Sinais de fumaça
Foi uma decisão acertada, professor de biologia aplicada a medicina na University College London, esse engenheiro civil que resolveu estudar desenvolvimento celular depois de ouvir falar das propriedades mecânicas da membrana plasmática tinha idéias interessantíssimas.
Mas como o meu conhecimento sobre o desenvolvimento embrionário é restrito (o suficiente para não conseguir distinguir a brilhantismo dele), ele me impressionou muito ao chamar atenção para coisas óbvias em biologia as quais eu nunca tinha levado em consideração.
Uma das coisas intrigrantes da célula é a comunicação celular. A célula está isolada do meio externo por uma membrana, que é semi-permeável mas muito, muito seletiva. Mas essa barreira também é a principal ferramenta de ‘percepção’ do meio externo. Proteínas na membrana são capazes de perceber variações no meio (pH, temperatura, carga, concentração de elementos), sinais de outras células ou órgãos (citocinas, neutrotransmissores, hormônios), além de xenobióticos (substâncias estranhas ao organismo como poluentes, venenos, remédios).
A detecção dessas variações no meio externo pode (e geralmente) desencadear uma resposta no meio interno, geralmente fruto de alterações na estrutura de proteínas e na expressão gênica. Mas como o sinal não ultrapassa a membrana, ele tem que ser transmitido do meio externo para o meio interno. Para isso a célula possui uma gama enorme de proteínas e moléculas sinalizadoras que funcionam de forma encadeada, em cascatas. São as vias de sinalização celular.
Apesar da sua grande variedade, a lógica é sempre a mesma: uma coisa modifica outra, que modifica outra, que modifica outra, que modifica outra, que modifica uma mais uma outra, até que modifica uma última coisa que dispara uma resposta, uma ação, por parte da célula. Essa resposta pode ser a produção de uma proteína, a modificação de outra, a divisão ou a morte celular.
A lógica é perfeita, o problema é o quão longas e complicadas podem ser as cadeias de eventos que participam da sinalização celular. Principalmente se pensarmos no ‘princípio da economia da natureza’ (sobre o qual já falei aqui e aqui)
Apesar de não ser uma lei universal, como a 2a lei da termodinâmica, que eu adoro, a ‘Navalha de Occam’ (que é o outro nome dado ao princípio, assim como parcimônia) é também um conceito importante a bastante útil. Ele diz que na natureza, tudo é feito da mais forma mais simples possível para que o fenômeno aconteça (veja, que não é possível. Se for simples e não funcionar… não vale).
Como nos brinquedos (cujo nome genérico eu não sei) dos filminhos, tirados de um episódio de Arquivo X, a reação (o enforcamento em um e a cesta em outro) decorrentes da ação (acionar um botão) passam por uma infinidade de etapas intermediárias, que gastam energia e que são simplesmente inúteis. Sim, elas devem permitir algum nível de controle e de ajuste fino, não mas isso não explica o número enorme de etapas, o gasto de energia e nem o risco de erro em cada uma delas. Para mim a sinalização celular simplesmente não fazia sentido.
Até a palestra de Wolpert. Ele mostrou que gastamos 95% da nossa energia para produzir eletricidade. Sim, corrente elétrica. Mais uma vez, os robôs do Matrix estavam certos: nos alimentem e nos deixem quietos que nós iluminaremos o mundo! Transmissão de impulsos nervosos, contração muscular, pensamento… tudo isso depende de potenciais de ação, a forma primária de comunicação entre as células através das longas distâncias do corpo (proporcionalmente ao tamanho da célula). Com o tanto de energia que temos que gastar para levantar um copo ou para corremos 5 km em 30 min (meu melhor tempo até agora), a quantidade de ATP que gastamos nas etapas intermediárias da fosforilação nas diferentes cascatas de sinalização celular é irrelevante. Talvez por isso a ‘seleção natural’ nunca tenha se preocupado com ela.
Talvez a sinalização celular não seja tão simples como poderia ser, mas é tão econômica quando comparado a uma corrida no aterro de Flamengo, que isso nem importa.
Vamos afogar a Amazônia
Bom, parece que o governo tem medo do EIA-RIMA. Tanto que no dia 25/04/2007 anunciou o desmembramento do IBAMA, criando um novo instituto para cuidar apenas do licenciamento ambiental.
O órgão que fiscaliza e cuida do meio ambiente, criado por Sarney em sua gestão 85-90 cresceu em importância nos últimos 20 anos, assim como o ambiente para o país. É verdade que é atravancado como qualquer outro gigante estatal, e limitado por uma legislação que é ao mesmo nova e obsoleta (já nasceu cheia de problemas). Apesar disso, e da crescente preocupação com o ambiente em todo o mundo, Lula transforma o IBAMA no bode expiatório da sua frustrada empreitada pelo crescimento: o PAC (plano de aceleração do crescimento).
