Diferença genética entre humanos e chimpanzés

Depois que o Watson descobriu com o Crick a dupla hélice do DNA, ele perdeu
muito do interesse que tinha nessa molécula e suas atenções voltaram-se para
o até então incógnito RNA. Ele acreditava (e estava certo no palpite) que essa
era a molécula tinha papel fundamental na codificação das proteínas, e
portanto no funcionamento da célula. Esse é de fato o paradigma central da “biologia molecular” (o ramo que estuda o processamento das informações genéticas): Genes no DNA são transcritos em RNAs que são traduzidos em Proteínas.

Atualmente, mais e mais grupos de pesquisa têm investido em técnicas para quantificar a expressão gênica. Ou seja, uma vez que os genes são seqüenciados e identificados no DNA, quais são as razões que fazem com que um gene seja mais expresso e produza mais a “sua” proteína que outros. Talvez isso seja conseqüência das observações de que, mais ou menos, todos os organismos apresentam proteínas semelhantes, ou com funções semelhantes.

A semelhança do genoma de espécies diferentes chama a atenção especialmente no caso do homem e do chimpanzé. Apesar de todas as diferenças morfo-fisio-psicológicas entre essas duas espécies, nós compartilhamos pelo menos 98,7 por cento do patrimônio genético. Em fato, se uma amostra de 3 milhões de pares de base, representando cerca de 0,1% do genoma do primata, for escolhida aleatoriamente e comparada com o que se conhece do genoma humano constata-se uma diferença média de apenas 1,3%. É possível que se você mostrar um fragmento de DNA a um biólogo molecular ele não saberia dizer se é de um humano ou de um chimpanzé.

Então fica a pergunta: Como pode o DNA conter toda a informação genética que produz as diferenças entre os organismos e ao mesmo tempo ele não ser assim tão diferente? Essa pergunta começa a ser respondida pela equipe do sueco Svante Pääbo, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolucionária, em Leipzig (Alemanha). Pääbo apresentou seus últimos resultados em 27 de março na Conferência Internacional sobre o Genoma no Brasil, em Angra dos Reis (RJ) e também publicada na revista “Science”.

Pääbo relatou experimentos em que sua equipe comparou a expressão de genes no homem (Homo sapiens), no chimpanzé (Pan troglodytes), orangotangos (Pongo pygmaeus) e macacos Rhesus (Macaca mulatta). Os resultados foram que a variação da expressão de genes encontrada nos glóbulos brancos do sangue e no fígado foi relativamente pequena (0,57 e 0,80%, respectivamente), mas foi mais significativa no cérebro (1,23%).

Ou seja, no cérebro do homem são produzidas algumas proteínas ligeiramente diferentes das produzidas pelos chimpanzés, mas a grande diferença está na quantidade de proteínas fabricadas pelas células cerebrais dos humanos, que é muito maior: 5,5 vezes mais elevada.

Isto quer dizer que, com o mesmo material genético, as duas espécies fazem coisas diversas. A informação codificada nos genes é activada de forma diferente no cérebro de homens e chimpanzés, o que produz padrões de expressão genética próprios de cada espécie.

Claro, seria tentador dizer que esse fenômeno bioquímico é responsável pelas características que acreditamos sejam distintivas da espécie humana, como o pensamento complexo e abstrato. No entanto, essas variações ainda não podem ser interpretadas do ponto de vista funcional. Já vemos que tem uma diferença, mas não sabemos o que ela causa. Na verdade, mesmo os muitos pesquisadores acreditam que quase todas as grandes descobertas da ciência já foram feitas, concordam que a compreensão do fenômeno da consciência é uma das grandes fronteiras da biologia.

Para o sueco, as diferenças que separam homem e chimpanzé são mais sutis do que acreditamos ao observar nossas diferenças morfológica (fenótipo). Segundo Pääbo, “as diferenças são apenas graduais” e cita estudos que constataram em chimpanzés atributos considerados específicos da espécie humana: aprender linguagens de sinais, capacidade de evoluir culturalmente…

A esse ponto, você que não via a importância de saber a diferença entre homens e macacos (indicando que eu não tenho direito feito meu trabalho de divulgador) devia estar satisfeito. Mas se você quer soluções ainda mais aplicadas, então lembre-se que uma quantidade enorme de medicamentos são testadas primeiramente em macacos antes de serem aplicadas em seres humanos. Eu ficaria contente apenas de compreender melhor os mecanismos como a evolução atuou para separar essas espécies.

