A Origem da Pressão Arterial I

Por trás da pergunta aparentemente inocente do último post, está uma questão que só pode ser respondida quando ampliamos o conhecimento médico com conceitos evolutivos, coisa pouco frequente, como já se disse.

A pressão arterial tem obviamente a função de perfundir tecidos e mantê-los metabolicamente ativos através do fornecimento de fontes energéticas e do próprio oxigênio; pode-se entender isso seja no nível celular ou microcelular (mitocondrial). Todos os animais citados no último post e o próprio homem têm pressão arterial de 120 x 80 mmHg, independentemente da posição ereta ou prona. Em relação às aves, a coisa não difere muito. Seguem exemplos de pressão arterial média em mamíferos e aves.

Modificado de Altman P L, Dittmer D S. Biological handbooks: Respiration and circulation.
Federation of American Societies for Experimental Biology, Bethesda, 1973

Quando analisamos répteis, anfíbios e peixes temos uma surpresa. A tartaruga tem pressão arterial de 34×29 mmHg. Os sapos, em média, 35×24. Os peixes têm a PA medida na aorta ventral, tudo em mmHg, são exemplos: bacalhau (29×18); dipnóicos (40×25), salmão (81×48); truta (40×32); cação (30×24). Por que pressões tão baixas e nos mamíferos e aves, tão altas? A questão hidrostática parece realmente ser a determinante no caso da girafa, mas e quanto ao inexplicável peru? Essa ave “natalina” tem a mesma pressão da girafa e quando não frequenta os fornos de fim-de-ano não é infrequente morrer de rutura espontânea de aorta por hipertensão! A pressão de perfusão tampouco parece dar conta de toda a explicação. Se considerarmos a diferença entre a pressão sistólica e a diastólica, no caso do homem, temos 120 – 80 = 40 mmHg, que é a pressão de perfusão média do organismo. Por que uma pressão tão alta se poderíamos ter a mesma pressão de perfusão com 80×40 ou mesmo 40×0 mmHg como no caso dos peixes?

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Perguntinha Hemodinâmica

Noah Ark at Swipnet

Qual a semelhança entre as pressões arteriais de um cavalo, de um canguru, de um rato e de um pardal sabiá com a pressão arterial de um homem adulto?

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A Dádiva da Doença

A Sindrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA ou AIDS) é causada por um retrovírus, o HIV, que provoca uma redução drástica na população de linfócitos CD4 (células brancas importantíssimas na imunidade do organismo) causando o espectro bastante conhecido da doença. A epidemia que acomete a humanidade desde suas primeiras descrições na década de 80, provocou uma explosão de artigos sobre o assunto, o que culminou com o prêmio Nobel de Medicina de 2008. O sequenciamento do vírus, uma simples fita de RNA, e o sequenciamento de nosso genoma trouxeram à luz uma enorme surpresa quando descobriu-se que a correspondente sequência em DNA do genoma viral estava muito bem integrada ao genoma humano, os chamados retrovírus endógenos ou ERVs. As melhores cabeças do mundo começaram a procurar explicações.

Desde a descoberta do DNA, havia uma enorme dificuldade em se explicar a grande variedade de características e complexidade dos seres vivos. Biólogos insistiam que a complexidade resultava de pequenos erros (mutações) que ocorriam quando o genoma era copiado e passado para gerações futuras. Mas essas pequenas variações não davam conta das alterações observadas nem da velocidade com que elas ocorreram. Perguntas incômodas como: Como nosso genoma aumentou tanto em tão pouco tempo? Por que temos tanto “lixo” genético nele? Por que tantos genes não-funcionantes? Surgiu então, uma hipótese de que os vírus pudessem ter um papel na evolução dos seres vivos.

Hoje, essa linha de pesquisa já está consolidada. Há evidências para supormos que os vírus de RNA estariam presentes mesmo antes do aparecimento dos LUCA (termo proveniente da sigla em inglês para Last Universal Cellular Ancestor) – expressão que indica a primeira célula precursora dos três domínios celulares atuais, a saber Archea, Eucariotas e Bactérias.