Eu dei aula muitos anos, e continuo dando, de Desenvolvimento sustentável. a primeira coisa que eu ensino é que não existe “Crescimento” Sustentável. Vivemos em um universo finito, o que se constitui em ecologia, para vários aspectos, um sistema fechado (no que tange entrada e saída de energia). Isso quer dizer que o crescimento contínuo levará, inevitavelmente, ao esgotamento dos recursos.
O primeiro recurso que irá se esgotar é a energia. Para que esse esgotamento não apareça enquanto ele for evitável, ou não for conveniente, parte importante do PAC é a construção de duas hidroelétricas no Rio Madeira: Jirau e Santo Antônio. Eu já estive em Santo Antônio (foto), acima de Porto Velho (RO) e já andei pelo Rio Madeira (vejam as fotos dessa expedição aqui). Li muuuuitos artigos de jornal antes de preparar esse texto.
É verdade que o Madeira é um dos maiores corredores de biodiversidade da amazônia, e por isso que a estória dos “bagres” serem a razão da negação da licença só mostra ingenuidade de quem faz essa acusação. Também é provavelmente verdade que o EIA está subestimando as áreas impactadas pelos lagos e pelo represamento dos rios, tanto no Brasil quanto na Bolívia e no Peru. Também é verdade que o Madeira não tem esse nome a toa: a água é cor de madeira (veja foto comigo ironizando o de caprio) por causa da grande quantidade de material em suspensão que inevitavelmente vai assorear o lago. É verdade ainda, que as audiência públicas foram insuficientes (eu tenho amigos que participaram delas) dadas a extensão da área e a importância do assunto.
Mas eu queria dizer um pouco mais do que esses muitos artigos. A idéia de um PAC é totalmente contrária a idéia de um Brasil moderno. Como podemos ter um plano de crescimento que prevê um aumento da capacidade energética da ordem de 3 MW por ano? Não há crescimento que dê conta disso! Com um plano desses estaremos sempre correndo atrás do Brasil do futuro, porque ele nunca vai chegar! Nós começamos essa corrida tarde, importamos tecnologias obsoletas, e investimos na idéia de um desenvolvimento industrial que desde os anos 50 não tem dado certo. Não vai ser agora que vai funcionar. Só pra vocês terem uma idéia, um professor da USP mostrou que 60% da energia que as duas usinas iriam produzir, e que o governo julga fundamental para que não haja risco de apagão em 2010, poderia ser obtida atualizando a capacidade (basicamente trocando as turbinas) de usinas existentes. Os outros 40% poderiam vir do melhoramento das redes de transmissão, que desperdiçam em torno de 15% da energia que transmitem.
O Brasil do futuro vai ser afogado em imensos lagos de hidroelétricas!
O Brasil moderno, mas também tradicional, deveria investir em industrias limpas, mas que também são a sua vocação: turismo e Biodiversidade. As companhias farmacêuticas sabem muito bem disso. Estima-se que apenas 30% das espécies da Amazônia são conhecidas. Por outro lado mais de 90% dos princípios ativos de medicamentos em todo o mundo vieram de vegetais. Outra grande parte de organismos marinhos (Apenas um menor percentual foi efetivamente inventado pelo homem). Ao invés do governo investir pesado em “conhecer para controlar” sua biodiversidade, fica querendo construir hidroelétrica no norte, para mandar energia para o sudeste (e centro-oeste, onde pretende construir uma siderúrgica no Pantanal).
Enquanto isso o ex-presidente da Celera Genomics, a companhia privada que sequenciou o genôma humano, corre o mundo em um iate filtrando água do mar para sequenciar o genôma de TODAS as bactérias do oceano. Mais do que desenvolvimento sustentável, é riqueza certa.
O Brasil faz tudo ao contrário e afoga a maior biodiversidade do planeta. Mas de novo, se só eu vejo isso, devo estar errado. Mas acho que não!
Por que meu quarto está sempre desarrumado?
A segunda lei da termodinâmica diz que nenhuma troca de energia é perfeita e sempre vai haver perda na transferência de energia de um elemento para outro. A energia se perde? Não, como vimos na primeira lei, a energia não se perde. Então como acontece essa perda? É uma perda de qualidade!
Ops, então quer dizer que energia tem qualidade? Exatamente, energia também tem qualidade. Existem energias que são mais úteis que outras. Energias com mais qualidade que outras. E como podemos medir a qualidade de uma energia? Pela sua capacidade de realizar trabalho. Bom… nesse momento eu realmente precisaria entrar na definição física de trabalho, que todo mundo já deve ter esquecido. Mas eu vou poupar vocês (e esse artigo que já está ficando teórico demais) da definição e vamos entrar direto na explicação.
