Assi-métrica

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Aconteceu de novo… me fazem uma pergunta e eu só tenho a resposta perfeita… 24h depois. Dessa vez ainda foi pior, porque eu já estava esperando a pergunta: “E que tipo de avaliação você vai usar pra mostrar que o seu método é melhor que o dos outros?”

Esperava, até, que fossem me ajudar a responder, mas… as vezes espero demais também.

Quem viu minha palestra deve ter visto que toda a minha motivação para adaptar um novo método de ensino é justamente a descrença em qualquer um dos tipos de avaliação que estão sendo aplicados atualmente para avaliar a aprendizagem. Funcionam, mas muito pouco. Então… por favor, não me peçam para avaliar justamente com as ferramentas que eu quero refutar.

Isso significa que o método não pode ser avaliado? Não… eu sou um cientista e um método que não pode ser negado, para mim não tem valor. Então significa o que? Richard Feynman dizia que “toda idéia inovadora, deve respeitar princípios básicos” O método que estou propondo deve ser avaliado, a priori, pelo quanto respeita princípios básicos. e eu não considero a prova, o ENEM, nem o PISA ou o que for, como princípio básico. Pra mim, princípio básico, é o que a neurociência e a psicologia evolutiva vem mostrando ao longo da última década sobre como funciona o nosso cérebro e sobre como aprendemos.

Quando se trata de avaliação educacional, eu bebi da melhor fonte: a Dra. Diva Lucia Costa, psicólogoa e professora da faculdade de educação da UFRJ. Tive o prazer de trabalhar com ela em 2008 com oficinas para doecentes da universidade Aberta do Brasil porque, desde lá, nos preocupávamos com a pergunta: como avaliar o aprendizado com EAD?

Diva escreveu um capítulo (Avaliação da aprendizagem) do livro sobre EAD que estamos para lançar. As pessoas tendem a pensar nos métodos de avaliação atuais como uma coisa ‘absoluta’, ‘inquestionáve’, ‘intocável’. Não é, não são. Veja alguns trechos do capítulo (e leia-o todo depois) de Diva que ilustram isso:

“Até o início do século XIX, a relação direta professor-aluno, em colégios episcopais ou escolas onde se aprendia a ler e contar, com um professor e pequenos grupos de alunos com idades e níveis de conhecimento diversos, permitia um acompanhamento mais próximo sobre o rendimento escolar. Naquele contexto, o que se esperava dos alunos era a reprodução dos modelos apresentados, seja na formação religiosa, seja na aquisição da leitura e da escrita. Havia padrões bem definidos, e aos alunos restava repetí-los, demonstrando ao mestre que haviam aprendido. A avaliação da aprendizagem também apresentava um caráter moral, ou seja, considerava-se que o grau atribuído ao aluno indicava a presença ou a falta de qualidades morais como esforço, dedicação, responsabilidade. Indicava também a existência de capacidades, de potencial para aprender, para progredir, para alcançar os padrões sociais mais elevados – ou não. […] E, ainda por cima, freqüentemente sujeitava os alunos menos ajustados às expectativas a castigos físicos.”

Imagina o choque que esses docentes devem ter sofrido quando disseram para eles que tinhamos que fazer avaliações padronizadas da aprendizagem e que o julgamento de valores morais pela compreensão de conteúdo, assim como porrada, não estão de acordo com a ética docente?

“Com o advento da educação como um direito, ecoando as discussões trazidas pela Revolução Francesa, no século XIX começa uma mudança radical, com o aumento de matrículas. O currículo organizado em séries, os alunos distribuídos em turmas e o saber disciplinarizado introduzem novas condições de funcionamento que vão se somar à massificação das matrículas. Na primeira metade do século XIX são registrados os primeiros exames escritos, ampliando expressivamente a amostra de conhecimentos avaliados, e cobrindo o conjunto de conhecimentos ensinados. As experiências de avaliação de grandes conjuntos de alunos começaram a se desenvolver no final do século XIX em função das críticas aos resultados obtidos por escolas.”

Ah… veja que a grande motivação era a competição entre as escolas, não os benefícios para os alunos. As avaliações se baseavam em pressupostos, nem sempre científicos e nem sempre confiáveis. Como até hoje.

“George Fisher propôs um padrão de exames para ortografia, matemática, navegação, conhecimento de escrituras, gramática e composição, Francês, História Geral, Desenho, Ciência Prática, a partir do qual qualquer aluno poderia ser classificado. […] Francis Galton, biólogo e primo de Darwin, demonstrara que crianças, jovens e adultos apresentavam diferenças intelectuais, emocionais, físicas e de padrões de sociabilidade, influenciando significativamente a avaliação […] O psicólogo James Catell associava rapidez de respostas à inteligência humana e também influenciou a avaliação da aprendizagem escolar na virada do Século XX, contribuindo para que se fixasse a idéia de que a inteligência se relacionava diretamente à capacidade do aluno em responder rapidamente às questões. Em 1895, Rice também tentou identificar o alcance do que os professores trabalharam com seus alunos sobre ortografia e formulou uma lista de palavras, que foi aplicada a cerca de 16 mil alunos, tendo obtido grande variedade de resultados. A pesquisa de Rice, sobre os instrumentos possíveis e mais adequados à verifi cação do conhecimento adquirido, foi um dos precursores da avaliação escolar que vai acontecer no século XX.”