Por exemplo, eles descobriram que com respeito aos leucócitos e ao fígado, homens e chimpanzés revelam-se sempre parentes muito próximos, praticamente idênticos entre si e bastante diferentes dos orangotangos e dos macacos Rhesus. No entanto, com relação ao padrão de expressão gênica do córtex cerebral dos chimpanzés é mais parecido com o dos macacos Rhesus do que com o dos humanos. Os resultados indicam que as alterações da expressão genética no cérebro ao longo da evolução foram muito aceleradas na linhagem que deu origem ao homem do que na do chimpanzé.

A equipa defende que a alteração dos níveis de expressão gênica sofrida pelo homem se deu muito recentemente na história evolutiva comum de humanos e chimpanzés, senão outros padrões de expressão também deveriam ser afetados. O que terá desencadeado este processo evolutivo é que os cientistas não são ainda capazes de definir. Erros na duplicação de células que levam a acumulação de material genético (a célula fica com o dobro da quantidade de DNA) e que causam os fenômenos de duplicação gênica observados em espécies tidas como mais evoluídas é uma das principais hipóteses.

Esclarecer as diferenças de fenótipo que separam as duas espécies será mais fácil quando o genoma do chimpanzé for conhecido. O principal passo já foi dado, com a constituição no Japão de “bibliotecas” de seqüências genéticas do primata. Mas dado o custo muito alto do seqüenciamento completo, é possível que ainda tenhamos de esperar muito até poder aumentar nossa compreensão dessas diferenças.

Quando você vier a Itália e olhar para o teto da capela Sistina, verá o dedo de Deus que tocando a mão de Adão dá o “sopro” de vida que lhe anima a alma. Mas pode ter certeza que nosso octoporoteratavo foi a Chita!

Do eletromagnetismo a TV, mas não vice-versa

Vamos supor que a Sua majestade Vitória, rainha da Grã Bretanha em 1860, a nação mais prospera do planeta, tendo uma idéia tão alucinada que nem mesmo o editor de Julio Verne ousaria publicá-la: pede que construam uma maquina que transporte sua voz, bem como imagens em movimento da glória do império para dentro de todas as casas do reino unido. E as imagens e sons não deveriam passar por dutos ou fios, mas sim pelo ar, alcançando o mais isolado dos camponeses e garantindo a unidade do império. As mensagens da rainha, a palavra de Deus e outras aplicações sociais poderiam ser encontradas para o invento. Com o apoio do primeiro ministro, chama ao seu gabinete os mais renomados e conceituados cientistas do reino e diz que disponiblizará um milhão de libras esterlinas para o projeto (um monte de dinheiro em 1860). Se precisar de mais é só pedir. Não importa como será o mecanismo e como vão inventá-lo. Apenas façam-no.

Parece excelente, mas infelizmente o projeto fracassaria, por que toda ciência adjacente necessária para a invenção do rádio e da televisão, a idéia alucinada que teve a rainha, ainda não tinham sido descobertas. No máximo eles conseguiriam, com custo muito elevado, colocar um telegrafo (que já existia em 1860) dentro de cada casa do reino unido e um monte de pessoas fazendo pontos e traços para enviar mensagens por código-morse.

Por outro lado, em 1831 nascia na Escócia James Clerk Maxwell. Com dois anos de idade ele descobriu que podia fazer o sol ricochetear nas paredes e nos moveis de sua casa, e dizia ter “prendido o sol com um pedaço de lata”. Ele colecionava besouros, flores, pedras, máquinas, e obviamente quando entrou no colégio ganhou um apelido do tipo “menino maluquinho”. Mas quando entrou pra faculdade, Maxwell foi definitivamente caracterizado como um CDF. Dentre os interesses dele se destacava a determinação em compreender a natureza da luz como eletricidade produzia magnetismo e vice-versa. Maxwell conseguiu resumir tudo que se sabia sobre eletricidade e magnetismo na sua época em quatro equações brilhantes. Com algumas sacações mais brilhantes ainda, adaptou as equações para que funcionassem no vácuo.