Trabalho é a quantidade de energia gasta para tirar um sistema de seu estado inicial e levá-lo a um outro estado. Quando você aquece a água, esta levando ela do estado frio para o estado quente. Isso foi realização de trabalho. Um outro exemplo excelente para ilustrar trabalho e quantidade de energia é uma lâmpada incandescente. Quando acende uma lâmpada também está levando o filamento de tungstênio para um estado ativado, que emite radiação, fótons e calor.
A energia com menor qualidade é o calor, porque ele tem pouca capacidade de realizar trabalho. Energia elétrica e energia química são energias de alta qualidade. O calor só serve para gerar mais calor, para esquentar. Todas as outras coisas que precisamos fazer, como mover motores, precisam de energia com mais qualidade. Muitos motores são movidos a energia elétrica. Os motores biológicos do nosso corpo são movidos a energia química, armazenada nas ligações de fosfato da molécula de ATP.
Mas muitas vezes utilizamos energia de alta qualidade para realizar trabalho que poderia ser feito com energia de menor qualidade. Se você quer esquentar alguma coisa, deveria usar calor. Se usa energia elétrica (como em um forno, grill ou chuveiro elétrico) está desperdiçando energia.
Mas vamos voltar a 2 lei da termodinâmica. A energia pode ser armazenada e passar de sistema para outro. Transformamos a energia da água rio acima em energia elétrica quando ela passa pela turbina da hidroelétrica em direção rio abaixo. Essa energia elétrica é transportada e pode até ser armazenada em pilhas e baterias. Mas já que a transferência é imperfeita, sempre vai haver formação de calor e menos energia elétrica vai estar disponível.
Por isso, quando acontece uma reação, a quantidade de energia que é armazenada é sempre menor que a quantidade de energia que foi necessária para o armazenamento. Assim, quando essa energia armazenada é liberada, sempre vai ser liberada um pouco menos de energia do que estava armazenado. E assim por diante.
Estima-se que da luz do sol que chega a terra, apenas 1% é armazenado na forma de energia química pelas plantas. Muita dessa energia (luz), é verdade, é simplesmente refletida, mas outra parte, é perdida na forma de calor.
Para onde vai toda essa energia que é “perdida” e que vira calor? Para lugar nenhum, ela não se perde, fica por ai… dando bobeira pelo universo.
Isso tem algum significado especial? Sim, muito especial! Vamos lá, você já reparou que se seu quarto nunca se arruma sozinho, e se você deixar, ele vai ficando mais e mais bagunçado? Tenho certeza que sim. E quanto mais desorganizado, mais energia você vai ter de gastar para colocá-lo em ordem. Uau! Que frase linda.
E além de linda, te ensina mais física do que todo o seu curso do segundo grau: A organização e a ordem dependem de gasto de energia. Sem esse gasto… tudo vira desordem. O nome da desordem na física é Entropia! É essa energia que virou calor e anda por ai dando bobeira no universo.
A entropia tem muitas implicações no nosso cotidiano (como na história do quarto que não se arruma sozinho), mas a maior parte delas é técnica demais e vou ter que ir contando pra vocês aos poucos. Só que tem duas que eu posso adiantar: é por causa da entropia que o universo está em expansão. E é por causa dela também que nunca podemos reverter uma reação com a energia que foi gasta ou produzida pela reação.
E essa “irreversibilidade” tem um papel fundamental no tema do meu próximo texto: é por causa dela que o tempo passa!
Por que algumas mulheres (homens) só atraem homens (mulheres) malucos(as)?
Cientificamente, os homens fazem parte do grupo que chamamos de estrategistas ‘r’. O ‘r’ é minúsculo mesmo e representa o valor do coeficiente de crescimento exponencial de uma população que nunca chega ao equilíbrio. Mulheres são estrategistas K, maiúsculo, e representa o valor da constante de equilíbrio de uma população quando alcança a estabilidade, em uma outra equação. Essas duas estratégias estão relacionadas com utilização de energia. Não existe estratégia certa ou errada. Existem duas formas de alcançar o sucesso reprodutivo (e evolutivo) em longo prazo. Ambas são perfeitamente viáveis (o que é mais importante que serem ‘certas’ ou ‘erradas’). Isso se não tivessem de conviver juntas!
