Posso tirar uma flor da árvore?
É uma pergunta que comporta um simples sim ou não como resposta, mas seria um desperdício, por que há tanto para se falar sobre esse assunto.
Vou fazer outra pergunta (daqui a pouco eu chego lá no ponto que interessa). Os elefantes podem tirar flores de árvores? Ou melhor, os elefantes podem derrubar árvores inteiras quando em manada correm pela savana (ah… você achava que eles desviavam)? Sendo mais delicado, é certo que abelhas retirem o néctar das flores? É errado que cupins alterem a paisagem dos pastos construindo cupinzeiros?
Uma das questões que se esconde por trás de retirar uma flor da árvore é a existência de certo ou errado na natureza, que como eu já falei antes, não existe. O que existem são estratégias que se mostram viáveis (eficientes) ou não em longo prazo.
O homem não deveria ser nem melhor, nem pior que o elefante, ou a abelha, que não estão nem ai pra natureza. Pra eles não existe certo ou errado. Mas eles puderam, por tentativa e erro, ao longo do tempo, descobrir se uma estratégia era viável ou não. Se pensarmos em TODAS as espécies que já habitaram o planeta terra, 99,9999% já se extinguiram. É um número bastante impressionante e mostra que o homem, por mais que esteja acelerando esse processo, não muda o fato que, assim como a morte é a única certeza da vida para um organismo, a extinção é a única certeza de uma espécie. Independentemente (e inclusive) do homem.
Os eventos que consideramos danosos a natureza (radiação, contaminação, incêndios, competição) sempre foram importantes mecanismos para controlar o tamanho das populações e criar a variabilidade que, eventualmente, gerou a grande biodiversidade que encontramos hoje no planeta.
A inteligência humana ainda não foi capaz de compreender como funciona a sua consciência, mas permitiu o homem desenvolver um ego grande o suficiente para se considerar à parte da natureza. Algo do tipo “bicho é bicho, gente é gente”. O que vem do homem não é natural. Que besteira!
Essa idéia tem levado a noção de que o homem é que está destruindo a natureza. De que somos os “vilões” e que estamos “errados”. Só que julgamos esse “errado” de acordo com a moral judaico-cristã predominante no mundo ocidental. Para reparar esses “erros” criamos parques nacionais, reservas biológicas e áreas intocadas, para compensar a destruição que fazemos em todos os outros locais. No entanto, a moral judaico-cristã não se aplica a natureza! Não é muito diferente do que fazer sacrifícios aos Deuses para que um vulcão não entre em erupção. E o vulcão… insensível ao sacrifício… explode do mesmo jeito!
Ainda que o homem esteja fazendo algum estrago, se considerarmos as mudanças pelas quais o planeta passou nos últimos 3 bilhões de anos, vemos que o potencial do homem para destruir a Terra é bem menor, muito menor, extremamente menor, do que o potencial da Terra para destruir o homem. Toda a humanidade! Se você não acredita em mim, pense nos últimos tornados, ciclones, secas, enchentes, terremotos e tsunamis. Na verdade, as áreas do planeta que apresentam maior diversidade de animais e plantas não são os parques e reservas. São justamente aquelas áreas onde comunidades humanas tradicionais (índios, ribeirinhos…) coexistem com a natureza.
Retirar uma flor da árvore, para qualquer fim que seja, não é errado. E não vai causar um desequilíbrio ecológico. Então enfeite sua mesa, enfeite sua vida!
Por que a Serra é dos Órgãos?
De acordo com os sites consultados, a reposta pode ser resumida nesse parágrafo extraído da revista Terra: “Um pouco mais à frente, através de uma trilha secundária, chega-se ao ponto conhecido como Portais de Hércules, onde se descortinam, subitamente, os picos que revelam a origem do nome da cadeia de montanhas. Pontiagudos, e dispostos paralelamente, o Dedo de Deus, o Dedo de Nossa Senhora, o Cabeça de Peixe, o Santo Antônio, o São João, o Verruga do Frade, o Agulha do Diabo e o Garrafão parecem mesmo os majestosos tubos de um órgão de igreja.”