Maxwell descobriu que eletricidade e magnetismo se unem para formar a luz, ou as ondas eletromagnéticas, do espectro que conhecemos que vai dos raios gama aos raios X, do ultravioleta ao infravermelho, passando por todo o espectro de luz visível, das microondas as ondas de rádio. Mais ainda, Maxwell descobriu que campos elétricos variando rapidamente deveriam gerar ondas eletromagnéticas que se propagariam no espaço. Em 1888 o alemão Heinrich Hertz descobriu as ondas de rádio e em 1901 o italiano Guglielmo Marconi se comunicava com o outro lado do Atlântico com um aparelho de rádio.

A ligação cultural, econômica e política do mundo moderno por meio de torres de radiodifusão, microondas e satélite; a televisão que nos instrui e diverte mesmo que de forma questionável, o radar que ajudou a derrotar os nazistas na segunda guerra, os controles de navegação de aero e espaçonaves, a radioastronomia e até a busca de inteligência extraterrestre, são devido a curiosidade de Maxwell por como se comportavam dois fenômenos estranhíssimos nos idos de 1860: eletricidade e magnetismo.

Ao contrário de um programa governamental induzido de telecomunicações, a descoberta de Maxwell custou bem pouco ao governo. É bem provável que qualquer programa tivesse falhado por que ninguém teria as mesmas idéias sutis de Maxwell ao compor suas equações e ao adapta-las para determinadas condições. Assim como é pouco provável que dessem essa importante tarefa para um jovem e obscuro CDF universitário. Se a invenção da televisão dependesse do projeto da rainha Vitória em 1860, dificilmente vocês poderiam derreter seus cérebros frente as novelas da Globo, (ou eu com os filmes do Steven Seagal) e eu não podereia ter enviado essa artigo pra revista por e-mail, mesmo estando do outro lado do Atlântico.

A AT&T, um gigante mundial das telecomunicações, gasta por ano mais de 2 bilhões de dólares em pesquisa. A IBM possui laboratórios onde cientistas (altamente dotados é verdade) são pagos para ficarem tendo idéias e fazendo experiências. QUALQUER idéia e QUALQUER experiência é bem vinda. Se elas gastam essas somas astronômicas em pesquisa e tem recompensas gigantescas, por que nossos governos insistem em cortar as verbas da ciência usando a desculpa das desigualdades sociais? É impressionante que o governo não perceba que programas induzidos de pesquisa não são a melhor forma de alcançar o desenvolvimento científico e tecnológico de uma nação. E que o investimento em ciência é uma das melhores alternativas para se alcançar uma verdadeira igualdade social e desenvolvimento sócio-econômico.

Mas porque eles não percebem? Ah, claro, eles estão ocupados demais com as próximas eleições.

PS: Influenciado fortemente pelo texto de Carl Sagan em “O mundo assombrado pelos demônios”

É proibido proibir!

A primeira tentativa de coibir a clonagem humana foi feita pelo antecessor de Mr. GW Bush, Mr. Clinton, em defesa de uma moral católica-ocidental (Israel conduz testes com clonagem humana já que ela não fere os princípios ideológicos do Alcorão), foi à proibição qualquer entidade pública ou privada que recebesse financiamento do governo de proceder tal tipo de empreitada, sob pena de perder o financiamento. Vale lembrar que no caso da ciência, mesmo da feita em entidades privadas, pelo menos alguma parte da verba é governamental. Falhou! E uma empresa totalmente privada a pouco tempo revelou o primeiro teste de clonagem de um embrião humano que sobreviveu poucos minutos.

Se você quer entrar nas discussões pseudoéticas e pseudomorais sobre clonagem tenha em mente alguns detalhes técnicos. Tá, tá, tá, eu aprendi com o Fritz Utzeri que não se deve indignar ao redigir um texto, mas sim relatar os fatos para que o leitor se indigne. No entanto eu não resisto e como não sou jornalista e estou escrevendo para uma revista que se chama “Sentando o Cacete” estou me dando esta licença jornalística. Fico indignado com essa pseudo moral, principalmente de um chefe de estado que não demonstra tal receio filosófico ao enviar tropas para os 4 cantos do mundo brigar guerras que não são dele.