Phylogenetic tree showing the relationship between the archaea and other forms of life. Eukaryotes are colored red, archaea green and bacteria blue. Adapted from Ciccarelli et al. at Wikipedia.

Mais ainda, há indícios de que os vírus de RNA podem de fato, ter proporcionado a diferenciação celular nos três tipos básicos de células. Uma teoria sugere que o DNA apareceu primeiro em estruturas virais por ser mais estável e por replicar-se de forma mais confiável. A partir disso, foi injetado por intermédio dos vírus em células primitivas – da mesma forma como ainda hoje ocorre – que se adaptaram a essa “doença” de várias formas, restando três, que seriam as formas primordiais dos três reinos atuais. Essa é a chamada “three viruses three domains hypothesis” (Ver Forterre).

Mais interessante ainda seria a origem do núcleo dos eucariotas. Talvez esse seja um dos grandes mistérios da evolução dos seres primordiais. O aparecimento do núcleo tem sido explicado pelo endocitose de um archaeon ancestral por uma “paleo”-bactéria, processo denominado endo-simbiose e utilizado para explicar o aparecimento de outras organelas celulares. Entretanto, essa hipótese não explica diferenças proteicas existentes entre os reinos. De fato, o núcleo produzido dessa forma não dá conta do aparecimento de poros em sua membrana, além do que esta última deveria ser dupla (uma de cada indivíduo de origem). Em 2001, foi sugerido que o núcleo se originaria de um vírus de DNA com dupla fita que infectou organismos procariotas. Essa hipótese resolve o problema dos poros e da duplicidade da membrana nuclear. Realmente, existem vírus com a capacidade de produzir estruturas assim: os poxvírus.

Só para lembrar, pertence à família dos poxvírus o vírus causador da varíola (além do reponsável pelo molusco contagioso), praga que assolou a humanidade desde a antiguidade e que foi a primeira doença considerada extinta pela OMS por intermédio da vacinação em massa. Não existe almoço grátis. Quando adquirimos uma complexidade, adquirimos junto, uma doença. Os vírus são o exemplo clássico disso. São subprodutos do projeto de vida vigente nesse planeta. São “códigos de máquina” e por isso mesmo podem incrementar ou acabar com ela de vez.

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Evolução e a Reação de Estresse

Imagine um hominídeo – nos primórdios da espécie. Há indícios de protossímios no quaternário do período cenozóico. Isso quer dizer mais ou menos 50 milhões de anos atrás, “logo após” a extinção dos dinossauros, que ocorrera dezenas de milhões de anos antes. A Terra seria então, povoada por grandes mamíferos e alguns macacos estranhos.

Imagine esse macaco caminhando numa floresta repleta de ameaças como tigres-dente-de-sabre, cobras gigantes, manadas de mamutes e outros bichos medonhos. Eis que, ao procurar frutas silvestres ou insetos para comer, se desgarra do grupo e se vê há alguns metros de distância em uma mata fechada, dando de cara com um esfomeado e enorme tigre-dente-de-sabre que o espreitava, lambendo os beiços. O quadro abaixo mostra um esquema das reações hormonais que se seguem, convencionalmente chamadas de reações de luta ou fuga, comuns a todos os mamíferos

Como funciona o medo

por Julia Layton – traduzido por HowStuffWorks Brasil

O aumento dos hormônios de estresse, adrenalina, noradrenalina e cortisol causa mudanças no organismo:

  1. aumento da pressão arterial e freqüência cardíaca, preparando o organismo para um exercício intenso;
  2. as pupilas dilatam para receber a maior quantidade possível de luz; O importante não é o foco. Aqui, muito mais importante são as variações mínimas de luz e sombra que podem definir um ataque, uma saída, algo que pode colocar o indivíduo em vantagem;
  3. as artérias da pele e tecido subcutâneo se contraem (vasoconstrição) desviando o fluxo sanguíneo aos grupamentos musculares mais importantes (reação responsável pelo “calafrio” muitas vezes associado com o medo – há menos sangue na pele para mantê-lo aquecido); O indivíduo fica pálido;
  4. o teor do suor se modifica; Esse suor associado à vasoconstrição periférica resulta na sudorese fria bastante conhecida nessas situações. Em situações de estresse, emitimos cheiros diferentes. Isso é usado como esquiva em muitos animais;
  5. Há uma tonificação dos músculos, a piloereção ocorre quando pequenos músculos conectados a cada pêlo da superfície da pele tensionam, os fios são forçados para cima, puxando a pele com eles; Essa é uma resposta muito importante. Os animais com a pele recoberta de pelos ficam “arrepiados” dando a impressão que são maiores e mais ameaçadores. Animais como o porco-espinho, permitem que seus grossos e afiados pêlos se desprendam, causando lesões em seus agressores;
  6. O cérebro trabalha em ritmo acelerado. Não há prioridade em se concentrar em tarefas pequenas (deve-se concentrar apenas em sobreviver).

Esse tipo de resposta estereotipada foi conservado pela evolução. Daí concluirmos que ele deve conferir algum tipo de vantagem pois os organismos que a possuiam tinham mais chances de sobreviver e passá-la a seus descendentes. Temos portanto, o mesmo tipo de resposta até hoje. Basta levarmos um grande susto, ou recebermos uma notícia muito ruim, ou mesmo termos a nítida sensação de que vamos ser assaltados. Essa sensação é uma reação de estresse.

Então, o “macaco” veio morar na cidade. Nosso modo de vida urbano, transformou nosso cotidiano em um constante estado de estresse. Ficamos ansiosos com trânsito, violência, dinheiro, trabalho, etc. Nossas fontes de estresse pré-histórico, em especial a fome, não são o problema principal (pelo menos nos países industrializados!). Esse estresse constante tem como consequência uma “pré-ativação” desse sistema de luta ou fuga. Ás vezes, essa reação é desencadeada desproporcionalmente em resposta a estímulos pequenos. Pior, em determinadas situações, não conseguimos identificar o estímulo que está a causá-la! Agora, imagine, todas essas reações descritas (dilatação pupilar, sudorese fria, taquicardia e palpitações, respiração curta e rápida, e etc) sem uma causa identificável. O quadro é desesperador!

Associe-se a isso a hipocalcemia. Sim, o cálcio é um cátion que no sangue está dividido em duas grandes porções: a livre, que age na contração muscular principalmente, e a ligada à proteínas. Quando um indivíduo tem uma crise como a descrita, sua tendência é fazer uma hiperventilação. Essa hiperventilação reduz drasticamente o teor de gás carbônico no sangue causando um aumento do pH sanguíneo o que leva a uma maior afinidade das proteínas pelo cálcio. Ele é “sequestrado” da porção livre no plasma o que leva a uma hipocalcemia aguda. A hipocalcemia causa contrações involuntárias dos músculos, principalmente faciais e dos membros superiores. Invariavelmente, o indivíduo pensa que está tendo um derrame! Sua boca se fecha, sua língua enrola, suas mãos não se movimentam direito, além do que apresentam intenso “formigamento”. (Daí a prática, não recomendada, de respirar num saco. O gás carbônico aumenta e o efeito desaparece).

Esse tipo de reação intensa e extenuante leva o indivíduo à um pronto-socorro. Lá chegando, recebe o diagnóstico de ansiedade aguda, crise de pânico, piripaque, piti, distúrbio neuro-vegetativo (jargão médico que não quer dizer absolutamente nada!) e um calmante (normalmente, benzodiazepínico). O quadro melhora progressivamente e o paciente é liberado. Nunca será curado assim! Casos com essa gravidade merecem acompanhamento minucioso. Medicação ajuda muito na fase aguda, terapia funciona a longo prazo. Tudo devido a uma resposta orgânica mal-utilizada, mal-adaptada. Temos reação de estresse quando praticamos esportes e damos aquela “raça” para ganhar um jogo; ou quando vemos de fato o perigo a nos ameaçar. Poderíamos dizer que são “instintos básicos” de sobrevivência como fome, sede, cuidar dos filhos. Mas quando presentes em situações inadequadas, eles são perigosos e devemos entender como funcionam para evitar seus efeitos ruins. Esse entendimento não ocorre se não tivermos conceitos de teoria da evolução presentes. Evolução e Medicina. Separá-los é perder a possibilidade de compreendê-los.

