Quem é você?


Tem uma frase do Mário Quintana que eu acho incrível. “Buscas a perfeição? Não sejas vulgar. A autenticidade é muito mais difícil!”

E é mesmo.

Da perfeição eu já desisti há muito tempo. Como a autenticidade veio de fábrica, eu corro atrás da originalidade. Bem, não sempre. Não procuro originalidade nos passos de dança. E olha que eu adoro dançar. Olho pro lado, é bacana, eu copio. Não fico em casa bolando novos passos de dança. Mas quando você é um cientista… dá tudo por uma idéia original.

Mas que isso, invisto grandes quantidades de tempo na busca da idéia original. Minha mente nunca se desliga. Tem um monte de gente, em um monte de empregos, que bateu 17h podem ir pra casa e não pensar mais naquilo. Mas o meu não desgruda de mim nunca. Sou cientista 24h por dia, 7 dias por semana. É tanto açúcar que o cérebro queima pensando, que eu tenho que compensar enchendo a cara de macarronada. A minha forma de recuperar o combustível (só que depois dos 30 é mais difícil se livrar das reservas, quando elas se formam).

Quando tenho uma idéia nova, original, sento e escrevo. Sempre fiz isso. Mas nem sempre funcionou. Na verdade, pouquíssimas vezes funcionou.

Uma das razões para não ter funcionado, eu descobri, também a duras penas, é que originalidade apenas não basta. Para que sua originalidade seja reconhecida você precisa de uma de duas coisas: genialidade ou credibilidade. A genialidade também vem de fábrica, mas é muito rara e eu não fui um dos contemplados. A credibilidade, essa a gente tem que conquistar, em geral, matando um leão por dia.

O resultado é muitas vezes frustrante. Por que? Porque não basta ter a idéia e guardá-la para você. Você tem que saber comunicá-la e muitas vezes, executá-la. Para saber comunica-la você precisa ter educação, o que elimina grande parte da população do processo criativo (se já não tivessem sido eliminadas antes). Para poder executa-la você precisa de recursos, o que elimina outra grande parte. A maior parte das idéias originais morre na cabeça do seu criador. Mas acontece que nos somos muitos. Quase 6 bilhões. Na verdade muito mais, porque competimos com todos aqueles cérebros que já existiram. Uma idéia não é original se alguém pensou nela junto com você, um pouco antes (10 min) ou muito antes (500 anos atrás). Somos um tipo de 6 bi! (a exclamação, na matemática, pra quem não lembra, é o símbolo do fatorial). Uma idéia original acaba escapando. Alguém escreve.


Mas chega o próximo desafio. Alguém tem de ler. Sem uma platéia, um comunicador está mudo. A busca por uma platéia pode exaurir um pensador. É um conselho desestimulador, mas, se você busca uma idéia original, busque antes uma platéia. Tente também conquistar algum reconhecimento e credibilidade. Essas três coisas você consegue se for um repetidor esforçado e competente. Porque se você é daqueles revoltados com o sistema, que não gosta de “jogar com a bola dos outros”, pode ser que não tenha ninguém pra jogar quando conseguir a sua própria bola.

Eu acho que tive algumas boas idéias até hoje. Observei a natureza das coisas, vi o que era, vi o que não era, e tive um vislumbre de como poderiam, ou como deveriam ser.

Coloquei no papel. Mandei até para uma revista. Mas foi rejeitada. Não sabiam quem eu era. Tudo bem, pode ser que eles só não achassem uma boa idéia. Mandei então para outra revista. Eles também não acharam a idéia boa. Depois mandei para muitas outras revistas. Um revisor, uma vez, disse que era uma boa idéia, mas que era inócua. Não ajudava a resolver nenhum problema. Descrevia o problema de uma forma mais correta, mas não ajudava a resolve-lo. Então aprendi que uma idéia original precisa, além de tudo, de ser útil. Mas isso é no caso especial de você não ter credibilidade nem reconhecimento. Nesse caso, quanto maior a utilidade, maior a probabilidade da sua idéia original vingar.

Com o tempo, paramos um pouco de investir na comunicação de algumas idéias. Cansa. De vez em quando tentamos dar uma espanada nelas, para ver se alguma nova estratégia de comunicação aparece, alguma utilidade não vislumbrada. Mas em geral, nada e acabamos investindo em novas idéias.

Um dia o reconhecimento virá. E vem mesmo. Só que para outro. Descobrimos nossas idéias originais publicadas por um outro com maior habilidade de comunicação, senso de utilidade, público, credibilidade, reconhecimento e… um editor.

No meu caso, terminei de ler um livro essa semana que resume grande parte dos pensamentos da minha vida científica que eu achava originais: “A tripla Hélice” de Richard Lewontin. Pelo menos ele é um cara realmente foda!

Nos resta a o gosto amargo da vitória sobre todos os revisores que algum dia disseram que sua idéia não era boa. Ela era (ainda que você talvez é que não fosse)! Nessa hora, o único consolo pode ser pensar que nenhum deles consegue dançar forró.

Posologia


Uma vez uma mulher me disse: “O que atrai em você, é o mesmo que depois repele.”

Lembro de uma exposição que fui, contrariado, porque era de monocromáticos. Chamava-se Bleu, do francês Ives Klein. Impressionante! A primeira parede tinha vários pequenos quadros, todos monocromáticos, mas de cores diferentes, que, em composição, eram impactantes.

Essa é uma boa palavra para a exposição: Impactante.

Os quadros, todos azuis, como esse na figura, eram de uma profundidade incrível. E dava vontade de ‘entrar’ dentro da pintura. Muitas coisas me marcaram nessa exposição. Tenho hoje, na minha sala, uma ‘Venus de Milo’ toda azul, copiando a idéia do pintor.