Tudo bem, muitos de vocês, mas sensíveis a motivos religiosos, podem ter algo contra a clonagem. O fato é que sempre que autoridades judiciais, políticas ou eclesiásticas tentaram direcionar o desenvolvimento e o progresso da ciência o resultado foi perigoso ou desastroso (como a inquisição e a bomba atômica).

E para terminar, a ciência deve ser acessível a população para que essa possa não apenas usufruir dos seus benefícios, mas para que possa ser fiscalizada por ela também. Por isso temos que alfabetizar cientificamente nossa população e não proibir alguns tipos de pesquisa ciência.

Ciência e Deus

Uma vez fui convidado para dar uma palestra na Vale do Rio doce sobre ‘O que é ser Biólogo’. Fui com muito prazer, por que, vaidoso como sou, adoro falar de mim e da minha profissão. Era um seminário para filhos de funcionário, em idade de vestibular, um tipo de teste vocacional.

Depois da minha apresentação uma menina me perguntou sobre direito ambiental, outro rapaz sobre os trabalhos de campo. Mas um especial me chamou atenção. Depois de todos irem embora ele se aproximou e disse que gostaria de fazer uma pergunta em particular, pois não queria me intimidar. Perguntou como eu poderia acreditar que o mundo tivesse realmente começado de uma explosão, e que Deus não havia criado Adão e Eva. Nem na defesa da minha tese de doutorado eu acho que tive uma pergunta tão difícil pra responder.

Minha primeira tendência seria de identificar que se tratava de um seguidor de uma dessas religiões evangélicas as quais eu não dou o menor crédito ou atenção, com uma leve tendência, não ao total descrédito, mas a verdadeira ridicularização.

No entanto, tenho uma preocupação de não me tornar preconceituoso. Carl Sagan chama a atenção para a polarização do movimento cético. Um Nós contra Eles. Um sentimento de que nós céticos temos o monopólio da verdade e que todas as outras pessoas que acreditam em doutrinas estúpidas são imbecis. Que se elas tiverem bom senso vão nos escutar, e se não o fizerem, pobres miseráveis, nunca alcançaram a verdade. Isso condena os céticos a uma situação sempre de minoria. É importante reconhecer as raízes humanas da pseudociência e da superstição. Quase todas as sociedades humanas acreditam em um mundo de Deuses e Espíritos, mesmo que algumas não valorizem nenhum dos 10 mandamentos cristãos. E sempre existe uma tentativa de conciliar um mundo de mito e metáfora com um mundo prosaico, sendo as arestas dessa união consideradas “fora do nosso alcance ou compreensão”. Muitos cientistas fazem isso. Compartimentalizam os dois mundos e conseguem movimentar-se sem esforço entre o mundo cético da ciência e o mundo crédulo da crença religiosa sem perder o compasso.

Lembro também de uma festa, já cursando biologia, quando um amigo totalmente ateu e cético falava da inutilidade de acreditar em Deus. Eu achava absurda a idéia de uma existência sem propósito nessa vida. Sem missão. Descordava veementemente dele. No entanto, com o passar do tempo, fui conhecendo o mundo natural, A idéia de um Deus que se preocupasse apenas com os homens me parecia mais e mais distante. Deus deveria se preocupar tanto com os homens quanto com os animais. O que dizer então das almas das moscas e formigas? Um vez, em um congresso um ser da sociedade protetora dos animais alemã falava da necessidade de controlar o numero de peixes utilizados em experimentos, quando um outro pesquisador perguntou quem se preocupa com as Salmonelas (bactérias também utilizadas em experimentos)? Foi aclamado por algum tempo. Mas continuando, a questão das almas de moscas e formigas começou a me entrigar. De onde viriam tantas almas?Para onde iriam? Bastou um pouco de estudo de psicologia para começar a considerar as sessões de Umbanda grandes rituais de Hipnose coletiva (tambores, palmas, velas) onde seções escondidas dos sub conscientes das pessoas se manifestam. Com um pouco, realmente muito pouco, de história, se desacredita em qualquer religião. As atrocidades cometidas pela igreja católica (certo, em outro contexto cultural e social, que impossibilita seu julgamento atualmente) ou descritos na Bíblia e no Alcorão.

