'Outliers' e 'Outsiders'

Toda aquela coisa para explicar a normalidade, foi com o intuito de relaciona-la com a previsibilidade. Em muitas situações não temos previsibilidade e quando isso acontece, quase sempre, é por causa da falta de normalidade dos dados. Terminei o texto sobre alando de como fazer para lidar com os anormais. Anormais, no sentido estatístico, são os assimétricos.
A questão curiosa é que, quem define a normalidade de uma dado, não é o dado em si, mas a distribuição a qual ele pertence. Na festa dos joqueis, os jogadores de basquete são anormais, no festa dos jogadores de voley, nem tanto.
Dependendo de com quem ele ande, um determinado dado, será sempre normal.
Se você é muito crítico, como eu sou, a curva normal que descreve o mundo é relativamente estreita, concentrada. Ou, estaticamente falando, leptocúrtica. Essa curva forma um sino muuuuito alto e muuuuito estreito. Na verdade mais parecido com um gramofone que com um sino. Conheço muita gente na média, e considero um monte de gente fora dela também. Eu juro que estou tentando mudar isso. Tornar a minha curva mais mesocúrtica (um sino normal) ou até mesmo um pouco platicúrtica (um sino achatado, quase como uma ondulação, onde tem quase tanta gente nas extremidades quanto na média). Que nem uma campainha de mesa.
Cada um de nós tem sua descrição normal do mundo, e tenta encaixar tudo que encontra nessa descrição. Para que o mundo se torne previsível e confortável. E é possível encaixar alguma coisa na distribuição normal? É sim.
Um ponto que está fora da distribuição é chamado de ‘outlier‘. Fora da linha. Tenho uma amiga que gosta de pessoas (mais do que de dados), e nesses casos ela usa o termo de Outsiders: os excluídos.
Estatisticamente, existe um conjunto de artifícios matemáticos para lidar com os outliers e encaixa-los na distribuição normal. Esses artifícios são chamados, convenientemente, de transformações. O logaritmo, por exemplo, é uma função que diminui a discrepância entre duas coisas diferentes. Por isso, é possível utilizar o log em um determinado dado para que ele se encaixe na sua distribuição.
Parece doidera, não é? Transformar um dado apenas para que ele se encaixe no que você conhece e possa entende-lo?
Mas é porque não? Você pode calcular o log de um número e o número de volta, quantas vezes quiser. O log e o número permanecem sempre o mesmo. E por que você faria isso? Porque pode ser mais fácil entender a relação entre o log de dois números do que entre os dois números em si. Principalmente, se os logs se comportam de forma… normal.
A vida reserva surpresas e muitas coisas novas também. Felizmente! Nossa primeira tendência, como falei aqui, é tentar encaixar algo novo nas categorias das “coisas que conhecemos”. Quando elas não se encaixam, tentamos dar uma ‘transformada’ nelas. Uma outra amiga chamaria isso de ‘enfeitar’.
Mas o que o cientista dentro de todos nós deveria aprender a fazer? Procurar a ferramenta mais adequada para lidar cada nova coisa nova. Criar essa ferramenta, se for necessário. Existe uma distribuição normal, simétrica. Mas existem muito mais distribuições assimétricas. E apesar das formas de lidar com elas sejam menos eficientes do que as paramétricas, você não precisa transformar nada. Nem ninguém.
Isso é trabalhoso, é cansativo. Mas como tantas coisas trabalhosas e cansativas, tem grandes recompensas. Então o problema não é esse, o problema é quando isso é impossível.
PS: A idéia e alguns instrumentos para a discussão da normalidade vieram de uma das muitas conversas com minha querida amiga e bióloga Cris.
Quantas vezes o Vasco ainda vai perder do Botafogo?
Uma das coisas que me irrita nas transmissões de futebol são as estatísticas. Só perdem pro Galvão Bueno.
“Desde 1932, Vasco e Botafogo se enfrentaram 763 vezes, com 22% de vitórias para um, 44% de empates e 34% de vitórias para o outro”. Não, não sei se esses são os números corretos. Está tarde e estou com preguiça de procurar. Mas não importa.
E não importa porque, nesse caso, essa estatística não se aplica!
A probabilidade pode ser calculada para eventos repetitivos. Um dado sendo jogado muitas vezes permite apenas um determinado número de possibilidades, eventos, que se repetem exaustivamente. Esse é um evento repetititvo, onde todo o universo de possibilidades é conhecido.