Com a licença de Lavoisier, “Nada se cria, tudo se copia!”
A invasão dos percevejos!
Uma amiga querida me perguntou, já que eu era o biólogo, por que sua casa foi invadida por percevejos. Apesar de ser um biólogo apaixonado, que de vez em quando se espanta com o quanto às pessoas desconhecem do que é ser biólogo, o mais engraçado nesse momento seria criar uma teoria mirabolante para responder a mirabolante pergunta. De acordo com um outro amigo querido, filosofo (na verdade dono de buteco, o que é quase a mesma coisa): A versão verdadeira deve ser sempre aquela que for a mais engraçada!
Essa amiga se interessou pelo assunto e foi a Internet (o Oráculo) a procura de informações. Descobriu que os percevejos são insetos do filo Arthropoda; classe Insecta e da ordem Hemíptera (a mesma dos besouros). Como insetos, possuem 3 pares de patas (ao contrário dos aracnídeos, do mesmo filo, mas de outra classe, que possuem 4 pares de patas). Os sites a assustaram, falando sobre percevejos sugadores de sangue que adoram fazer ninhos nas camas. Na verdade esses insetos são caseiros, mas de diferentes tipos. Alguns voam, outros não, e nem todos fazem ninhos nos colchões (menos ainda nos chuveirinhos higiênicos dos banheiros) e nem todos sugam sangue. A sua principal característica, o cheiro desagradável, é justamente a sua ferramenta pra espantar os outros. Por outros, leia-se, seus inimigos, competidores e predadores.
Mas o que faz com que uma casa seja invadida por percevejos? Um desequilíbrio ecológico? É a pergunta e também a resposta mais natural, mas não necessariamente a correta.
Vemos o dano que os desequilíbrios ecológicos vem causando por todo planeta: Aquecimento global, falta d’água potável, furacões e tsunamis, derretimento da calota polar, mosquitos mutantes… Mas geralmente os vemos em noticiários leigos e sensacionalistas.
A primeira coisa que temos de descobrir é se realmente ouve uma invasão de percevejos. Os ovos de muitos insetos se parecem, e podem ser confundidos. O odor característico dos percevejos pode permanecer em um ou mais cômodos da casa mesmo quando os animais, que estavam de passagem, já foram para outro local. A segunda coisa é saber se é um evento isolado. Seus vizinhos foram invadidos por percevejos? A rua? Saiu na televisão?
O mais provável é que não tenha havido desequilíbrio ecológico. A maior parte dos insetos é oportunista. Quando encontra um ambiente favorável, um nicho ecológico desocupado, sem predadores e com oferta de alimento, se instala e explora o ambiente, tentando se reproduzir rapidamente (alguns machos humanos adoram fazer o mesmo em bares!). Mas o que leva a esse nicho estar desocupado? Provavelmente nunca poderemos responder.
Apesar disso, certamente deve existir uma razão: um filho que foi passear no parque trouxe ovos ou mesmo uma fêmea grávida na roupa e, tirando a camisa na sala depois do jantar, deixou os bichinhos perto de alimento e abrigo: tudo que eles precisam pra desencadear um processo de “o ambiente está propício para novas gerações, vamos reproduzir”. Mas também pode ter sido o cachorro do irmão que veio passar o final de semana, ou um pássaro que pousou no terraço. Quem pode saber?
O acaso é uma ferramenta poderosa, mas vamos deixar pra falar dele um outro dia.
Incoerente?! Eu?!
