Bebida Alcoólica e Vacina contra Gripe A H1N1
O álcool não é um item imprescindível da alimentação humana. Há, acreditem, pessoas que passam a vida toda sem colocar uma gota de álcool na boca e vivem muito bem, até mais que os usuários crônicos da bebida. O excesso de álcool causa inúmeros males à espécie humana dentre os quais cirrose hepática, alterações neurológicas e psiquiátricas graves, sem contar a violência. Sou a favor da lei do Código de Trânsito Brasileiro que instituiu a alcoolemia 0 (zero) e impôs penalidades mais severas para o condutor que dirige sob a influência do álcool. Pelo número enorme de perguntas que recebi sobre a influência da ingesta alcoólica na vacinação contra gripe A H1N1, concluí que valia a pena escrever um novo post um pouco mais elucidativo. Aqui vai, então, minha tentativa de salvar os “bebuns” do meu Brasil!
Empreendi uma busca na Pubmed com os seguintes termos: alcohol consumption, alcohol ingestion, alcohol & immunization efficacy, immunization efficiency, immunization rate, vaccination, vaccination efficacy, vaccination efficiency, vaccination rate.
Achei dois estudos relacionados ao assunto que queremos saber, ambos em alcoólatras e sobre a vacina da hepatite B. São eles Rosman et al. Efficacy of a high and accelerated dose of hepatitis B vaccine in alcoholic patients: a randomized clinical trial. Am J Med (1997) vol. 103 (3) pp. 217-22 e Nalpas et al. Secondary immune response to hepatitis B virus vaccine in alcoholics. Alcohol Clin Exp Res (1993) vol. 17 (2) pp. 295-8. Os links mostram os resumos. A conclusão é que em alcoólatras a eficácia da vacina para hepatite B é menor. Ponto. Achei um estudo coreano que mostra que o número de pessoas que se vacinam para gripe sazonal é menor nos alcoólatras o que talvez indique um certo descaso patológico dos alcoólatras nessa situação específica. Curiosamente, a conclusão do estudo é que o fator mais importante para que uma pessoa se vacine é a indicação do médico.
Muitos profissionais de saúde, médicos, enfermeiros e agentes de saúde, recomendam a NÃO ingestão de álcool nos dias subsequentes à qualquer vacinação. As interações entre o álcool e as vacinas não são bem conhecidas e de fato, há estudos que mostram que a ingestão de álcool altera a imunidade desfavoravelmente. Além disso, os efeitos colaterais da vacina podem ser mascarados ou exacerbados pelo álcool, o que dificultaria um possível diagnóstico. Aliás, essas são as mesmas razões para não se vacinar estando-se gripado ou doente.
Achei também um documento do CDC (Centro de Controle de Doenças e Epidemiologia do governo americano) recomendando a não ingestão de álcool durante o período de vacinação, sem citar, entretanto, as razões para isso.
Em suma, acho bastante prudente esperar ao menos uma semana em abstinência alcoólica após a vacinação (isso não inclui abstinência sexual, gente!) apesar de não haver uma referência específica sobre o assunto (se alguém achar, por favor coloque nos comentários que, com certeza, vou ler e comentar). Vale a pena perder uma semaninha para poder tomar um vinho tranquilo no inverno que se aproxima, sem medo de pegar gripe suína.

Ciência e Poesia

Jorge Drexler – Mi Guitarra y Vos
“Os textos que dizem coisas de caráter prático ou mesmo cognitivo, tais como os textos técnicos e científicos, são mais ou menos assim, abertos e fluidos, pois, caso contrário, o que dizem acaba por deixar de ser verdadeiros, de modo que eles se tornam obsoletos e deixam de ser lidos, isto é, deixam de se concretizar.”
Esses textos são instruções. Têm o objetivo de levar um conhecimento ou técnica ao seu leitor. Esse é seu fim. Se a técnica muda ou o conhecimento perde de alguma forma seu valor, os textos, ato contínuo, se tornam descartáveis. A poesia e a literatura seriam então, textos não descartáveis. Para isso, seria preciso que não fossem um simples meio para que se transmita uma técnica ou conhecimento. A poesia e a literatura deveriam ser um fim em si mesmo, ou como escreve Cícero, “… textos que não estão sujeitos a esse tipo de descartabilidade são aqueles cujo valor – atenção: neste ponto, não há como não empregar juízos de valor – não depende de serem verdadeiros ou falsos”. Os textos literários pertenceriam “mais à ordem dos monumentos que dos documentos”, brinca Cícero, fazendo poesia.