Mas mutios outros eventos, a maioria dos eventos da vida real, não são repetitivos e as probabilidades associadas a eles não dependem de quantas vezes você repete, mas sim da aquisição de novas informações.
O fato de chover todo o dia 15 de junho nos últimos 23 anos, não define nenhuma probabilidade de que va chover hoje. As massas de ar, pressão atmosférica, temperatura, umidade… isso sim, pode te ajudar a decidir se vai sair com guarda chuva ou não
“O Botafogo não perde para o Vasco há mais de 10 jogos”
Essa parece uma estatística um pouco melhor. Porque os times devem ser os mesmos, assim como os técnicos, táticas de jogo… Mesmo assim, basta um jogador torcer o pé, outro comer feijão demais que… acaba toda a ‘repetibilidade’ do evento.
As estatísticas furadas são mais um motivo para você desligar o som da TV quando está assistindo futebol. Elas não ajudam a prever… NADA! E com isso só posso torcer para que a maré de sorte do Botafogo termine logo!
Aprender o quê?
“O que aconteceu (…) faz parte de um grande fracasso geral. No tempo de meu pai, quem fracassava era o indivíduo. Agora é a disciplina. Ler os clássicos é muito difícil, por isso a culpa é dos clássicos. Hoje o aluno afirma a sua incapacidade como um privilégio. Eu não consigo aprender essa matéria, então essa matéria deve ter algum problema. E deve ter algum problema o professor que resolve ensiná-la. Não há mais critérios, senhor Zuckerman, só opiniões”
O trecho transcrito do livro A Marca Humana de Philip Roth verbalizou o que tenho pensado ultimamente quanto aos meus alunos. Em geral!
A aceitação do fracasso está virando a regra. Quem quer ser mais, se esforça mais, consegue mais está “inflacionando” o mercado. Admiram os colegas mais esforçados e dizem… ‘Se eu fosse inteligente como ele…’
O problema é que é tudo mentira. Uma falsa humildade disfarça a arrogância escondida por debaixo da pele. Como um lobo coberto de cordeiro, pra se dar bem com as ovelhas e se esconder dos outros lobos. Lobo que é lobo veste a pele!
De nada adianta inventar novos cursos. As evasões são altíssimas! Os alunos duvidam do professor. Questionam a própria necessidade do ensinar, já que existem tantas fontes de saber. Querem criticar o conteúdo, a forma, a avaliação, mas todo seu embasamento foi conseguido em meia hora de pesquisa no Google. E se não está lá, no ‘oráculo’, então não existe! Que fracasso. Que fracassados!
O problema está na falta de vontade de aprender e não no aprender o quê.
Falta água, falta luz, falta verba, falta bolsa, falta material, falta computador, falta mesa, falta espaço. Falta, é verdade. Mas tudo isso se torna desculpa para justificar a dificuldade e o fracasso. Falta tempo, falta interesse, falta tesão, falta coragem, falta orgulho, falta amor.
Não, tem um fracasso pior do que não querer aprender, é achar que ninguém tem nada à aprender!
O que é a normalidade?

Alguns termos realizam todo o seu sentido apenas a luz da estatística. “Significativo” por exemplo, é um termo estatístico. Dizer que a diferença entre duas coisas é significativa, é dizer que a alteração (aumento ou redução) nessa grandeza foi testada com uma probabilidade de erro conhecida. Digamos, minha chance de estar errado é de… 5% (estatisticamente, essa é uma probabilidade aceitável de estar errado).
A mesma coisa serve para a normalidade. O termo “normal” certamente apareceu antes do seu significado estatístico, mas apenas na estatística ele se realizou plenamente.
Uma característica normal é aquela que se distribui em uma população seguindo uma curva gaussiana. Ops, compliquei. Refraseando, curva em forma de sino. Como na figura abaixo. Mas o que essa curva em forma de sino quer dizer?
Imagine que você pudesse medir a altura de todos os seus amigos. A não ser que você goste de sair por ai apenas com a galera do time de basquete, alguns poucos amigos devem ser muito altos. Da mesma forma, se seus outros amigos não são jóqueis, então outros poucos devem ser muito baixos. Alguns um pouco menos altos e outros um pouco menos baixos. Se você calcular a média (ah… esse sim é um termo estatístico que todo mundo conhece), vai descobrir que a maior parte dos seus amigos tem uma altura próxima ao valor da média. Vamos fazer um gráfico disso (minha namorada pergunta se eu vou desenhar pra ela entender melhor)?