É verdade que os problemas que enfrentamos são mais complexos do que isso simplesmente jogar bola ou ir a praia. Mas vamos manter o exemplo e complicar um pouco a situação: você prefere ir a praia se estiver sol, mas e se chover? Chovendo, deve ser melhor ir ao cinema. Mas e se você não sabe se vai chover? Melhor ir pra praia e arriscar? Ou ir ao cinema e correr o risco de perder o dia de sol, mas se divertindo sem o risco de passar frio?
Bom, agora entra em cena outra questão, a ‘propensão ao risco’. Esse fator é ainda mais variável. Principalmente por que a propensão ao risco da chance de ganhar e do premio. Em geral, quanto maior o ganho (ou melhor o premio), maior o risco que a pessoa está disposta a correr. Mas isso pode mudar se as chances de ganhar forem pequenas. A propensão ao risco varia de cultura para cultura e de pessoa para pessoa, mas se ela depende das chances, podem variar até para a mesma pessoa. Nesse caso, dependendo do risco, o premio pode deixar de ser interessante. Parece lógico? Pode (até) parecer, mas a conseqüência é a falta de coerência. E falta mesmo!
Dependendo do premio e do risco, a coerência… flutua!
Bom, e agora?! Como viver nesse mundo cheio de pessoas INCOERENTES? Não é fácil. Desde pequenos vivemos em um mundo dicotômico (dia e noite, muito e pouco, etc) e somos ensinados a escolher entre ‘certo’ ou ‘errado’. Nunca pudemos dizer: tenho 70% de certeza de que tenho a resposta certa.
A forma que o ser humano elegeu para lidar com a incerteza dos eventos foi eliminá-la, ao invés de aprender a lidar com ela. Como eliminar a incerteza é impossível (vocês já ouviram falar do principio de incerteza de Heisenberg?), agora temos de nos re-educar para lidar com ela. Mas não dá pra, depois de macaco velho, sair por ai calculando probabilidades e montando árvores decisórias pra decidir se vamos passar as férias na montanha ou na praia. O que podemos é, sabendo que os eventos são incertos e que as pessoas são incoerentes, propormos escolhas mais flexíveis (até para nós mesmos). Quanto menos você colocar uma situação entre certo ou errado, menos pressão vai colocar sob a pessoa que deve decidir. E mais fácil vai ser (deveria ser) a decisão. Não é coerência, é ciência!
PS: De acordo com diversos estudos, só um elemento consegue generalizar a coerência nos seres humanos. Dinheiro! (apostos que vocês pensaram que eu ia falar sexo!) Repita o teste do ‘se A é melhor que B e B é melhor que C, então A é melhor que C’; substituindo os eventos por quantias monetárias crescentes. Todos os participantes do teste concordarão e serão coerentes: uma quantia maior é sempre preferível a uma quantia menor.
Por que algumas mulheres (homens) só atraem homens (mulheres) malucos(as)?
Cientificamente, os homens fazem parte do grupo que chamamos de estrategistas ‘r’. O ‘r’ é minúsculo mesmo e representa o valor do coeficiente de crescimento exponencial de uma população que nunca chega ao equilíbrio. Mulheres são estrategistas K, maiúsculo, e representa o valor da constante de equilíbrio de uma população quando alcança a estabilidade, em uma outra equação. Essas duas estratégias estão relacionadas com utilização de energia. Não existe estratégia certa ou errada. Existem duas formas de alcançar o sucesso reprodutivo (e evolutivo) em longo prazo. Ambas são perfeitamente viáveis (o que é mais importante que serem ‘certas’ ou ‘erradas’). Isso se não tivessem de conviver juntas!
Evolutivamente, as fêmeas acharam por bem manterem seus ovos próximos a elas, já que o custo” energético de um ovo é extremamente alto para um predador qualquer se valer dele. Acabaram por manterem seus ovos ‘dentro delas. Isso trouxe uma vantagem seríssima para as fêmeas: seus filhotes são sempre seus! Ela nunca corre o risco de cuidar de um ovo que não seja seu! O que é importantíssimo, já que o custo de manter o ovo dentro do próprio corpo e depois ainda amamentar, no caso dos mamíferos, é muito elevado.
