Para que precisamos de biomarcadores?

malcheiroso_180344_2143.jpg

“Quando o dano está feito, até um tolo pode percebê-lo.”

Não canso de repetir essa frase de Homero. Especialmente para mim mesmo.
Ela me faz lembrar uma outra frase, mas essa eu não sei quem disse: “Se nosso cérebro fosse simples a ponto de podermos compreendê-lo, jamais conseguiríamos compreendê-lo”
Que por sua vez me leva a palestra do Richard Dawkins no TED “Queerer than we can suppose. The strangeness of Science” ou “Mais esquisito do que nós podemos supor. A estranheza da ciência”, que vocês não podem perder.
Ele, por sua vez, estava citando J.B.S. Haldane, que uma vez disse “The universe is not only queerer than we suppose but queerer than we can suppose.” (“O universo não é apenas mais esquisito do que supomos, é mais esquisíto do que podemos supor”)
Eita, já escrevi 4 citações a até agora não disse ao que vim. Espero que não tenham se cansado e ido embora.
Veja, os ecotoxicologistas, mas acredito que também os ecólogos e os toxicologistas, ainda não se convenceram disto. De nada disso! Parece que quanto mais complexo tornarmos o problema, quanto menos pessoas puderem compreendê-lo, quanto mais equipamentos caros precisarmos para avaliar o problema, melhor é o problema.
Não é, ou não deveria ser, assim.
Robert Aumman diz que a compreensão é um fenômeno complexo, mas que usa 3 elementos: relação, abrangência (unidade) e simplicidade. Para compreendermos alguma coisa, precisamos ser capazes de relacioná-la com outras, que nos são familiares. Ela precisa ser aplicável em várias situações, quanto mais situações, melhor será a nossa compreensão. E finalmente, ela precisa ser simples!
Mas nem tudo é, ou pode ser, simples.
A teoria da gravitação universal é simples. Massa, distância e BUM! Você tem a gravidade. Mas esses tais de biomarcadores… gente… que coisa complicada! Eu trabalho com eles, há muitos anos, e são tão poucos os que podemos dizer que realmente entendemos.
Quer dizer, entendemos os mecanismos. A biologia molecular (quando aquelas letrinhas ACGT do DNA viram uma proteína) e entendemos a bioquímica (quando todas aquelas proteínas fazem alguma tarefa em um ciclo ou processo), mas quando tentamos entender PORQUE ou PARA QUE elas fazem isso ou aquilo… o problema fica complicado demais.
Já tentou entender porque uma garota é capaz de passar horas e horas em uma loja de sapatos? Ou um cara horas e horas discutindo sobre carros? É a mesma complicação: não dá pra entender!
Por favor, não me entendam mal, eu sei que DNAs e proteínas não fazem nada com razão ou propósito. Usei os termos mais no sentido de ‘causa’ e ‘consequencia’. Porém, mesmo essas coisas complicadas, que talvez jamais consigamos entender ou prever, acabam levando a coisa que podemos observar mais facilmente: um sintoma de doença, um cheiro ruim de esgoto no rio.
Não precisa de pós-doutorado. É tão fácil que até um tolo percebe. E é isso que a palestra do Dawkins fala. Nosso cérebro foi desenhado (no sentido de evoluiu) para compreender fenômenos do mundo visível, audível e palpável. E para tomar decisões levando em consideração muitas variáveis, medindo a importância de cada uma delas em diferentes contextos, algumas vezes de forma inconsciente, e em outras, levando em conta parâmetros emocionais (não-racionais). As coisas continuam sendo complicadas, mas em algumas escalas, ordens de grandeza, nosso cérebro está equipado para compreendê-las.
Acho que a escala dos biomarcadores de poluição não é uma delas. Se você coloca peixes em um rio contaminado com esgoto e depois de meses de análises, milhares de reais, horas de trabalho, análises químicas e estatísticas, tudo consegue concluir é que aquele rio estava contaminado com esgoto, então existe algum problema ai.
A questão é: se os biomarcadores só forem tão bons quanto nossos olhos e narizes, porém muito mais caros e trabalhosos, então fiquemos com os olhos e narizes!
Começo a acreditar que não poderemos, nunca, nem mesmo com os ‘omics’, explicar os complexos mecanismos através dos quais os efeito de mudanças climáticas, os antigos contaminantes que ainda estão presentes (como DDTs, PCBs e HPAs), os novos contaminantes como as nanopartículas e os fármacos, associados a variantes genéticas entre espécies e indivíduos, estágios do desenvolvimento, idade, gênero, doenças e acrescidos da presença de parasitos e influência de variações ambientais; prever o que vai levar um organismo a desenvolver um tumor e outro não, após uma exposição no ambiente.
Acho que como ecotoxicologistas, estamos fadados a sermos os tolos que explicam depois, com um nível de detalhamento sem precedentes na história, o dano logo depois dele acontecer.