A maioria das coisas que pode ser medida continuamente em uma escala, quando a gente avalia em uma população grande, apresenta uma distrubuição com essa forma de sino. E por isso, essa distribuição é chamada normal. Por que é normal que seja assim!
Mas a distribuição normal tem outras características importantíssimas. Ela é paramétrica: o lado direito da curva é igual ao lado esquerdo. Ou, da “média para baixo” é igual à “da média para cima”.
Já sei, você nunca gostou de matemática, não está entendendo onde eu quero chegar, e está quase desistindo. Mas enquanto a matemática tenta colocar tudo em números, a estatística quer explicar o mundo. E isso aqui é estatística. Me dá mais 1 min…
A questão é que o fato da curva ser paramétrica torna possível fazer um monte de… previsões (ahh… agora que eu falei em previsões, vocês gostaram, não é mesmo?!). Acordar, comer, cagar, ir pro trabalho, voltar pra casa… as vezes parece que nada muda. Todas essas são coisas “normais” e justamente porque não mudam, são previsíveis.
A normalidade está totalmente ligada a previsibilidade. Algo imprevisível… é anormal. Pelo menos a luz da estatística.
Essa previsibilidade da curva Gaussiana, permitiu o desenvolvimento de um monte de “ferramentas” estatísticas muito poderosas para estudar as variáveis que apresentam características normais. A média é uma dessas poderosas ferramentas. Fácil de calcular, muito descritiva e, principalmente, muito intuitiva. Todo mundo entende o que a média quer dizer.
O problema é que essas ferramentas só se aplicam aos dados com distribuição Gaussiana. Traduzindo: A média só pode ser usada no que é normal! E, apesar da altura dos seua amigos apresentarem uma distribuição normal… aposto que nem eles todos eles são.
E como fazer para lidar com as coisas (e amigos) que não são normais? Essa pergunta eu deixo para outro texto!
Quem (se) importa?
Vocês conseguem ver alguma coisa ai em cima? Pois é, nem nós! Então achei que se fazia necessária a compra de um microscópio decente pro laboratório. Passamos as últimas duas semanas procurando um modelo que atendesse as nossas necessidade e ao nosso bolso e, depois de verificar os preços astronômicos dos fabricantes americanos e europeus, conseguimos chegar a um fabricantes chinês, bastante elogiado (MOTIC) que tinha o microscópio que queríamos (modelo AE31; invertido, preparado para epi-fluorescência e como camera de vídeo).
Pedimos um orçamento e o valor girava em torno dos USD 5.000,00. Um site nos EUA anunciava o mesmo produto por USD 7.890,00. Ligamos para o representante nacional e qual não foi a nossa surpresa ao descobrir que o mesmo produto custava no Rio de Janeiro R$ 50.000,00!!! Com essa quantidade de encargos e impostos, não há parco orçamento de pesquisa que resista.
Saiu hoje uma nota na coluna da Márcia Peltier no Jornal do Comércio citando o drama. Clique na foto para ver a imagem ampliada.
Transcrevo pra vocês a nota:
“CÂMBIO: Pesquisador da UFRJ, Mauro Rebelo levou um susto quando fazia cotação para comprar um microscópio da chinesa Motic, para pesquisa de contaminação ambiental. Na China o equipamento é comercializado por US$ 5 mil. Nos EUA, por cerca de US$ 7 mil. No Rio, sairia por R$ 50 mil. Por essas e outras, a comunidade científica se mobiliza para entregar um relatório para o ministro Sérgio Rezende sobre as dificuldades de importação.”
Desde o ano passado faço parte de uma comissão, juntamente com a ONG Movitae e a Associação Brasileira de Ciências da Vida (dos fabricantes e representantes de material para pesquisa) para facilitar os procedimentos de importação do país.
Cavando pouco, muito pouco, descobrimos que o buraco é embaixo. Muito mais embaixo. Coisa pra dar CPI.
Enquanto isso, minha aluna de iniciação científica tem de usar a visão além do alcance pra ver as células de ostra do trabalho dela.
Sangue bom!
Em 2000, esse mesmo grupo já havia publicado um estudo parecido, mostrando que os brancos (ou caucasianos), que segundo o IBGE representam um pouco mais de 50% da população brasileira, têm sangue materno de origem indígena ou africana. Mas praticamente não existem genes negros e índios de origem paterna. Os nossos pais ancestrais são quase todos europeus.
