A Junção Angular/Supramarginal e as Viagens Astrais

From N Engl J Med 2007;357:1829-33.
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Quando eu era adolescente, minha mãe, uma das maiores mentes místico-sincréticas que já conheci, assinava um tipo de clube do livro que mudava a capa de alguns bestsellers e os entregava a domicílio. Um dia, ela me deu um livro de capa dura e laranja e disse “você, que fica questionando tudo, deveria ler isso!”. (Imagine o quanto eu não devia ter torrado a paciência dela!) O livro era de um autor com nome bastante esquisito: Terça-Feira Lobsang Rampa. Li a “Terceira Visão”. Depois, li “O Médico de Lhasa”. Achava interessante as narrativas com detalhes da vida no Tibete pré-ocupado. Posteriormente, descobriram que o tal Lobsang Rampa era um baita de um charlatão, um encanador na Inglaterra chamado Cyril Hoskins, mas até aí, ele já era um blockbuster com 20 livros publicados, uma legião de seguidores e uma anotação no Guinness de fraudes e cafagestagem em geral. Até as mulheres que viveram com ele tiraram uma casquinha editorial (ver San Ra’ab Rampa e Sheelagh Rouse). Morreu negando as acusações e dizendo ter sido sequestrado espiritualmente pelo tibetano de quem assumiu o nome.

O que eu mais achava legal nos livros eram as tais viagens astrais. O indivíduo saía do corpo e ficava olhando seu “invólucro” inerte, extendido em uma cama. Daí, poderia embarcar para os mais variados e longíquos logradouros, inclusive, no caso de nosso herói, o planeta Vênus (sim, está publicado!). Confesso que tentei, conforme as técnicas descritas com extremo detalhe, realizar viagens astrais mas, o máximo que consegui numa madrugada foi enfiar a cabeça no estrado do beliche e ser mandado enfaticamente para “um local bem longe” pelo meu irmão, que dormia na cama de cima.

Mas não é que as viagens astrais são mesmo possíveis!! Um artigo do New England descreve um paciente que, após anos de tratamento ineficaz contra um torturante zumbido, foi submetido a uma estimulação estereotáxica (procedimento no qual são colocados eletrodos para estimulação em áreas cerebrais mapeadas e posicionadas com um sistema semelhante ao utilizado pelos GPS). Os médicos não conseguiram tratar o zumbido, mas ao estimular a junção dos giros cerebrais de nomes angular e supramarginal, o pobre (ou felizardo) paciente sentiu que saía de seu corpo! Foi uma viagem, digamos, curta: apenas 50 cm para trás. Também um pouco frustrante: o paciente não teve o que se convencionou chamar autoscopia – a visão do próprio corpo! Mas já é alguma coisa.

O interessante dessas “desincorporações” é que elas podem ser desencadeadas por crises epilépticas e até por enxaquecas. São, segundo o conhecimento atual do problema, causadas por estimulação de áreas onde existe a integração de informações multissensoriais (visuais, proprioceptivas, etc). A estimulação e algumas doenças podem desconectar essas informações de modo que haja um descolamento entre as sensações dando uma impressão de desincorporação. Ainda não existem relatos de que meditação ou estados de transe (como em sessões espíritas) possam desencadear o processo, mas é possível. Drogas psicoativas teoricamente também poderiam, mas há pouca literatura sobre isso. Depois, os médicos fizeram ressonâncias funcionais para ver qual área cerebral estava trabalhando mais intensamente durante a experiência de desincorporação e o resultado é a foto acima. Um frenologista diria que encontrou-se o “centro da mediunidade”. Minha progenitora fatalmente diria “viu, viu?”. Mas ainda não contei isso para ela…

É isso que dá torrar a paciência de mãe!

Agradecimento especial a T.A.

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Animação Suspensa

Com essa expressão, cientistas de 3 décadas atrás descreviam o estado bastante procurado e pesquisado, onde um indivíduo estivesse com o metabolismo celular reduzido a funções estritamente básicas (manutenção de membrana celular, equilíbrio osmótico, etc) a ponto de poder ser resgatado e restituir plenamente suas funções normais. Seria a imortalidade, máquina do tempo! Poder conservar-se e ver o futuro…
A animação suspensa não está mais na moda (apesar de existirem pesquisas rolando) mesmo na ficção científica e, hoje, sabemos que algumas situações são de fato, irreversíveis. Mas um blog pode realizar vários sonhos. Inclusive este.
Este blog entrará em um pequeno recesso, nas próximas 2 semanas. Uma animação suspensa que, tomara, traga uma visão de futuro mais otimista.