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A Vingança dos NERDS

In press na revista Intelligence:
Intelligence and semen quality are positively correlated

Authors: Rosalind Ardena, Linda S. Gottfredsonb, Geoffrey Millerc and Arand Pierced
Social, Genetic, Developmental & Psychiatry Centre, Institute of Psychiatry, King’s College London, London SE5 8AF, United Kingdom
School of Education, University of Delaware, Newark, DE 19716 USA
Psychology Department, Logan Hall 160, University of New Mexico, MSC03 2220 Albuquerque, NM 87131 USA
Department of Pathology, School of Medicine, University of New Mexico, MSCO8 4640, Albuquerque, NM 87131 USA
Abstract
Human cognitive abilities inter-correlate to form a positive matrix, from which a large first factor, called ‘Spearman’s g’ or general intelligence, can be extracted. General intelligence itself is correlated with many important health outcomes including cardio-vascular function and longevity. However, the important evolutionary question of whether intelligence is a fitness-related trait has not been tested directly, let alone answered. If the correlations among cognitive abilities are part of a larger matrix of positive associations among fitness-related traits, then intelligence ought to correlate with seemingly unrelated traits that affect fitness—such as semen quality. We found significant positive correlations between intelligence and 3 key indices of semen quality: log sperm concentration (r = .15, p = .002), log sperm count (r = .19, p < .001), and sperm motility (r = .14, p = .002) in a large sample of US Army Veterans. None was mediated by age, body mass index, days of sexual abstinence, service in Vietnam, or use of alcohol, tobacco, marijuana, or hard drugs. These results suggest that a phenotype-wide fitness factor may contribute to the association between intelligence and health. Clarifying whether a fitness factor exists is important theoretically for understanding the genomic architecture of fitness-related traits, and practically for understanding patterns of human physical and psychological health.

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Blogs, Ciência, Religião e o Debate no Lablog

Talvez, o que mais irrite nos creacionistas e defensores do design inteligente (DI) é a forma de argumentação, principalmente quando utilizam-se de argumentos “científicos”, mas que em geral, são bastante diferentes dos utilizados por nós, simpatizantes da ciência. Também cometemos os mesmos erros quando tentamos discutir assuntos metafísicos com nosso arsenal argumentativo e quando esquecemos da metafísica presente na própria ciência! (Tenho um artigo interessante sobre a metafísica das espécies).
Quando colocamos um blog no ar, temos uma responsabilidade pública e social. Quero testar minhas opiniões sobre as coisas nas quais gosto de pensar. Quero testar a opinião de outras pessoas. Quero melhorar o mundo, por que não?! Posso tanto mudar de idéia, como também fazer com que outras pessoas comecem a raciocinar de forma diferente. Que fazer com idéias divergentes, muitas vezes agressivamente opostas, às vezes com objetivo explícito apenas de provocar? Acho “deletar” um tanto autoritário. Acredito (e isso é fé pura) na razão compartilhada. Isso implica em aceitar opiniões diversas e construir juntos afirmações com valor de verdade. E não em amar a Verdade. A Verdade é tão intangível quanto fadas, duendes e amigos imaginários deificados. Substituir Deus pela Verdade não alivia. Nietzsche já dizia que ciência e religião estão no mesmo terreno pois ambas acreditam na inestimabilidade e incriticabilidade da verdade e nisso, sempre serão aliadas (GM§25, 3a Dissertação). Da mesma forma como existem defensores irascíveis do DI, também conheci vários “ativistas” do ateísmo dogmático que agem como se a ciência fosse a sua religião. Demolir, destruir ou ridicularizar argumentos contrários é para quem acha que detém a Verdade (com “v” maiúsculo mesmo). É fazer o que um provocador quer. É não reconhecer aquela parcela de fé única e exclusiva da qual a ciência também depende.
Qual a diferença entre a crença nessa Verdade quase absoluta que achamos que possuímos e a crença em ETs? Qual é a razão de estudarmos ciência se não adquirirmos tolerância? Isso já não deu certo outras vezes. Que ao menos não se repita o mesmo erro.