Para fazer esses estudos, são examinados segmentos do DNA que são altamente conservados de geração para geração, ao mesmo tempo que são específicos em diferentes grupos, chamados “Marcadores genéticos”. O DNA está dentro do núcleo da célula, geralmente na sua forma desorganizada, chamada eucromatina. Quando a célula vai se dividir, então o DNA se organiza em cromossomos. Todos os seres humanos possuem 23 pares de cromossomos: 22 cromossomos autossômicos e 2 cromossomos sexuais. As mulheres possuem dois cromossomos sexuais X (portanto XX) enquanto os homens possuem um X e um Y.
Daqui poderíamos partir para vários pontos. Da mesma forma que se tirarmos uma perninha do X ele pode virar um Y, a teoria mais aceita é de que o cromossomo Y realmente se originou da perda de material do X (mais uma evidência de que ambos os sexos se originaram do sexo feminino). “Imprint Parental” que determina se é o material genético herdado da mãe ou do pai que vai determinar uma característica, é uma das muitas nuances que temos entre o nosso material genético e nossas características físicas e psicológicas. Nas mulheres, existe a teoria de que os dois cromossomos X “lutem” para determinar quem vai controlar quais características. E seria por isso que as mulheres NUNCA conseguem se decidir!
Mas para voltarmos a questão da descendência é importante lembrar que se apenas os homens possuem o cromossomo Y, então, ele passa sempre de Pai para filho (e nunca de pai para filha). Com isso, o meu cromossomo Y é praticamente identico ao do primeiro macho ancestral da minha árvore genealógica. Assim como o seu, caso você seja um “ele”, é do macho ancestral da sua árvore. O cromossomo X passa de mãe para filha, de mãe para filho e de pai para filha. Com isso, tudo vira uma bagunça e é impossível fazer um rastreamento da mãe ancestral através do X.
Mas as mulheres tem seu trunfo. Durante a fecundação, apenas a cabeça do espermatozóide que contem o DNA do macho, é utilizada para fecundar o óvulo (a cauda do sptz fica do lado de fora). Assim, o macho contribui apenas com o material genético. Todo o “aparato celular” do zigoto é feminino. Por aparato celular, podemos entender toda a maquinária bioquímica da célula: ribossomos, aparelho de golgi, retículo endoplasmático e as mitocôndrias. As mitocôndrias, todo mundo já ouviu no 2o grau, são a “usina elétrica” da célula, queimando carbono para produzir energia.
A teoria mais aceita ainda hoje é de que essas organelas eram bactérias simbiontes em um passado muito, muito remoto. E uma das evidências mais fortes para essa explicação, é o fato delas possuírem um material genético próprio: O DNA mitocondrial. Então, da mesma forma que o cromossomo Y é sempre passado de pai para filho, o DNAmt é sempre passado ao filho ou a filha pela mãe. Com isso, o meu DNA mitocondrial remonta ao da “fêmea fundadora” da minha linhagem.
É claro que com o passar do tempo, esse material genético pode sofrer mutações aleatórias, além de simplesmente perder material. Mas com sorte, os pedaços que servem para fazer as análises estão intactos.
Então se pegarmos o cromossomo Y e o DNA mitocondrial (que podem nos levar ao macho e a fêmea fundadores de nossas linhagens) e juntarmos pedaços de cromossomo Y e de mtDNA que são específicos para caucasianos, negros e ameríndios… conseguimos ótimos marcadores genéticos.
O que o estudo não fala é que nada disso interessa. Esses marcadores genéticos servem para comprovar linhagem, mas não se encontram em nenhum gene que determine características fenotípicas, características ativas. Eles se encontram no chamado DNA lixo, que compões 95% do nosso genoma e até semana passada não servia para nada (digo até semana passada porque o estudo de um brasileiro mostrou o papel de algumas dessas seqüencias na regulação da função de genes). Não comprovam inteligência, habilidade específica, capacidade imune… nada! 99,99% do DNA de um caucasiano é igual ao de um negro ou um ameríndio. O DNA de um caucasiano pode ser inclusive apresentar mais diferenças com relação ao de outro caucasiano do que de um ameríndio (ou negro). Genéticamente, o conceito de raça não existe na espécie humana!
Minha tatuagem pode fritar na ressonância magnética?

