O que você faria?
No final do mês de Agosto estarei ministrando juntamente com dois outros colegas um mini-curso sobre “Táticas de sobrevivência na Academia” (não, não é na academia de musculação!). É uma versão atualizada do curso que foi aclamado (nossa… que exagero) no Congresso da FeSBE (Federação das Sociedades de Biologia Experimental) em 2001, e visa discutir com alunos de graduação e pós-graduação os dilemas vividos no meio acadêmico. Para isso, estamos planejando a discussão de casos onde se apresentam dilemas técnicos, morais e éticos para que os alunos se posicionem. Abaixo descrevo uns dos casos, que apesar de fictício, se parece em muito com situações do dia-a-dia em um instituto de pesquisa. Veja as perguntas no final e sinta-se a vontade para dar sua opinião.
“Dr. Arnold é um jovem pesquisador que acaba de ser aprovado em um concurso para um importante instituto de pesquisa. Ele está ansioso para iniciar sua nova linha de pesquisa, mas as opções de financiamento para jovens são limitadas e ele começa a fazer propostas de colaboração com outros pesquisadores que permitam a ele independência de trabalho. Um pesquisador sênior de uma outra instituição, Dr. Farias, se interessa muito pela linha de trabalho de Dr. Arnold e oferece recursos para que ele realize seus experimentos. Mas em troca Dr. Farias pede que esses experimentos preliminares componham a tese de mestrado do jovem Anthony, que está com seu prazo se esgotando e ainda não definiu seu tema. A orientação seria informal, já que Dr. Arnold ainda não preenche os requisitos para orientação formal do aluno, e o crédito seria todo de Dr. Farias.
Animado com a possibilidade de iniciar seus trabalhos com os recursos oferecidos por Dr. Farias e de orientar Anthony, Dr. Arnold aceita a proposta. No início, Anthony se mostra muito interessado e aplicado. No entanto, com o passar do tempo, Dr. Arnold percebe que Anthony teve uma formação científica deficiente, com muitas lacunas em conceitos fundamentais. Sua base teórica é fraca, muitas de suas iniciativas são equivocadas e o esforço que ele emprega na bancada não se reverte em resultados positivos. Paralelamente, Dr. Farias oferece mais recursos a Dr. Arnold e propõe a co-orientação de um segundo aluno, Brian, que tem mais tempo para planejar seus experimentos e parece ter uma formação mais sólida, com potencial para realizar efetivamente um bom trabalho. Mas quando chega o momento de Anthony escrever a tese, o resultado é pior ainda. A sua dificuldade em colocar em palavras todo o conhecimento adquirido na revisão bibliográfica e em discutir seus resultados, torna a tese de difícil leitura e Dr. Arnold teme pela sua aprovação. Dr. Farias por outro lado acredita que os resultados de Anthony são suficientes para a defesa. Alem disso, Anthony já foi aprovado para o programa de doutoramento em sua instituição.
Dr. Farias então pede a Dr. Arnold que tome parte da banca e monte uma comissão julgadora que minimize as dificuldades de Anthony para que ele possa ser aprovado. Preocupado com o futuro da colaboração que envolve o trabalho de Brian e efeito que a reprovação na tese causaria no prosseguimento da carreira de Anthony, Dr. Arnold, juntamente com outro colega, resolvem aprovar a deficiente tese de Anthony.”
Animado com a possibilidade de iniciar seus trabalhos com os recursos oferecidos por Dr. Farias e de orientar Anthony, Dr. Arnold aceita a proposta. No início, Anthony se mostra muito interessado e aplicado. No entanto, com o passar do tempo, Dr. Arnold percebe que Anthony teve uma formação científica deficiente, com muitas lacunas em conceitos fundamentais. Sua base teórica é fraca, muitas de suas iniciativas são equivocadas e o esforço que ele emprega na bancada não se reverte em resultados positivos. Paralelamente, Dr. Farias oferece mais recursos a Dr. Arnold e propõe a co-orientação de um segundo aluno, Brian, que tem mais tempo para planejar seus experimentos e parece ter uma formação mais sólida, com potencial para realizar efetivamente um bom trabalho. Mas quando chega o momento de Anthony escrever a tese, o resultado é pior ainda. A sua dificuldade em colocar em palavras todo o conhecimento adquirido na revisão bibliográfica e em discutir seus resultados, torna a tese de difícil leitura e Dr. Arnold teme pela sua aprovação. Dr. Farias por outro lado acredita que os resultados de Anthony são suficientes para a defesa. Alem disso, Anthony já foi aprovado para o programa de doutoramento em sua instituição.