A evolução da moda – parte II: As mulheres também

LuisXIV_75462034.jpg
(Esse post é uma continuação. Talvez você queria começar lendo a primeira parte)
Uma vez estava assistindo TV quando aparece a ex-modelo e ex-policial Marinara na telinha. Eu estava falando com uma amiga no telefone e comentei dos dotes ‘loiraça Beuzebu’ do Fausto Fawcett, o que levou ela a sintonizar mesmo no programa, ao que se seguiu o seguinte comentário: ‘Mas você viu esse cabelo dela? Não se usa essa franjinha desde os anos 80!’ Eu franja tinha passado desapercebida enquanto eu estava concentrado na relação C/Q.
Acho que foi nesse momento preciso que eu entendi que a moda era muito diferente para homens e mulheres.
Para ser justo, eu deveria começar perguntando também o que as mulheres querem, mas a resposta certamente escaparia das minhas mãos. Então, sem perguntar, vou começar respondendo que as mulheres também avaliam a beleza masculina com base na trindade rosto-torso-idade. Só que, consistentemente, as mulheres consideram esses fatores menos importantes do que a personalidade e o status (ou hierarquia) social.

Os homens colocam as características físicas acima da personalidade e do status ao avaliar as mulheres; as mulheres, não.

A única exceção parece ser a altura. Em todo o mundo, as mulheres consideram homens altos mais atraentes do que homens baixos. Estima-se que menos de 1% dos casais humanos sejam formados por homens menores que as suas mulheres! Como conseqüência (ou talvez causa) calcula-se que cada 2 cm a mais de altura valem 6.000 dólares a mais no salário anual de um homem na América do Norte.
As mulheres também trazem essa preferência no hardware (a metáfora que estou usando para identificar um comportamento selecionado geneticamente). E novamente, tem a ver com a nossa sociedade monogâmica.
Nela, freqüentemente uma mulher escolhe o seu parceiro muito antes que ele tenha possibilidade de se transformar em um “chefe”. Mas ela tem de saber avaliar esse potencial futuro, e para isso, as ‘realizações passadas’ pouco contam. Os bons indicadores que ela deve procurar são traços de personalidade como equilíbrio, segurança, otimismo, perseverança, coragem, decisão, inteligência, ambição – estas são algumas das características que fazem com que os homens cheguem ao topo da carreira nas suas profissões. E não por acaso, estas são as características que as mulheres acham atrativas em um homem: os indícios do seu futuro status.
Essas preferências são confirmadas por estudos com o de Buss, que analisou 37 sociedades modernas, ou o de Low com duzentas sociedades tribais, e em todas elas a ‘beleza’ de um homem dependia mais das suas habilidades e bravura do que da sua aparência. Definitivamente, a linguagem corporal é importante para que um homem seja considerado sexy. Mas enquanto ela fala da sua personalidade, os ‘símbolos’ é que falam do seu status.
Para alguns pesquisadores esses símbolos sempre estiveram presentes na roupa e os ornamentos masculinos e atualmente, um terno Armani, um relógio Rolex e uma BMW são indícios de hierarquia gritantes, como eram antigamente as listras da patente de um general ou o cocar de um chefe Yanomami.
Mas peraê?! Eu não disse que as mulheres eram programadas geneticamente para buscarem personalidade e status? Como é que agora eu digo que as mulheres estão buscando a triade Armani-rolex-BMW, que existe há apenas uma geração humana, para avaliar os homens?
É que o que é selecionado geneticamente não é o símbolo em si, mas sim a ‘busca pelo símbolo de status’, qualquer que ele seja naquela época e lugar. As mulheres modernas possuem um mecanismo mental, evoluído durante o período Pleistoceno, que permite a elas perceber o que se correlaciona com status, entre os homens, e achar esses símbolos impressionantes.
E ai? Percebeu alguma coisa? Acendeu algum neurônio?