Eu tenho uma irmã loira e linda. Na verdade tenho duas irmãs e as duas são lindas, mas atualmente, só uma é loira. Minha sobrinha, essa sim, loira de verdade, é a mais linda. Mas a minha irmã, que, não deixem ninguém saber, nem é loira de verdade (mas é realmente linda), pediu para eu escrever um texto respondendo a sua pergunta, apesar de eu já tê-lo feito ao telefone. “Não, mas você tem que escrever um texto pra mim, só pra mim, sem mencionar mais ninguém. Quero uma resposta exclusiva!” Esse senso de exclusividade das mulheres ainda vai levar a humanidade à extinção!
Um belo dia desses, depois de falar horas pelo Skype com o maridão que está nas Arábias, ela estava, lá pelas 19h, assistindo House, o médico pedante, azedo e brilhante (não necessariamente nessa ordem) do Universal Channel; quando solta um grito e desmaia.
No episódio (que eu também já assisti porque fiquei viciado em House) um presidiário tem de fazer uma Ressonância Magnética. Um exame que quase todo mundo já fez. Não dói, não arde, não queima. O máximo que pode acontecer é uma claustrofobia de ficar dentro da máquina (mas atualmente já existem umas abertas). A enfermeira que acompanha o exame apenas te informa que você não pode usar nada metálico. Brincos, anéis, pulseiras, botões de calça jeans. Apesar do presidiário da TV estar só com o avental do hospital, a médica informa ele que sentira suas tatuagens queimando, e que não havia nada a fazer.
Minha irmã, linda porem louca e escandalosa, com suas 3 enormes tatuagens no corpo (uma ave do paraíso na cintura, um cavalo na nuca e uma serpente no pé) desmaiou na hora. Ela teria de fazer uma ressonância magnética dali alguns dias e… nenhum diagnóstico preciso valia a perda das tatuagens. Alguns dias depois do susto, foi que ela se tocou de perguntar: “Mas porque a ressonância fritaria as tatuagens?” A pergunta é de loira, mas o biólogo explica e responde.
Primeiro a gente tem que explicar o que é a ressonância magnética. O magnetismo é um fenômeno simples, porém pouco intuitívo. Ele tem a mesma origem da eletricidade. Cargas elétricas estáticas produzem um campo elétrico, cargas elétricas em movimento produzem um campo magnético. O As cargas elétricas dos átomos são produzidas pelos seus elétrons (a eletricidade que chega a nossas casas é quase toda transferida pelos elétrons de cobre nos fios). Uma das formas de avaliar a carga das partículas é ver como elas são influenciadas (que significa desviadas no percurso de um tubo com paredes de imãs) por campos magnéticos. E controlando o campo eletromagnético da parede do tubo, podemos controlar o comportamento dos átomos carregados. De forma oposta, quando átomos neutralizados (sem carga elétrica) são submetidos à um campo irregular deveríamos observar um comportamento aleatório. Uma nuvem de particular que migraram aleatoriamente no tubo. Mas o que se vê é que ainda existe um desvio em duas direções, sugerindo ainda a presença de cargas positivas e negativas nos átomos neutralizados. Como as cargas não poderiam vir dos elétrons, a explicação é que os núcleos se comportavam como minúsculos ímãs. Isso porque eles giram, assim como os elétrons, em torno de si mesmos. Para um lado ou para outro.
Com o tempo foram descobrindo que os núcleos dos átomos eram capazes de absorver energia de ondas de rádio por ressonância. O que é ressonância? Imagine que duas coisas estão vibrando próximas uma da outra, como cordas de um violão. Quando essas duas coisas vibram na mesma freqüência, então elas podem trocar energia através de suas vibrações. Isso é ressonância. Como os núcleos de cada elementos são diferentes, eles absorvem a energia de ondas de rádio específicas que ressonam na mesma freqüência que eles. Todos esses fenômenos, que são a base da maquina de ressonância magnética nuclear que você já freqüentou, foram observados no início do século XX.
Para gerar uma imagem por ressonância magnética, um campo magnético muito forte é utilizado para emparelhar os átomos de hidrogênio da água presente no corpo. Depois, ondas de rádio com freqüências específicas são aplicadas de diferentes direções e os muitos espectros obtidos são reunidos por um computador para formar a imagem tridimensional.
É por causa desse campo magnético super forte que não podemos utilizar nada de metal durante o exame. Influenciaria na imagem e poderia até mesmo ser atraído pelo aparelho.