Doctors Talk: Ceasefire

 Gaza’s Children at PMRS site

Two humanitarian organizations deserve mention for occasion of the attacks that occur in Gaza. The Palestinian Medical Relief Society (PMRS) is the largest non-governmental healthcare agency in Palestine. PMRS “carries out a variety of programs from organizing village health committees to offering community-based first aid training to establishing mobile clinics. PMRS is a leading advocate for national health care delivery”.

The second, Physicians for Human Rights-Israel “was founded in 1988 with the goal of struggling for human rights, in particular the right tho health, in Israel and the Occupied Territories. Human dignity, wellness of mind and body and the right to health are at the core of the world view of the organization and direct instruct our activities and efforts on both the individual and general level”.

Together, they publish alerts about population conditions at occupied territories. The last yesterday at Palestine Monitor and  PHR-Israel site. The dramatic alert is the following:

“The most recent escalation of the Israeli attack against the Gaza population has led to further chaos and destruction and to rising numbers of casualties. The Palestinian Medical Relief Society and Physicians for Human Rights-Israel call for urgent and immediate intervention by the international community, and especially the Quartet, for the enforcement of an immediate ceasefire.

In addition to total closure of all crossings and destruction of essential infrastructures including electricity, running water, communications and roads, hospitals are on the verge of collapse due to overload and the inability to provide adequate intensive care to the high numbers of casualties. External evacuation of the sick and wounded is completely prohibited. Due to telephone and mobile communication failures, dangerous conditions, and the limited number of foreign press on the ground, there are growing difficulties reporting the situation to the outside world. The Palestinian Medical Relief Society and Physicians for Human Rights-Israel call for urgent and immediate intervention by the international community, and especially the Quartet, for the enforcement of an immediate ceasefire.”

Doctors sit together at the same table, talk about their problems, seek for solutions to suffering people at this dramatic situation. That this example could be followed by politicians and leaderships of both sides of the conflict in order people stop suffer and die.

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Sobre Metástases

A última edição do New England Journal of Medicine tem um artigo sobre as bases moleculares das metástases. Há tempos queria ter escrito sobre elas. Sempre achei algo de bastante mórbido na disseminação do câncer. Sim, o leitor vai dizer, mas em qual doença não há? Eu concordo, mas insisto que nas metástases, mais que em outras doenças, há alguns requintes de crueldade contra a humanidade, com paralelo apenas em filmes ou romances de ficção. Filmes como Alien ou Resident Evil, têm seus conceitos de terror tirados de sistemas vivos como hospedeiros de outros sistemas vivos. Em determinado momento, o sistema vivo que está hospedado toma conta de tudo e passa a dominar o processo, o que invariavelmente costuma levar o hospedeiro à morte. Com o câncer metastático, parece ocorrer algo parecido. Um mérito desses filmes está em expor o sentimento aterrorizante de passar por uma experiência como essa. De fato, apesar de seguir alguns padrões de disseminação (ver figura abaixo), uma célula cancerosa pode colonizar virtualmente qualquer outra do organismo.

Um professor de patologia ao analisar um pulmão com metástases de um câncer de tecido muscular disse, certa vez, que o pulmão resolveu adotar um novo projeto: queria se transformar em um músculo! Mesmo dita em tom jocoso, essa frase ficou na minha cabeça. Trouxe para mim a idéia de que as células de um organismo obedecem de fato a algum comando central, um governo, que as mantem trabalhando em prol de um bem comum que é o organismo completo. Quando alguma célula resolve, egoisticamente, trabalhar independentemente isso é um câncer. Uma vez instalado, sempre há a possibilidade de que ele se dissemine, “colonizando” outros orgãos. É esse o termo utilizado. O câncer, a exemplo dos portugueses no séc. XV, partem para outras paragens distantes a fim de dominar e impor sua maneira de “ver o mundo”. Mesmo sob controle com quimioterapias, radioterapias e cirurgias, o paciente portador de um câncer deve saber que abriga células revolucionárias em seu organismo. Essas células, em situações de guerra, podem adotar táticas de guerrilha, se escondendo e fugindo para outros locais, para manifestar-se tempos mais tarde. É estranho pensar que um organismo possa ser portador de células que não partilham de seu projeto. Mas se pensarmos bem, a pergunta seria por que as outras obedecem sem reclamar? Qual o poder que as mantém unidas? Esse poder emana do conjunto que é o organismo?