Estudando um pouco de filosofia, realmente muito pouco, cheguei na metodologia cientifica. A diferença entre o conhecimento religioso, baseado na fé, o filosófico, baseado na lógica do pensamento, e o científico, baseado em evidencias, foi o argumento definitivo para eu me tornar um exemplo de ceticismo. Depois me lembrem de contar sobre o curso de historia e filosofia das ciências, e a geração de padrões pelo acaso. (uma historia interessante pra responde aquele adesivo absurdo que se lê nos carros “O acaso não existe. Leia Kardek”.)

Desde então só tenho ouvido, de amigos queridos e pessoas que considero muitíssimo, como meu pai e minha mãe, que é altamente religiosa, mas não duvida do DNA, baboseiras sobre todo o tipo de fenômenos sobre naturais. Uma menina tentou vender no sinal a um grupo de amigos (incluindo eu) que iam a um congresso, um conjunto de canetas. Ela começou dizendo: “Oi… Eu faço parapsicologia”. Meu amigo ao volante disse…: “Começou mal…”E seguimos viagem sem comprar nada. Minha irmã, a do meio, foi curada de um tumor na bexiga por uma suposta cirurgia mediúnica. Ainda acho que alguém errou violentamente na ultra-sonografia que mostrava o pólipo. Meu amigo relata ter visto uma entidade que recebia Picasso e pintava como ele, mas um especialista disse que os quadros eram falsificações etc etc etc.

Hoje eu não acredito em alma, espírito, força suprema, diabo ou Deus (mesmo que evite ver filmes de terror 🙂 Não acredito em moral ou no bem e no mal. O que existe, para mim são estratégias que funcionam a curto e longo prazo. Minha avó tem 82 anos. Vocês conhecem algum traficante de drogas com 82 anos? Não é que Deus ou qualquer força o castigue e o mate antes disso, mas se você usa a violência como estilo de vida, então aumenta as chances dela ser a única forma com que os outros lidem com você.

Mesmo assim eu não fui capaz de dizer a mãe de meu amigo de infância que morreu em um acidente de carro aos 19 anos que Deus e vida após a morte não existem, e que naquele momento os fungos e bactérias da espécie X estavam degradando o corpo dele. A ciência trás esclarecimento, mas nem sempre consolo. Especialmente para quem não está preparado.

Pegando emprestado mais uma vez de Sagan: “Em uma vida curta e incerta, parece cruel fazer qualquer coisa que privar as pessoas do consolo da fé, quando a ciência não pode remediar suas angustias. Aqueles que não conseguem suportar o peso da ciência tem liberdade para ignorar seus preceitos. Mas não podemos fazer ciência aos pedacinhos, aplicando-a quando nos sentimos seguros e ignorando-a quando nos sentimos ameaçados. Provavelmente não temos a sabedoria para caminhar nessa estrada tortuosa”.

Eu disse ao rapaz que sua crença em Deus ou na religião necessita apenas de fé. Que acreditava que a fé trouxesse conforto, e por isso, muitas vezes fosse boa. Mas que evidências tem uma força muito grande, e que ele não deveria levar tudo que está escrito na bíblia ao pé da letra. O mundo realmente nasceu de uma explosão e nos realmente descendemos dos macacos e a vida realmente começou de um acaso químico. Ele não deu muita importância ao que eu disse e foi perguntar a fonoaudióloga se o Axel Rose voltaria a cantar novamente.

A ciência é a gente que faz

O mesmo país que é o segundo contribuinte mundial no volume de informações sobre o seqüenciamento do genoma do câncer, ficando atrás apenas dos americanos (responsáveis por 30% de toda a produção científica mundial), assiste a uma epidemia de dengue, causada por um mosquito (Aedes aegypti) que havia sido aparentemente erradicado no início do século XX por Oswaldo Cruz.

Essa é apenas uma das aparentes contradições do país, que atualmente responde por 1,2% da produção mundial de ciência, mas passou da 28ª para a 17ª posição no número de artigos científicos e técnicos publicados entre 81 e 2000, à frente de todos os demais países latino-americanos e também da Bélgica, da Escócia, de Taiwan, Israel, da Polônia, da Dinamarca e da Finlândia. Entretanto, apenas 10% população entre 18 e 24 anos que concluiu o ensino médio está na faculdade e há 20 vezes mais pessoas na graduação do que na pós-graduação.