Imediatamente, meu cérebro começou a procurar exemplos que contradissessem um de meus colunistas prediletos com aquele mesmo prazer mórbido dos alunos CDFs (acho mais legal que nerd) que tentam pregar peças nos pobres professores. Me perguntei então, se a poesia não poderia transmitir algum tipo de conhecimento ao invés apenas de permitir uma contemplação “monumental” ou se um livro ou artigo científicos não poderiam perenizar-se não pelo conhecimento seminal que proporcionaram, mas talvez, por um encadeamento de ideias elegante, uma condução cognitiva suave e especial que poderíamos, por que não, chamar de bela. Ao organizar assim meu pensamento, os exemplos enxamearam com o zumbido característico da abundância.
A crítica literária moderna trouxe esse tipo de pensamento à ciência. Contra um artigo somente outro artigo. Uns acham que isso é “pós-moderno” demais. Pode ser, mas acho bem mais divertido ver “conhecimento” em poesia e poesia em “literatura científica” que ficar procurando a Verdade em cada rodapé das coisas que leio. Separar as coisas como quer Cícero também é meio sem graça.
Se por um acaso, algum leitor quiser ilustrar com exemplos, por favor, a caixa de comentários está à disposição.
Foto Intense Science de nenonafirestardragonstrgteg1’s photostream at Flickr.

Nota do Ministério da Saúde sobre a Vacina contra Gripe A H1N1
Apesar de um atraso de mais ou menos 2 meses, que foi quando começou a boataria na internet e o começo da vacinação, o Ministério da Saúde finalmente divulga nota oficial desmentindo os mais “famosos” boatos sobre a vacina contra a gripe pandêmica A H1N1. A nota também cita, muito superficialmente, o fato de que alguns médicos se posicionaram contra a vacina. O caso mais grave foi o da Sociedade Brasileira de Diabetes na figura do Dr. Ney Cavalcanti. É lamentável que um texto com opiniões pessoais sobre um assunto com as proporções da pandemia que ocorreu no ano passado possa figurar no site de uma sociedade tão importante como a SBD.
Sobre a histeria da vacina, o post definitivo saiu no Ceticismo
Aberto. Não deixem de ler.
Aqui vai a nota na íntegra.
(E) Tome Vacina!
Hoje começa a vacinação de gestantes, crianças de 6 meses a 2 anos e a população com doenças crônicas e eu estou impressionado com o número de manifestações alarmistas e falsas, contrárias à vacinação para a gripe pandêmica. É uma desinformação completa em emails com vários tamanhos de fontes, cores diferentes e grifos escandalosos. Infelizmente, “parte da desinformação vem de médicos, incluindo infectologistas” afirmou um colega médico infectologista. Vou tentar responder algumas perguntas do outro post e desfazer algumas falácias mais frequentes nesses emails criminosos.
O ESCALENO
O Escaleno [1] é um adjuvante usado nas vacinas da Novartis e GSK e tem sido usado nas vacinas da influenza sazonal em idosos desde 1997. Na Europa, aproximadamente 45 milhões de doses de vacinas contendo escaleno foram administradas. Segundo o relatório da ECDC, o escaleno é uma substância natural encontrada em plantas, animais e humanos. Faz parte do metabolismo do colesterol e é um componente da membrana das células. É fabricado no fígado e circula no sangue normalmente. Entre 60-80% do escaleno ingerido na alimentação é absorvido no trato gastrointestinal sendo encontrado comercialmente em preparações como óleo de peixe – que é usado em produtos farmacêuticos ou ingerido in natura -, cométicos, inúmeras medicações e suplementos nutricionais.
Alguns veteranos de primeira guerra do Golfo desenvolveram o que se convencionou chamar de Gulf War Syndrome e anticorpos anti-escaleno foram encontrados nesses pacientes levando a acreditar em uma possível relação causal entre o escaleno que estaria na vacina contra Antrax que os soldados usavam e a síndrome (veja mais aqui). Entretanto, essa relação não foi demonstrada, sendo descartada em detrimento a inúmeras outras como gás sarin, pesticidas organofosforados, brometo de piridostigmina, entre outros.