Todo esse ‘investimento energético na gestação, fez com que as fêmeas desenvolvessem mecanismos muito seletivos para a escolha do macho. Pra gerar um filho, não poderia ser qualquer um. Tinha de ser o mais forte e com sistema imune mais eficiente. Um macho que pudesse providenciar comida e abrigo para ela e o filhote. Bom, achar um macho assim, nem era difícil, o problema era convencer ele a topar essa proposta. Basicamente a proposta é: “Me dê casa, comida e roupa lavada, por que eu juro que o filho é teu!”. Mas muitas vezes… o filho não era.
Durante um mesmo período fértil, quando o macho dava uma escapada pra buscar comida, se aparecesse outro macho, mais viril, mais forte, mais bonito ou mais resistente a doenças, a fêmea não pensava duas vezes, e dava pra ele também (de acordo com alguns cientistas, a partir desse momento começa uma ‘guerra’ entre os espermatozóides dos dois machos, dentro das trompas da fêmea. Se você quiser saber mais pode ler o livro Sperm Wars: The Science of Sex de Robin Baker).
A questão é tão séria que define promiscuidade. Apesar de muitas fêmeas humanas terem diversos parceiros ao longo da vida, elas não são promiscuas, sendo o termo reservado apenas para aquelas que tem diferentes parceiros durante o mesmo ciclo ovulatório. Ou seja: aquelas que não podem garantir quem é o pai!
Os machos para não precisarem correr o risco de acreditar em suas fêmeas, desenvolveram uma outra estratégia. Como eles efetivamente nunca teriam certeza que seus filhotes eram seus, eles resolveram investir pouca energia neles, ou melhor, em cada um deles. Produziram muitos espermatozóides, mas muitos mesmos, células pequenas, simples e que não gastassem muita energia. E jogaram com a sorte: poderia ser que uma fêmea, duas, vai lá, três se ele fosse muito ferrado, poderiam encontrar um macho mais interessante depois de terem sido fecundadas por ele. Mas mais que isso… seria difícil. Como as mulheres sabem, não tem tanto homem interessante dando sopa por ai. Bom, os machos também sabiam disso (alias, melhor que as mulheres, por isso fazem um doce de vez em quando) e por isso, resolveram espalhar seus espermatozóides pelo maior número de fêmeas possível. Só assim, estatisticamente, seus genes seriam passados adiante. De uma forma, ou de outra. E como ainda por cima eles não tem interesse em investir energia na prole que não tem certeza de ser sua, precisam fecundar um número ainda maior de fêmeas, para aumentarem suas chances de terem uma descendência.
Parece machista? Terrível? Olhe a sua volta: peixes, aves, cães e gatos… todos fazem assim, só nós queremos ser diferentes.
Agora entra o argumento óbvio: Ahh… mas nós não somos cães e gatos! Nós somos inteligentes! Mesmo os seres humanos, viveram como animais no último 1 milhão de anos. Apenas nós últimos 4-5 mil anos, começamos a nos civilizar(?). Acreditem em mim, isso não é tempo suficiente pra seleção natural agir e mudar nossa biologia.
A natureza criou as mulheres exigentes e os homens descompromissados. As fêmeas exigem qualidade e prometem fidelidade, mas… traem! Os homens… bem, os homens só traem mesmo!
Não somos malucos, mas temos regras sociais que ditam uma coisa e hormônios que exigem outra. Uma equação difícil de resolver. Somos a primeira espécie que tenta apaziguar uma guerra evolutiva entre os sexos que dura milhões de anos. E estamos pagando o preço.
Mas isso não serve de desculpa para ninguém. Temos mesmo a inteligência e a cultura, e devemos fazer uso delas. Mas se resolvermos fechar os olhos para as questões biológicas (e abrirmos muito eles para os contos de fadas), corremos o risco, simplesmente de morrer tentando. Ou pior ainda, de não trepar!