O crescimento qualitativo e quantitativo da produção científica, apontado de forma quase unânime como muito significativo, levou o país a formar 6,3 mil doutores no ano passado e, neste ano, segundo o secretário executivo do Ministério da C&T, Carlos Américo Pacheco, esse número deve chegar a 7 mil.

Para a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Glaci Zancan, o percentual de doutorados em relação aos docentes de nível superior no país é bem menor do que em nações vizinhas, como a combalida Argentina, em que todos os professores universitários têm titulação.

O dado é contestado pelo secretário executivo do MCT. Pacheco afirma que a Argentina forma 600 doutores por ano quando, proporcionalmente à sua população, deveria formar cerca de 2,5 mil. ‘Nossos números, não são de envergonhar, de modo algum’, garante ele.

De acordo com Glaci, porém, um dos grandes nós que o Brasil têm que desatar nos próximos anos é o da alfabetização científica. Para isso a SBPC lançou o Projeto Brasil 2006, que pretende ‘demarcar metas mínimas modestas, porém objetivas e verificáveis, que nos permitam avançar de forma absoluta’, conforme documento elaborado pela entidade.

Glaci ressalta que ‘por alfabetização científica entenda-se que todo brasileiro, até 2006, tem de saber o porquê de lavar as mãos antes de comer’. Na opinião dela, há um despreparo até mesmo do magistério para a elucidação dessas simples e essenciais questões. ‘Esse é um dos motivos das doenças reemergentes no país.

O jornalista Ulisses Capozoli, presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico (ABJC), aponta soluções na mesma direção. Ele afirma que a prática mais extensiva do jornalismo científico ajudaria a estabelecer uma mentalidade nova entre a população brasileira.

‘A função do jornalismo científico é ajudar no processo da alfabetização científica. Com isso, as pessoas se situariam melhor no país e na comunidade em que vivem e poderiam tomar atitudes mais cidadãs.’

Para ele, o jornalismo científico é ‘quase uma prestação de serviço, mas a imprensa brasileira ainda não percebeu isso. Os jornais não têm um suplemento de ciência, embora tenham cadernos de turismo ou de televisão. Há, também, um analfabetismo científico dentro das próprias redações.’

E destaca outra vitória internacional da ciência brasileira: ‘Como nas vinhas da Califórnia há uma praga cuja bactéria é uma prima da ‘Xylella‘, a associação americana contratou o mesmo grupo que fez nosso genoma para fazer o deles – isso é espetacular, uma inegável afirmação de maturidade dos pesquisadores brasileiros’, destaca Landi.

Otimista, o presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fapesp afirma que se o Brasil conseguir atrair Universidades particulares e criar sistemas de garantia de ensino nelas, grande parte do problema de produção científica no Brasil estará solucionado. Capozoli diz que a iniciativa privada no Brasil não costuma investir em pesquisa científica básica.

‘Nós temos uma mentalidade de que o Estado deva bancar tudo e a iniciativa privada só faça a coleta dos benefícios. Mas nos últimos 20 anos, desde a criação do MCT, em meados dos anos 80, tem sido feito um esforço sistemático para atrair a iniciativa privada. Ao que parece, as coisas começam a mudar, porque o empresariado se deu conta de que essa é uma área em que se pode ganhar muito dinheiro.’

Mônica ressalta que, apesar dos inegáveis avanços, falta massa crítica de cientistas, opinião compartilhada pela presidente da SBPC.

‘Precisamos de mais gente para trabalhar, por exemplo, no problema da dengue, de uma política para o desenvolvimento científico da Amazônia. Temos de aumentar nossa massa crítica em tudo. Mudando o espírito de que a ciência seja apenas informação, poderemos ensinar as pessoas a pensar em soluções criativas para nossos imensos problemas’, conclui Glaci.

