe certo ou errado, apenas estratégias que sejam favoráveis em longo prazo. O nome que ele deu pra isso foi “Estratégia Evolutivas Estáveis (EEE)”, que podem ser avaliadas com base na “teoria dos jogos“.

Abre parênteses de novo: fiquei tão empolgado com o assunto que fiz uma coisa que meu amigo Edu faz muitas vezes, comprei a referência bibliográfica que o autor dá, pra começar a ler antes de terminar o primeiro livro. Tive que ir até a Amazon.com porque o “Evolution and the Game Theory” do Maynard Smith não tem no Brasil. Fecha parênteses.

Uma EEE é uma estratégia para qual não existe nenhuma outra “estratégia mutante” que possa dar mais sucesso. Funciona tanto no caso de uma partida de pôquer quanto para o sucesso reprodutivo. Não ficou claro o que é estratégia mutante? Ficou pensando nos X-men? Calma, acho que com o exemplo vai ficar mais claro.


Maynard ilustra sua teoria com dois personagens, que representam duas estratégias opostas de comportamento: O pombo e o gavião. Os gaviões lutam sempre, ferozmente, até que vençam ou sejam gravemente feridos. Os pombos lutam de forma ritualística, trocando ameaças até que um deles se canse e vá embora. Eles sempre se retiram antes do confronto.

Nenhuma dessas duas estratégias é uma EEE, pois um gavião sempre obteria mais sucesso reprodutivo em uma população de pombos e vice versa. Então qual é a melhor? Na verdade o melhor (e é o que acontece na natureza) é um equilíbrio entre as duas estratégias. Uma possível EEE seria que os animais da população apresentassem uma relação de 5:7 entre pombos e gaviões. Com a possibilidade de agressões ritualísticas inofensivas e agressões reais e mortais.

Mas é isso mesmo que a gente encontra na natureza? Esses são modelos simples que não incluem uma figura tipicamente carioca: O malandro! Aquele gavião que se finge de pombo pra atacar depois, ou o pombo que se finge de gavião e depois sai correndo.


Na verdade o próprio Maynard já havia descrito mais 3 estratégias além do gavião e o pombo: o atrevido, que se faz de gavião mas na verdade sai correndo como o pombo se o oponente é do tipo gavião; o retaliador, que se faz de pombo mas ataca como gavião se o oponente também o é; e o experimentador, que se comporta quase sempre como um retaliador, mas eventualmente pode começar atuando como gavião para testar a força do oponente.

O reino animal está cheio de exemplos que comprovam essas estratégias. Entre os humanos não é diferente. E ao que parece, somos até uma espécies pacífica (acho que quem escreveu isso não mora no Rio).

A teoria é tão bacana que até leva em conta a agressão não realizada nunca. Uma forma de guerra fria. O que conta para cada um dos opoentes é o tempo gasto durante a batalha. O tempo, com a gente bem sabe, é um bem precioso.

Em princípio, toda população vai ter um lutador de Jiu-Jitsu que se comporta como gavião (até encontrar um gavião com um “trêsoitão”). E sempre haverá um jovem que não sabe se defender, ou um animal doente, que se comportará como pombo. A questão é que nada disso está escrito nos seus genes. Ninguém nasce gavião ou pombo! Ou experimentador. Isso a gente aprende. Basta querer experimentar ser algo diferente do que a gente sempre foi.
Por isso, a não ser que você goste do gosto de sangue da mesma espécie, saber a hora de desistir e… abandonar a luta, ainda que você seja o mais forte, te devolve um bem muito precioso: seu tempo! Pena de quem não sabe reconhecer quem é da mesma espécie, e fica brigando até a morte à toa.

As travessuras dos genes egoistas

Durante uma espera de 6h no aeroporto do Rio, que me levou direto para a livraria mais próxima (e depois pra pizzaria mais próxima e pro chopp mais caro do Rio), o título do novo livro do Mário Vargas Llosa me chamou atenção: “As travessuras da menina má”. O livro foi devorado em 3 dias.