Dr. Farias então pede a Dr. Arnold que tome parte da banca e monte uma comissão julgadora que minimize as dificuldades de Anthony para que ele possa ser aprovado. Preocupado com o futuro da colaboração que envolve o trabalho de Brian e efeito que a reprovação na tese causaria no prosseguimento da carreira de Anthony, Dr. Arnold, juntamente com outro colega, resolvem aprovar a deficiente tese de Anthony.”
Você acredita que a decisão de Dr. Arnold contribuiu para o futuro científico de Anthony?
Na sua opinião, a decisão de Dr. Arnold envolveu a proteção do futuro e do trabalho de Brian, ou os recursos provenientes de Dr. Farias?
Como você vê a decisão de Dr. Farias de aprovar para o doutorado um aluno com tantas deficiências como Anthony?
Na sua opinião, a decisão de Dr. Arnold envolveu a proteção do futuro e do trabalho de Brian, ou os recursos provenientes de Dr. Farias?
Como você vê a decisão de Dr. Farias de aprovar para o doutorado um aluno com tantas deficiências como Anthony?
Discussão - 3 comentários
Eu devo confessar que me divirto mais com as escaladas científico-sentimentais desse blog... (vamos lá Mauro, nos dê algo pra esquentar essas escadarias frias, que eu sei que você é bom nisso!). Mas, um dilema é sempre um dilema, e eu gosto de me sentir desafiada a dar uma opinião. Eu diria que, se o nosso amigo Arnold estivesse mais pra exterminador do futuro da Ciência do que o próprio Schwarzenegger esteve pra exterminador da Sarah Connors, então ele teria comprometido de verdade o futuro do garotinho Anthony e o nosso, que somos biólogos! Mas, alunos como o Brian sempre nos fazem ver “the bright side of life” e, especialmente, o fato de que não há lugar no mundo para incontáveis talentos. Tem sempre uma pipeta velha pra um reagente cansado... (desde que nem um nem outro seja eu, claro). Então, a dúvida é se o Arnold faria ou não faria algo que comprometesse seu futuro com o Dr. Farias (mesmo sem ele ter feito nada de concreto ainda), não é isso?. Acho que quando a gente se depara com uma situação que dá pra contornar, a gente contorna. Porque há benefícios no contorno e porque não tem uma linha que separe, discretamente, os bons e os ruins, os feios e os bonitos, os malucos e os sãos. Esse limite é variável, claro, mas não é uma banda larga! A gente sabe onde mora a boa ciência e onde mora a ciência ruim. Mas onde mora todo o resto que fica no meio, nem sempre a gente sabe. Sendo assim, eu diria que, quando a coisa é negra mesmo, então a gente extermina o mal pela raiz (mas nunca o futuro da Ciência), entra com o pé embaixo, quebrando a porta, olha no olho do garotinho Anthony e diz: “No, you will not be back”.
Começo a achar, assim como o Edu, que os seus comentários realmente são melhores que os textos do blog! ;-)Beijo,
Mauro, meu querido... sabe o que você prova com esse seu depoimento tão bonitinho e espontâneo? Que eu sou preciso do início ao fim, como sempre brado no balcão do Buteco!E faça sua parte, pô!Minha prgunta: por que um biólogo diz que vai marcar um jantar, por exemplo, e não marca porra nenhuma, fica só punhetando, divagando e não concretizando os planos elaborados?Beijo.