Em tempos de Dengue

Tem brasileiro espalhado pelo mundo inteiro e fazendo de tudo. Mas um em especial, trabalha no melhor instituo de pesquisa biomédica dos EUA (o National Institute of Health) e com algo que poderia ser considerado por vocês como, no mínimo, inusitado: saliva de mosquitos. Sim, o indivíduo estuda a saliva de mosquitos dos gêneros Aedes e Anopheles.

Aposto que mesmo que soubessem que se tratam dos mosquitos da Malária, da febre amarela e da dengue, ainda assim muitos de vocês pensariam: “Como alguém trabalha com saliva de mosquito?” ou pior “Por que alguém estuda saliva de mosquito?” ou pior ainda “Como alguém paga alguém pra estudar saliva de mosquito?” Com tantas crianças por ai passando fome não é mesmo?!

Bom, vocês podem ler tudo sobre a importância de estudar a saliva de mosquitos no artigo do pesquisador José Marcos Ribeiro. Ou também sobre a arma biológica (eufemismo para vermes) que os cubanos estão mandando para combater o mosquito da dengue. Mas eu queria a sua atenção para um outro tema. Os assuntos estudados pelos cientistas e sua relação com a sociedade e a cidadania.

Em 1951 foi criado o Conselho nacional de pesquisa (CNPq), hoje Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, principal órgão fomentador da atividade científica no país. Na pauta de sua primeira reunião estava a seguinte questão: Como justificar investimentos em ciência em um país com tantas desigualdades e problemas sociais?

Cinqüenta anos depois a pergunta ainda paira no ar. Montar um laboratório custa MUITO dinheiro e a manutenção dele talvez mais ainda. Resumindo, estudar rabo de lagartixa e saliva de mosquito custa um dinheirão. E vale a pena? Justifica? Devemos (e podemos) investir em ciência básica? Ou vamos investir só em tecnologia e ciência aplicada?

O problema começa nessa classificação entre ciência básica e aplicada, que, certamente, cria más interpretações e preconceitos. Essa dicotomia na verdade foi introduzida em 1945 por Vannevar Bush (Science, The Endless Frontier). Neste texto foi feita à famosa e clássica definição de pesquisa básica: “contribuir para o conhecimento e compreensão da natureza e suas leis”. Dai veio à dicotomia que dura décadas!

Em 1997 foi publicado um livro chamado Pasteur’s Quadrant, Basic Science and Technological Innovation. Nesse livro Donald Stokes propõe uma nova taxonomia das atividades de pesquisa e desenvolvimento, cujo mérito principal é justamente superar a FALSA dicotomia existente entre pesquisa básica e aplicada.

No livro de Stokes propõe-se uma nova nomenclatura baseada em coordenadas: uma dimensiona o avanço do conhecimento que a pesquisa propicia. A Segunda dimensiona a aplicação que dela decorre. Com isso, uma pesquisa pode ao mesmo tempo contribuir para o avance do conhecimento e ter grandes perspectivas de aplicação pratica. Pela definição antiga poderia ser básica e aplicada, o que consequentemente invalida tal definição.

Para alcançarmos um estágio onde a pesquisa científica se reverta em grande desenvolvimento tecnológico é necessário massa crítica de pesquisadores, de cérebros, cabeças pensantes. Cérebros que são formados em universidades livres, públicas e de qualidade, com políticas sólidas de apoio a ciência e com uma sociedade que permita a inserção do cientista. Uma sociedade que esteja preparada para “consumir” a ciência.

E durante as epidemias de dengue e os racionamentos de energia elétrica teremos uma massa de pesquisadores capazes de “decodificar” a informação científica disponível e buscar a melhor aplicação para responder aos anseios e necessidades da sociedade.

*Colaborou (muito) Dr. Stevens K. Rehen, pesquisador brasileiro então trabalhando na Universidade da Califórnia em San Diego, EUA.