No final da exposição, ficávamos sentados em um sofá vendo dois quadros: um todo azul e o outro todo de ouro. O ouro, que deveria atrair, repelia. Porque? Não sei dizer. Tenho também um quadro todo azul e outro todo dourado na minha sala. Pra lembrar que o que parece monótono atrai, e o que deveria atrair, repele.

Lembrei disso esses dias. Duas amigas leitoras do blog andaram pedindo pra eu falar de amor. Elas acham que eu já falei de amor aqui, apesar de eu achar que era tudo biologia. Mas aqui um pedido do leitor é uma ordem.

Dizem que o amor é cego. Na verdade essa é uma fase do amor. A paixão já foi medida. É um processo bioquímico que pode durar, no máximo, 6 meses. O amor não é cego, mas a paixão pode cegar. Literalmente.

Evolutivamente, essa chuva de hormônios e neurotransmissores deve ter tido a função de manter duas pessoas juntas até conseguirem reproduzir. Como as fêmeas humanas não evidenciam o período da ovulação, nem todo coito era garantia de uma prole. Era preciso tentar mais de uma vez. Mas como convencer o macho a ficar por perto até a fecundação? Como prevenir que a fêmea não… pulasse a cerca? Desenvolvendo uma atração inexplicável e irresistível entre os dois. Quem poderia fazer isso? Amor? Não, a bioquímica!

Mas depois disso, os conflitos entre os interesses de homens e mulheres, cada um preocupado em gastar a menor quantidade de energia possível na criaçào dos filhotes, apareciam. E ai… era cada um por si, e a evolução por todos.


“O que atrai em você, é o mesmo que depois repele.” Eu já tinha ouvido isso antes, mas onde?

Lembrei. Paracelcius foi um médico alemão que viveu no final do Sec XIII e início do século XIV. No fervor da renascença, ele estudava venenos (um envenenador era um profissional requisitadíssimo naqueles tempos) e antes de inventar a homeopatia, ele fez considerações importantíssimas sobre a toxicidade das substâncias. Ele disse:

“Tudo pode ser tóxico. O que diferencia o remédio do veneno, é a dose”

Se o que atrai é o que depois repele, então não dá pra mudar. Mudança não é a resposta.

Dose. A dose é a questão.

Saber dosar é o segredo do amor. E de todo resto também.

Sei ou não sei? Eis a questão!

O tema do Roda de Ciência desse mês é ‘A importância da comunicação da incerteza para o público leigo’.


Eu não tenho certeza, mas foi com o prof. Paul Kinas, e não com Heisenberg, que eu passei a perceber a incerteza do mundo. Ele era um mago da estatística Bayesiana que ensinava estatística como filosofia de vida. Filosofia que eu adotei.

Marcelo Gleiser começa o livro ‘Dança do Universo‘ falando da importância da dualidade para o ser humano: Dia e Noite, Claro e Escuro, Quente e Frio, Certo e Errado! O meu professor de estatística dizia que o problema é que nós não fomos educados a conviver com a incerteza. Durante toda nossa educação formal, fomos obrigados à escolher entre o ‘certo’ e o ‘errado’. Não nos ensinaram que as coisas, muitas delas, eram (e sempre serão) ‘incertas’. Aprendemos a fazer aproximações, aprendemos a escolher entre o ‘certo’ e o ‘errado’. Mas não aprendemos que entre os dois existe o ‘incerto’. Aliás, é muito pior, aprendemos a ignorar o incerto, ou tortura-lo até que se torne ‘certo’ ou ‘errado’. O resultado é desastroso: a grande incapacidade da maioria das pessoas de entender a ciência.

O Kinas dizia que deveríamos poder, na escola, escolher o certo apontando nosso grau de certeza relacionado com a escolha: “Acho que está certo, mas tenho com 70% de certeza!” Não seria lindo poder dar uma resposta dessas no vestibular?

Bom, ele nos deu uma prova assim. Lembro até hoje de algumas das perguntas:
“Qual cidade tem maior área urbana, Rio de Janeiro ou Buenos Aires?” Bairrista, respondi ‘Rio’ sem titubear. 95% de certeza! Mas como a geografia não se dobra a emoção, errei e perdi muitos pontos. Porém, mais pontos perdia quem dissesse que ‘sim’ ou que ‘não’ com 50% de certeza (que reflete não só a ignorância, mas o descaso e o descompromisso com a questão). Isso trás outra questão: a importância de escolher. O fato de existir incerteza não nos exime de ter de tomar decisões frente à ela.

Os psicólogos vão dizer que sempre fazemos escolhas, pois mesmo quem não escolhe, está fazendo uma escolha. E está mesmo. Só que as pessoas acham que têm de estar seguras do ‘certo’ pra escolher, quando o que nos diferencia do todo são justamente nossas escolhas frente ao incerto. Já escrevi aqui que acreditar no óbvio é fácil. Tomar decisões quando se tem todas as informações também é. Já quando a gente não sabe…

Bem, quando a gente não sabe, pode sempre recorrer ao ‘Cálculo de utilidades’ e as muitas outras ferramentas de ‘Tomada de decisão’ e ‘Análise de risco’, que a estatística tem a nos oferecer. E que, diga-se de passagem, deveriam ser matéria obrigatória na escola, porque podem ajudar muito a escolher a melhor opção frente a incerteza. Da mesma forma que companhias de seguro e cassinos fazem (e ganham rios de dinheiro com isso).

Mas enquanto isso não entra no currículo, poderíamos pelo menos parar de perguntar aos nossos alunos ‘se’ eles sabem, e começar a perguntar ‘o que’ ou ‘o quanto’ eles sabem.

Por favor, comentários aqui!

Amuletos

Césio 137
Tem gente que carrega pedra por proteção. Seja de um amuleto que dá sorte, seja da arma que ameaça. “Estou armado, vai encarar?” Tem ainda outros que carregam por falta de opção (é a pena deles, trabalho forçado ou pedra amarrada no pé mesmo). De qualquer forma não me parece um bom negócio.