Mas, por que o organismo? Sempre acabo voltando a essa pergunta. As respostas alternativas poderiam ser a espécie ou o gene. Essa é a velha discussão sobre a hierarquia da seleção natural. Onde a seleção natural se dá de fato. No nível da espécie (Gould), no organismo (Darwin) ou no gene (Dawkins). Esse presumível “comando” seria para preservar genes, o organismo ou a espécie?

E sempre que penso nisso, cada vez mais me convenço de que a doença faz parte da vida. Só pode ter câncer quem é multicelular. Dentre esses, só quem tem disponível um sistema de regeneração celular e cicatrização altamente desenvolvido. Sim, genes cancerígenos teriam a função de estimular o crescimento de células rapidamente – e nesse caso quanto mais rápido, melhor – com intuito de reparar um dano. Essa “arma” quando utilizada com outros objetivos, pode levar o organismo à própria morte. Não pudéssemos nós usufruirmos do fato de sermos um amontoado altamente organizado de células capazes de amar, sentir prazer, compreender nosso entorno e ousar sonhar, não teríamos cânceres de nenhuma espécie. Somos beneficiários e vítimas de uma complexidade. Cada um deve saber, portanto, da “dor e da delícia de ser o que é”.

Epidemiologia Cognitiva

Um novo ramo da epidemiologia foi criado. É chamado de Epidemiologia Cognitiva. Consiste em considerar a baixa performance em testes cognitivos de qualquer espécie como fator de risco de mortalidade geral ou fator de risco para o aparecimento de determinadas doenças, por exemplo, doença coronariana. Até então, apenas desfechos “duros” (hard endpoints) tinham sido utilizados para demonstrar as associações entre “inteligência”, saúde e doença. Recentemente, outras associações começaram a aparecer devido à irresistível vontade em se correlacionar a inteligência com fatores evolutivos. Esse post recém-publicado se articula com esse conceito. Como bem lembrou Dra. Sandra do Leia o Rótulo, fatores ambientais podem influenciar o aparecimento de duas ou mais características que seriam co-relacionadas pelo meio e não envolvidas numa relação de causa-efeito.
Não por acaso, epidemiologistas convencionais argumentam exatamente a mesma coisa. Por exemplo, citam as condições sócio-econômicas na infância como responsáveis pela associação entre mortalidade e QI. Se as igualarmos para todos indivíduos estudados, as diferenças desaparecem. Os epidemiologistas cognitivos dizem que não. A correção de tais fatores não responde pelo efeito da performance cognitiva sobre a mortalidade. O assunto é complexo. Se a infância não responde por tudo, existe o argumento de que as condições econômicas dos adultos possa influenciar a mortalidade. Pessoas mais inteligentes trabalham em ambientes mais seguros e mais saudáveis; ou que pessoas mais inteligentes ouvem mais os conselhos médicos e terminam por fumar menos, fazer mais exercícios e assim por diante (coisa que, na minha experiência, está longe de ser verdade!). Além disso, existe um efeito chamado causalidade reversa: algumas doenças somáticas como diabetes e hipertensão, muito comuns em adultos, podem diminuir a função cognitiva e também aumentar a mortalidade.
O fato é que se as relações entre QI e mortalidade são complexas, imagine então a relação entre QI e qualidade do sêmen, preferências eleitorais (também aqui) ou sobrevivência na guerra. Vejo isso mais como um sintoma da epidemiologia do risco. No Risco, como já se disse, a especulação causal é a razão de ser da investigação biomédica e sugere vínculos causais para que as ciências biomédicas experimentais explorem “adequadamente” tais associações. Mas acho também que todo esse assunto merece ainda ser explorado e amadurecido para que possamos entender a relação entre inteligência, seja lá o que isso quer de fato dizer, e sofrimento humano. Esse último, todos sabemos bem o que é.

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O Pó Branco que Vicia

Na década de 70, mais precisamente em 1975, foi lançado o livro Sugar Blues de William Dufty. Rapida e surpreendentemente, o livro se tornou um clássico. Bíblia dos naturebas e best-seller do segmento da população que começava a se preocupar de maneira séria com sua alimentação, o livro é uma colcha de retalhos sobre a influência econômica e cultural do açúcar refinado. Escrito por um jornalista casado com uma musa hollywoodiana fissurada por saúde e influenciado pela macrobiótica – bastante na moda na época (aliás, cadê a macrobiótica?!), o livro fez escola (ver o Dilema do Onívoro). Se abstrairmos muitas das teorias conspiratórias presentes no texto, encontraremos lá, uma sugestão de que o açúcar, de fato, vicia. O livro caiu no esquecimento e hoje se reconhece que algum exagero foi cometido. Passa o tempo e…