Alguma coisa que mude de acordo com a época e o lugar é quase uma definição precisa de MODA! A moda não é importante para aprimorar beleza, é importante para identificar símbolos de status!
Mas isso não sou eu que estou dizendo e nem é novidade. Vários estudos de historiadores da arte mostram que a Moda, até recentemente, estava amarrada à competição entre as classes: primeiro a simulação da aristocracia pela burguesia e depois das classes médias pelo proletariado.
Chegamos então a um paradoxo. Os evolucionistas e historiadores de arte concordam que a moda é uma questão de status. As mulheres procuram nos homens indícios de status, que mudam com moda, e os homens procuram nas mulheres indícios de fertilidade, que não mudam.
Biologicamente, os homens deveriam se importar menos com o que as mulheres vestem, desde que a sua pele seja lisa, elas sejam esbeltas, jovens, saudáveis e, preferencialmente, solteiras. Já as mulheres deveriam se importar extremamente com o que os homens vestem, porque isso lhes diz muito sobre a sua história, sua riqueza, seu status social e mesmo sobre suas ambições.
Mas então porque as mulheres seguem avidamente a moda para roupas e acessórios enquanto os homens se importam bem menos (muito, muito menos) com elas?
Angie Dickinson disse: “Eu me visto para as mulheres e me dispo para os homens”. É uma tremenda frase de efeito, mas não a luz da evolução.
Essa é uma questão que atualmente a ciência não consegue responder. O que parece é que a nossa moda, hoje, é uma aberração que surgiu alguns 200 anos atrás, porque durante o período regencial na Inglaterra, o reinado de Luis XIV na França, na idade media cristã européia, na Grécia antiga, ou mesmo entre Yanomamis modernos, os homens seguiam a moda tanto ou mais que as mulheres, vestindo cores brilhantes, roupas esvoaçantes, jóias e ornamentos luxuosos, lindos uniformes e armaduras decorados até com brilhos. O que podemos dizer com certeza é que estar ‘na moda’ é certamente um símbolo do status entre mulheres e por isso “qualquer pequeno detalhe que sinalize a habilidade de seguir as tendências da moda” é um sinal de status de uma mulher, que pode significar a sua posição hierárquica ou a riqueza do seu marido.
Falta esclarecer a razão, mas o erro esta claro: cada sexo age de acordo com seus instintos, na convicção que o outro sexo tem as mesmas preferências. As mulheres se importam mais com a roupa e os homens se importam menos, mas em vez de tentar influenciar o sexo oposto com seus interesses, eles tentam influenciar o próprio sexo.
Um experimento interessante foi feito na universidade de Pensilvânia. Os cientistas apresentavam para os sujeitos, homens ou mulheres, desenhos simples de figuras masculinas e femininas, e pediam que eles indicassem, nas figuras do seu próprio sexo, qual aquela que eles acreditavam que se assemelhava a sua forma física atual, sua forma física ideal e a forma física que eles consideravam mais atraente para o sexo oposto. E nas figures do sexo oposto, pediam que indicassem qual a forma física que consideravam mais atraente. Em geral, os sujeitos conseguiam identificar corretamente a sua própria forma física mas enquanto os homens colocavam a sua forma física ideal muito próxima da sua forma física atual (mostrando que os homens estão satisfeitos com o seu corpo), as mulheres escolhiam sempre figuras mais magras como o seu ideal. Mas o que intrigou os pesquisadores foi o cruzamento dos resultados de ‘qual a forma física do sexo oposto eles achavam mais atraente’ com ‘qual forma física você acha que mais atrai no sexo oposto’: os resultados não bateram! Os homens acham que as mulheres preferem caras mais fortes do que elas realmente preferem, e as mulheres acham que os homens preferem mulheres mais magras do que eles realmente preferem.