Vejam esse exemplo. A radioatividade não foi descoberta de uma vez só. Podemos dizer que começou com os raios-X de Röntgen em 1895. Mas essa era uma radioatividade artificial. Os raios-X eram produzidos pela passagem de eletricidade por um tubo catodo contendo um gás rarefeito. Os Tubos catódicos eram muito utilizados por pesquisadores daquela época para estudar os fenômenos de brilho que eles apresentavam. Henri Becquerel foi o primeiro a observar a radiatividade natural em sais de urânio em 1896. Mas foi o casal Marie e Pierre Curie que desenvolveram em muito o estudo da radioatividade, descobriram que o Urânio se transmuta em Rádio e Polônio por perda de energia e desenvolveram métodos para purificar o Rádio. Foi Marie inclusive que cunhou o termo radioatividade.

Rapidamente os pesquisadores descobriram que aquelas elementos tinham a capacidade de causar alterações biológicas. Curie e Becquerel bolaram então um experimento para investigar as lesões causadas pelas emissões do rádio na pele. Bequerel carregou no bolso de seu colete durante 6 h um vidrinho contendo uma pedrinha (do tamanho de uma cabeça de alfinete) de Cloreto de Bário radioativo (800.000 vezes mais radioativo que o Urânio). 10 dias depois ele observou a formação de uma mancha vermelha no peito, que nos dias seguintes ficou preta. 20 dias depois da exposição havia sido formada uma ulceração que só foi curada com um mês de tratamento com bandagens, deixando uma cicatriz na forma do tubo. Durante esse tempo, uma nova mancha apareceu na posição oposta, referente ao outro lado do bolso, onde o tubo havia ficado menos de 1 h.


A foto mostra a lesão feita propositalmente por Pierre Curie em seu braço com um sal de Rádio e publicada em um jornal francês.

Carregar a pedra no bolso não servia nem para dar boa sorte. Marie e Pierre Currie ganharam o prêmio Nobel de Física em 1903, mas ele morreu atropelado por uma carruagem em Paris em 1906 e ela em 1934 de Leucemia (causada pelos anos de manuseio dos elementos radioativos).

Uma pedra no bolso também foi a razão do acidente radioativo de Goiânia em 1987 se transformar em uma catástrofe. Um velho aparelho de radioterapia foi roubado do prédio de um hospital abandonado pra ser vendido como sucata em um ferro velho. A blindagem da fonte de radiação, com algo em torno de 20g de Césio 137 (primeira foto), tinha mais de 120 kg de chumbo e devia valer alguma coisa. Quem comprou foi Devair Alves Ferreira, que depois de abrir a proteção da fonte a marretadas, ficou encantado com o pó azul brilhante e resolveu levar pedaços da pastilha de Césio para casa. Devair carregou a pedrinha no bolso por vários dias, mostrava para os amigos e vizinhos, em casa e no bar:

“Todos os dias eu pegava aquela pedra. Minha mulher tinha pavor e vivia tapando a pedra. Ela detestava e eu amava a pedra. Eu convivi oito dias com aquela pedra. Tomava cerveja e colocava o copo em cima dela”.

Nossa… parece coisa do Senhor dos Anéis. “My precious…” Deu no que deu: 16 mortes e a maior contaminação acidental depois de Chernobyl.

A verdade é que pedras no bolso pesam, tiram a leveza e a velocidade. Prendem. Machucam quem carrega e podem dar câncer.

Homens que choram


Eu sempre chorei a tôa, então sempre tive de conviver com aquela história de que homem não chora. E também que homem não isso e que homem não aquilo.

Por outro lado, nas últimas semanas, tenho ouvido repetidamente as mulheres reclamando dos homens. Que os homens não fazem isso, que os homens não fazem aquilo. Quase tudo que elas reclamam que os homens não fazem, são coisas de mulher. Ou coisa de homem que chora?

Lembrei do texto ‘Testosterona’ do João Ximenes Braga, onde ele fala dos homens heterosexuais que gostam mais de homens (companhia, papo, interesses) do que de mulheres. São os Men’s man. O texto dá ótimas definições, como a dos caras que preferem ficar em rodinhas de outros caras no baixo Gávea e enquanto outros preferem ficar sorrindo para mulheres (ainda que feias) na mesa do bar. Acho que os que choram, devem se encaixar nesse segundo grupo.

Existe um ramo da biologia chamado sociobiologia, que acredita que todos os comportamentos sociais tem fundo genético. Qual a importância de ter fundo genético? É que se está nos genes, de alguma forma isso pode ser passado dos pais para os filhos. E também as escolhas que podemos fazer são muito, muito mais restritas, porque muito já foi decidido no nosso DNA.

A sociobiologia tem seus adeptos, mas é amplamente questionada. Mesmo assim, Edward O Wilson, seu criador e principal teórico e, escreveu em seu livro de 1975 a primeira tentativa de explicar geneticamente o homosexualismo.

Vejam que a parada era duríssima. Explicar as bases genéticas de um comportamento social, que basicamente impede a reprodução e a transmissão genética desse mesmo comportamento. Só que na verdade, já existia uma explicação, que pode ser verdadeira para outros genes que também conferem baixa reprodutibilidade. Nesses casos, a única forma do gene se manter na população, é através de uma maior adaptabilidade dos heterozigotos. Ah… você não lembra o que são os heterozigotos? Vamos supor que a característica ‘opção sexual’ seja determinada pelos genes H e h. Vamos supor ainda que H seja o gene para o gene para heterosexualidade enquanto h o gene para homosexualidade. E continuar supondo ainda que H seja dominante sobre h. Um homem pode ser homozigoto para a característica ‘opção sexual’ se tiver ambos alelos (o par de genes que determina uma característica) iguais. O par HH então caracteriza o homozigoto dominante para heterosexual e o par hh caracteriza o homozigoto recessivo para homosexual.