Um pressuposto, vocês sabem… leva a outro. E vão criando-se castelos no ar.

“Influenciada pelo paradigma da medição que orientava as ciências exatas e naturais, pesquisadores e gestores dos sistemas educacionais iniciam a produção de testes padronizados, aplicáveis a toda a população de estudantes de um grau de ensino ou série – já naquela época, portanto, instituiu-se o que hoje chamamos de sistemas nacionais de avaliação como o SAEB, a Prova Brasil, o ENEM, o ENADE. Os princípios da medição consideram que aquilo que está sendo medido constitui “algo” em si, obedece a leis próprias de funcionamento, que possui propriedades como ser repetível, ou variar de intensidade/quantidade, e que portanto é passível de ser apreendido quantitativamente. Saber uma certa quantidade de algo, nessa perspectiva, equivaleria a conhecer, e de certa forma manter sob controle a manifestação desse “algo” por parte dos interessados. Assim é que o conhecimento escolar assume o estatuto de objeto a ser medido, e traz ainda para o interior das escolas o conceito Curva Normal de Distribuição. A idéia de que o desempenho escolar obedecia às regras de distribuição normal fez com que se acreditasse que, em cada turma, cerca de 25% dos alunos tendiam a ser “fracos”, com rendimento abaixo da média; cerca de 50% obteriam resultados próximos, em torno de um valor que passa a se chamar “média”, e que passa a ser a norma para aquela população de estudantes, e cerca de 25% teriam desempenho acima da média, os “melhores alunos”. Assim, a obtenção de parâmetros de avaliação com a fixação de valores médios em uma escala numérica, a média, instituíram um modo de pensar eminentemente quantitativo para a avaliação da aprendizagem escolar. O conhecimento escolar é tratado como um objeto quantificável, do qual se poderia obter, através de provas e testes, quantidades de conhecimento dos conteúdos escolares, decorrendo daí a idéia de que alunos saberiam muito ou pouco de uma determinada disciplina. Os advérbios de quantidade associados aos resultados traduzem o principal sentido atribuído aos resultados das avaliações.”

Se você concorda com isso… muito bem, não temos mais o que conversar. Discordamos tanto que estamos em universos diferentes. “I rest my case”. Eu desisto. Mas só de argumentar. Como disse Selton Mello na entrega do prêmio ‘Faz a diferença’ esse ano:

Eu não sei se vou continuar fazendo a diferença, mas vou continuar fazendo”

Luz no fim do túnel

calvin_ignorancia_instantanea.jpgFinal de semestre significa milhares de provas pra preparar e pra corrigir. Eu sei, é o meu trabalho e é pra isso que eu ganho. Mas a questão que quero colocar não é o trabalho de preparar ou a chatíce de corrigir prova. É a frutração das notas. Depois vou ver o questionário de avaliação da disciplina e outra frustração… Sempre tem quem gostou e quem não gostou. E sempre vai ter, então não é essa a questão.
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A questão é que os meninos (e meninas) não sabem reclamar. Não sabem argumentar. Não sabem quais são os seus direitos e deveres. E acham que eles merecem tudo e que o professor deve tudo a eles. Vão quebrar muito a cara quando se depararem com um concurso público ou uma entrevista de emprego. É como a Eliane Brum disse: “Meu filho você não merece nada!”
calvin_professores não me entendem_4.pngSe eles gastassem metade da energia que gastam para tentar me convencer que uma resposta errada é válida, pensando na resposta certa, seria muito mais produtivo. Mas não… é como o Calvin… “Não tenho tempo para gastar com isso”, “Como assim, tenho que ler o livro?”
Mas de vez em quanto alguém se salva e mostra correção, concisão e criatividade no que escreve. Por exemplo, o aluno Paulo Rodrigues, inspirado pelo texto das “Aventuras de um carbono viajante” deu a resposta abaixo para a pergunta: “Qual a relação entre a estrutura de uma molécula e a sua origem, ação na célula, efeitos no organismo e disposição no ambiente?”
“No início, quando o universo ainda era jovem, os átomos de oxigênio descobriram que lhes faltavam 2 elétrons para que ficassem iguais a elite da química, os gases nobres, que esnobes por si só, não se ligavam a ninguém. Os oxigênios tentaram enganar os incautos hidrogênios, porém não adiantou que fossem altamente eletronegativos e por fim não conseguiram roubar os elétrons dos hidrogênios. Ficaram então os três ligados, com um oxigênio no meio de dois hidrogênios. Esses trios, chamados de água, descobriram que podiam viver agrupados como gelo, se ligando por pontes de H, ou até mesmo na forma de gás. E foi na Terra que essas moléculas decidiram viver no estado líquido (nem tão perto, nem tão longe). E foi justamente nesse planeta que elas deram uma forcinha para um movimento revolucionário antr-entropia: a vida. Precisa-se solvatar alguém? Chame a água. Precisa-se esfriar os ânimos perdendo calor? A água faz isso. O maligno O2 está sozinho no fim da fosforilação oxidativa? Mande ele virar água.
Desse modo, Gaia percebeu que esse trio chamado H2O tinha vindo para ficar e lhe ofereceu até um ciclo, mimando-o com diferentes coisas, como oceanos, rios, nuvens, geleiras e lençóis freáticos.”

Sensacional! Levou 10 e salvou meu dia.

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