A moda ainda cria um outro paradoxo, que é o da uniformização da beleza. Evolutivamente, em uma espécie monogâmica, a beleza pode ser tudo, menos uniforme!
Charles Darwin já havia dito que “se todas nossas mulheres devessem se tornar tão bonitas quanto a Venus de Medici, nós acharíamos aquilo encantador por um momento; mas logo desejaríamos variedade; e assim que nós obtivéssemos a variedade, nós desejaríamos ver determinados caracteres nas nossas mulheres um pouco exagerados além do padrão comum existente.”
Bell disse que ‘É incrível que o hábito de se vestir de uma determinada maneira, que consiste em leis leis irracionais, arbitrárias e, freqüentemente, cruéis; impostas sem nenhuma sanção formal, sejam obedecidas com tamanha docilidade.’
No Brasil, onde a moda pega tanto e as leis tão pouco, é bem provável que o destino de mais estilistas seja o congresso nacional.
Para saber mais: Leia o capítulo 9 – “Os usos da beleza” do livro “A Rainha Vermelha: sexo e a evolução da natureza humana” de Matt Ridley.

A evolução da moda – parte I: Os homens são todos iguais

ilustracao.modelo.dv714032.jpg
Meu pai é completamente avesso a modismos. Se mais de 5 pessoas começarem a gostar de alguma coisa (que não seja o Vasco), ele logo arruma uma razão pra discordar. Se a gente estende um pouco o assunto, descobre que ele tem uma grande dificuldade para ‘entender’ a questão da moda. Só que nisso, ele não é o único: a maior parte dos homens tem dificuldade de entender o interesse da maior parte das mulheres com a moda.
A estação brasileira dos desfiles está terminando e com espaço que os desfiles, as modelos e os estilistas ganharam na mídia nessa Fashion Week, eu me pergunto se não teria espaço para um cientista também fazer algumas considerações sobre a moda (afinal, depois que ouvi a tal de Glória Coelho falar e não dizer nada sobre aquecimento global, eu estaria até perdoado se o que vou dizer não tiver interesse).
A primeira pergunta que precisa ser feita é: do que os homens gostam? (Fiz essa pergunta também porque ela é muito mais fácil de responder do que a outra: do que as mulheres gostam?)
Os homens não gostam de mulheres porque ‘aprenderam’ isso durante o seu desenvolvimento. Existe uma predisposição genética para os organismos com cromossomas sexuais XY gostarem de mulheres. Mais especificamente os genes SRY, SOX9, FGF9 e WNT4, já que são eles que controlam as doses de testosterona durante o desenvolvimento que fazem com o que o cérebro seja ‘masculino’ e, entre outras coisas, ‘goste de mulheres’.
Homens gostam de mulheres, ponto. Isso não é uma moda e não vai passar. O que eu quero dizer, é que existem coisas, comportamentos, que não são aprendidos, não são flexíveis e não poderiam variar com a moda.
Mas os homens gostam de qualquer mulher? Essa é uma pergunta um pouco mais complicada que a primeira, mas ainda assim mais fácil de responder do que a variante feminina da mesma.
Os machos da espécie humana são, na verdade, muito mais seletivos do que as mulheres da espécie humana podem imaginar. Certamente não tão seletivos quanto as mulheres, mas muito mais seletivos do os machos das espécies de primatas próximas a nossa. Um chimpanzé ficará interessado (e excitado) por uma fêmea seja ela feia ou bonita, alta ou baixa, gorda ou magra, nova ou velha, desde que ela esteja no cio. E, pensando bem, porque ele deveria desperdiçar uma oportunidade, qualquer que fosse, de reproduzir?
No caso dos homens esse ‘desperdício’ pode ser vantajoso. É que somos uma espécie muito particular em aspectos sociais. E uma dessas particularidades é a monogamia. A monogamia também não é aprendida, é algo que está no nosso hardware. Já veio de fábrica (eu sei que isso dá outros posts inteiros, mas peço que por favor guardem suas considerações para que possamos seguir adiante na questão da moda).