Segundo alguns médicos, uma das fontes de dúvida é que parece estar havendo um embate EUA vs Europa/OMS. Os primeiros não estão usando escaleno como adjuvante na vacina para Influenza A H1N1 enquanto os europeus o estão utilizando. Compare só as informações das páginas do CDC: “There is no plan at this time to recommend a 2009 H1N1 influenza vaccine with an adjuvant” com a página da OMS: “Over 22 million doses of squalene-containing flu vaccine have been administered. The absence of significant vaccine-related adverse events following this number of doses suggests that squalene in vaccines has no significant risk.” A vacina Sanofi-Pasteur/Butantã não contem escaleno. Como já dito, as vacinas da Novartis e GSK contém o adjuvante.
ALERGIA A OVOS
Me perguntaram se uma criança alérgica a ovos pode tomar a vacina. A pergunta procede porque os vírus vacinais são propagados em ovos. A resposta do CDC:
“Perguntar se a pessoa tem algum efeito após comer ovos ou alimentos preparados a base de ovos é um bom método de saber quem pode ter riscos ao usar a vacina. Pessoas com sintomas como chiados, vergões pelo corpo, inchaço nos lábios e língua e desconforto respiratório após ingerirem ovos e derivados, devem consultar um médico para uma avaliação apropriada. Pessoas que têm a hipersensibilidade às proteínas do ovo documentada (dosagem da IgE), incluindo as que têm asma ocupacional associada à exposição à proteína do ovo, também podem ter risco aumentado de desencadear reações alérgicas à vacina contra influenza e uma consulta com um médico antes da vacinação deve ser considerada.” Há estudos mostrando ser seguro aplicar a vacina da influenza sazonal – que tem o mesmo processo de fabricação – em crianças. Recomendo fortemente uma consulta ao médico responsável pela criança para avaliação da relação risco/benefício em se tomar a vacina sendo alérgico à proteína do ovo.
QUEM JÁ TEVE H1N1 DEVE TOMAR VACINA?
Só quem teve a gripe A H1N1 confirmada em reações sorológica (rRT-PCR) pode ser considerado imune à gripe pandêmica. Se a pessoa “acha” que teve a gripe, deve consultar o médico que a assistiu para se certificar se as sorologias corretas foram realizadas e que o diagnóstico foi confirmado. Na dúvida, tomar a vacina não causa nenhum mal, pois não foram descritas reações em pessoas que já tiveram a doença.
O MEDO
É a tônica desse processo de vacinação. As vacinas compradas pelo governo (que aliás está tendo um comportamento muito bom, apesar de todas as críticas e erros), foram de fontes diferentes e têm componentes diferentes. Não há truque. Não há tentativa de enganar as pessoas. Não há intenção de exterminar a raça humana da terra com as vacinas! Eu gostaria muito de uma vacina que exterminasse a desinformação e propiciasse o uso da racionalidade como guia, mas essa ainda vai demorar para ser fabricada e mesmo que fosse, ia ser uma “briga” enorme para vacinar todo mundo: as pessoas preferem ter medo de fantasmas.
[1] Lippi, G., Targher, G., & Franchini, M. (2010). Vaccination, squalene and anti-squalene antibodies: Facts or fiction? European Journal of Internal Medicine, 21 (2), 70-73 DOI: 10.1016/j.ejim.2009.12.001. (Baixe o artigo clicando na figura).
[2] Para saber mais sobre o escaleno (ou esqualeno) veja o post do Brontossauros.
Perguntinha Brega


Uma Propaganda que Vale a Pena
A Hybrid Medical Animations é uma empresa de computação gráfica especializada em animações médicas. Existem várias desse tipo, mas eu fiquei especialmente intrigado com a qualidade e principalmente, conceitos fisiopatológicos envolvidos nesse demo divulgado no site. Vou tentar “irradiar” o filme – tal qual jogos de futebol transmitidos pela internet (eu sei que é horrível, mas fazê o quê?). Sugiro assistir o filme todo (3:10 min) e depois, com calma, entender cada um dos passos. Vamos lá:
00:00 – 00:10 Tudo começa com um lindo olho azul. Hehe
00:14 Aparece um coração que eu achei feio. A própria Hybrid tem um coração de vidro bem mais legal.
00:23 – 00:33 Aparece uma plaqueta (em azul) e, numa tomada mais alta, um trombo. Os fiapos são fibrina.
00:34 Uma válvula cardíaca (que acredito ser atrioventricular; tem as aórticas também).
00:41 Aparece o que eu acredito ser uma superfície de membrana celular com receptores acoplando-se a fármacos.
00:54 Não sei bem o que é a representação depois. Quem souber, ajude.