Como os homosexuais, em princípio, não deixam descendentes, então rapidamente o alelo h desapareceria da população. A não ser que… o heterozigoto, aquele individuo que possue um alelo de cada (ou seja um H e outro h), fosse mais adaptado (o que nesse caso quer dizer sucesso reprodutivo), do que o homozigoto dominante para heterosexualidade.

Voltando ao texto do Ximenes, os heterozigotos Hh seriam um tipo de Woman’s men. Homens totalmente heterosexuais, mas com maior sensibilidade, mais tato (coisas importantes para as mulheres) e por isso fariam mais sucesso, conseguiriam mais oportunidades de reproduzir, e deixariam mais descendentes.

Os heterozigotos então inflacionam um mercado escasso e criam a ilusão de que podem haver homens que efetivamente sejam capazes de fazer o que as mulheres esperam. Só porque um cara prefere ir ao shopping ou assistir a um drama no cinema na companhia de uma mulher, ao invés de jogar futebol com os amigos; elas inferem que eles vão entender também o que se passa no complexo e caótico universo feminino.

É preciso manter em mente duas coisas: A primeira é que a sociobiologia é uma tautologia, um sistema lógico que encontra explicação em si mesmo e por isso nunca pode ser realmente comprovado. É como explicar que a galinha veio primeiro que o ovo, que veio da galinha. Por isso, essas teorias serão sempre hipotéticas. Bom papo pra buteco. A segunda é que, por mais que tenham um alelo h, os heterozigotos são homens. E como homens, querem exatamente a mesma coisa que todos os outros.

O heterozigoto Hh é só aquele cara mais sensível que come todas as amigas, enquanto os caras machões HH acham que ele é viado.

De olhos bem fechados

ResearchBlogging.org
Li uma vez que a razão pela qual nos lembramos sempre das coisas ruins, é justamente para não repeti-las. Uma memória seletiva, que favorece a armazenagem de más recordações, não está exatamente de acordo com nossas concepções atuais de qualidade de vida, mas certamente salvou a vida de muitos hominídeos milhares de anos atrás.

Ontem, no blog do Shridhar vi um texto sobre enzimas, baseado em um artigo científico da Nature onde os autores encontraram uma droga para acabar com o medo.

Já falei sobre o medo aqui. Como eu dizia, existem alguns tipos de medo e o tipo ao qual os autores se referem é o medo adquirido. Justamente essas ‘más recordações’ de que eu comecei falando.

Esses medos protegeram e ainda protegem muito a gente. Mas no mundo em que vivemos, eles também são o ponto de partida das neuroses. Medos fictícios ou medos desnecessários (que foram reais um dia mas que agora não tem mais razão de ser) e que se gravaram em nossas memórias e não conseguimos esquecer. Os autores comentam o óbvio exemplo dos ex-combatentes de guerra, que mesmo depois de voltarem pra casa, suspeitam que o inimigo esteja a espreita. Mas é um mal que, em diferentes graus, pode afligir todos nós.

No caso dos ratos do experimento, o medo em questão era o de tomar um choque elétrico (0,7 mA por 2 s) 3 min após ser colocado em um novo contexto. O medo era representado pelo comportamento de imobilização dos ratos quando expostos novamente ao mesmo contexto. Depois de tomar o choque elétrico, os animais começavam a perder o medo apenas depois da 6a vez que eram re-apresentados ao mesmo contexto sem tomar o choque. Uma injeção de Butirolactona I no cérebro dos bichos, fez com que eles perdessem o medo já na primeira vez que eram re-apresentados ao contexto.

Você vai abrir a porta da geladeira e toma um choque. Em seguida alguém pede para você abrir a porta da geladeira e você hesita porque sabe que pode tomar outro choque. Mas se esse alguém injetar Butirolactona I no seu cérebro, então você abrirá a porta da geladeira sem medo do choque. Impressionante, não?!

A mágica é feita em uma proteína quinase chamada CDK5. As quinases são proteínas que modificam outras proteínas pendurando um fosfato nelas, como se fosse um brinco, e que participam de reações em cadeia. Cascatas de reações onde uma proteína vai colocando um brinco de fosfato em outra, como uma forma de enviar mensagens de um lugar a outro na célula. A cascata da CDK5 começa em uma proteína G da membrana plasmática chamada Rac-I e vai até o alvo, a proteína PAK-1, uma proteína envolvida na remodelação do citoesqueleto de actina (as proteínas que servem de ossos) da célula. Fico difícil?! Vamos lá, o que PAK-1 faz é mudar algumas sinapses, as conexões entre dois neurônios, de lugar.

Quando alguma coisa ruim acontece, CDK5 é ativada e faz com que as sinapses se re-organizem. Sempre que aquela o contexto ruim reaparece, os impulsos nervosos percorrem o mesmo caminho e você é alertado por um medo adquirido. Esse medo contextual. Nos ratos, a droga impede o funcionamento da CDK5. Sem a ativação do alvo PAK-1 as sinapses parecem voltar para seus lugares originais e Shazan você perde o medo. O contexto não mais percorre a via das sinapses fora de lugar. O medo desaparece.

Só pra confirmar, os caras testaram ratinhos mutantes, onde uma dieta a base de doxicilina faz com que eles tenham uma super produção de CDK5, e os bichinhos não perdem o medo do choque nunca mais.


É um estudo lindo, mas eu acho que o problema é outro. O problema é o contexto! Colocamos a culpa no medo, quando o problema é que não somos capazes de reconhecermos as mudanças de contexto. E sentimos medo à toa. Se o contexto é diferente, não há porque achar que vem choque pela frente. Atacamos nossos medos com química, por que não conseguimos reconhecer as mudanças do mundo a nossa volta. Termina tudo doido! Não são nossos medos que nos deixam neuróticos, são nossos olhos fechados!