PS: Pra quem estiver mais curioso sobre os aspectos científicos do sexo e dos relacionamentos, não deixe de ler o impagável “Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor” de Allan e Bárbara Pease. E pra quem estiver muito interessado mesmo nas questões biológicas mais intrigantes (Por que as mulheres mestruam? Por que os homens não amamentam?) podem tentar ler (por que é meio chato, apesar de super interessante) “Why sex is fun?” de Jared Diamond.
Você que é biólogo…

Sempre que ouvia essa frase sentia um arrepio. Alguma pergunta idiota estava por vir. Claro, nenhuma pergunta é idiota, dirão os pedagogicamente corretos. Mas é um fato científico, algumas perguntas são idiotas! O tempo passa e sempre, SEMPRE, alguém inicia a fatídica frase: Você que é biólogo… e, talvez por que eu esteja sendo mais complacente, ou por que tenho novos amigos, ou por que meus amigos estão ficando mais interessados (e interessantes) as perguntas não são mais idiotas. Tanto que me animaram a voltar a escrever no blog simplesmente para respondê-las. Um outro motivo é eu adorar falar, especialmente pros outros, meus amigos, e amigos deles, sobre ciência. Um tipo de catequese. No último final de semana, em São Paulo, onde fui assistir a duas rodas de samba especiais, respondi perguntas sobre as marés de sizígia, com direito a explicações sobre a natureza da gravidade, e o efeito Doppler. Vejam bem que, nem sempre, ou quase nunca, as perguntas são sobre biologia, o que aumenta em muito a minha capacidade de divagar sobre o assunto, e impressionar meus amigos parecendo que efetivamente entendo de tudo. E a maior prova de que não entendo, é uma pergunta bastante pertinente, feita há mais ou menos cinco anos, quando escrevi um artigo sobre o artigo de um outro amigo, que é a chance nacional de ganhar um prêmio Nobel, sobre os mosaicos do número de cromossomos no cérebro humano. A pergunta era sobre os efeitos do álcool nos nossos neurônios. Talvez por que quisesse dar uma resposta completa e adequada ao curioso, seguramente um bêbado, acabei deixando o cara na mão. Hoje, anos depois, ainda sem uma resposta completa, vou tentar me virar pra não deixar o curioso ainda mais ansioso. Ou seja: vou fazer um misto do pouco que sei sobre o assunto com um monte de divagações e torcer pra tentar impressionar! Existem diversos estudos que mostram que o álcool causa danos diretos no sistema nervoso. Ou seja, causa a MORTE dos nossos neurônios. Por sorte, nós temos bilhões deles e podemos nos dar ao luxo de perder alguns de vez em quando por uma causa tão nobre. Muitos dos efeitos são causados pela produção de radicais livres. O álcool é metabolizado em organelas celulares chamadas peroxissomos, que entre outras coisas, ajudam a célula a se livrar do peróxido de hidrogênio, que a maior parte de nós conhece como água oxigenada. Que deixa os pelos loiros, mas dentro da célula, produz radicas hidroxila, destruindo a membrana plasmática, os lisossomos, o DNA, proteínas diversas… e por aí vai. Essa é a mais provável razão da morte celular direta (necrose) e também da indução de morte celular programada (cujo nome chique é apoptose), que é um mecanismo para evitar que células com o DNA danificado se reproduzam formando, por exemplo, tumores. Como então o vinho, consumido em quantidades moderadas, parece ter um efeito benéfico a saúde? Por que apesar do álcool, o vinho é rico em substâncias antioxidantes. Que combatem os radicais livres. Não só os produzidos pelo efeito do álcool, mas aqueles outros produzidos no corpo diariamente. Está comprovado que pessoas que vivem em regiões (sul da Europa) que tradicionalmente consomem mais vinho, tem menos derrames e doenças do coração. Por outro lado, uma série de experimentos com camundongos demonstram, claramente, que o álcool afeta o equilíbrio e, principalmente, a memória de curto prazo. Nos famosos experimentos com labirintos, onde os camundongos mostram sua capacidade de “decorar” o caminho, os bichinhos que consomem álcool se enrolam todos pra chegar do outro lado. Nada que a gente precise de cientistas em laboratório pra já ter descoberto! E nem adianta comprar Ginkgo Biloba pra compensar. Os camundongos que tomaram o remédio não melhoraram em nada a sua performance no labirinto. Ou seja: é placebo! Quer um consolo: cigarro faz muuuuuito mais mal que o álcool. Quer uma solução? Sexo! O coquetel de hormônios produzidos pela excitação sexual e pelos orgasmos contribuem, entre outras coisas, pra aumentar nossas defesas imunológicas e antioxidantes. Mas se você beber até cair…
A Ciência Jovem do Rio de Janeiro
(carta publicada no Jornal da Ciência e no JC e-mail 2975, de 15 de Março de 2006).