Mas o que isso tem a ver com a biologia? O egoísmo da “menina má” e o altruísmo do bom menino, talvez pelo seu desmedimento, me levaram a pensar nessas duas características como estratégias de vida. Não, eu não sou o primeiro a pensar nisso. Existe todo um ramo da biologia chamado sociobiologia que fala muitíssimo a esse respeito. Nem sempre com muita propriedade, é verdade, mas fala (não sei se é exatamente uma falta de propriedade. Talvez apenas uma forçação de barra. Quando tentamos encontrar uma explicação para uma fato que já aconteceu, é sempre fácil encontrar uma que seja plausível). E a sociobiologia exagera.

A cooperação entre indivíduos da mesma espécie tem sido tema muito controverso. Veja as abelhas e as formigas. Parece que existe muita cooperação entre elas. Mas olhando por outro ângulo, o que existe é escravidão. E você pode pensar que a rainha é uma felizarda que come geléia real. Mas quem come geléia real mesmo são as larvas das abelhas, e a rainha é uma pobre coitada cuja única função no universo é colocar ovos. Um depois do outro! Até morrer.

Eu teria de ler novamente o “Gene egoísta” pra poder ir a fundo no tema com vocês, mas vamos tentar simplificar: O Richard Dawkins desenvolveu essa teoria de que nós somos maquinas, robôs desengonçados, controladas pelos nossos genes. E o único objetivo deles fazer maquinas cada vez melhores para desempenhas a sua função primordial: passar os genes adiante. Na verdade, essa não seria a função primordial e sim a única função! Comer, pensar, sentir… todo o resto serve apenas para gente poder passar os genes adiante. E tudo que entre no caminha desse objetivo primordial, deve ser relevado a segundo plano. Por isso, o egoísmo é a estratégia mais importante para o indivíduo. Somos egoístas por natureza, mas também por causa dos nossos genes. Então como explicar a cooperação entre os indivíduos? Como explicar o altruísmo?

A questão é que nós temos genes em comum com outros indivíduos da nossa espécie. Condividimos 50% dos nossos genes com nossos pais e irmãos, 25% com nossos primos e assim por diante. Se continuássemos na verdade chegaríamos a razões ínfimas de compartilhamento de genes (com um primo de 8º grau chegaria a 1/250), mas alguns estudos mostram que temos pelo menos 1/8 dos nossos genes semelhantes aos de qualquer outra pessoa na rua. É justamente essa semelhança que faz com que os nosso genes, “egoístas” por natureza, nos permitam esses comportamentos altruístas.

Quais comportamentos? Os pássaros que quando encontram um predador ao invés de se esconderem e salvar a própria vida, gritam, chamando atenção para si, mas salvando as vidas dos outros indivíduos do bando, por exemplo. Mas todos vocês devem ter um monte de outros exemplos de atos de altruísmo, até de heroísmo.

Não acho que precisamos dos genes para explicar os comportamentos sociais. Mas com o mundo lindo e estranho em que vivemos, é tentadora a idéia de que o altruísmo é apenas uma outra face do egoísmo. Ainda que não expliquem a “niña mala” ou o bom menino do Vargas Llosa, porque afinal não dá pra explicar maus tratos e tortura, ainda que psicológica, daria pra explicar muitas das belezas estranhas que encontramos no nosso caminho.

Somos todos egoístas. O que determina a nossa capacidade para o altruísmo é nossa história de vida. Talvez o número de “niñas malas” ou “bons meninos” que a gente encontra pelo caminho.

O importante é que você não seja apenas egoísta ou altruísta. Ser apenas egoísta ou apenas altruísta é uma estratégia ruim (por ruim devemos entender, menos eficiente a longo prazo), que uma mistura balanceada dos dois. E por isso a gente quebra a cabeça tentando determinar o equilíbrio exato entre um e outro.

O que eu acho que é mais importante é a gente não se enganar. Se você quer ser egoísta, tente não disfarçar de altruísmo. Criar confusão é uma estratégia ruim se o seu objetivo não é despistar, confundir e fugir. Pensando, pensando, vamos ver que os meninos bons devem ser mais egoísta que as “niñas malas”.

Reconhecer nossos egoísmos é reconhecer nossa humanidade. E nossa natureza animal. Mas exercitar o altruísmo, alem de bonito, e útil também.

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