Sananbenesi, F., Fischer, A., Wang, X., Schrick, C., Neve, R., Radulovic, J., & Tsai, L. (2007). A hippocampal Cdk5 pathway regulates extinction of contextual fear Nature Neuroscience, 10 (8), 1012-1019 DOI: 10.1038/nn1943

Vai encarar?


No semestre que vem tenho de dar um curso sobre Evolução e como estou numa fase muito literata, comprei um livrinho pra estudar mais sobre “Sociobiologia“. Durante décadas esse foi um tema controverso em Biologia, porque sugere que os comportamentos sociais no mundo animal, incluindo o humano, teriam uma base genética (o autor, Edward O. Wilson, foi até mesmo acusado de Nazista, o que certamente é um exagero).

Já digo pra vocês que não sou muito adepto da Sociobiologia. Queria apenas saber mais sobre o assunto. E foi ai que me deparei com um dos principais temas do comportamento animal: A agressão!

Como a seleção natural sempre foi vista como a “luta pela sobrevivência” a agressão animal sempre teve um papel importante nessa luta. Depois, a visão da seleção foi mudando do “mais forte” para o “mais apto”, ou mais adaptado, e a agressão pode tomar várias formas menos violentas.

O maior problema é sempre a nossa visão romantizada dos eventos naturais e a nossa eterna necessidade de classificar tudo como certo ou errado. A agressão entre animais de espécies diferentes é aceitável, ou pelo menos compreensível, como nas relações predador-presa.

Abre parênteses: Isso me lembra meu primeiro dia de aula na universidade. Fomos todos da turma conhecer os diferentes laboratórios e acabamos chegando na herpetologia (estudo dos répteis) onde um estagiário estava alimentando as cobras no terrário. As meninas da turma logo se indignaram: “Oh…. pobre ratinho”. Seguiu-se então a explicação do estagiário sobre a pobre cobra, presa em cativeiro e que deveria, pelo menos, comer. Com o passar do tempo houve uma curiosa inversão. A cobra ia acompanhando o ratinho dentro do terrário e do lado de fora, todos, inclusive as meninas, passaram a torcer pela cobra. Fecha parênteses.

Já a luta entre animais da mesma espécies é menos aceita. Mas não por isso, quando a luta é intra-específica, acontece algo curioso: a ameaça é mais utilizada do que a agressão. Existe um ritual onde o mais fraco pode sempre dar sinal de conciliação, impedindo a agressão mortal do mais forte. Bem, parece que também existe uma contribuição, essa sim uma tendência genética, a um animal não gostar do sabor da carne de um companheiro da mesma espécie.

Mas o que determina qual o ponto da batalha onde se opta pela conciliação ou pela agressão mortal?

Quem melhor definiu isso foi um outro biólogo, brilhante, chamado Maynard Smith. Roberto Freire disse que “a maioria dos grandes criadores sinceros já sentiu e já comunicou essa sensação de estar sendo uma espécie de tradutor, de comunicador da linguagem do inconsciente coletivo que existe igualmente em todos nós, mas que eles especializaram em decifrar e comunicar. (…) Costumo dizer, com envergonhada honestidade ou com humilde paranóia, que todos os poemas de Fernando Pessoa são meus, como se ele apenas tivesse revelado em seus versos o que já estava pronto poeticamente em mim.” Maynard Smith colocou em teoria matemática o que eu já sabia há muito tempo, como bem já coloquei aqui no blog outras vezes: Não existe certo ou errado, apenas estratégias que sejam favoráveis em longo prazo. O nome que ele deu pra isso foi “Estratégia Evolutivas Estáveis (EEE)”, que podem ser avaliadas com base na “teoria dos jogos“.

Abre parênteses de novo: fiquei tão empolgado com o assunto que fiz uma coisa que meu amigo Edu faz muitas vezes, comprei a referência bibliográfica que o autor dá, pra começar a ler antes de terminar o primeiro livro. Tive que ir até a Amazon.com porque o “Evolution and the Game Theory” do Maynard Smith não tem no Brasil. Fecha parênteses.

Uma EEE é uma estratégia para qual não existe nenhuma outra “estratégia mutante” que possa dar mais sucesso. Funciona tanto no caso de uma partida de pôquer quanto para o sucesso reprodutivo. Não ficou claro o que é estratégia mutante? Ficou pensando nos X-men? Calma, acho que com o exemplo vai ficar mais claro.


Maynard ilustra sua teoria com dois personagens, que representam duas estratégias opostas de comportamento: O pombo e o gavião. Os gaviões lutam sempre, ferozmente, até que vençam ou sejam gravemente feridos. Os pombos lutam de forma ritualística, trocando ameaças até que um deles se canse e vá embora. Eles sempre se retiram antes do confronto.

Nenhuma dessas duas estratégias é uma EEE, pois um gavião sempre obteria mais sucesso reprodutivo em uma população de pombos e vice versa. Então qual é a melhor? Na verdade o melhor (e é o que acontece na natureza) é um equilíbrio entre as duas estratégias. Uma possível EEE seria que os animais da população apresentassem uma relação de 5:7 entre pombos e gaviões. Com a possibilidade de agressões ritualísticas inofensivas e agressões reais e mortais.

Mas é isso mesmo que a gente encontra na natureza? Esses são modelos simples que não incluem uma figura tipicamente carioca: O malandro! Aquele gavião que se finge de pombo pra atacar depois, ou o pombo que se finge de gavião e depois sai correndo.