Abre parênteses:
para alguma coisa ‘entrar no hardware’, que significa se transformar em um comportamento determinado geneticamente, é necessário que durante milhões de anos, homens que não apresentavam essas características (esses comportamentos) e por ‘vontade’ ou ‘aprendizado’ escolheram mulheres fora desse padrão, deixaram menos filhos, que deixaram menos netos, que eventualmente desapareceram. Fecha parênteses.
E junto com a monogamia, foram selecionadas 3 características de gosto dos homens, sem as quais essa opção evolutiva (a monogamia) seria infrutífera. E por isso os homens gostam de mulheres bonitas de rosto, jovens, e com uma alta relação entre a cintura e os quadris.
Você, mulher, pode não gostar (e até conhecer vários exemplos contrários), mas o conjunto de evidências científicas apontando nessa direção é enorme. E não, vestidos novos ou velhos, azuis ou verdes, de seda ou de malha, estampados ou floridos, com ou sem brilho, combinando ou não com o sapato, não fazem parte da opção.
A beleza do rosto é um ótimo indicador não só de bons genes, como de uma boa nutrição durante a criação. Existem vários estudos (e eu não vou ficar citando tudo aqui porque essa não é uma revisão formal, mas você pode ler o capítulo que eu recomendo no final do texto) que mostram, por exemplo, o efeito de doses de testosterona ou estrogênio nos delineamentos do rosto (o que qualquer transsexual sabe). Don Symons diz que “A face é a parte mais densa de informação de todo corpo”.
A relação entre a cintura e os quadris (C/Q) mostra que não há um acúmulo de gordura que poderia ser prejudicial a saúde, ao mesmo tempo que sugere facilidade na hora do parto.
“Dentro do limite do razoável, um homem achará uma mulher de qualquer peso atraente desde que sua cintura seja mais fina do que seus quadris.”
Os estudos mostram que uma mulher cheinha, mas com uma alta C/Q é geralmente preferida à uma mulher magra mas C/Q baixa. Como a dieta em mulheres razoavelmente magras, como as modelos das passarelas, não tem nenhum efeito na relação C/Q (e quando muito piora ela, ao reduzir o quadril e não a cintura), elas estão condenadas a nunca se sentirem atraentes.
Finalmente, a juventude diz que aquela fêmea poderá reproduzir muitas vezes. Na verdade, muitos dos componentes da beleza feminina são indicadores da idade: ausência de marcas na pele, lábios cheios, olhos brilhantes, seios firmes, cintura estreita e pernas finas.
Abre parênteses: “Os homens (realmente) preferem as loiras”. As mulheres tingiam (ou descoloriam) em os cabelos de loiro desde a Roma antiga. O gene para cabelo loiro nas crianças é bastante comum na Europeus (e também entre os aborígines Australianos) e por isso, quando apareceu um mutação para que o cabelo loiro permanecesse até o início da idade adulta (não depois dos 20 anos de idade), todos os homens com tivessem uma preferência genética por mulheres loiras estariam casando somente com mulheres jovens. Os homens nunca tiveram uma forma direta de saber a idade das mulheres e por isso esse tipo de ‘hardware’ foi levou a um número maior de descendentes, espalhando a preferência e também a propagação do próprio traço (o cabelo loiro) que era certamente um indicador honesto do valor reprodutivo da fêmea. Fecha parênteses.
Se esses os 3 fatores que podemos dizer que determinam geneticamente a preferência dos homens por mulheres, a próxima pergunta tem que ser: pra que serve a moda? Porque certamente não é para deixar as mulheres mais bonitas para os homens. Quem achar isso, não entende nada de homem!
É verdade, a cirurgia plástica pode dar uma esticada no rosto e adiar um pouco a avaliação da idade, uma saia com crinolinas (armações usadas sob as saias para lhes conferir volume) podem enganar a relação C/Q ali; assim como esses malditos sutiãs com forro (que estão super na moda, ainda que sejam menos eficientes e bem menos bonitos que os antigos ‘meia-taça’), mas todos esses subterfúgios não são suficientes para enganar a maquinaria psico-fisiológica dos homens para detectar uma boa candidata a parceira.
A roupa pode ajudar, as pesquisas revelam o que todos já sabem: Os homens são atraídos por mulheres em roupas reveladoras, apertadas, curtas, coladas e decotadas. Quanto mais ‘inadequada’, melhor. A moda faz pouco por isso.
“Os homens são todos iguais” dizem a sabedoria feminina popular. Pelo menos no que tange o gosto pelas mulheres, é verdade. Podemos até dizer que todos os homens querem o mesmo tipo de mulher: o tipo bonito, jovem e reprodutor.
Mas, como os Stones já diziam, “You can’t always get what you want”.
Na Europa medieval e na Roma antiga, os homens poderosos pegavam todas as belezas para seus haréns, deixando uma falta generalizada de mulheres para os outros homens (hoje ainda é assim, na verdade, um pouco menos). Assim uma mulher feia tinha alguma chance de encontrar um homem desesperado bastante para casá-la. Isso não pode parecer muito justo, mas a justiça raramente é uma conseqüência da seleção sexual.
(Continua no próximo post)
Para saber mais: Leia o capítulo 9 – “Os usos da beleza” do livro “A Rainha Vermelha: sexo e a evolução da natureza humana” de Matt Ridley.