Tudo bem, mas onde entra a história da tatuagem do presidiário? A resposta foi dada 5s depois do desmaio pela própria médica do seriado. Muitas tintas possuem metais pesados em sua composição. Quanto mais barata a tinta, mais chumbo, cádmio, zinco e outras porcarias ela possui. Ao que parece, as tintas de tatuagens de prisão são baratas e cheias de metais. Quando o corpo do paciente é submetido ao inofensível campo eletromagnético, o metal dentro das células começa a se agitar, querendo migrar para o aparelho. A sensação não deve ser boa.
Minha irmã loira fez suas tatuagens no Chico Tatoo, em Búzios. Não acredito que elas tenham metais pesados e acho que ela pode fazer o exame sem problemas. E ela nem teria de perguntar se tivesse assistido o episódio até o final. Mas sem Pitty… não seria ela.
Tôme ciência
Engana-se quem acha que só se faz ciência no laboratório.
Muito mais do que os laboratórios farmacêuticos, que compram ciência, nos fazemos ciência no vermelho do cheque, no roxo do sem ar e no branco de susto. Fazemos ciência em pé na bancada, sentado na sala de aula e deita dormindo em casa. As vezes meio deitado dormindo na rede no barco na expedição a Amazônia.
Os adultos fazem ciência, os idosos fazem ciência, as crianças fazem muuuuuita ciência. Os adolescentes estão muito ocupados com os hormônios para fazer ciência, mas experimentam muito dela o tempo todo. Motoristas, carpinteiros, pedreiros e, sem preconcêito, até porteiros, fazem ciência.
Tias em geral tem dificuldade para entender ciência, mas mal sabem elas que já fizeram muita ciência na vida. Os amigos preferem, em geral, tomar ciência. Principalmente se estiver bem gelada. Astrólogos cartomantes e pedagogos fazem menos ciência, mas só porque a filosofia lhes consome quase integralmente. Ainda assim, tentam legitimar suas atividades com o selo das ciências sociais, ciências ocultas e outras logias mais.
Só não faz ciência quem já morreu!
PS: Esse post pode, e será, sempre atualizado.
A pílula da imortalidade

Estou preparando a aula de amanhã e me deparo com algo que nunca tinha pensado a respeito. Ao que parece, a senescência, mais conhecida como velhice (definida ecologicamente como um aumento na mortalidade e redução da fertilidade em decorrente da deterioração das funções fisiológicas), é uma característica que evoluiu ao longo do tempo. Então a velhice é uma coisa boa, importante? Não, simplesmente porque a “seleção natural” tem pouco poder para influenciar os idosos.
Explico melhor.
Se você é jovem e pouco hábil, ou pouco adaptado, então não deve conseguir se reproduzir. Não vai deixar descendentes e aquelas características hereditárias que só você tinha vão desaparecer da população com o tempo. Se você é um sujeito bem apessoado e bem adaptado ao seu ambiente, tem mais chances de conseguir uma fêmea para deixar seus genes na ativa por mais uma geração.
Agora imagine que a longevidade (basicamente o oposto da senescência), é uma das características que uma pessoa pode apresentar. Alguns podem ter genes que favoreçam viver até 120 anos, enquanto outros apenas até 60 anos. A questão é que, apesar de muitos de nós considerarmos a possibilidade de viver até 120 anos uma coisa boa, a seleção natural, com toda a sua falta de tato e gentileza, não tem como saber disso.
Explico melhor.
De acordo com alguns autores, a partir dos 30 anos, o ser humano começa um processo de redução das suas capacidades fisiológicas, de forma linear até a idade de 80 anos. Essa perda é da ordem de 80% para a transmissão do impulso nervoso nos neurônios, 45% para a atividade dos rins e 35% para a capacidade respiratória. Um sujeito com um grande potencial longevo, ou perderia menos do que esses valores, ou perderia os mesmos valores mais devagar.
A questão é que se até os 30 anos todos eles tem as mesmas capacidades fisiológicas, então essa vantagem nunca vai se refletir em uma maior fecundidade (prole viável deixada por um indivíduo). Seja ou não um longevo, todo mundo vai ter a mesma chance de deixar prole antes de começar a perder suas funções fisiológicas após os 30 anos (meu deus… eu já vou fazer 36!).