Na verdade o próprio Maynard já havia descrito mais 3 estratégias além do gavião e o pombo: o atrevido, que se faz de gavião mas na verdade sai correndo como o pombo se o oponente é do tipo gavião; o retaliador, que se faz de pombo mas ataca como gavião se o oponente também o é; e o experimentador, que se comporta quase sempre como um retaliador, mas eventualmente pode começar atuando como gavião para testar a força do oponente.

O reino animal está cheio de exemplos que comprovam essas estratégias. Entre os humanos não é diferente. E ao que parece, somos até uma espécies pacífica (acho que quem escreveu isso não mora no Rio).

A teoria é tão bacana que até leva em conta a agressão não realizada nunca. Uma forma de guerra fria. O que conta para cada um dos opoentes é o tempo gasto durante a batalha. O tempo, com a gente bem sabe, é um bem precioso.

Em princípio, toda população vai ter um lutador de Jiu-Jitsu que se comporta como gavião (até encontrar um gavião com um “trêsoitão”). E sempre haverá um jovem que não sabe se defender, ou um animal doente, que se comportará como pombo. A questão é que nada disso está escrito nos seus genes. Ninguém nasce gavião ou pombo! Ou experimentador. Isso a gente aprende. Basta querer experimentar ser algo diferente do que a gente sempre foi.
Por isso, a não ser que você goste do gosto de sangue da mesma espécie, saber a hora de desistir e… abandonar a luta, ainda que você seja o mais forte, te devolve um bem muito precioso: seu tempo! Pena de quem não sabe reconhecer quem é da mesma espécie, e fica brigando até a morte à toa.

A realidade e a relatividade

Vocês podem dizer que eu estou substantivando tudo. Mas uma leitora assídua me pediu para falar de relatividade e, como já tem livros demais, e textos demais, falando sobre Einstein, resolvi dar uma outra abordagem a relatividade.

Fui no CCBB ver o Veríssimo (, Luís Fernando) na “Oficina para escritores”. Cheguei mais de uma hora antes, mas a fila já dava voltas pelo salão. Sem chance! Então eu e o JP fomos ver a exposição ‘China Hoje’ e acabamos assistindo duas exposições paralelas sobre fotografia. A primeira tinha o nome do autor, o fotografo espanhol “Chema Madoz” e a segunda se chamava ‘Instantes de Felicidade’.

A primeira foto era do pioneiro Louis Jacques Daguerre. A primeira fotografia com uma figura humana: Um engraxate, que ficou na mesma posição tempo suficiente para ser capturado pela exposição de horas. Na foto, uma movimentada esquina de Paris aparecia vazia. Até esse momento, a foto não registrava o ‘instante’.

Eu devia estar com as palavras na cabeça, porque conforme via as fotos ia só vendo as diferenças entre a realidade e a realidade registrada na foto. E portanto, a relatividade da realidade.

Ao contrário do que podem pensar, a relatividade não é nova, nem foi concebida por Einstein. Galileu havia descrito a relatividade de um evento dependendo da posição de um observador (o clássico exemplo da bola de ping-pong quicando no mesmo lugar pra quem está em frente a mesa dentro do trem, mas formando arcos para quem vê desde o lado de fora, o trem passando). O que Einstein descreveu foi a relatividade especial, aquela que descreve os fenômenos ligados a luz. Tudo que acontece na velocidade da luz está sujeito a uma relatividade especial. E foi ai que ele descobriu a relatividade do tempo e do espaço.


Fotografia é um excelente exemplo de como ciência pode influenciar a vida das pessoas. Por exemplo, a arte, mas também todo o resto. Com a fotografia, a arte deixou de ser meramente representativa da realidade e pode partir para o abstrato. Ao mesmo tempo, foi a necessidade de retratar o real, exercida primeiramente pelo desenho e pela pintura, que motivou inicialmente Nicéphore Nièpce a explorar as possibilidades da fotossensibilidade. O tempo de exposição da fotografia diminuiu de horas para milésimos de segundo. E pudemos guardar o… instante. Para sempre! Depois, foi a fotografia que passou ao abstrato, como nas fotos de Madoz.

Em um dos antigos cofres do CCBB, uma projeção mostrava fotos do julgamento de Klaus Barbie: O Carniceiro de Lyon. Em uma das fotos, ele aparecia como um gentil velhinho. Poderia ser meu ou seu avô. Em outra foto, uma das testemunhas, um senhor chamado Favve, totalmente deformado pelas torturas, parecia um monstro. Mas era, na verdade, uma pessoa doce e gentil, em busca de justiça.

A realidade e a relatividade das imagens continuaram me assolando por toda exposição. Como podemos saber o que é realmente real? Se até o que é fotografado é relativo? (ainda mais nesses tempo de Photshop…)

A grande realidade está no saber. A informação é a única força capaz de alterar o estado da relatividade, transformando ela cada vez, mais e mais, em realidade. Com informação, a imagem de Barbie não pode ser suavizada pela fotografia.

Mas esse pode ser também o problema da informação. Uma vez que você sabe… não dá pra fingir que não sabe. Não dá mais pra relativizar a realidade.

Por que que a gente é assim?


Fico pensando da onde os humanos tiraram essa fixação pela Gentileza.

Estava agora fazendo uma avaliação do módulo II do curso de capacitação de professores da UAB e me lembrando da aula de ecologia que dei hoje para uma turma mezzo addormentata sobre os elementos que controlam o crescimento das populações. Os fatores relacionados a densidade são os principais controladores de uma população, porque quanto mais indivíduos, maior a competição entre eles. Na natureza nem sempre dá pra ser gentil. E muitas vezes ser gentíl é muito pouco útil.

O próximo módulo do curso começa com um guia de “como criticar o próximo” e dá todas as dicas para uma crítica gentil. Quanto cuidado será que é necessário para que eu aprenda mais ? Aquele de quem quer conquistar? As vezes a gente tem tempo para (e interesse em) ser conquistado, outras vezes só quer (eu só quero) é aprender. Logo!