Inconformados!


Lembro-me de estar almoçando na casa de um professor carioca, quando morava na monótona Rio Grande, de perguntar pra ele, olhando a Lagoa dos Patos pela janelona do apê, como ele aguentava aquela cidade: ‘A gente acostuma’. Naquele momento descobri que eu era um inconformado! E que assim gostaria de permanecer. Não queria me acostumar à algo que fosse realmente ruim.

Foi na mesma época que eu aprendia fisiologia animal com o grande professor, Euclydes Santos (que hoje é advogado). A boca da Lagoa dos Patos é um estuário, aquela região salobra onde o rio encontra o mar, e que tem como principal característica mudar de uma hora pra outra. São ambientes instáveis, ainda que não sejam extremos (o polo norte é extremo, o Atacama é extremo!)

Para viver nesses ambientes, os organismos, tanto animais como plantas, tem de ter uma grande capacidade de adaptação as rápidas mudanças ambientais, já que, pelo menos duas vezes por dia, muda a maré e com ela todas as condições daquele ambiente. Essas adaptações eram a especialidade do Euclydes e o que eu aprendi com ele, uso até hoje. Até mesmo alguns dos textos, que já eram clássicos naqueles idos de 1995.

As duas principais estratégias de adaptação fisiológica são a regulação e a conformação.

Os reguladores são aqueles organismos que se esforçam (gastam energia) para manter o seu ambiente interno (o que incluí sangue, ou hemolinfa, citoplams, líquidos intersticiais…) com as mesmas características independentemente da variação do meio. Nós somos reguladores de muitos, muitos parâmetros fisiológicos. Nossa temperatura ideal sempre se mantém entre 35,5oC e 36,5oC independentemente de estar 15oC ou 40oC do lado de fora. O pH do nosso sangue ainda é mais restrito, não podendo se desviar nem mesmo dois décimos do seu valor de 7,2.