01:04 Parecem colônias de bactérias reproduzindo-se em camera rápida.
01:07 Eletrodos epicárdicos. Um estabilizador de coronária. Imagem simplesmente perfeita.
01:14 Pode ser uma secreção de alguma proteína de anticorpos (azul) e depois algo brotando que não parece ser médico (botânico?) a princípio.
01:24 – 2:00 Aqui você entra em uma coronária. Agora começa a emoção. Após ver passar umas pouquíssimas hemáceas, plaquetas e glóbulos brancos (isso não tem nada a ver com a realidade – o número seria bem maior), você se defronta com uma placa de colesterol que logo se rasga. Plaquetas (azuis) aderem ao local e ficam “peludas”, ativadas por substâncias provenientes da placa. Um trombo se forma e obstrui a coronária. Entra em cena um cateter que tem um tipo de rede na ponta. É o stent. Ele é colocado no local e esmaga a placa abrindo a luz da artéria e mantendo-a aberta (isso não é mostrado). A imagem que se segue é muito bonita. Mostra a trama do stent sendo recoberta por plaquetas que o consideram “estranho” ao organismo. Depois de um tempo, uma reação inflamatória ocorrerá no local e pode obstruir o stent. Por isso, alguns stents são recobertos com substâncias que inibem a proliferação celular e retardam essa obstrução. Também por isso, é necessário tomar medicações antiagregantes plaquetárias.
02:01 – 02:14 São umas bolhas azuis que, sinceramente, não consegui identificar.
02:15 – 02:20 Um procedimento intramedular.
02:21 – 02:26 O tal eletrodo cardíaco. O estabilizador de coronária. Parece representar uma desfibrilação. 02:27 – 02:44 Acho que eles quiseram representar células brancas do sangue.
02:45 – 03:10 Finaliza com uma belíssima imagem de um leucócito fagocitando bactérias. Eu achei interessante. Se houver discordâncias das imagens ou sugestões, por favor deixem-me saber.
(Agradecimentos sinceros a Kentaro Mori e Gabriel RNA_m)

Esclarecimentos sobre a Vacina para Gripe A H1N1
Essa semana fiquei surpreso com o número de pessoas, inclusive médicos, que estão inseguros em relação à vacinação para a gripe pandêmica. Por isso, mais um post sobre a vacina. Espero não estar torrando a paciência de vocês. Vamos lá:
Existem vários tipos de vacina para a gripe A H1N1. Segundo o Ministério da Saúde, a Organização Pan Americana de Saúde (OPAS) fornecerá 10 milhões de doses para o Brasil. O Governo já havia comprado, em novembro de 2009, o primeiro lote de vacinas com 40 milhões de doses fornecidas pelo laboratório Glaxo Smith Kline (GSK). Além disso, encomendou 33 milhões de doses ao Instituto Butantan que as fabricará segundo transferência de tecnologia negociada com o laboratório Sanofi-Pasteur. A vacina que eu tomei foi essa, Butantan-Sanofi Pasteur de vírus inativado da cepa A/California/7/2009 (H1N1)v, propagada em ovo, com 15 μg de hemaglutinina por dose plena. O tipo de vacina também é um dos determinantes do esquema de vacinação proposto pelo Governo.
O que são os adjuvantes?
Os componentes da vacina além dos vírus inativados estão dando o que falar. Em especial devido a “correntes” totalmente desinformadas que circulam por meio de spams nos emails por aí. Vamos às informações: Os adjuvantes são substâncias que aumentam a imunogenicidade da vacina. Em tempos de pandemia, a quantidade de vírus disponíveis é um fator limitante e os adjuvantes aumentam a capacidade de produção da vacina em 100 a 200%. Mesmo assim, isso pode não ser suficiente. Há dois tipos principais de adjuvantes: o esqualeno e os sais de alumínio. A vacina Butantan-Sanofi Pasteur não tem nenhum dos dois. A vacina da GSK tem o AS03, o esqualeno e ainda outro agente imunogênico, o tocoferol (vitamina D). Os adjuvantes foram testados na fabricação de vacinas da gripe sazonal e da H5N1.