Da relatividade de Einstein à estrutura do DNA de Watson e Crick, as mais brilhantes descobertas científicas do século XX foram realizadas por pesquisadores com menos de 40 anos de idade.
No Brasil, Carlos Chagas tinha apenas 31 anos quando descreveu a doença que recebeu seu nome. César Lattes tinhas apenas 23 anos quando participou da descoberta do méson pi, uma subpartícula do átomo. Ainda antes dos 40, Rocha e Silva e Pacheco Leão fizeram avanços enormes, respectivamente, na farmacologia e neurobiologia.
Os fatos não são mera coincidência, trata-se de uma das fases mais produtivas da carreira de um cientista. Apesar disso, agências de fomento possuem poucos programas que efetivamente apóiam o pesquisador em início de carreira.
Atualmente, a Fundação Carlos Chagas Filho de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) possui três programas voltados para jovens pesquisadores: o Auxílio Instalação, Primeiros Projetos e o Jovem Cientista do Nosso Estado.
Embora iniciativas importantes e algumas inéditas até então no Brasil, esses programas apresentam financiamentos insuficientes, onde os repasses são excessivamente fracionados ou carecem de continuidade.
O “Auxílio Instalação” é destinado a jovens doutores já inseridos no mercado de trabalho e aptos a iniciar suas atividades em uma instituição científica sediada no estado.
A proposta é interessante, mas nos moldes atuais apresenta-se ineficiente, já que poucos cientistas estão instalados até dois anos após o término do doutoramento, como exige o edital.
Nos últimos cinco anos, somente 90 pesquisadores receberam tal auxílio. Além disso, o valor oferecido (R$ 5.900,00) é irrisório frente às necessidades de um pesquisador iniciando suas atividades profissionais.
Uma forma alternativa de aplicar recursos de tal ordem seria a criação de um “auxílio publicação”, através do qual o jovem pesquisador precisaria apresentar resultados antes de solicitar os recursos, que seriam aplicados em experimentos pontuais, necessários à finalização de uma determinada publicação.
O programa “Primeiros Projetos” foi a proposta da nova Diretoria da Faperj para remediar a falta de apoio aos jovens pesquisadores. Entretanto, o edital apresentava critérios de elegibilidade muito amplos e não trazia definição clara do que viriam a ser “primeiros projetos”. Com isso, cientistas já estabelecidos, detentores de linhas de pesquisa próprias e em andamento, foram também contemplados.
Dos 1.135 candidatos, mais de 50% tinham idade superior a 40 anos. Apenas 1/4 desses projetos (277) foram aprovados. Os valores médios de R$ 25.000,00, apesar de ainda baixos, estavam de acordo com a faixa de recursos oferecidos pelo CNPq em editais como o Universal. Entretanto, até o momento somente 3/4 dos recursos foram repassados aos contemplados.
