Isso é flexibilidade adaptativa?!?

Uma pergunta complexa merece uma reflexão que nem sempre favorece uma resposta simples. Outras vezes a resposta simples, simplesmente, é menos interessante (ainda que consiga cumprir o papel de responder). A pergunta da Sonia, sempre tentando aprofundar a idéia da flexibilidade adaptativa, mereceu uma reflexão que eu divido com vocês.

Sonia: “(…) o ser humano (…) orgulhoso (…) obrigado por contigências materiais a um exercício de humildade, sem ficar ressentido em demasia, (…) está demonstrando flexibilidade adaptativa?”

Acho que a resposta ainda é não. Mas está quase virando sim!

A flexibilidade age através de mecanismo adaptativos: fisiológicos, bioquímicos, comportamentais, mentais. E para ser considerado um mecanismo, uma forma de operar, temos que poder diferenciar do que é eventual, incidental. Fisiologicamente, podemos diferenciar tolerância de resistência, e a diferença é muito importante. Lembrem-se que tolerância aqui tem uma definição provavelmente diferente das ciências sociais (e portanto, diferentes do sentido que usei para tolerância no texto anterior).

Os mecanismos que conferem a flexibilidade adaptativa são mecanismos de tolerância às variações no ambiente. Quanto mais numerosos os mecanismos e mais amplos os intervalos de tolerância, maior a flexibilidade. Um peixe que pode tolerar variações de temperatura entre 10 e 30 oC tem uma tolerância maior que aquele que tolera temperaturas entre 15 e 25 oC. Sua flexibilidade é maior e ele pode colonizar novos ambientes (de águas mais frias ou mais quentes) ou simplesmente sobreviver quando um fenomeno com El niño alterar a temperatura da água para um desses valores extremos.

Muito bem, até agora só dei mais um exemplo de flexibilidade (ainda que dessa vez com uma definição correta de tolerânci). Mas o conceito novo que quero introduzir é o de resistência. Quando acaba nossa tolerância à alguma variável, é inevitavelmente perecermos se a razão do nosso estresse não cessar. É perecer ou perecer, dependendo apenas de quando! O tempo que leva entre a quebra do mecanismo de tolerância e a morte é tido como tempo de resistência. Não sei se podemos definir um “mecanismo” de resistência, já que ele não pode a priori ser descrito ou previsto. Quando algo essêncial se quebra (o mecanismo de tolerância), algo incidental (o “mecanismo” de resistência) passa a operar. A resistência não contribui para a adaptação ao ambiente. Tanto o peixe que tolera 25 oC quanto o que tolera 30 oC podem sobreviver à 40 oC. A questão é como e por quanto tempo. Mas além disso, essa resistência não faz com que os próximos peixes consigam tolerar os 40 oC. Não há adaptação.

Por isso a resposta a pergunta da Sonia depende se o nosso humano orgulhoso tolerou ou resistiu (no sentido fisiológico) as contingências materiais que lhe obrigaram a um exercício de humildade. Acredito que isso esteja relacionado com a essencialidade ou a incidentalidade do seu orgulho. Assim como aos personagens que ele possui e os papéis que eles precisam desempenhar.

Discussão - 1 comentário

  1. Sonia disse:

    Cara,Dessa vez, você se superou! Claro, preciso, rápido, consistente, com multiplicidade de conexões e estimulando a imaginação de quem lê. Assim, você acaba militando na Pedagogia da Imaginação e deixando de ser uma pessoa do século passado para se tornar um homem desse milênio.

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