Genes e Nosologia

Ainda sobre o artigo de Pollack, que muito me intrigou:

Se considerarmos minimamente a evolução humana, podemos entender que somos fruto de uma série de contingências que por uma ou outra razão, possibilitaram nossa sobrevivência e de nossos descendentes, sob as mais variadas e hostis condições ambientais. Condições que ou deixaram de existir, ou foram substituídas por outras, mais recentes. Por exemplo, recente nosso acesso ao sal e às gorduras insaturadas. A avidez por essas substâncias foi muito útil em determinados períodos da evolução, mas com certeza, não é o caso agora.

Ao desenhar o mapa das doenças, quem vai contar essa história? De que me adianta saber que a distrofia de Duchenne está ligada a doenças cardiovasculares? A pergunta muito mais interessante é: Por que elas estão ligadas?

Para evoluir e sobreviver, ganhamos doenças! A Vida carrega a Morte dentro de si. Essa continua sendo a grande contradição da existência.

Teleologia II

Ernst Mayr defendia uma filosofia particular para a Biologia. Uma das razões para isso é o fato de o pensamento biológico contar com certas características próprias. Talvez, a principal delas seja o pensamento teleológico. A linguagem médica é obscenamente teleológica com a desculpa de ser pragmática. Até posso aceitar esse argumento. Porém, não concordo quando os interlocutores comunicam-se assim por desconhecimento total do assunto e sua polêmica no universo da Biologia. O texto que se segue pertence ao portal Talk Origins

“There are two forms of teleological explanation (Lennox 1992). External teleological explanation derives from Plato – a goal is imposed by an agent, a mind, which has intentions and purpose. Internal teleological explanation derives from Aristotle, and is a functional notion. Aristotle divided causes up into four kinds – material (the stuff of which a thing is made), formal (its form or structure), efficient (the powers of the causes to achieve the things they achieve) and final (the purpose or end for which a thing exists). Internal teleology is really a kind of causal explanation in terms of the value of the thing being explained. This sort of teleology doesn’t impact on explanations in terms of efficient causes. You can, according to Aristotle, use both.

Evolutionary explanations are most nearly like Aristotle’s formal and efficient causes. Any functional explanation begs the further question – what is the reason why that function is important to that organism? – and that begs the even further question – why should that organism exist at all? The answers to these questions depend on the history of the lineage leading to the organism.

External teleology is dead in biology, but there is a further important distinction to be made. Mayr [1982: 47-51] distinguished four kinds of explanations that are sometimes called teleology: telenomic (goal-seeking, Aristotle’s final causes, ‘for-the-sake-of-which’ explanations); teleomatic (lawlike behaviour that is not goal-seeking); adapted systems (which are not goal seeking at all, but exist just because they survived); and cosmic teleologyO’Grady and Brooks 1988]. Only systems that are actively directed by a goal are truly teleological. Most are just teleomatic, and some (e.g., genetic programs) are teleonomic (internal teleology), because they seek an end.”