ScienceDaily – 11 de Dezembro de 2008 — Cientistas da Universidade de Princeton apresentam evidências decorrentes de experiências em ratos, de que o açúcar pode ser uma substância viciante de maneira similar a drogas ilícitas. Ratos acostumados com uma dieta rica em açúcar demonstraram comportamento abusivo e recorrente quando re-expostos à dieta após um período de “abstinência”. Interessante, durante esse período abusaram também de álcool (por que álcool?) sugerindo alterações no funcionamento cerebral, provavelmente mediadas pela dopamina. O autor sugere que pode haver um canal para comportamentos auto-destrutivos abertos pelo o açúcar (!!!). O estudo sairá no Journal of Nutrition.

Sugar. Rats drank more alcohol than normal after their sugar supply was cut off,
showing that the bingeing behavior had forged changes in brain function.
(Credit: iStockphoto/Tobias Helbig)

Sugar Blues e Dufty já foram considerados visionários devido a outros experimentos que demonstraram a dependência de organismos, humanos ou não, ao açúcar, principalmente em sua forma refinada, que tem absorção praticamente imediata.
Particularmente, acredito nos males da dieta ocidentalizada rica em açúcar refinado. Mas a velha máxima se repete aqui. A diferença entre o veneno e o remédio é a dose. A privação de algo que é disseminado em nossa cultura causa prejuízo psicológico indiscutível e tenho dúvidas se a proibição, pura e simples, é o melhor caminho. De qualquer forma, o assunto passa a ter enorme relevância devido a epidemia de obesidade e diabetes que vivemos atualmente. Isso é considerado assunto de saúde pública em países sérios. Os prejuízos são enormes, para pacientes e ministérios da saúde. Nunca operamos tantos estômagos e intestinos com objetivo de reduzir suas eficiências como hoje. É mais difícil aprender a ser moderado.

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Cai a Lei da Mordaça

Com 40 anos de idade, finalmente cai o artigo 242 do estatuto do servidor público, apelidado “carinhosamente” de Lei da Mordaça:
O artigo 242 diz que é proibido ao servidor “referir-se depreciativamente, em informação, parecer ou despacho, ou pela imprensa, ou qualquer meio de divulgação, às autoridades constituídas e aos atos da administração, podendo, porém, em trabalho devidamente assinado, apreciá-los sob o aspecto doutrinário e da organização e eficiência do serviço.”
Como funcionário público estadual há alguns (vários!) anos, vi esse artigo ser citado em algumas situações tensas entre funcionários e o estado. Como criticar, por exemplo, políticas de saúde totalmente descabidas, trabalhando para o governo apesar de termos uma posição privilegiada para isso? Como diz a reportagem da Folha, “desde a abertura democrática, em 1985, o Estado já teve como governadores Franco Montoro, Orestes Quércia, Luiz Antonio Fleury Filho (todos eleitos pelo PMDB), Mário Covas, Geraldo Alckmin (ambos do PSDB), Claudio Lembo (DEM) e agora Serra, sem que a “lei da mordaça” fosse removida.”
Dizem que a Felicidade, não é uma palavra, nem um sentimento, tampouco. Seria, digamos, um adjetivo dos olhos. Isso. Um adjetivo dos olhos é uma boa metáfora para humor. Humor que melhora sobremaneira com notícias como esta. Temos uma longa caminhada em direção à livre comunicação e liberdade de expressão e hoje estou feliz.

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Aliquid Hominis

Infinite Imperfection by Emuishere Peliculas at Flickr

Enquanto isso, na raiz do pseudo-debate entre ciência e religião, uma perguntinha agostino-cartesiana:
“O que faz mais sentido, perguntar ‘Quem sou?’ ou ‘O que sou?'”