Evolutivamente, as fêmeas acharam por bem manterem seus ovos próximos a elas, já que o custo” energético de um ovo é extremamente alto para um predador qualquer se valer dele. Acabaram por manterem seus ovos ‘dentro delas. Isso trouxe uma vantagem seríssima para as fêmeas: seus filhotes são sempre seus! Ela nunca corre o risco de cuidar de um ovo que não seja seu! O que é importantíssimo, já que o custo de manter o ovo dentro do próprio corpo e depois ainda amamentar, no caso dos mamíferos, é muito elevado.
Todo esse ‘investimento energético na gestação, fez com que as fêmeas desenvolvessem mecanismos muito seletivos para a escolha do macho. Pra gerar um filho, não poderia ser qualquer um. Tinha de ser o mais forte e com sistema imune mais eficiente. Um macho que pudesse providenciar comida e abrigo para ela e o filhote. Bom, achar um macho assim, nem era difícil, o problema era convencer ele a topar essa proposta. Basicamente a proposta é: “Me dê casa, comida e roupa lavada, por que eu juro que o filho é teu!”. Mas muitas vezes… o filho não era.
Durante um mesmo período fértil, quando o macho dava uma escapada pra buscar comida, se aparecesse outro macho, mais viril, mais forte, mais bonito ou mais resistente a doenças, a fêmea não pensava duas vezes, e dava pra ele também (de acordo com alguns cientistas, a partir desse momento começa uma ‘guerra’ entre os espermatozóides dos dois machos, dentro das trompas da fêmea. Se você quiser saber mais pode ler o livro Sperm Wars: The Science of Sex de Robin Baker).
A questão é tão séria que define promiscuidade. Apesar de muitas fêmeas humanas terem diversos parceiros ao longo da vida, elas não são promiscuas, sendo o termo reservado apenas para aquelas que tem diferentes parceiros durante o mesmo ciclo ovulatório. Ou seja: aquelas que não podem garantir quem é o pai!
Os machos para não precisarem correr o risco de acreditar em suas fêmeas, desenvolveram uma outra estratégia. Como eles efetivamente nunca teriam certeza que seus filhotes eram seus, eles resolveram investir pouca energia neles, ou melhor, em cada um deles. Produziram muitos espermatozóides, mas muitos mesmos, células pequenas, simples e que não gastassem muita energia. E jogaram com a sorte: poderia ser que uma fêmea, duas, vai lá, três se ele fosse muito ferrado, poderiam encontrar um macho mais interessante depois de terem sido fecundadas por ele. Mas mais que isso… seria difícil. Como as mulheres sabem, não tem tanto homem interessante dando sopa por ai. Bom, os machos também sabiam disso (alias, melhor que as mulheres, por isso fazem um doce de vez em quando) e por isso, resolveram espalhar seus espermatozóides pelo maior número de fêmeas possível. Só assim, estatisticamente, seus genes seriam passados adiante. De uma forma, ou de outra. E como ainda por cima eles não tem interesse em investir energia na prole que não tem certeza de ser sua, precisam fecundar um número ainda maior de fêmeas, para aumentarem suas chances de terem uma descendência.
Parece machista? Terrível? Olhe a sua volta: peixes, aves, cães e gatos… todos fazem assim, só nós queremos ser diferentes.
Agora entra o argumento óbvio: Ahh… mas nós não somos cães e gatos! Nós somos inteligentes! Mesmo os seres humanos, viveram como animais no último 1 milhão de anos. Apenas nós últimos 4-5 mil anos, começamos a nos civilizar(?). Acreditem em mim, isso não é tempo suficiente pra seleção natural agir e mudar nossa biologia.
A natureza criou as mulheres exigentes e os homens descompromissados. As fêmeas exigem qualidade e prometem fidelidade, mas… traem! Os homens… bem, os homens só traem mesmo!
Não somos malucos, mas temos regras sociais que ditam uma coisa e hormônios que exigem outra. Uma equação difícil de resolver. Somos a primeira espécie que tenta apaziguar uma guerra evolutiva entre os sexos que dura milhões de anos. E estamos pagando o preço.
Mas isso não serve de desculpa para ninguém. Temos mesmo a inteligência e a cultura, e devemos fazer uso delas. Mas se resolvermos fechar os olhos para as questões biológicas (e abrirmos muito eles para os contos de fadas), corremos o risco, simplesmente de morrer tentando. Ou pior ainda, de não trepar!
PS: Pra quem estiver mais curioso sobre os aspectos científicos do sexo e dos relacionamentos, não deixe de ler o impagável “Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor” de Allan e Bárbara Pease. E pra quem estiver muito interessado mesmo nas questões biológicas mais intrigantes (Por que as mulheres mestruam? Por que os homens não amamentam?) podem tentar ler (por que é meio chato, apesar de super interessante) “Why sex is fun?” de Jared Diamond.