Os conformadores são aqueles animais que preferem não gastar energia para controlar o seu meio interno independentemente das váriações externas. Quando o meio ambiente muda, eles mudam junto. Alguns caranguejos que vivem na zona estuarina, ou mangue, deixam que a concentração de sáis na sua hemolinfa (o equivalente deles pro sangue) acompanhe a salinidade da água. Suas enzimas estão adaptadas a essa variação, que certamente não premite que elas trabalhem o tempo todo no seu ótimo, mas representa uma economia energática enorme!

Fisologicamente, os reguladores são uns inconformados. Preferem gastar energia para manter o seu organismo como gostam, ao invés de aceitar o que o meio ambiente lhes impõe. Para isso, é preciso que ele (organismo) restrinja suas ‘trocas’ com ele (ambiente). Assim as mudanças afetam menos. Claro que não dá pra ‘encerrar’ todas as trocas, senão, o ser (a gente) morre.
Já os ‘conformistas’, se o ambiente muda, eles mudam junto com ele. “Vão com a maré”, “Dançam conforme a música”! Só pra vocês verem o quanto isso é normal. Mas o conformismo também só funciona dentro de limites fisiológicos. Que podem variar de organismo para organismo. Ao de lá desses limites… o ser morre!

São duas estratégias diferentes e é difícil dizer qual é melhor. Como todas as estratégias, não podem ser avaliadas como certa ou errada, e sim como relação custo/benefício em longo prazo.

Mas uma coisa é certa, pras duas têm limite!

Bate Coração!

No último domingo, a revista do Globo publicou uma reportagem sobre as descobertas da ciência que previnem o infarto. Como eu dou aula de fisiologia cardíaca, fui lá conferir. Que decepção. Não tinha nada de fisiologia! Era quase uma propaganda de um novo exame que obviamente não previne nada, diagnostica! O que previne o infarto é uma mudança de estilo de vida, que na sociedade moderna, é difícil.

Pensei que eu poderia fazer um artigo com coisas bem mais legais para serem contadas sobre o coração.

Vocês sabiam que o som do tambor é o único som presente em todas as culturas? Alguém se arrisca no porquê? Exatamente, o som do coração! Desde a antiguidade clássica (egípcios, gregos e romanos), ainda que não se soubesse muito de anatomia e fisiologia, já era conhecida a relação entre os batimentos do coração e a vida.

Só que era uma relação intuitiva: nos corpos vivos dá pra ver, sentir, ouvir os batimentos no peito, enquanto nos mortos… não.

Essa relação entre os batimentos e a vida, levou esses povos a acreditarem que o coração era a “residência da alma”. Por isso, era o órgão aonde se depositavam todas as emoções humanas. Entre elas, o amor!

Nasceu entre os egípcios a tradição de usar um anel pra representar o casamento. Mas foi depois de 2000 anos que os gregos inventaram de usar o anel no dedo anular da mão esquerda. Segundo eles, um anel imantado ajudaria a atrair o coração. Isso por que no dedo anular esquerdo existiria a vena amoris a “veia do amor” que conectaria direto com o coração! Mas antes que as meninas delirarem dizendo “ah…. que romântico”, devo dizer que não existe nenhuma evidência científica ou anatômica da venas amoris! Era tudo um truque de algum Don Juan barato da época.

Mas essa não foi a única confusão que os antigos fizeram por não saberem anatomia. Eles confundiram um monte de coisas. Pra eles era o fígado que produzia e bombeava o sangue, que só caminhava pelas veias. Isso por que eles viam apenas pessoas mortas. E nos mortos, o sangue sai das artérias e se acumulam no fígado. As artérias ficavam vazias. Alias, esse era outro equivoco. Eles acreditavam que era ar que circulava pelas artérias. Tanto que receberam esse nome AR-TÉRIA “caminho do ar”. Se vocês prestarem bem atenção, vão ver que o coração nem está do lado esquerdo do peito. Ele tem uma posição central, estando ligeiramente apontado para o lado esquerdo. Feche o seu punho esquerdo. Coloque na região central do toráx, acima da barriga e entre os peitos. Ai fica o seu coração. E ele, inclusive, tem aproximadamente esse tamanho: o de um punho fechado!