Superbonder

Era uma vez um cara que estudava patas de Lagartixas. A Lagartixa, como vocês bem sabem, é o animal com a maior capacidade de adesão a diferentes tipos de superfícies. Mais que qualquer outro. O cara descobriu que essa curiosa capacidade era conferida por estruturas similares a pêlos, que o cito réptil possui em suas patas. Essas estruturas microscópicas são capazes de interagir a nível atômico com o material da superfície, e daí a fantástica capacidade de se aderir a qualquer coisa. Pois bem, o cara falou com um amigo e esse amigo conseguiu reproduzir sintéticamente os tais microfilamentos. A “cola” feita com os tais microfilamentos é capaz de “colar”, por exemplo, fuselagem de avião, ou um caminhão em outro. Me parece que os dois (e os filhos dos filhos, e os netos dos filhos dos filhos) nunca mais vão precisar se preocupar com dinheiro 🙂

A ciência como nós a conhecemos hoje…

…começou no séc XV com Galileu. Antes dele as teorias não eram verificadas, ou testadas se preferirem, com observações e dados experimentais, mas sim aceitas pela lógica (e às vezes beleza) do seu raciocínio. Depois dele a ciência passou por sua primeira grande revolução no séc XIX. Newton produziu uma quantidade absurda de conhecimento e ainda que seus escritos mais numerosos tenham sido em alquimia e teologia, foram suas descobertas na matemática e física que mudaram nossa visão do mundo. Ainda bem, por que senão estaríamos acreditando hoje que é possível transformar outros metais em ouro ou que a perfeição da mecânica clássica em explicar o movimento dos corpos se deve a imensa sabedoria de Deus (essas algumas de suas declarações em vida).

Darwin também causou rebuliço quando, em uma época de grande poder da igreja católica, afirmou que os humanos descendiam dos macacos como resultado de uma guerra evolutiva conhecida como seleção natural. A partir daí a teoria atômica de Bohr, a relatividade de Einstein e a mecânica quântica de Planc e a dupla hélice do DNA de Watson e Crick causaram um fenômeno, talvez, até então não percebido: as áreas estudadas pelos grandes nomes da ciência eram muito distantes da realidade cotidiana do publico em geral, o que contribuiu certamente para o distanciamento do cientista da sociedade e vice-versa.

Antes de Einstein nunca um cientista tinha sido uma celebridade, dado autógrafos ou fugido de tietes. O próprio Watson (o do DNA), reclama em sua recente biografia que, apesar do sucesso de sua descoberta, ninguém o convidava para nenhuma festa.

A sociedade não percebe (e talvez com razão) que a ciência que estuda o 5o pleópodo dos copépodos e descreve o desvio da luz causado pela distorção do espaço próximo a corpos de grandes massas, é a mesma ciência que possibilitou todos os avanços tecnológicos que permitiram o aumento da expectativa e da qualidade de vida. A imagem do cientista recluso que foi Newton (que inclusive nunca se casou e segundo as más línguas morreu virgem) e dos cabelos desgrenhados de Einstein, permeiam o imaginário popular com a idéia de que todos os cientistas são loucos. Isso não é só inferência, mas o resultado de uma pesquisa coordenada pelo prof. Leopoldo de Méis do instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, um dos cientistas mais respeitados do Brasil, com crianças e adolescentes de diversas classes sociais.

Os cientistas de hoje são pessoas normais: adoram tomar chope no buteco, jogar futebol no final de semana e pensam em sexo 98% do tempo, como quase todo ser humano. Sua única loucura talvez tenha sido escolher fazer ciência no Brasil, onde nos últimos 10 anos conseguimos entrar no seleto grupo dos 20 paises que são responsáveis por mais de 1% da produção científica mundial, mas as verbas para ciência são consideradas supérfluas já que o governo considera mais interessante comprar tecnologia do que formar cérebros e cidadãos.

Verdade seja dita, os cientistas tem que fazer sua parte, e dedicar mais tempo para atividades sociais, a terceira perna do tripé universitário conhecido por ensino, pesquisa e extensão. A vaidade científica (talvez a pior das vaidades profissionais, já que dinheiro algum pode comprar o tesão de “saber”), tem feito os cientistas se isolarem em seus laboratórios: “me dêem financiamento e me deixem trabalhar já que vocês não conseguiriam mesmo entender o que estou fazendo”.

Precisamos divulgar o conhecimento científico, fazer marketing com a ciência e dissemina-la para todas as pessoas. Essa é a única forma de combatermos os bispos Macedo, os “Big Brother Brasil”, os Tarots e as Roseanas que adentram nossas casas e derretem pouco a pouco o nosso cérebro todos os dias sem que tomemos consciência disso. É isso que essa coluna pretende daqui por diante.

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