Timerosal, ou em inglês, thiomersal, é o nosso antigo mertiolate. É uma tintura de mercúrio orgânico com poderes antimicrobianos quando usado tópicamente. Foi retirado do mercado por causar uma ardência enorme nos ferimentos abrasivos e pela necessidade de retirada gradual dos produtos à base de mercúrio por razões ambientais. O timerosal é usado nas vacinas na manufatura e para evitar a contaminação do produto final. A vacina pandêmica tem mais ou menos 2,5 a 50 μg timerosal por dose como preservativo. O timerosal contem 49,6% de mercúrio (ou seja, 1,25-25 μg de mercúrio por dose). Essas doses são consideradas baixas e aproximadamente 1/4 da ingestão máxima diária para uma pessoa de 60 kg. Muitas pessoas, inclusive alguns vizinhos meus, são alérgicos ao timerosal. E agora? Podem tomar a vacina ou não?
Segundo o relatório abaixo [2] e um especialista em vacinação que consultei, as alergias de contato ao timerosal NÃO contraindicam a vacinação. Existem tipos raros de alergia ao composto nos quais o paciente apresenta sintomas sistêmicos, por exemplo, angioedema (inchaço na boca e face), broncoespasmo (chiado no peito), urticária (vergões na pele). Nesse caso, a alergia é mais importante e a vacina está contraindicada. Na dúvida, é sempre melhor perguntar ao seu médico.
Essa vacina, afinal, é segura?
Vou citar o relatório novamente: “Baseado em informações recebidas de 16 países, a OMS estima que por volta de 80 milhões de doses da vacina pandêmica foram distribuídas e aproximadamente 65 milhões de pessoas foram vacinadas. Campanhas de vacinação globais têm se utilizado de vacina com e sem adjuvantes, com vírus atenuados e inativados (este último grupo não licenciado na Europa). Apesar da intensa monitorização sobre a segurança das vacinas, todos os dados compilados até o momento, indicam que as vacinas pandêmicas gozam do mesmo excelente perfil de segurança que as vacinas sazonais, as quais tem sido utilizadas por mais de 60 anos.”
Nesse ponto, acho que fomos beneficiados por estarmos no hemisfério sul. Dessa vez, testaram lá antes.
[1] Atmar RL, & Keitel WA (2009). Adjuvants for pandemic influenza vaccines. Current topics in microbiology and immunology, 333, 323-44 PMID: 19768413
[2] European Centre of Disease Prevention and Control. [link]
Figura retirada daqui.
Atualização
Várias perguntas feitas nos comentários foram respondidas no novo post. Por favor, deem uma checada para não nos tornarmos repetitivos, ok?
Hoje Começa a Vacinação contra a Gripe A H1N1
No Hospital das Clínicas, eu quase fui filmado pela Globo!! (Te cuida, Tiago Lacerda). Tomei minha vacina e recomendo a todos, que não tiveram gripe suína, a tomar também. Segue a medaglia da campanha. Vou deixar no Blogroll.


Mais Vacinas
Quando a epidemia de gripe começou, escrevi sobre como ela causava a morte. Basicamente, o quadro é pulmonar. Um grupo de pesquisadores resolveu fazer uma pergunta bastante interessante e importante: bem, já que temos vacinas eficazes para o pneumococo – um dos principais germes causadores de infecções respiratórias graves -, será que a vacinação contra esse germe teria impacto na mortalidade por gripe suína?
O resultado saiu publicado na BMC infectious diseases [1]. É uma ideia há muito perseguida por um dos autores (Klugman) que tem inclusive uma publicação na Science sobre o tema. Apesar da metodologia ser um modelo teórico e apresentar as limitações inerentes a esse tipo de metodologia, foi possível demonstrar uma diminuição no número de infecções secundárias à gripe e, consequentemente, na mortalidade geral atribuída à epidemia. Interessante notar que o período da exposição ao pneumococo em relação ao vírus da gripe parece ser crítico, ao menos em camundongos: se o indivíduo entre em contato com o pneumococo ANTES da gripe, não parece haver aumento da mortalidade. Se a exposição é concomitante, um risco intermediário ocorre. Mas é grandemente aumentado se a exposição ao pneumococo ocorre 7 dias após a gripe. Aventa-se que a base biológica para isso seria o γ-interferon, que tem um pico em camundongos em 7 dias e facilita o clareamento das bactérias pelos macrófagos alveolares.