Uma pisada de elefante não é gentil para a formiga, mas isso não quer dizer que o elefante não tenha gentileza. Ele é apenas um elefante (estou sempre tentando encontrar exemplos na fauna brasileira para escrever, mas existe algo menos gentil do que uma patada de elefante?)! Uma cobra também não pode ser gentil ao comer o rato: corre o risco de morrer de fome. Assim como um macaco que queira arrancar um fruto de uma árvore corre o risco de quebrar um galho. Falta de gentileza?! Acho que é só fome!

José Datrino, o Profeta Gentileza, deve estar se remexendo agora. Não gente, não sou contra a gentileza. Não sou a favor da grosseria. Não luto Jiu-jitsu! Só quero lembrar que se tentarmos colocar gentileza em tudo, podemos acabar passando fome! Outro dia lí um texto que dizia que “é mais importante ser gentil do que estar certo”. Imprimi e coloquei na minha parede porque acho que eu preciso aprender a ser mais gentil. Mas também lí aquele texto da filosofia canina, que diz: “Evite morder quando só um rosnado funciona”. Essa é a grande gentileza da natureza!

A gentileza faz parte do pacote de sentimentos humanos. Amor, tristeza, alegria, compaixão. Nós somos assim! Então a questão, que eu vou estudar pra responder em um outro post, é se nós somos assim porqe os sentimentos humanos é que determinam nossa humanidade, se somos assim porque temos esses sub-produtos de nossa consciência ou se ‘ser assim’ fazem parte de uma estratégia super eficiênte que nos tornou a espécie dominante no planeta?

Ainda não sei, mas também não consegui seguir as 15 regras de como fazer uma crítica com gentileza. No entanto, escrevi um texto lindo fazendo uma analogia entre avaliação de um curso e a avaliação de um vinho.

“Me dizer que o vinho contém 12% de álcool ou que foi um vinho que ‘você gostou’ não contribui para a minha seleção do próximo vinho que quero tomar. Já se você me disser que é um Chianti, praticamente todo de uva Sangiovese, envelhecido alguns anos no carvalho; eu sei que esse é um vinho que eu quero experimentar. E mais, sei que certamente vou gostar.”

Minhas críticas podem ter taninos marcantes mas se você deixar elas envelhecerem um pouco na madeira podem ter ajudar no futuro a escolher “seu próximo vinho”. Não sei se os alunos vão entender e isso me deixa em dúvida se vale a pena o esforço para bolar essa abordagem gentil. Mas se “Gentileza gera Gentileza” então eu não devo ter nada a perder. Quem quiser passar fome, que passe!

O Físico visita o Xamã

“O circulo é o universo. O ponto no centro do círculo representa o ser humano, a convergência de toda a energia do universo…”


É certo que existem muitas verdades, mas qual delas é a mais verdadeira? Eu continuo gostando das verdades baseadas em evidências, mais do que aquelas baseadas na fé. Não existe nenhuma evidência científica da lógica por detrás de um mapa astral. Absolutamente tudo é questionável.

“Mas qual premissa você questiona?”, perguntou o Xamã.
“De que o homem é o centro do universo, por exemplo!”, respondeu o Físico.
O Xamã faz uma cara de espanto e pergunta: “Mas… que outro ser existe?
O Físico pensa se espanta um pouco com a obviedade da resposta que está para dar, mas hesita por um brevíssimo momento: “Uhum… as bactérias?!?”

A longa gargalhada que se seguiu estabeleceu um consenso amigável entre duas realidades tão distintas. Estabelecemos ali os limites do nosso universo possível. O universo onde o físico e o xamã podem se encontrar.

Parênteses: Tenho pensado muito, muito nisso: como os limites, que dão idéia de restrição, podem funcionar para efetivamente te libertar. Uma vez que estabelecemos os limites que não podemos ultrapassar, tudo dentro daquele limite se torna possível. É assim em tantas, tantas coisas na vida. Um não abre uma gama imensa de possibilidades de sims. Fecha Parênteses.

Por que o cientista iria visitar o esotérico? Por que o físico iria visitar o metafísico? Por que o doutor iria visitar o Xamã? Porque abrir a mente é importante. E manter a mente aberta é fundamental. Um físico que vêm de uma família de bruxos precisa se exercitar constantemente para se manter físico. Mas, como em todo exercício, a gente corre risco de atrofiar o músculo. E eu não quero um cérebro atrofiado.

Pode ser que exista verdade por trás da astrologia. Mas se há, não é com a lógica que ela se apresenta que vamos conseguir aproveitá-la. Houve uma época em que pensava que se a lua podia mexer com os oceanos, outros astros também podiam influenciar na nossa vida. Não é só o fato de ser uma astronomia anterior a Copérnico. Toda essa coisa das 12 casas, etapas da vida… gente… tudo isso foi inventado pelo homem! A astrologia é uma grande epidemologia do ser humano. E é por isso que a astronomia se separou dela ao longo dos séculos. A primeira não sobrevivia ao exame da segunda. É o problema da epidemiologia: nem sempre (aliás, dificilmente) se consegue estabelecer a causa olhando a conseqüência.

Uma vez li sobre um experimento onde pediram a um astrólogo para fazer o mapa astral de 3 pessoas. Depois esses 3 mapas foram mostrados, juntamente com as 3 pessoas, a 100 (ou muitos) outros astrólogos, pedindo que eles identificassem a quem pertencia qual mapa. O índice de acerto foi de 30%. Ou seja… chute! Claro, o primeiro astrólogo pode ter sido o charlatão, o que prejudicaria o trabalho dos outros. Por isso seria importante fazer um segundo exame, que é: quantas vezes um mesmo astrólogo acerta? Não sei , mas algo me diz que é em torno de 50%. Chute novamente.