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A Relação Médico-Parente

O que fazer quando alguém que você gosta muito fica doente prá valer? Qual é o limite entre cuidar de alguém da família e interferir na conduta de outro colega? Essa, juntamente com sua própria doença, é uma das situações mais estressantes para um médico. Frente a esse tipo de situação, o comportamento dos médicos pode ser resumido em três configurações paradigmáticas: Há o “Sem- Noção”, médico que discute tudo, dá palpite em tudo, prescreve, pede exames, acha que é o médico que mais entende do problema de seu parente. Há o “Desencanado” que diz que não quer ser identificado como médico no caso, não quer saber de nada, acha que tudo está bom. E há o “Meio-Termo”, aquele que intervém quando chamado, prestativo e colaborador, pode dar informações técnicas importantes para a condução do caso.
Obviamente, o Meio-Termo seria a conduta ideal para um médico que tivesse alguém da família doente e quisesse ajudar. Entretanto, entre os extremos existe uma infinidade de situações que correspondem melhor à realidade. Vejamos algumas situações as quais já tive a oportunidade de vivenciar e que trazem uma outra perspectiva a essa visão simplista. Não recomendo a postura do Desencanado. Uma conversa amigável entre o médico parente e o assistente, sempre coloca um pouquinho mais de pressão, sem ser desconfortável. Indica zêlo, cuidado, interesse por parte do médico da família. Novamente, os limites são fugazes.
O Sem-Noção pode ainda ser radicalizado. Tenhos amigos que mastectomizaram esposas, apendicectomizaram filhos, intubaram avós! Nenhuma dessas experiências, por mais bem sucedida que seja pode ser descrita como gratificante. Mas há uma questão que pouca gente coloca. O que fazer quando você sabe que é, digamos, um excelente cirurgião de mama e sua esposa precisa de uma cirurgia exatamente na sua especialidade? Normalmente, um expoente assim tem críticas ao trabalho de outros médicos da área e obviamente não encaminha pacientes a ele. Isso para não falar de vaidades pessoais e rivalidade. Não é difícil imaginar a ansiedade de saber fazer algo, e muito bem, e não poder fazê-lo devido o paciente ser da sua própria família. Já vi histórias assim acabarem muito bem. E também muito mal.
Um artigo bem recente do Annals Internal Medicine discute esses pontos com exemplos. Segue o resumo abaixo. Leitura bastante interessante.

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Ciência e Social II – Racismo Científico

Mad Scientist at DHM

Do repórter de ciência da Folha de São Paulo e blogueiro Marcelo Leite, um texto com o sugestivo título de “O Favor Impacto” no Caderno Mais! de 16/08/11 (para assinantes):

“Há muito se suspeita de que pesquisadores de nações periféricas sejam prejudicados nesse troca-troca de citações. Seus artigos tenderiam a ser menos lidos e, segundo a hipótese, incluídos de modo menos freqüente nas listas de referências dos colegas dos países desenvolvidos. Um protecionismo acadêmico, por assim dizer.”

Se isso fosse aplicado a indivíduos do sexo feminino, negros, gays, índios, anões, espíritas, umbandistas, crentes ou ateus de qualquer espécie seria simplesmente chamado de racismo! Mas são cientistas do terceiro mundo, apenas. Continua:
 
“Meneghini, Packer e Nassi-Calò tomaram por base um acervo de 1.244 textos publicados em 2004 e 2005 com autores de quatro países latino-americanos (Argentina, Brasil, Chile e México) em sete periódicos internacionais de prestígio. E, claro, as citações que receberam no ano subseqüente (2006). Para comparação, montaram outro banco de dados sobre mais de 44 mil
trabalhos com autores de cinco países ricos (Alemanha, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido). Em seguida, separam ambas as amostras em dois subconjuntos menores: um com artigos assinados por autores de um mesmo país, sem colaboração internacional, e outro com. Resultou o previsível (mas boa parte da ciência serve para isso mesmo, confirmar e apoiar em números objetivos aquilo que já se sabe). Estatisticamente, tanto faz para autores de países desenvolvidos publicar com ou sem colaboradores estrangeiros -serão citados em proporção semelhante e muito próxima do fator de impacto da publicação.  No caso latino-americano, a desvantagem é enorme. Artigos sem apoio de colegas desenvolvidos têm fatores de impacto 34% menores que a média. Com colaboração internacional, se aproximam do usual na publicação. Resta estabelecer se os trabalhos de latino-americanos são menos citados só porque são ruins, o menos provável, ou se os pesquisadores de países ricos é que não se dão ao trabalho de lê-los. Muitos latino-americanos já concluíram, bingo, que o caminho das pedras exige o favor de um co-autor bacana.”

Por fim, um artigo da Plos cujo título é “The Chilling Effect: How Do Researchers React to Controversy?” e cuja pergunta é, “Can political controversy have a “chilling effect” on the production of new science?” e que tem a seguinte conclusão:

These findings provide evidence that political controversies can shape what scientists choose to study. Debates about the politics of science usually focus on the direct suppression, distortion, and manipulation of scientific results. This study suggests that scholars must also examine how scientists may self-censor in response to political events.”

Ia comentar, mas deixo para meus fiéis e críticos leitores.

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