Isso justifica o conselho de nossas avós de que, após uma gripe forte, não vale a pena ficar se expondo. Parece também corroborar o dito popular de que uma gripe pode “se transformar” em uma pneumonia. Por fim, parece que não é má ideia a vacina para pneumococo na vigência de uma epidemia de influenza. A vacina desse modelo é uma vacina heptavalente produzida por um grande laboratório e os pesquisadores todos são consultores pagos, exceto um, que é funcionário da empresa. Independentemente disso, o racional para o modelo é muito forte. Eu costumo recomendar a vacina contra infecções pelo Streptococus pneumoniae (o pneumococo) a pacientes com problemas respiratórios normalmente. A vacina vale por 5 anos. Confesso que estou propenso a indicar mais essa vacina com o inverno que se aproxima.
[1] Rubin JL, McGarry LJ, Klugman KP, Strutton DR, Gilmore KE, & Weinstein MC (2010). Public health and economic impact of vaccination with 7-valent pneumococcal vaccine (PCV7) in the context of the annual influenza epidemic and a severe influenza pandemic. BMC infectious diseases, 10 PMID: 20092638

Emoções e a Vacina da Gripe A H1N1
O inverno foi turbulento no hemisfério norte. Não pelas nevascas, nem pelas alterações de temperatura, mas muito mais no que concerne às políticas relacionadas à pandemia da gripe suína. A OMS, em meio a acusações de interferências da BigPharma em suas decisões “pandêmicas”, prepara um pronunciamento cuidadoso sobre a “segunda onda” para não “baixar a guarda dos governos” (sic). Vacinas sobram nos países e os governos não sabem o que fazer com elas. Alguns doam. Pouca gente fala da “nova” gripe e a sensação é de “fim-de-festa”.
O argumento é que a epi(pan)demia não foi o que esperávamos, principalmente no que se refere à letalidade. Como não foi? Caríssimos leitores, o inverno de 2009 foi um dos períodos em que mais trabalhei na minha vida! Eu vi o bicho de frente. Insisti nas hipóteses não catastrofistas por acreditar (e saber) que gripe sazonal mata pra caramba também, além de dengue, febre amarela, malária e outras cositas desse meu Brasil varonil. Mas o negócio não foi brinquedo, não! Gente doente + Paranoia = Caos! Tentativas de respirar e pensar com calma foram vistas como peleguismo a favor do ministério da saúde. Teorias conspiratórias, informações desencontradas, médicos, autoridades e pessoas batendo cabeça, formaram um cenário patético com uma real sensação de fim-de-mundo! Apesar da letalidade da nova gripe não ser comprovadamente maior, sim, existiam perguntas que ainda precisariam ser respondidas. A principal delas é que trata-se de um vírus desconhecido ao qual os seres humanos são extremamente suscetíveis. E assim terminamos 2009.
E eis que surge a vacina. Não que eu esperasse fogos de artifício, banda na rua, feriado nacional, mas também não precisava ser surpreendido por uma enxurrada de questionamentos sobre “quais os argumentos racionais temos para se tomar a vacina contra gripe A H1N1”! Descobri que médicos de outros países passaram pelo mesmo problema. Fiquei pensando bastante sobre isso e conclui que: o principal argumento racional para se tomar a vacina é a própria irracionalidade com que a epidemia foi enfrentada no inverno passado! Ou as pessoas vão querer passar pelas mesmas aflições? A vacina tem problemas? Tem. Como qualquer vacina! Ou vamos deixar de tomar a dupla adulto a cada 10 anos ou parar de vacinar os pequenos em função de seus efeitos colaterais? Mas que raio de raciocínio é esse? “Não vou tomar a vacina porque é nova e não sei exatamente de seus efeitos”. Mas essa é a mesma razão do porque a gripe A H1N1 é perigosa”: é nova e não sei de seus efeitos! Talvez a médica americana que escreveu isso tenha mesmo razão: “The dramatic shift in public sentiment over the course of this H1N1 epidemic is both fascinating and frustrating. It is clear that there is a distinct emotional epidemiology and that it bears only a faint connection to the actual disease epidemiology of the virus.” Epidemiologia emocional diferente da real. Nem desespero na época da epidemia, nem descaso agora, por favor! Um pouco de temperança (à época da epidemia) e de prudência (agora) não fariam mal.
Volta e meia, alguém me chama de “véio” carinhosamente no Twitter. Se ser velho é ficar, um pouco que seja, intolerante, acho que eles têm razão. Eu vou tomar vacina e dar aos meus filhos.
Para ler mais:
1) Portal da Bireme sobre H1N1.
2) Portal da OMS. (inglês)
3) FAQs do CDC sobre vacinação da gripe suína. (inglês)
4) Sobre a utilidade da vacinação (em francês).
5) Informações do Ministério da Saúde.