Não digo esse número por acaso. Uma amiga médica homeopata me pediu uma vez ajuda para fazer uma estatística da eficiência de seus tratamentos com crianças. Não cheguei nem mesmo a examinar os dados, porque só uma conversa inicial mostrava que a amostragem era tendenciosa. Se o paciente voltasse, queria dizer que o tratamento havia funcionado. Se ele não voltasse, não tínhamos como saber. Bom, isso criou um índice era de 50%, que como eu disse pra ela, a gente não tinha como avaliar. A homeopatia é outra pseudo ciência que também não consegue se apoiar em evidências científicas.

Então todos os astrólogos são picaretas? A ciência tem sido muito eficiente em rechaçar todas as tentativas de logro em massa inventadas ao longo da história. Mais ultimamente, as abduções e outros tipos de contatos com extraterrestres. É claro que a ciência erra (é feita por humanos), mas a ciência, como instituição, é muito honesta ao admitir o erro, e principalmente, a não se aventurar muito pelo desconhecido sem evidências.

Mas então como lidar com o inexplicável? Não aquilo que todo mundo acha que é inexplicável. Estou falando do que é REALMENTE inexplicável? Em um livro que li mais ou menos recentemente (Um adivinho me disse; Tiziano Terzani), um jornalista italiano viaja todo o sudeste da Asia e em cada cidade por onde passa com o seu trabalho de correspondente, visita o mais brilhante adivinho da região. Homens que lêem o futuro em cinzas de ossos, borra de café, na palma da mão. Chineses que prevêem que você ficará rico, muçulmanos que dizem que você terá muitas esposas. Um monte de charlatões, ainda que fossem charlatões que aceitassem visa, com fila de espera e consultados pelo altos escalões dos governos asiáticos. Mas ao se consultar com o astrólogo de um traficante de heroína na Birmania, ele se depara com um verdadeiro xamã. Ele dá seu nome, mas a data e hora do nascimento do traficante. O astrólogo faz uma perfeita leitura… do traficante, sem conseguir encaixar o que vê no mapa astral com a pessoa a sua frente. Parece que algumas pessoas realmente, lendo mapas ou cinzas, mãos ou datas de nascimento, conseguem algum tipo de conexão com outras pessoas.

No seu livro “O mundo assombrado pelos demônios” Carl Sagan dizia que a telepatia, em algum nível, era algo que a ciência eventualmente iria explicar. Aparentemente, existe um corpo de evidências grandes o suficiente para indicar algo nesse sentido. Nessa mesma direção, no livro “As ilusões da vida. A estranha ciência do extremamente comum”, Jay Ingran relata a série de experimentos que mostram que algumas pessoas, realmente possuem a capacidade de dizerem, a distância, se estão sendo observadas por outrem.

“Os olhos não vêem, quem vê é o cérebro”. Já ouvi essa afirmação muitas vezes e ela é completamente verdadeira (mas também já ouvi de neurocientistas a explicação de como nossa visão do mundo se organiza dentro de nossas mentes e garanto pra vocês que pode ser mais fantástico do que um jogo de Tarot). Está tudo na nossa capacidade de perceber o mundo. E essa capacidade é limitada por nossos cinco sentidos. Cinco?

É verdade que eu não conheço nenhum outro, mas durante muito tempo eu também tive dificuldade para entender como os físicos conseguiam pensar em 10, 11 dimensões (depois de muito tempo e muito esforço, comecei a conseguir entender a 4ª dimensão: o tempo). Hoje em dia consigo pelo menos assistir a um documentário da BBC sobre a Teoria das Membranas, a mais nova sensação entre os físicos para explicar o universo, e entender quase tudo. De qualquer forma não acho sadio acreditar que nossos sentidos são suficientes para percebermos o mundo como ele deve realmente ser. Alguns animais conseguem, por exemplo, enxergar comprimentos de luz no ultravioleta. Com ajuda de equipamentos especiais nós também podemos ver fenômenos de fluorescência de UV. Imagina como seria uma imagem do mundo se pudéssemos ver o UV emitido e refletido pelos objetos? Qual seri
a a ima
gem que teríamos do mundo se tivéssemos outros sentidos para captar outros tipos de energia que estão pairando pelo universo?

Um cientista não pode ser permitir fechar os olhos, ou os outros poucos sentidos que têm, para perceber a coisas que não pode explicar no. Corre o risco de perder o NOVO. Aceitar o novo pode ser difícil, mas é inevitável. E talvez por isso, é brilhante! Mas o que é esse novo que estou me dispondo aceitar?

“Há mais entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã sabedoria” disse Shakespeare. É pouco provável que você encontre um bom xamã. No seu livro “A imortalidade” Kundera discorre sobre a limitação física do corpo humano e usa um aceno de mão como partida para mostrar que nossos gestos se repetirão inevitavelmente em outras pessoas, por uma simples limitação biológica. O lugar comum entre os humanos é mais comum do que imaginamos. Chico Buarque deveria ser o maior Xamã de todos, afinal, quem não se identificou, tantas vezes, com o que ele diz em suas canções? Chico Buarque também é um grande epidemiologista da humanidade!

Assim como encontramos médicos que são melhores ou piores epidemiologistas, você pode encontrar xamãs que sejam melhores ou piores epidemiologistas. Deixe ele desenhar o circulo dele, mas desenhe você o seu. Mas dependendo de quão bom epidemiologista você é para com você mesmo, esses caras podem realmente ser de muito pouca ajuda.

Mas, digamos que você cruze com um xamã de verdade no seu caminho. Alguém que, como o inseto que eu falei, vê com outros sensores o que nós não conseguimos ver. Nesse momento, se o coração e a mente estiverem abertos, pode ser que a gente aprenda a ver um pouco mais também, dentro do círculo de possibilidades infinitas.

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