O programa “Cientista Jovem do Nosso Estado”, criado a partir da sugestão de jovens pesquisadores da UFRJ, fornecia auxílio mensal destinado à manutenção de laboratórios de pesquisa.
Esse programa, muito bem recebido pela comunidade científica, beneficiou em torno de 300 pesquisadores, todos com até 40 anos de idade. Mas, infelizmente, não houve continuidade e somente dois editais foram lançados desde sua criação em 2000.
A consolidação do estado como centro de inovação tecnológica e desenvolvimento industrial é apenas viável na presença de uma sólida malha de recursos humanos capacitados a gerenciar o conhecimento produzido.
Para isso, é crítico o investimento em pesquisa em áreas básicas e aplicadas na tentativa de dar suporte às diversas linhas, intimamente associadas à C&T, que vem encontrando ressonância no estado como metalurgia, siderurgia, biotecnologia, fármacos, software, dentre outras.
Jovens cientistas são fundamentais para atender a demanda crescente dessas áreas e para fortalecer a Ciência e Tecnologia do estado frutificando em novos serviços, produtos e empregos e, em última instância, melhorar a qualidade de vida da população do Rio de Janeiro.
A ciência fluminense é capaz de sobreviver a vários percalços devido à construção, nos últimos 30 anos, de uma massa crítica consistente. Entretanto, a falta constante de apoio ao jovem pesquisador pode impedir o crescimento e comprometer o investimento feito ao longo desses anos.
É urgente uma reestruturação dos programas de apoio a cientistas recém-estabelecidos, evitando-se a pulverização de recursos.
O novo Conselho Superior da Faperj acaba de tomar posse, formado por quatro representantes do governo estadual e apenas um representante das entidades de pesquisa.
A participação de jovens pesquisadores no Conselho poderia incrementar a representação da comunidade científica na Faperj e contribuir para a criação de formas mais eficientes de apoio a pesquisadores em início de carreira, permitindo sua inserção definitiva na ciência fluminense.
Assinam:
Mauro Rebelo, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, UFRJ
Stevens Rehen, Instituto de Ciências Biomédicas, UFRJ
Milton Moraes, IOC-Fundação Oswaldo Cruz
Marcelo Einicker Lamas, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, UFRJ
Jennifer Lowe, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, UFRJ
"Disseram que eu voltei americanizada"

Pergunto isso por que um amigo biólogo, certamente futuro premio Nobel, acaba de voltar definitivamente para o Brasil após um par de anos nos EUA. Cara… o cara anda no carro sentado no banco do carona segurando na maçaneta, fechando os olhos e eriçando a espinha; totalmente assustado com o transito no Rio. Quer sair da UFRJ antes do sol se por com medo dos tiroteios, prefere não sair de noite e não conhece mais as ruas por onde passa.
Não, ele não é um nerd. Esse cara toca percussão numa banda de Reggae formada por outros cientistas, pega onda de pranchão e é campeão de volei da biologia. Mas acho que as paranóias americanas afetaram ele.
Fiquei pensando em todos os meus amigos cientístas e na variedade de perfis. Incluindo o meu.
Tem o prático. Gosta da ciência mas gosta mesmo é de viver a vida. Foi morar na Suécia porque lá tudo funcionava e o tempo que a gente gasta a mais no laboratório porque falta luz, falta água, ou um equipamento não funciona; ele faz curso de fotografia, computador, e sueco. Se casou com um suéca e tem uma filha linda. Hoje mora na Inglaterra, onde tudo também funciona.
Tem o correto. Quebra a cara porque nunca usa o dinheiro de um projeto em outro. Passa meses esperando que as coisas funcionem pelos caminhos corretos. É preocupado com os aspectos sociais de tudo que faz. Brilhante pesquisador, descobriu a causa das mortes em uma clínica com problemas no tratamento da água mas, como quis fazer tudo correto, a chefe dele quem levou o crédito. Se casou com uma promotora e mora no interior de Pernambuco.