Foi ai que me veio em mente: O Viagra é a a fonte da juventude! Com as pessoas reproduzindo mesmo depois de velhas, a seleção natural terá como agir na idade avançada. E é possível que a longevidade passe a ser selecionada. A pílula da eternidade!
Com os avanços da medicina, com a redução da natalidade em função da crise econômica mundial e se a previdência social não quebrar, é inclusive possível que os idosos tenham realmente vantagens reprodutivas sobre os jovens. Pelo menos em número 😉
É claro que existem vários problemas também. As fêmeas não tem viagra. Certo que elas não precisam, mas existe uma sugestão de que a menopausa se desenvolveu ao longo da evolução justamente para proteger as mulheres do grande risco da gravidez e do parto em idades avançadas. Acabaria existindo uma população longeva apenas de machos.
Mas se o gene da longevidade fosse transmitido de pai para filha… ai as fêmeas estariam no páreo evolutivo novamente. E sem precisar de bolinha azul!
Por que que a gente é assim?
Fico pensando da onde os humanos tiraram essa fixação pela Gentileza.
Estava agora fazendo uma avaliação do módulo II do curso de capacitação de professores da UAB e me lembrando da aula de ecologia que dei hoje para uma turma mezzo addormentata sobre os elementos que controlam o crescimento das populações. Os fatores relacionados a densidade são os principais controladores de uma população, porque quanto mais indivíduos, maior a competição entre eles. Na natureza nem sempre dá pra ser gentil. E muitas vezes ser gentíl é muito pouco útil.
O próximo módulo do curso começa com um guia de “como criticar o próximo” e dá todas as dicas para uma crítica gentil. Quanto cuidado será que é necessário para que eu aprenda mais ? Aquele de quem quer conquistar? As vezes a gente tem tempo para (e interesse em) ser conquistado, outras vezes só quer (eu só quero) é aprender. Logo!
Uma pisada de elefante não é gentil para a formiga, mas isso não quer dizer que o elefante não tenha gentileza. Ele é apenas um elefante (estou sempre tentando encontrar exemplos na fauna brasileira para escrever, mas existe algo menos gentil do que uma patada de elefante?)! Uma cobra também não pode ser gentil ao comer o rato: corre o risco de morrer de fome. Assim como um macaco que queira arrancar um fruto de uma árvore corre o risco de quebrar um galho. Falta de gentileza?! Acho que é só fome!
José Datrino, o Profeta Gentileza, deve estar se remexendo agora. Não gente, não sou contra a gentileza. Não sou a favor da grosseria. Não luto Jiu-jitsu! Só quero lembrar que se tentarmos colocar gentileza em tudo, podemos acabar passando fome! Outro dia lí um texto que dizia que “é mais importante ser gentil do que estar certo”. Imprimi e coloquei na minha parede porque acho que eu preciso aprender a ser mais gentil. Mas também lí aquele texto da filosofia canina, que diz: “Evite morder quando só um rosnado funciona”. Essa é a grande gentileza da natureza!
A gentileza faz parte do pacote de sentimentos humanos. Amor, tristeza, alegria, compaixão. Nós somos assim! Então a questão, que eu vou estudar pra responder em um outro post, é se nós somos assim porqe os sentimentos humanos é que determinam nossa humanidade, se somos assim porque temos esses sub-produtos de nossa consciência ou se ‘ser assim’ fazem parte de uma estratégia super eficiênte que nos tornou a espécie dominante no planeta?
Ainda não sei, mas também não consegui seguir as 15 regras de como fazer uma crítica com gentileza. No entanto, escrevi um texto lindo fazendo uma analogia entre avaliação de um curso e a avaliação de um vinho.
“Me dizer que o vinho contém 12% de álcool ou que foi um vinho que ‘você gostou’ não contribui para a minha seleção do próximo vinho que quero tomar. Já se você me disser que é um Chianti, praticamente todo de uva Sangiovese, envelhecido alguns anos no carvalho; eu sei que esse é um vinho que eu quero experimentar. E mais, sei que certamente vou gostar.”
Minhas críticas podem ter taninos marcantes mas se você deixar elas envelhecerem um pouco na madeira podem ter ajudar no futuro a escolher “seu próximo vinho”. Não sei se os alunos vão entender e isso me deixa em dúvida se vale a pena o esforço para bolar essa abordagem gentil. Mas se “Gentileza gera Gentileza” então eu não devo ter nada a perder. Quem quiser passar fome, que passe!