Foi apenas durante a época dos gladiadores que o papel do coração começou a ser esclarecido. Galeno, o médico chefe dos gladiadores, tinha chance de observar corpos vivos abertos. Alguém tomava uma espadada e o peito aberto podia ser observado: o coração batia e o sangue jorrava pelas artérias. Conforme o gladiador ia morrendo, os batimentos iam diminuindo e se Galeno tivesse sido um pouco mais observador, já poderia ter observado a contração seqüencial dos átrios antes dos ventrículos.

Mas ele foi muito importante e durante mais de 10 séculos suas descobertas guiaram a medicina. Claro, com uma pequena participação do fato dos experimentos necessários para aprimorar os seus conceitos acabarem levando as pessoas para morte na fogueira durante a idade média.

Atualmente, as coisas estão muito mais avançadas e o Brasil é líder mundial nas pesquisas de células tronco para o tratamento de infarto do miocárdio (inclusive, o instituto onde eu trabalho é o líder!).

Mas quando eu dou aula, uma coisa que chamam mais atenção é da força do coração. Um coração sadio em bate cerca de 70 vezes por minuto. E em cada batimento, bombeia cerca de 70 mL de sangue para a Aorta. Faça as contas e você vai ver que o coração é capaz de bombear em torno de 5 litros de sangue por minuto. Você sabe quanto é isso? É muito! Pra vocês terem uma idéia, eu fiz um vídeo caseiro. Peguei uma garrafa de 1,5L de água e abri a torneira do tanque a ponto de enchê-la em 18s (faça de novo as contas, 5L em 60s; 1,5L em 18s). A vazão dessa torneira é a vazão do seu coração quando você está tranqüilo, lendo um livro ou vendo TV. Em repouso. (O video termina antes de encher a garrafa porque minha câmera é antiguinha e só grava 15s.)

Mas já se a mulher da sua vida rêaparecer, se um caminhão quase te atropelar ou se você resolver correr a meia-maratona do Rio, a vazão do coração pode aumentar muito. Em situações de ansiedade, estresse ou, principalmente, de esforço físico; os tecidos do corpo vão precisar trabalhar com mais intensidade, vão gastar mais energia e precisar de mais oxigênio. E como quem leva o oxigênio é o sangue, então o coração tem que bombear o sangue com mais intensidade. No vídeo abaixo, abri totalmente a torneira do tanque, e a garrafa levou sete segundos para encher. Isso corresponde ao coração batendo em torno de 180 vezes por minuto.

Só que não pára por ai. O coração ainda é “elástico” e com a necessidade, pode passar a bombear mais de 70mL/batimento. Com o aumento do volume bombeado para 130mL/min e o aumento da freqüência cardíaca para 220 bat/min, faça as contas novamente, e você vai ver que o coração pode chegar a incrível marca de 28.600 mL/min. Quase 30 litros de sangue por minuto!

Pense nisso da próxima vez que for maltratar seu coração!

PS: Algumas dessas curiosidades estão no livro: “As dez maiores descobertas da medicina. (Friedman M, Friedland GW. 2000. Capítulo 2: 37-63. Companhia das Letras. Rio de Janeiro. 363pp)”

Sobre ScienceBlogs Brasil | Anuncie com ScienceBlogs Brasil | Política de Privacidade | Termos e Condições | Contato


ScienceBlogs por Seed Media Group. Group. ©2006-2011 Seed Media Group LLC. Todos direitos garantidos.


Páginas da Seed Media Group Seed Media Group | ScienceBlogs | SEEDMAGAZINE.COM