Tem o carismático. O cara consegue tudo com seu carisma. Bons alunos, bons colaboradores. Mas como só carisma não basta, trabalha como um condenado. Faz um monte de coisas ao mesmo tempo, mas como é muito competente (como todos os outros) consegue fazer tudo e tem dois artigos publicados na Nature. Não fica entediado: “seu nome é trabalho!” Esse canta na banda de Reggae, tem duas filhas pré-adolescentes e é casado com uma dançarina de Flamenco expetacular.
Tem o certinho. Nosso amigo americanizado gasta tanto tempo montando sua agenda que eu não consigo imaginar qeu sobre tempo pra fazer o que tem de ser feito. É talvez o mais brilhante de todos, mas atravancado pelas correntes que o aprisionam. Explico: no colégio tinha uma caneta de cada cor para sublinhar (com régua) as informações de acordo com o tema ou importância. Também é carismático, mas faz o tipo discreto (e um sucesso…). É casado com uma cientista.
Tem o meu tipo. Fica difícil eu mesmo me definir. Acho que trabalho por pulsos. Fico atolado com milhares de coisas pra fazer durante muito tempo, e depois, em pouco tempo, resolvo tudo. Sou dedicado, mas não muito. Conto com meu jogo de cintura e acho que sou muito criativo. E que esse é meu grande trunfo perto desses monstros consagrados que trabalham pra caramba. Cultivo a amizade deles como ouro e não sou casado.
O que eu não posso deixar de falar é que nosso só voltou americanizado porque voltou. E voltou porque quis voltar. Fez questão. Ama o Rio, ama a família que está no Rio. Ama o Brasil e faz de tudo pela ciência brasileira.
Massa de modelar
Desci pra tocar café da manhã. Toda 2ª feira as 10:00h tem Bagels and coffee pra enturmar o pessoal. Antigamentee, quando as revistas eram apenas em papel, esse era também o momento de ver as novas edições. Como os caras aqui tem grana, eles continuam tendo algumas revistas impressas. E foi assim que eu me deparei com a capa de um número da Nature falando de “Intelligent design” (veja o artigo na integra aqui). Não, não tem nada a ver com uma nova arquitetura planejando melhor novos ambientes. Apesar do criacionismo ter muitos adeptos entre pais e políticos americanos (e aparentemente no Rio de Janeiro), ele encontra dificuldade para se difundir nas universidades. Apesar disso, com a educação religiosa que muitos estudantes de ciência receberam em algum momento de suas vidas (independentemente da religião), existe um choque entre a bagagem que trazem e as informações que recebem quando iniciam seus cursos. Independentemente de serem ciências físicas, químicas ou biológicas.
A nova teoria tenta reconciliar a experiência religiosa de cada um com os novos conhecimentos científicos, mas adventa que os fenomenos que observamos no dia a dia de nossos laboratórios ou no ambiente natural, tem explicações científicas, mas são “guiados”, “conduzidos”ou “orientados” por uma “força superior”, Deus.
Esse pensamente fere profundamente a razão científica e deve ser duramente rejeitado.
Atualmente, a maior parte dos cientistas concorda que Ciência e Religião tem de continuar separados (é curioso como muitos desses mesmos cientistas conseguem fazer essa separação em suas vidas, já que conduzem suas pesquisas de maneira cética, mas acreditam em forças superiores em suas vidas particulares). Quantas conquistas a ciência proporcionou a humanidade? Quantos milagres Deus presenteou os seres humanos?
Enquanto muitas pessoas acreditam que suas vidas não tenham sentido a não ser a luz de um projeto maior coordenado por uma força superior, a vida passa. E preocupados com o que vem após a morte, esquecem de viver a vida. John Lennon já dizia “Life is what happens while you’re busy making other plans”