How the four forms of apparent teleology relate.
Venn diagram with Teleological systems in Teleonomic systems in Teleomatic systems with Adapted systems overlapping some (but not all) of each of the other four but entirely within Teleomatic systems

Exemplos de processos teleomáticos são aqueles em que a lei da gravidade e a 2a lei da termodinâmica regulam as transformações. Não apresentam um objetivo final. Os processos teleonômicos são guiados por programas e dependem da existência de uma meta que pode ser uma estrutura, uma função fisiológica ou mesmo um comportamento. Os programas estão sujeitos à seleção natural. Para Mayr, o programa genético proporciona em exemplo de processo teleonômico. Os sistemas adaptativos (por exemplo, funções de orgãos ou comportamentos de espécies) têm sido erroneamente chamados de teleológicos. Segundo Munson (1971) isso ocorre porque ao estudar um traço adaptativo buscamos uma explicação. Essa explicação é dada contando-se a história evolutiva desse traço como sendo um sucesso da seleção natural. De novo, não há metas.
Esse raciocínio muitas vezes explica o aparecimento de doenças que, assim, não necessitam mais ser vistas como maldições à espécie humana. A razão médica se beneficiaria do pensamento evolucionário que pode estar distante da prática clínica, mas traria de volta sua historicidade. Afinal, a história de um ser vivo, tão cara a Mayr, é o que o diferencia de um ente inanimado; e o que o torna irredutível à físico-química, sem recorrer a explicações vitalistas.

Teleologia I


Certa vez, ao assistir uma aula de fisiologia, fiz a pergunta que todo aluno do 2o ano de Medicina faz ao seu professor de fisiologia (ou pelo menos tem vontade de fazer!): “Mas, para que serve o sistema límbico?” (era uma aula de neurofisiologia). O professor, deixou o giz cair na calha, inverteu as sombrancelhas – até então, amigáveis – e me respondeu: “Você não deve pensar assim!”. Por quê? “Por quê?! Passamos anos tentando nos livrar dessa pergunta! Esse tipo de pergunta não leva a lugar nenhum!” Fiquei um pouco humilhado pelas risadas da classe e não quis me alongar no debate, mas a resposta nunca me satisfez. Principalmente porque ninguém nunca tinha me dito como não pensar antes!
Para que serve o rim? Para livrar o organismo de subprodutos tóxicos, eliminar ou economizar água e manter o equilíbrio ácido-básico. Nada mais simples. Entretanto, essa linguagem teleológica é quase um tabu na Biologia e mostra como a Medicina desconhece conceitos básicos de Teoria da Evolução. Nos próximos posts, tentarei refletir sobre o pensamento teleológico, principalmente à luz de Ernst Mayr. Extrapolações para a Ciência Médica e a Medicina propriamente dita serão permitidas, aceitas e até encorajadas. Nada faz muito sentido senão à luz da evolução, não é mesmo?

Isaac, Albert ou Charles

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Ernst MayrPhoto by Kris Snibbe

Ernst Mayr defendia uma filosofia própria para a Biologia (Toward a New Philosophy of Biology). Acreditava que a Biologia não poderia nunca ser reduzida à Física, como sonhavam mecanicistas de outrora. Por que falamos em darwinismo e não existe um newtonismo ou eisteinismo?

Chamou a atenção por exemplo, à diferença entre a Biologia Funcional e a Evolucionária. A pergunta principal do biólogo funcional é “Como?”. Como isso funciona? Como aquilo interage com isso? e etc. A pergunta do biólogo evolucionário é “Por quê?”. No sentido de “Como aconteceu?” e não no sentido de “Para quê?”, a pergunta que Aristóteles fez e que gerou uma confusão que atravessou milênios! Voltaremos a ela, com Mayr em outro post.

Para usar uma analogia didática de Mayr, podemos comparar o trabalho dos campos da Biologia com a tecnologia da informação: o biólogo funcional quer decodificar a informação programada no DNA. Entender os mecanismos de funcionamento do processo. O biólogo evolucionista, por outro lado, está interessado na história destes programas de informação e nas leis que controlam suas mudanças de geração a geração. Ou seja, nas causas destas mudanças.

Os seres humanos são produtos de uma infinidade de experiências casuais da natureza culminando no que somos hoje. Para onde caminha a Ciência Médica? A quem ela almeja desposar: Isaac, Albert ou Charles ?